De olho nas promissoras perspectivas do mercado de proteína animal, Jorge Espanha, diretor-presidente da Zoetis Brasil, antiga unidade de Saúde Animal da Pfizer, avalia que a pecuária brasileira está em plena tendência de incremento tecnológico em função da própria melhoria dos índices produtivos. Em entrevista ao repórter Fábio Moitinho, o executivo traça o perfil do mercado e alerta para a adoção de novas tecnologias nas áreas de genética, reprodução, nutrição, controle e prevenção de doenças para a garantia da competitividade.
Revista Rural – Qual a opinião do senhor acerca dos resultados que o Brasil tem registrado na bovinocultura de corte brasileira? No contexto atual, muitos criadores se veem desanimados com altos custos da alimentação, por exemplo. Isso de certa forma prejudicaria investimentos por parte de produtores nas áreas de sanidade e reprodução animal?
Jorge Espanha - Em 2012, os pecuaristas enfrentaram um período em que foi preciso adequar as expectativas e refletir como reverter esse cenário, uma vez que a bovinocultura representa um setor forte e de destaque para o País no exterior. O pecuarista, além de buscar o aumento da produtividade e, principalmente, tentar reduzir custos vem se preocupando em manter a qualidade, o que é sempre um desafio.
O aumento de insumos, custos de mão de obra e concentração dos frigoríficos vem apertando as margens do produtor. A produtividade passa a ser importantíssima na sustentabilidade econômica da atividade. Não obstante, a procura e a adoção de tecnologias vão depender muito da conscientização e do estilo de atuação do produtor. O empreendedor, por exemplo, é mais voltado para o uso de produtos inovadores e leva em conta o retorno do investimento. Há o pecuarista neutro, que usa tecnologia somente quando precisa, em momentos delicados e pontuais, quando as práticas que emprega tradicionalmente já não resolvem. Existem ainda os pecuaristas tradicionais, que não utilizam determinadas tecnologias de maneira rotineira, mas adotam tais tecnologias porque são influenciados por alguém que lhes deu uma dica. E, finalmente, há aqueles pecuaristas que têm um orçamento bastante limitado e não investem em tecnologia. Portanto, não se pode avaliar o pecuarista de uma forma generalizada. Mas é notório que o crescimento do uso de produtos veterinários para controle de doenças e para aumentar a produtividade, seja na pecuária de corte ou de leite, bem como para melhorar os índices de reprodução e da genética, demonstra claramente que o pecuarista está aberto a novidades para conquistar mercado.
Rural – Dois segmentos, o de frango e o de suínos, conquistaram a padronização de produtos e de níveis tecnológicos em termos genéticos e de manejo. Na opinião do senhor a que isso se deve?
Espanha – No caso da avicultura, a flutuação no custo de produção, devido aos preços dos grãos, tem exigido do setor uma forte estruturação para que a otimização dos investimentos em aditivos, vacinas e nutrição traga o maior retorno possível. Hoje, não é o aditivo mais barato que produz o melhor resultado financeiro, mas sim aquele que promove o maior retorno ao produtor. Além disso, as restrições do mercado externo por meio de barreiras não tarifárias como, por exemplo, o controle de salmonelas, apresenta novos desafios à produção, exigindo um nível de controle e excelência nas tecnologias usadas para esse fim. Consequentemente, temos um aumento da exigência ao setor e uma melhora na qualidade do produto final oferecido. No caso da suinocultura, o Brasil, tem ganhado ainda mais importância, principalmente, no mercado internacional, por algumas vantagens comparativas que tornam a atividade competitiva no cenário externo. Com um sistema produtivo baseado na integração vertical, demanda pelas agroindústrias, e com disponibilidade de insumos básicos para a produção, principalmente de grãos essenciais como soja e milho, e investimentos em tecnologia, a produção de suínos no Brasil apresenta custos inferiores aos principais competidores mundiais. Assim, o País vem se consolidando como um importante player no mercado mundial de carne suína e com potencial para ampliar ainda mais sua participação relativa nesse mercado. Como consequência, a cadeia produtiva tem se organizado no sentido de atender a demanda do mercado externo e prospectar novos mercados, investindo na padronização de produtos e de níveis tecnológicos em termos genéticos e de manejo.
Rural – Pesquisas fazem um paralelo entre a adoção de tecnologia nas áreas de agricultura e bovinocultura de corte. A primeira apresenta um nível alto no uso de tecnologia, chegando a cerca de 80%, ao passo que, para a segunda, o nível de adoção no País beira os 40%. O senhor também percebe esse baixo índice na área de pecuária ou esse quadro está se invertendo?
Espanha – Acredito que esse quadro está sendo revertido, principalmente, porque a modernização e a atualização tecnológica na bovinocultura configuram um processo natural, que acompanha a atualização científica presente em outras áreas de conhecimento. A Zoetis tem entre suas premissas o investimento constante em pesquisa e desenvolvimento, alinhado às necessidades dos mercados regionais e priorizando sempre a inovação – um dos principais atributos associados à identidade da companhia. Esta diretriz se reflete no lançamento de produtos pioneiros, que muitas vezes modificam as categorias em que atuam e, consequentemente, levam a um reconhecimento e confiança na marca por parte dos pecuaristas. A bovinocultura é hoje o segmento de maior representatividade dentro dos negócios da companhia no País. Por conta disso, visitamos mais de sete mil fazendas por mês, num total de cerca de 38 mil visitas por ano. Essa presença intensa e contínua no campo é tão importante quanto a preocupação com Pesquisa e Desenvolvimento, pois é por meio desta troca que temos o retorno sobre a aplicação das nossas soluções e que podemos identificar as necessidades específicas de cada mercado, antecipando tendências.
Rural – Qual a saída para a produção de carne bovina se fazer mais competitiva?
Espanha – A produção se tornará ainda mais competitiva na medida em que os pecuaristas adotarem os avanços significativos na saúde e na produtividade dos animais, alicerçados principalmente por novas tecnologias nas áreas de genética, reprodução e nutrição, além da adoção de novas ferramentas para controle e prevenção de doenças que acometem os bovinos. É importante ressaltar que todos esses fatores - genética, nutrição e sanidade - merecem a mesma atenção dentro de uma propriedade. Maior qualidade tem que vir com a remuneração por parte dos frigoríficos.
Rural – Como a empresa tem analisado o uso de aplicação de tecnologias como a inseminação artificial, a indução de cio, sexagem e transferência de embriões? Quais outras tecnologias podem ser citadas que podem garantir maior desenvolvimento da pecuária brasileira?
Espanha – A aplicação de tecnologias como inseminação artificial, a transferência de embriões, a sexagem de espermatozoides e de embriões, a produção in vitro de embriões (após a maturação in vitro e a fertilização in vitro) são ferramentas que certamente aumentam a taxa e promovem a disseminação do ganho genético. A Zoetis tem visto com bons olhos essa tendência do mercado, encabeçada pelos pecuaristas que pretendem aumentar sua lucratividade, produtividade e melhorar o rebanho geneticamente. À medida que os produtores passam a ter mais conhecimento das técnicas disponíveis, seja por meio de indicações de outros pecuaristas ou da mídia, decidem experimentar também. Podemos citar ainda a inseminação artificial em tempo fixo (IATF) como uma das tecnologias que beneficia os programas de melhoramento, pois permite novas estratégias de manejo reprodutivo dos rebanhos. Essa técnica tem contribuído para garantir ainda mais desenvolvimento da pecuária brasileira, pois as vacas são inseminadas com data marcada e a reprodução fica sob controle do produtor. O método, feito com utilização de produtos específicos, pode ser aplicado em propriedades de qualquer tamanho e permite inseminar o rebanho em horário predeterminado, sem a necessidade de detecção do cio. Com a técnica, o criador pode inseminar mais vacas em menos tempo, programar a inseminação e o nascimento dos bezerros, aumentar o número de bezerros de inseminação artificial no início da estação de nascimento, com melhor aproveitamento da mão de obra. Com o uso da sincronização da ovulação e IATF, o produtor determina quando e quantos animais serão inseminados. O resultado é maior produtividade e melhoria da qualidade genética do rebanho. Também a rastreabilidade e o desenvolvimento de coleta eletrônica de dados, quando implantados em todo o rebanho nacional, deverão contribuir substancialmente para os programas de melhoramento do País, aumentando a quantidade e a confiabilidade dos dados armazenados.
Rural – Tem crescido o apelo à área genética tanto para achar a cura de doenças como para dinamizar a produção com a descoberta de machos e fêmeas promissoras no campo da reprodução animal. Como o senhor vê a exploração de ferramentas como essas na atividade pecuária do País?
Espanha – A área de genética molecular é estratégica, sobretudo por trazer de uma forma antecipada para o pecuarista informações sobre o potencial genético do rebanho. No Brasil, desde 2008, temos investido em pesquisas locais com o objetivo de desenvolver testes genéticos específicos para o rebanho bovino nacional de corte. Isso culminou em 2010, com o lançamento de Clarifide Nelore, painel de marcadores de DNA para essa raça zebuína, associada à Associação Nacional dos Criadores de Pesquisadores (ANCP). Expandimos também nossa atuação em marcadores moleculares bovinos para pecuária leiteira, com o lançamento de Clarifide para gado de leite. Voltada para fêmeas das raças holandês, jersey e pardo suíço, a nova tecnologia identifica o potencial genético de cada animal em 30 características economicamente importantes de produção, saúde e composição corporal, além de gerar nove índices compostos. Em 2012, a Zoetis, a Embrapa Gado de Leite e a CRV Lagoa estabeleceram uma parceria para a realização conjunta de pesquisas nas áreas de genômica e de melhoramento genético de bovinos leiteiros. Pela parceria, pesquisadores das instituições buscarão implementar a seleção genômica e identificar genes de interesse econômico para a pecuária de leite de cerca de 20 mil animais, potencializando as ações que vêm sendo realizadas no melhoramento genético nacional. A Embrapa Gado de Leite vem trabalhando no sequenciamento dos genomas de bovinos das raças gir e guzerá. Em breve, o girolando e o sindi também terão seus genomas sequenciados. Com estas pesquisas, será possível identificar marcadores moleculares específicos para as raças zebuínas e, a partir dos resultados do sequenciamento e com as tecnologias já existentes no mercado, o consórcio poderá criar uma ferramenta de seleção genômica para identificar bovinos destas raças com maior potencial genético para a produção de leite, com resistência a parasitos, a estresse térmico, além de diversas outras características de interesse econômico. Esta ferramenta permitirá que os testes genéticos sejam realizados em animais ainda em fase embrionária. Acreditamos que essas ferramentas sejam capazes de aumentar a rentabilidade da atividade pecuária, pois ao serem aplicadas maximizam a produtividade com a melhor relação custo-benefício. Nesse contexto, o estabelecimento de um plano de melhoramento genético do rebanho, que permite identificar os melhores animais com maior probabilidade de acerto, quando comparado a uma seleção empírica, figura como uma das principais técnicas para ganho em qualidade e consequente aumento da lucratividade.
Rural – O senhor representa uma das empresas que mais investe no desenvolvimento de uma pecuária mais saudável, literalmente, e, mesmo, assim o Brasil esbarra muito em questões sanitárias. O senhor acredita que isso tem a ver, basicamente, com políticas protecionistas de países compradores do que com possíveis falhas do controle sanitário dos rebanhos no País?
Espanha – Ao analisarmos o cenário sanitário dos rebanhos no País, podemos afirmar que, hoje, o pecuarista tem acesso a uma enorme quantidade de vacinas que são altamente eficazes no controle de quase todas as doenças importantes que podem acometer os bovinos e, consequentemente, causar perdas econômicas ao negócio. Outro ponto que beneficia a sanidade da produção é a rastreabilidade, um processo em contínuo aperfeiçoamento, que em muitos países não existe.
Rural – Em termos de descobrimento ou desenvolvimento de tecnologias para o tratamento de doenças e reprodução animal, como o Brasil está nesse campo?
Espanha – O Brasil e, principalmente, a Zoetis, estão alinhados ao que há de mais atualizado em termos científicos em saúde animal, buscando o desenvolvimento de tecnologias para o tratamento, prevenção de doenças e reprodução animal. Focamos o nosso trabalho em proporcionar o maior número de benefícios possível aos criadores, refletindo o investimento por eles realizado em ganhos reais em produtividade, redução de custos e de impacto ambiental, maior eficiência na produção de proteínas, melhoria da eficácia dos tratamentos e da segurança alimentar. Na área de reprodução e melhoramento genético, a IATF, por exemplo, tem sido uma das ferramentas mais utilizadas atualmente e que mais se desenvolveu nos últimos anos. Esse método é uma prova de como a tecnologia pode trazer uma eficiência produtiva numa determinada atividade em que todos os envolvidos são beneficiados – empresas detentoras da ferramenta, pecuaristas e clientes. Aliamos, ainda, as tecnologias inovadoras, eficácia e segurança dos produtos a uma assistência técnica pré e pós-venda bastante presente no campo e próxima dos nossos clientes e proporcionamos também ganhos que são intangíveis ao negócio. De nada adiantaria adotarmos tecnologia de ponta se não houvesse o treinamento adequado para sua utilização.