"Nos
testes de campo realizados, mesmo com muita presença
da mosca branca, inseto que transmite o vírus do mosaico,
a planta transgênica não foi infectada pela doença",
afirma Francisco Aragão, pesquisador do Cenargen e
um dos responsáveis pelo projeto. A produção
mundial de feijão é de mais de 12 milhões
de toneladas. O Brasil ocupa o segundo lugar nesse ranking
e a planta é produzida principalmente por pequenos
agricultores, com cerca de 80% da produção e
da área cultivada em propriedades com menos de 100
hectares. Uma vez que o vírus do mosaico dourado atinge
a plantação ainda na fase inicial, pode causar
perdas de até 100% na produção. Segundo
estimativas da Embrapa Arroz e Feijão, os danos causados
pela doença seriam suficientes para alimentar até
10 milhões de pessoas.
O feijão transgênico apresentou vantagens econômicas
e ambientais, a exemplo da diminuição das perdas,
a garantia das colheitas e a redução da aplicação
de defensivos. Com a aprovação, as sementes
transgênicas serão multiplicadas e devem chegar
ao mercado em dois ou três anos. "Todas as análises
de segurança foram realizadas e o feijão geneticamente
modificado é tão ou mais seguro que as variedades
convencionais, tanto para o consumo humano quanto para o meio
ambiente", ressalta Aragão.
Os pesquisadores da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia,
Francisco Aragão, e da Embrapa Arroz e Feijão,
Josias Faria, utilizaram quatro estratégias de transformação
genética. Em linhas gerais, eles modificaram geneticamente
a planta para que ela produzisse pequenos fragmentos de RNA
responsáveis pela ativação de seu mecanismo
de defesa contra o vírus do mosaico dourado, devastador
à lavoura. "Mimetizamos o sistema natural",
diz Aragão. Além disso, os fragmentos de RNA
podem causar resistência a várias estirpes do
mesmo vírus.
Brasil vai exportar tecnologia
O primeiro feijão transgênico totalmente desenvolvido
no Brasil é o primeiro passo para a independência
tecnológica do Brasil e mostra que o País poderá
ser um grande exportador de tecnologia de sementes geneticamente
modificadas para o mundo em um futuro próximo, de acordo
com a Associação Nacional de Biossegurança
(ANBio).
"Em um momento de crise alimentar, quando o mundo tem
cada vez mais necessidade na produção de alimentos,
sementes mais seguras e eficientes são a melhor alternativa
para garantir a boa produção das lavouras",
afirma a pesquisadora Leila Oda, presidente da ANBio. "Além
do potencial para prover alimentos para a população
do planeta, o Brasil tem agora chance se consolidar como um
dos principais exportadores de tecnologia na agricultura do
mundo".
Alimento seguro
De acordo com Oda, o feijão transgênico da Embrapa
é seguro para consumo humano e em nada difere do feijão
tradicional, presente no prato dos brasileiros. "Todos
os organismos geneticamente modificados produzidos no país
são confiáveis, pois são analisados caso
a caso antes da liberação, seguindo a Lei de
Biossegurança brasileira, que é considerada
referência e uma das mais rigorosas do mundo".
O Brasil é o maior produtor de feijão do mundo.
Ele é um dos alimentos mais consumidos pelos brasileiros,
e a principal fonte de proteína vegetal, ferro e inúmeras
vitaminas, principalmente para as classes menos favorecidas.
"Pesquisas que levem ao aumento da produtividade desse
grão devem não só ser apoiadas, como
serem motivo de orgulho para o Brasil", afirma.
Consea pede mais estudos
A CTNBio aprovou a liberação comercial do feijão
transgênico no país com 15 votos a favor, duas
abstenções e cinco diligências (pedidos
por mais testes e pesquisas). O Conselho Nacional de Segurança
Alimentar e Nutricional (Consea) defendia um prazo maior para
debates - ouvindo posições favoráveis
e contrárias - e a ampliação de testes,
estudos e pesquisas em todos os biomas e regiões do
país.
O Consea não concorda com a liberação
enquanto não houver a certeza de que o feijão
geneticamente modificado não trará danos à
saúde nem prejuízo à segurança
alimentar da população. Um dado curioso é
que a proposta foi aprovada no dia em que a Lei Orgânica
de Segurança Alimentar e Nutricional completou cinco
anos. "Foi a crônica de uma aprovação
anunciada", lamentou Leonardo Melgarejo, representante
do Ministério do Desenvolvimento Agrário na
CTNBio.
Benefícios socioeconômicos
Para os que comemoraram a aprovação, ela "é
a esperança para tornar o Brasil autossuficiente na
produção do grão e democratizar o consumo
do alimento em todas as classes da população.
Ao contrario do que se imagina, mesmo sendo o maior consumidor
de feijão do mundo, o País ainda não
consegue abastecer todo o mercado interno, pois as doenças
das lavouras trazem prejuízos irreversíveis
aos agricultores. De acordo com Francisco Aragão, a
produção interna insuficiente eleva os preços
e faz com que, muitas vezes, as camadas mais pobres da população
deixem de consumir o feijão, um dos alimentos mais
ricos em fontes de proteína vegetal, ferro e vitaminas.
Inimigo
antigo, e perigoso
O
vírus do mosaico dourado é o maior problema
para a cultura do feijão. "As perdas vão
de 90 a 280 mil toneladas por ano. Se a doença atacar
as lavouras precocemente, as perdas podem chegar até
100%". Alguns lugares do Brasil, inclusive, deixam de
cultivar o feijão, pois não conseguem resistir
aos prejuízos. "Com a semente geneticamente modificada,
serão abertas novas áreas de produção,
onde antes não era possível alcançar
bons resultados", comemora, dizendo que "esse será
um benefício para todos os produtores, mesmo os de
pequenas propriedades". Ainda segundo o pesquisador,
a lógica é que, com mais sementes de feijão
transgênico disponíveis, mais o mercado interno
estará abastecido. Assim, os preços ficam estabilizados
e maior quantidade de pessoas pode consumir o alimento.
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