Neste
ano a Vinícola Almadén, integrante da Miolo Wine
Group, localizada na região da Campanha, em Santa do
Livramento (RS), iniciou um tipo de colheita até então
não visto aqui no País - tratava-se da ceifa totalmente
mecanizada da safra 2011 de uvas, iniciada em 25 de janeiro.
Entre as variedades brancas estavam gewurztrminer, chenin blanc
e sauvignon blanc, e, as tintas gamay. A empresa estimou um
resultado de 4,5 milhões de quilos de uva para a safra
deste ano.
O exemplo dessa propriedade gaúcha reflete, de certa
forma, como vem se desenvolvendo o mercado de máquinas
e implementos de auxílio para a colheita, total ou parcial,
em lavouras que culturalmente não dependiam desse tipo
de tecnologia no Brasil.
"Lavouras de frutas e hortaliças têm um aspecto
de dificuldade para implantação de sistemas totalmente
mecanizados de colheita em função destes oferecerem
maior risco de dano à fruta ou à hortaliça",
explica o especialista em tecnologia de pós-colheita
em lavouras de frutas e hortaliças, Marcos David Ferreira,
pesquisador da Embrapa Instrumentação, localizada
em São Carlos (SP). "Nesse sentido, é complicado
fazer a substituição do trabalho humano no processo
de colheita".
No entanto, no caso das uvas da Almadén, a utilização
da colheita 100% mecanizada veio agregar mais ritmo à
produção de vinhos. E aí, mora uma questão
preponderante à introdução dessa tecnologia
- a fruta (e aí, pode-se incluir também o café)
ou a hortaliça são destinadas especificamente
à indústria - que na maioria das vezes não
vai se ater à qualidade física dos frutos.
Há exemplos, como a lavoura de tomate, que podem ser
totalmente mecanizados. "Neste caso, são tomates
voltados para a indústria, e estima-se que aqui no Brasil
ela realiza a colheita mecanizada de mais de 70% da produção.
O mesmo pode ser observado em pomares de pêssego e ameixa,
nos Estados Unidos (EUA). Lá, essa inserção
da tecnologia é mais influente em função
das indústrias", destaca Ferreira.
Uva
Para a colheita da uva, a tecnologia teve de ser trazida da
França. De acordo com a vinícola gaúcha,
desde o dia 2 de fevereiro, a máquina da marca Pellenc,
faz a colheita mecânica de cerca de 200 hectares (ha)
de parreirais, que corresponde a um terço de toda área
produtiva da vinícola. O investimento chegou a R$ 500
mil na aquisição da máquina e na reforma
dos vinhedos para viabilizar o trabalho do equipamento.
Os parreirais antigos tiveram as estruturas de sustentação
revitalizadas, e foram estreitados e elevados para se adequarem
ao tamanho da máquina, que "abraça"
as parreiras para fazer a colheita. O equipamento é tracionado
por um pequeno trator e envolve as parreiras. A movimentação
interna da máquina derruba numa esteira frutos e folhas
- estas últimas descartadas pela ação de
um sistema de ventilação.
Mesmo com a mecanização dos trabalhos, a Almadén
não reduziu o número de colhedores de uva, mantendo
os mesmos 150 contratados em 2010, que atuam em 300 ha. Para
o próximo ano, a vinícola pretende preparar mais
100 hectares para a colheita mecânica, o que refletirá
num investimento de R$ 250 mil.
Laranja
O parque citrícola do País também possui
o emprego de maquinários, inclusive nacionais, para realização
da colheita. No entanto, Ferreira pondera que isso ainda representa
um nicho de mercado muito específico e diminuto. "A
respeito da laranja, a colheita totalmente mecanizada nos EUA
teve maior desenvolvimento em função das características
de solo, variedades e sistemas de produção. Aqui
no Brasil há uma série de fatores de limitam a
introdução dessa tecnologia com a tipologia de
solo, as variedades produzidas, que são diferentes das
cultivadas nos EUA, a disposição da lavoura e
a própria resistência dos citricultores brasileiros",
analisa o pesquisador.
No caso norte-americano, a adaptação 100% mecânica
teve influência do solo ser arenoso em muitas regiões.
Um dos tipos de máquina que faz a colheita naquele país
chacoalha e balança a árvore, derrubando os frutos
numa esteira, recolhendo-os. Essa característica do solo
aliado ao tipo de variedade produzida permite a melhor movimentação
da árvore sem causar dano à planta.
"Já no Brasil, como a maior região produtora
está em São Paulo, onde há maior incidência
de solos argilosos, em alguns casos latossolos, essa chacoalhada
no pé de laranja poderia causar danos às plantas,
com risco de quebrar galhos e até mesmo o pé",
explica Ferreira.
Nesse sentido, o desenvolvimento de técnicas e tecnologias
para auxiliar a colheita humana e oferecer melhores condições
de trabalho à mão de obra tem sido uma das linhas
de pesquisa da Embrapa Instrumentação. "Equipamentos
de auxílio à colheita não mecanizam todo
o processo e, consequentemente, não tiram o empregado
do campo. Nesse caso, eles melhoram as condições
de colheita e ajudam o trabalho com o uso de menos esforço",
atesta.
Uma solução para os pomares de laranja está
em andamento, através de uma parceria da Embrapa Instrumentação
com uma grande indústria de suco de laranja do País.
Alegoria carnavalesca?
Não, uma plataforma de colheita
Pode-se dizer que atualmente grande parte da colheita de citros
ainda é manual no País, cerca de 80%, 90% ou mais,
de acordo com o pesquisador. Em alguns aspectos, esse processo
traz algumas perdas com a derriça (derrubada de frutos)
pelo fato de os colhedores não alcançarem os frutos
mais altos - com o uso de varas, os trabalhadores cutucam esses
frutos para então caírem ao chão, o que
leva a danos físicos à laranja.
O equipamento, ainda em fase de testes, trata-se de um tipo
de plataforma autopropelida (que possui um sistema próprio
de locomoção, com motorização).
Nela ficam fixos de seis a oito colhedores de laranja e podem
levantá-los a alturas próximas às copas
e assim alcançar os frutos, sem necessidade da derriça.
Pode-se dizer que ela trabalharia como um carro alegórico
de escola de samba, o qual possui uma plataforma que sustenta
e eleva os colhedores. Em geral, seis ficam no equipamento,
dois na parte de baixo e quatro na parte de cima, ou vice-versa,
dependendo da lavoura.
Inteligência artificial a serviço do campo
Métodos mecânicos aplicados à agricultura
vêm ganhando maior espaço em função
até dos rumos da mão de obra atualmente existentes
nos países. Nos EUA, por exemplo, ainda é possível
encontrar pessoal para a realização das colheitas,
pela proximidade das regiões produtoras norte-americanas
com áreas de maior concentração de povoamento
latino. "Já no caso da Austrália, torna-se
complicado a disponibilidade de trabalhadores para a realização
de atividades braçais. Lá, por exemplo, há
equipamentos que poderiam ser facilmente aplicados aqui no Brasil,
como é o caso da colheita de melão", afirma
Ferreira.
Um tipo de esteira móvel acompanha os colhedores que
retiram os frutos e os coloca nela, daí, são levados
para uma espécie de tenda. Para o pesquisador da Embrapa,
são tecnologias que possuem seus prós e contras,
e a introdução delas dependerá de condições
da lavoura, viabilidade econômica e, igualmente, a própria
adesão do produtor, pois se trata de uma quebra de paradigma,
ou seja, uma mudança de pensamento. Neste caso, trazer
o uso da mecanização para algo que era desenvolvido
manualmente.
Na colheita de laranja, por exemplo, com a utilização
do equipamento de auxílio, haverá benefícios,
mas também problemas, que podem ser controlados. O que
foi observado pelo pesquisador, durante os testes com os trabalhadores
na plataforma, é que a remuneração, antes
feita individualmente, no sistema de colheita manual, deverá
passar a ser grupal - nesse sentido o grupo teria de encontrar
uma forma de trabalhar com máximo de sincronia. "Uma
saída interessante foi a utilização de
um aparelho de som, seja ligado num CD, ou numa rádio,
para 'embalar' o processo de colheita. Isso garantiu a sintonia
dos colhedores e melhorou as condições de trabalho,
tornando o ambiente mais agradável".
Acerca das mudanças relativas a disponibilidade de mão
de obra na lavoura, são necessários estudos específicos
para mensurar em que pé o Brasil está em termos
de oferta. No entanto, é possível perceber que
isso aos poucos vem mudando, conforme o aumento de índices
de escolaridade da população, que influi numa
menor participação de trabalhadores rurais.
Em termos de desenvolvimento de áreas para a introdução
de tecnologias de colheita mecanizada, as lavouras de laranja
e melão podem ser as que mais devam se desenvolver futuramente
segundo Ferreira. "A laranja pelo fato da alta demanda
e a importância que a cultura tem na produção
nacional, em especial, em São Paulo. O melão,
também, pela demanda e a facilidade de introdução
do equipamento que dinamizaria o processo de colheita sem prejudicar
os frutos", conclui.
O balanço que faltava nos cafezais brasileiros
É fruto, inicialmente, mas que depois gera os grãos
valiosos para a produção de uma bebida tradicional
no mundo todo. O café também foi uma lavoura na
qual a tecnologia 100% mecanizada chegou no País desde
a década de 1990, a partir de máquinas da Case
IH.
Atualmente, a empresa dispõe de dois modelos de colhedoras
para a cafeicultura - Coffee Express 100 (tracionada) e Coffee
Express 200 (autopropelida), máquinas nacionais, montadas
na fábrica da Case IH em Piracicaba (SP). "O sistema
de colheita dos dois modelos é o mais moderno do mercado",
declara Roberto Biasotto, especialista da Case IH, "alcançando
um alto padrão de rendimento mesmo em terrenos com declividade
acentuada, além de colherem seletivamente, uma vez que
contam com um dispositivo de regulagem hidráulica de
vibração, possibilitando ao operador escolher
a melhor opção de acordo com o estágio
de maturação do grão que será colhido".
Basicamente a máquina reproduz o sistema manual de colheita,
realizando a derriça dos grãos através
de vibração e do contato de um grupo de varetas
instaladas na máquina, segundo Biasotto. A partir da
derriça, o grão cai num sistema de transporte,
passando pelo sistema de limpeza que vai eliminar as impurezas,
chegando ao sistema de descarga.
A produtividade da máquina depende de algumas variáveis,
entre elas, a principal é a condição da
lavoura e a produtividade do cafeeiro. "Em um ensaio realizado
recentemente pela Universidade Federal de Lavras [em Minas Gerais],
em uma lavoura com produtividade beneficiada esperada de 54
sacas por hectare, utilizando o conceito de duas passadas, 96,3%
dos frutos foram retirados das plantas. A capacidade de colheita
verificada girou entre 1,5 e 3 horas por hectare", destaca
o especialista da Case IH.
Graças ao sistema de espinha de peixe, o volume de perda
dos dois modelos é bastante reduzido, uma vez que ele
evita que os grãos caiam fora do sistema, minimizando
o desperdício.
Em geral, são modelos simples de serem operados. "A
Coffee Express 100, diferente das outras máquinas existentes
no mercado, precisa de apenas um operador, que a partir do trator,
controla também a colhedora através de um controle
remoto. O equipamento possui uma altura máxima de 3,975
metros e centro de gravidade baixo, o que lhe confere excelente
estabilidade para trabalhar em declives acentuados, de até
12%, com segurança", ressalta Biasotto.
Já a Coffee Express 200, por suas duas rodas traseiras
e uma dianteira, oferece grande facilidade de manobra nos finais
de rua, carreadores e giradores estreitos. A tração
é independente e permite girar em forma de compasso.
Além disso, possui o menor raio de giro da categoria,
de 3,5 metros. Possui ainda pistões hidráulicos
nas rodas, que garantem um perfeito nivelamento com o chão,
um recurso que assegura melhor estabilidade, mesmo em terrenos
acidentados. |