HELICOVERPA

O incômodo das lavouras


Praga descoberta no começo de 2012 ainda causa dor de cabeça e prejuízos aos produtores de soja, milho e algodão, principalmente da região oeste baiana. Para amenizar esta situação, governo cria sistema de manejo emergencial.

Ataques severos de lagartas nas principais culturas da região do Cerrado têm sido relatados por produtores, especialmente na porção oeste baiana. Esta é a constatação da pesquisa, “Ações emergenciais propostas pela Embrapa para o manejo integrado de Helicoverpa spp em áreas agrícolas”, fruto de uma reunião de pesquisadores da entidade, divulgado em abril deste ano, acerca das últimas safras do País.

A suspeita predominante recai sobre a ocorrência de populações de Spodoptera frugiperda e Helicoverpa spp. (Lepidoptera: Noctuidae) causando, conforme sua especificidade, danos em cultivares que possuem genes que expressam proteínas Bt supostamente resistente a essas pragas. O gênero Helicoverpa é composto por diversas espécies altamente destrutivas, devido a suas características biológicas (polifagia, alta fecundidade, alta mobilidade local das lagartas e migração das mariposas) que lhe permite sobreviver em ambientes instáveis e adaptar-se a mudanças sazonais do clima. Práticas emergências de manejo como, aplicação de produtos disponíveis, que são considerados de média eficiência, acompanhamento das áreas com ataque e destruição dos restos vegetais, são pontos que ajudarão a reduzir a incidência desta lagarta, cuja ocorrência foi observada a partir de fevereiro de 2012 em níveis populacionais nunca antes registrados, causando sérios prejuízos econômicos em milho, algodão, soja, feijão comum, caupi, milheto e sorgo. No País, há também relatos de ataques em tomate, pimentão, café e citros, dentre outras plantas.

Um dos pesquisadores que fez parte da criação deste documento é Ivan Cruz, da Embrapa Milho e Sorgo, localizada em Sete Lagoas (MG), que declara que a taxonomia (ciência que lida com a descrição, identificação e classificação dos organismos, individualmente ou em grupo) desse gênero é complexa, inédita no Brasil e requer conhecimentos muito específicos de suas estruturas reprodutivas. “Na safra 2012/2013”, explica Cruz, “em amostras originárias de lavouras de soja, milho e algodão a Embrapa identificou, com base na genitália masculina e na análise molecular de adultos, a espécie exótica Helicoverpa armigera”. Segundo ele, a entidade considera que o crescimento populacional dessas lagartas e consequentes prejuízos aos sistemas de produção foram ocasionados por um processo cumulativo de práticas de cultivo inadequadas, caracterizadas pelo plantio sucessivo de espécies vegetais hospedeiras em áreas muito extensas e próximas uma das outras. Além disso, o manejo das lavouras estava associado a práticas inapropriadas no uso de defensivos agrícolas. “Isso tornou o agroecossistema progressivamente suscetível a doenças e aos insetos-praga devido à farta disponibilidade de alimentos, sítios de reprodução e abrigo durante quase todo o ano”, avalia.

A pesquisadora da Fundação de Apoio à Pesquisa Agropecuária de Mato Grosso (Fundação MT), Lúcia Vivan, comenta que o Estado da Bahia apresenta população de Helicoverpa atacando a cultura do algodão superior em relação a Mato Grosso, por ter ocorrido períodos de veranico prolongados. “Em MT, só a partir de fevereiro deste ano se observou a alta incidência de populações no algodoeiro”. E foi a partir desse período que os danos s tornaram visíveis, principalmente com ataque em flores, botão floral e maçãs.

Partindo da mesma opinião de Vivan, o diretor da Associação Baiana dos Produtores de Algodão (Abapa), Celito Breda, diz que além da Bahia, onde há a maior incidência da lagarta, os Estados do Piauí, Goiás e Tocantins, registram um ataque de nível mediano em suas lavouras. “Esta praga está assombrando todos os produtores destas três culturas, em todos os grandes polos brasileiros”, declara. Ele revela que em outros locais como o Rio Grande do Sul, Paraná, São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Ceará e Maranhão, o registro dos ataques tem sido menor.


Duro de matar

Considerando a insustentabilidade ecológica e econômica dos sistemas agrícolas produtivos, ainda segundo os dados da pesquisa, a Embrapa faz, em caráter emergencial, algumas sugestões e recomendações, tais qual o estabelecimento de um consórcio para manejo de Helicoverpa. Esta ideia é projetada pensando na próxima safra, 2013/2014, e consiste em estabelecer um alerta para a ocorrência dessa praga. Além disso, o mesmo poderá também ser utilizado para o alerta de outras pragas de importância para os cultivos agrícolas brasileiros. “A partir daí, sugerimos a criação de um grupo, em formato de consórcio, composto por profissionais de múltiplas disciplinas, de instituições públicas e privadas, empresas de pesquisa, universidades, indústrias de produtos químicos e biológicos, entre outros”, declara Cruz. O pesquisador diz que o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), será o responsável pela coordenação do consórcio que também terá como objetivo capacitar profissionais sobre o manejo integrado de pragas (MIP) e manejo de resistência de plantas transgênicas que expressam toxinas Bt. “Este sistema está sendo criado para evitar que continuem os estragos que as plantas sofrem em função da quantidade de agroquímicos utilizados para tentar combater a praga”.

Cruz revela que só na região oeste da Bahia, houve perda de 1,3 milhões de hectares de soja, 300 mil de algodão, e aproximadamente 180 mil de milho. “No começo, os produtores não estavam conseguindo combater os insetos com a pulverização normal. Com isso, houve grande mobilização de quem trabalha no combate a eles”. A Helicoverpa armigera é uma praga do tipo A1 e é muito comum na Austrália e África. “Ainda não se sabe como ela chegou ao Brasil”, diz.
Breda complementa que além destas perdas por área, na região citada ocorreu um custo adicional, em função do aumento de aplicação de inseticidas, de 100 US$ por hectare para a soja e 400 US$ na lavoura de algodão. O diretor da Abapa conta que para reduzir este prejuízo causado, os produtores de algodão devem continuar aplicando os produtos disponíveis, que são considerados de média eficiência. “Quando chegar um produto novo, com maior eficácia, poderemos reduzir as populações desta praga em tempo, no final do ciclo”. Para ele, esta ação ajudará a diminuir as populações resistentes aos atuais inseticidas, assim, as possibilidades de um grande ataque da praga para a safra 2013/2014, serão menores. Quanto a recuperar o que foi perdido, Breda afirma que a cultura do algodão ainda permite que isso aconteça em parte do plantio, se chover bem até final de abril. “As posições do baixeiro da planta, perdidas pela praga, poderão ser recompostas no ponteiro das plantas, mas não de uma forma total”.

Já para Lúcia, é importante que o produtor acompanhe as áreas com ataque e destrua os restos vegetais. “Como a fase de pupa no solo é viável realizar um revolvimento”, diz. Além disso, rotacionar inseticidas com modos de ação distintos ao longo do ciclo agrícola pode minimizar o risco de evolução da resistência. Segundo a pesquisadora que também é pós-doutorada em entomologia, adotar práticas de preservação de inimigos naturais da praga é fundamental, assim como, monitorar a população e realizar controle na cultura do milho, para que não haja migração para outras plantações. “É bom e torna-se eficaz intensificar o uso de culturas Bt com duas proteínas, a fim de evitar a evolução da Helicoverpa”.

Cruz lembra que todas estas práticas de manejo devem buscar ter impacto mínimo na atmosfera, senão os produtores terão mais problemas e mais trabalho a fazer. “Eu digo que o manejo emergencial integrado, é o mesmo que dizer uso racional de todas as técnicas exigentes para diminuir prejuízos das principais pragas que atingem o milho, soja e algodão, sem causar grande poluição no ar”, finaliza o pesquisador.



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