Revista
Rural - Como o sr. analisa o desempenho do agronegócio
brasileiro?
Carlos Alberto dos Santos - O agronegócio é
um dos vetores do nosso desenvolvimento, em termos de mercado
externo, contribuição ao PIB e avanços
tecnológicos verificados em alguns setores. Mas não
se pode esquecer que ainda há um enorme potencial e espaço
para melhorias de desempenho na agricultura familiar, grande
geradora de ocupação e renda, além de ser
uma redutora da pobreza e da violência urbana, pois ao
fixar sua moradia e trabalho no campo, as pessoas reduzem a
pressão social, ambiental e econômica sobre as
cidades. Os empreendedores rurais de pequenos negócios
também têm uma lacuna tecnológica, de mercado
e de gestão que precisa ser conhecida e trabalhada; e
aí entra o apoio do Sebrae e de mais de 6,3 mil parceiros
por todo o nosso país.
Rural - Há quase 40 anos atuando no apoio aos micro
e pequenos empreendimentos brasileiros, o Sebrae tem como principal
missão atualmente levar inovação para dentro
das micro e pequenas empresas. Qual é a parcela desses
pequenos empreendimentos voltados para o agronegócio
brasileiro?
Santos - Vamos completar 40 anos em outubro deste ano. São
quatro décadas de conhecimento e experiência no
apoio e fomento aos pequenos negócios, em todo o país.
A busca pela melhoria da competitividade, que passa pela sustentabilidade,
além do fomento ao empreendedorismo, é a nossa
missão. Do mesmo modo que há alguns setores dinâmicos
e avançados no agronegócio, como o complexo soja,
carnes e etanol, há outros que precisam da inovação
e da tecnologia para melhorar a qualidade de seus produtos e
processos, aumentar a produtividade ou a diferenciação,
dependendo do caso e, sobretudo, aumentar a renda do produtor
rural integrante de nossos projetos (são mais de 600)
e parcerias.
Rural - E por qual motivo nos últimos anos o setor
agropecuário despertou para ações junto
com o Sebrae?
Santos - O Sebrae iniciou seu apoio ao setor em meados dos
anos 90, quando se verificou a grande capacidade do mundo rural
em gerar ocupação, renda e riqueza e aliado a
isso, a grande lacuna existente entre os setores dinâmicos
e os pequenos negócios e a agricultura familiar. Para
entrar em contato com o Sebrae basta telefonar para nossa central
de relacionamento - 0800 570 0800 - ou recorrer a um dos quase
800 pontos de atendimento instalados em todo o país.
Rural - Em uma entrevista realizada em outubro passado, a
entidade mencionou que em 2012, devem ser formalizados mais
700 mil trabalhadores e, até 2014, o número pode
chegar a 4 milhões. Quais são os números
destinados ao agronegócio?
Santos - A formalização de trabalhadores autônomos,
que obtém CNPJ e direitos previdenciários, como
aposentadoria, de forma simples, rápida - via internet
- a um custo mensal relativamente baixo é uma iniciativa
de grande impacto socioeconômico. Começamos 2011
com quase 800 mil empreendedores formalizados e chegamos ao
final do ano com mais de 1,8 milhão. O mundo rural, porém,
é um pouco diferente em função da questão
do CNPJ - alguns estados exigem do agricultor familiar, da parcela
de povos e comunidades tradicionais (índios, ribeirinhos
e quilombolas entre outros) e do pescador, que possui um registro
próprio, diferente da inscrição do produtor
rural, documento mais usual em praticamente todo o país.
Por ser diferente do empreendedor urbano, optamos por não
ter uma meta numérica específica. No entanto,
o Sebrae apoia e estimula a formalização de agricultores
familiares e a legalização e certificação
dos produtos, a exemplo do selo SIF e de outras como IG - Indicações
Geográficas e de origem, orgânicas, sociais e de
comércio justo.
Rural - O Sebrae, por intermédio de suas ações,
está conseguindo levar a inovação para
dentro de pequenas propriedades rurais?
Santos - Sim, por meio de diversas formas, com soluções
como o SebraeTec, programa nacional que dispõe de um
serviço tecnológico com várias linhas de
ação, ligadas a consultorias , design de embalagens,
certificações e melhorias nos processos produtivos
e desenvolvimento de produtos, visando adequar ao mercado que
se busca. Também na propriedade rural é importante
fazer diferente para fazer melhor. Além da qualidade
garantida, a tendência é de produtos sustentáveis.
Essa é uma perspectiva inovadora no mundo rural brasileiro.
Na nossa página www.sebrae.com.br há temas de
interesse - Inovação e Tecnologia - com informações
mais detalhadas.
Rural - Em relação à agricultura orgânica,
em sua opinião o Brasil tem condições de
produzir em alta escala?
Santos - Esta é uma boa reflexão! Em todo
o mundo, os produtos orgânicos ainda representam uma pequena
parcela sobre o total consumido... varia entre 0,5% e 5% no
máximo, dependendo da categoria de produto. Alguns produtos,
como alimentos para bebês, que em alguns mercados chega
próximo a 20% são exceções e podem
servir de aprendizado e de oportunidades. Já estamos
trabalhando essa questão em um dos estados da Região
Sudeste; logicamente existem algumas poucas experiências
e empreendimentos que já atingem uma escala maior e que
podem ancorar o esforço e a produção de
pequenas propriedades. Em todos os estados onde os produtores
integrantes de projetos do Sebrae participam de feiras de orgânicos,
a venda dos produtos é de praticamente 100% do que levam
para comercializar. Mas falar em escala talvez ainda seja prematuro.
Transformar em um empreendimento em negócio cada vez
mais profissionalizado, lucrativo e competitivo aí sim,
é um grande desafio!
Rural - A Copa do Mundo de 2014 poderá beneficiar
o agronegócio brasileiro, principalmente, a gastronomia?
Santos - Com certeza, porém, de modo seletivo; seletividade
tanto geográfica, pois serão 12 cidades-sedes
e algumas subsedes próximas dessas capitais, mas seletivos,
sobretudo, na definição do mix de produtos a serem
oferecidos. Temos um programa nacional, o Sebrae 2014, que busca
desenvolver e qualificar as micro e pequenas empresas, urbanas
e rurais. Estamos na expectativa da definição
da Fifa no tocante aos requisitos para o fornecimento de produtos
alimentícios, agrícolas e de origem animal (carne,
leite e derivados) para afunilar e aprimorar esse esforço.
Além disso, há setores, como floricultura e plantas
ornamentais, que já estão se preparando para estar
presentes nos negócios de turismo e produção
associada. O importante é criar e deixar um legado de
riqueza e prosperidade às micro e pequenas empresas do
país, tanto rurais quanto urbanas.
Rural - Projetos do Sebrae ao longo dos anos ajudaram as
agroindústrias e a agricultura familiar. Qual foi o papel
do Sebrae no desenvolvimento?
Santos - Creio que conseguimos suprir algumas lacunas no
desenvolvimento dos pequenos negócios rurais e na agricultura
familiar. Sabemos que a dispersão, as longas distâncias
e os baixos orçamentos destinados à agricultura
e pecuária nos municípios são fatores inibidores
do desenvolvimento do agronegócio no país. O Sebrae
atua em todos os setores e, no agronegócio investimos
em mais de 600 projetos com cerca de 6,5 mil parceiros. Na agroindústria,
a demanda por gestão e por tecnologia é grande,
e estamos trabalhando esse questão, seja num pequeno
laticínio, num alambique, numa torrefadora de café
ou numa pack house de frutas, legumes e verduras, entre outros
micro e pequenos negócios. O programa nacional SebraeMais
é uma das soluções de gestão genéricas
que temos, além de outras mais específicas para
alguns setores como o NCR - Negócio Certo Rural, o QT
- qualidade total rural e o PAS - Programa Alimento Seguro,
em produtos como leite e derivados, uva para processamento,
mel e açaí e outras sendo negociadas ou desenvolvidas.
Rural - O alto índice de sobrevivência no Brasil
é o resultado de vários fatores, quais deles?
Santos - Do ponto de vista macro, a estabilidade econômica,
a distribuição de renda e um maior grau de previsibilidade
parecem estar consolidados, apesar de turbulências provenientes
do cenário internacional. Mas a disseminação
da cultura de gestão, empreendedorismo e planejamento,
sobretudo planejamento, gera um salto qualitativo considerável
na criação, na condução e no desenvolvimento
dos pequenos negócios, rurais e urbanos. Lembrando que
no mundo rural os fatores climáticos e de pragas e doenças
também são pontos nevrálgicos e sensíveis.
Rural - Quais sãos as regiões que mais crescem
no país no desenvolvimento da agricultura familiar?
Santos - O Sul parece mais consolidado no tocante ao desenvolvimento
de produtos e sua qualidade; entretanto, graças a ações
estruturantes dos governos federal e estaduais e à política
de aquisições governamentais (PAA, PGPAF, PNAE
entre outras) temos a oportunidade de dar um salto significativo
na agricultura familiar. Hoje, há 30% de obrigatoriedade
na aquisição de alimentação escolar
junto à agricultura familiar, o que representa quase
R$ 1 bilhão por ano. São 47 milhões de
refeições por dia em 200 dias letivos. Mas ainda
são poucas as prefeituras que conseguiram esse índice;
a maioria alega que os agricultores familiares ou não
produzem o suficiente ou produzem sem cumprir as exigências
mínimas de segurança alimentar. Estamos atentos
e trabalhando parceiras estratégicas para esse importantíssimo
tema.
Rural - Do seu ponto de vista, quais são os principais
gargalos da produção agrícola no País?
Santos - A agricultura brasileira avançou muito em
escala, produtividade e tecnologia. Mas ainda um descompasso
em relação à agricultura familiar. Ainda
há uma cobertura insuficiente da assistência técnica
e extensão rural, a Ater oficial, além do desconhecimento
de linhas de crédito específicas, bem como a questão
de logística e de infraestrutura, estradas pavimentadas
para agilizar o escoamento da produção e falta
um seguro agrícola mais efetivo nos pequenos negócios
rurais. Soma-se o grau de escolaridade no campo que precisa
avançar muito e a falta de atratividade para juventude
permanecer no campo (sucessão rural) são alguns
desafios a superar, além é claro, daqueles decorrentes
de problemas climáticos.
Rural - Ações como a Indicação
Geográfica (IG), a Responsabilidade Social, e o Programa
Talentos para o Brasil são do Sebrae para elevar e registrar
a cultura brasileira. Quais são os benefícios
desses programas?
Santos - Importante destacar que o Programa Talentos do
Brasil é uma iniciativa do Ministério do Desenvolvimento
Agrário (MDA), onde o Sebrae é um dos parceiros.
O principal benefício que o produtor rural, por meio
de suas associações e cooperativas tem, é
o de aumentar sua renda a partir do desenvolvimento de produtos
e de mercados. É importante conhecer o programa e perceber
como ele é interessante no sentido de emancipar e melhorar
o nível de resultados do agricultor familiar participante.
Quanto às IG e a responsabilidade social, prosseguiremos
no esforço apoiar a obtenção de certificações
e de buscar um processo socialmente justo na distribuição
da riqueza do mundo rural.
Rural - Podemos esperar novas ações em 2012,
destinado ao agronegócio e principalmente a agricultura
familiar?
Santos - Continuaremos investindo no que vem dando certo
e, sobretudo, buscaremos desenvolver a qualidade, a inovação,
a certificação e a diferenciação
dos produtos, além dos esforços de formalização
e legalização do produtor rural e de melhoria
de seus processos de gestão, de tecnologia e de acesso
a mercados. |