A
preocupação do pecuarista tem justificativa. Na
primeira semana de 2012, o país vizinho anunciou as reincidências
no caso da febre aftosa no gado. Isso três meses depois
de anunciar que a detecção da doença em
seu rebanho. O Serviço Nacional de Qualidade e Saúde
Animal (Senacsa) do Paraguai confirmou um novo foco da febre
em uma fazenda de criação de gado no distrito
de San Pedro, a 330 quilômetros, ao nordeste da capital
paraguaia, e a 180 quilômetros da fronteira com o Brasil,
no município de Ponta Porã (MS). O novo foco está
localizado a 15 quilômetros da fazenda, na qual em 18
de setembro, foi declarado o primeiro foco, o que obrigou o
governo à suspensão cautelar das exportações
de carne, segundo agências internacionais. A reincidência
da doença no Paraguai acendeu o sinal amarelo.
Rapidamente, o Ministério da Agricultura (Mapa) anunciou
a suspensão temporária das importações
de carne de bovinos da região de San Pedro. Em conjunto
com o Ministério da Defesa, eles acertaram retomar o
apoio das Forças Armadas, para dar suporte às
ações de defesa sanitária animal na região
de fronteira. "Os militares estão na área,
além da fiscalização permanente de mercadorias,
eles passaram a fiscalizar todos os produtos derivados de carne,
que ingressam em nosso país", diz Guilherme Marques,
diretor do Departamento de Saúde Animal (DSA) do Ministério
da Agricultura. Segundo ele, desde a notificação
do segundo foco da doença, fiscais federais agropecuários
e médicos veterinários dos serviços veterinários
estaduais de todo o Brasil atuam na faixa de fronteira internacional
em trabalhos de prevenção. "São 14
postos fixos, com projeções para 20 barreiras,
sendo que nove volantes estão em operação
plena e em vigilância em propriedades consideradas de
maior risco. Estão sendo intensificadas as operações
na faixa de fronteira aproximadamente 15 km de Mato Grosso do
Sul entre o Paraguai", afirma Marques.
Em nota, o Mapa declarou que desde setembro, quando foi detectado
um foco da doença no país vizinho já existia
uma operação para barrar a doença. Na divisa
com Pedro Juan Caballero, no Paraguai, havia uma operação
de controle da febre aftosa, realizada pelo Exército
Brasileiro e pela Agência Estadual de Defesa Sanitária
Animal e Vegetal (Iagro). Segundo o Iagro, o trabalho na fronteira
vem sendo benfeito e o Brasil está protegido. Na opinião
de Marques, a ocorrência da aftosa naquela localidade
é um problema porque houve falha no sistema de proteção
dos animais. As dúvidas foram levantadas a esse respeito,
no Brasil, pelo próprio Ministério da Agricultura.
Uma das preocupações da entidade é a entrada
no Brasil de animais vivos originários do Paraguai por
meio de estradas vicinais onde não há fiscalização.
"No Brasil, existe há anos uma campanha de vacinação
intensa. Temos no nosso país 180 milhões de animais
que são considerados livres da doença. Alguns
estados brasileiros estão com o mercado aberto para a
exportação. No entanto, não basta estar
livre, temos que se manter livre da doença", ressalta.
Para garantir a segurança no território brasileiro,
os recursos do governo foram mantidos. Segundo o Mapa, neste
ano serão R$ 90 milhões destinados para a campanha
nacional de vacinação, que começa a partir
do dia 01 de maio, sendo que 95% do orçamento serão
repassadas para os órgãos estaduais. "O governo
já acenou que está em alerta e qualquer urgência
poderá disponibilizar verba extra", afirma Marques.
O governo federal afirma ter intensificado as ações
contra a febre aftosa nos últimos oito anos. No período
de 2003 a 2010, segundo o Mapa, os recursos passaram de R$ 3,3
milhões, para R$ 55,9 milhões. Com um rebanho
de 205 milhões de bovinos e pouco mais de um milhão
de búfalos, o Brasil se transformou no maior exportador
de carne do mundo, o que se traduz pelo acréscimo de
US$ 3,2 bilhões no saldo da balança comercial
nacional, de janeiro a agosto de 2011, segundo dados do Mapa.
O Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Saúde
Animal (Sindan), entidade que reúne os laboratórios
que atuam no mercado brasileiro, lamentou o foco de febre aftosa
no distrito de San Pedro, no Paraguai e comunicou que está
acompanhando a situação da doença. "A
febre aftosa no país vizinho é delicado. O governo
brasileiro está tomando suas providências cabíveis
junto ao governo paraguaio. E nós nos colocamos à
disposição", diz Emílio Salani, presidente
do sindicato que representa a indústria veterinária
do Sindan. Em 2003, a entidade doou 500 mil doses de vacina
contra a febre aftosa à Bolívia com o intuito
de imunizar dos rebanhos nos municípios de fronteira.
Atualmente, no Brasil há 200 milhões de doses
de vacinas contra aftosa. "O suficiente para atender ao
seu rebanho", afirma. Conforme reunião recente do
Comitê Veterinário Permanente do Conesul (CVP),
no qual o Brasil preside, o país se colocou a ajudar
o Paraguai com apoio operacional e de especialistas das áreas
de epidemiologia, vigilância e diagnóstico laboratorial.
De acordo com Salani, não se pode resolver apenas a questão
da febre aftosa no Brasil, enquanto houver países limítrofes
com a enfermidade. "Sem poder controlar totalmente a entrada
de animais doentes, é necessária ação
conjunta em toda América do Sul", afirma.
Do lado de lá
De acordo com o Senacsa, serviço nacional paraguaio,
o aumento do número de casos de febre aftosa fez o governo
declarar, no dia 04 de janeiro, o estado de emergência
sanitária animal na região afetada. No dia 09
de janeiro, o país anunciou o sacrifício de mais
de 154 cabeças de gado no distrito de San Pedro. No início
do mês de fevereiro, o Paraguai deu o pontapé inicial
e começou o primeiro período da campanha de vacinação
contra a febre aftosa nos 150 mil animais dos municípios,
onde os focos de febre aftosa foram detectados no final do ano
passado. Por sua vez também, o governo paraguaio disse
que pretende fazer um calendário único de vacinação
para todo o país.
Segundo agências internacionais, o Paraguai, oitavo maior
exportador mundial de carne bovina e com um rebanho de 12,5
milhões de cabeças, encontra-se em processo de
estabilização de seus embarques, que haviam sido
interrompidos de maneira preventiva em setembro passado. Desde
2004 o Paraguai era considerado um país livre de aftosa
com vacinação, até que em setembro de 2011
se descobriu um foco da doença.
O mal que assola o rebanho
A febre aftosa é um mal à saúde humana
é questionável ou quase insignificante. O fator
preponderante, nesse caso, é a queda da produção
dos animais e óbitos de animais jovens. De acordo com
o médico veterinário e diretor Técnico
da Ourofino, Marcus Rezende, entre os sinais clínicos
observados em animais acometidos pela doença estão
à febre e lesões na boca, gengivas e língua,
como aftas (daí, então, o nome febre aftosa).
"As feridas dificultam o animal de se alimentar e promovem
o emagrecimento da rês. Além disso, há ocorrência
de salivação e lesões entre os cascos",
explica. "A febre aftosa é suscetível a todos
os animais biungulados, principalmente bovinos e bubalinos.
O vírus causador da doença pertence ao gênero
Aftovirus da família Picornaviridae que tem sete sorotipos
conhecidos (A, O, C, SAT1, SAT2, SAT3, Asia1). No Brasil e na
América Latina os sorotipos comumente encontrados são
O1 Campos, A24 Cruzeiro e C3 indaial, que formam a vacina trivalente
comercializada no País", diz.
Ele lembra ainda que este vírus tem grande capacidade
de propagação (pelo ar), podendo em poucas horas
ser disseminado para mais de 300 km de distância. "Por
isso a importância do respeito às áreas
de isolamento que o Mapa exige quando ocorre o aparecimento
de surtos", diz. Rezende lembra que a prevenção
por meio da vacina, é sem dúvida a alternativa
mais barata e eficiente no controle da doença. Neste
caso, aponta ele, o país tem algumas fábricas
de vacina mais modernas do mundo e produz um produto eficaz.
"O estoque de segurança que o Mapa exige dos laboratórios
produtores é suficiente para que o Brasil possa atender
qualquer surto que supostamente venha a ocorrer". Em nome
dos bons ventos do crescimento das exportações
de carne, o país blinda o seu rebanho.
A cronologia da aftosa no País
A doença foi detectada na Itália, em 1514. No
Brasil, o primeiro registro ocorreu em 1895, no Triângulo
Mineiro. Como prevenção, o Mapa realiza ações
desde 1934, quando foi publicado o Regulamento do Serviço
de Defesa Sanitária Animal. Mas as instruções
específicas para seu controle, que incluía a vacinação,
foram definidas em 1950, e as campanhas organizadas tiveram
início em 1965.
Os pioneiros nessa ação foram os estados do Rio
Grande do Sul, que vacinou 2,07 milhões de bovinos, do
total de 11,6 milhões, e o Paraná, que imunizou
3,8 mil bovinos, de 3,4 milhões de animais estimados
na época.
Em 1976 foi registrado o maior número de focos da doença,
com 10,2 mil casos. Desde abril de 2006, o Brasil não
registra nenhum caso, sendo o último em Mato Grosso do
Sul.
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