Para
Sebastião Pereira de Faria Júnior, gerente técnico
de pecuária da Intervet/Schering-Plough, após
uma fase de visível distorção do mercado,
com supervalorização de animais supostamente
de elite, mas sem nenhuma avaliação genética
para características produtivas, existe hoje um movimento
em direção oposta. "A carne uruguaia criou
mercado e, agora, ao ser direcionada a mercados de maior valor,
deixou um vácuo e os preços do cordeiro para
abate dispararam. Os programas de melhoramento como o da Embrapa,
que já existiam, passam a ser percebidos como consistentes
e servem como referência de valor dos reprodutores",
aponta.
Segundo ele, a tendência agora é de haver uma
estruturação dos rebanhos, crescimento da produção
comercial e real aumento de eficiência, porém,
há um longo caminho a ser percorrido no sentido da
padronização dos animais e, como consequência,
da carne oferecida. "Para isto, os esforços devem
se dar na definição de pacotes tecnológicos,
com uniformização de processos, como se vê
em outras cadeias de carnes. Os frigoríficos, grandes
interessados em reduzir a incerteza na qualidade e quantidade
da oferta de matéria prima, devem se engajar no processo:
podem oferecer diferenciação de preço
e modelos de manejo para induzir a adoção das
melhores tecnologias", sinaliza o gerente.
Do lado de dentro da porteira, conhecer o ciclo de desenvolvimento
dos animais é uma das ferramentas que podem auxiliar
o criatório nessa busca pela padronização
do rebanho. Atualmente, já existem informações
de desempenho dos animais nas diversas fases da produção,
tanto na fase de cria - que engloba as etapas de estação
de monta, gestação, nascimento e desmama - quanto
nas fases de recria e terminação. Fernando Henrique
de Albuquerque, pesquisador em Produção Animal
da Embrapa Caprinos e Ovinos, explica que estes indicadores
variam principalmente em função do sistema de
produção, da raça dos animais e da época
do ano. Segundo ele, os indicadores da fase de cria refletem
principalmente o desempenho reprodutivo das matrizes (ovelhas
e borregas - animais de até um ano), como fertilidade
(ovelhas paridas/ovelhas expostas à monta), proliferação
(cordeiros nascidos/ovelhas paridas) e intervalo de partos.
Além do desempenho dos cordeiros até o desmame
(peso ao nascer, peso ao desmame, ganho de peso diário
e sobrevivência do nascimento ao desmame).
Albuquerque destaca que na fase de recria das borregas para
reposição os indicadores estão relacionados
ao desempenho destas para estarem aptas para entrar na estação
de monta (ganho de peso diário, escore de condição
corporal, peso e idade à primeira cobertura). Já
na fase de terminação (engorda) os indicadores
têm como objetivo principal retratar a eficiência
alimentar dos cordeiros (ganho de peso diário, dias
para atingir o peso de abate, conversão alimentar,
escore de condição corporal).
Indicadores de eficiência
O pesquisador reforça que a ovinocultura de corte no
Brasil apresenta uma grande variação de modelos
de sistemas de produção e que os indicadores
de eficiência são muito variáveis. Na
fase de terminação, por exemplo, o ganho de
peso dos cordeiros até o abate varia de 80 gramas por
dia (g/dia) em pastagem nativa (caatinga raleada) no período
chuvoso, 180g/dia em pastagem cultivada irrigada em manejo
rotativo com suplementação concentrada, até
ganhos superiores à 300g/dia em confinamentos utilizando
concentrado e silagem.
Quando o assunto é a conversão alimentar de
ovinos na fase de terminação, ele ressalta que
a taxa varia principalmente em função da idade,
da raça e do tipo de alimentação. Os
cordeiros com idade inferior a cinco meses, de raças
de corte especializadas e alimentados em confinamento com
concentrado e volumoso de alta qualidade, apresentam os melhores
resultados de conversão alimentar, por volta de uma
proporção de três por um (3:1), enquanto
borregos com idade superior à oito meses, de raças
não especializadas e alimentados em pastagem apresentam
conversões superiores à 10:1. "Estas variações
de eficiência produtiva mostram a necessidade de planejamento
e gestão dos sistemas produtivos para que a atividade
apresente sucesso técnico e econômico".
Para garantir altos índices de fertilidade, especialistas
recomendam que o importante é não perder escore
corporal e a suplementação entra como aliada
nesse sentido. A correta mineralização implica
em ganhos adicionais de peso de até 30%. O correto
manejo nutricional também proporciona benefícios
à carne - quando se tem um ganho diário maior,
o marmoreio da carne é melhor, garantindo sabor e textura
mais agradáveis. De acordo com Lauriston Bertelli diretor
técnico da Premix (empresa do ramo de nutrição
animal), no caso de suplemento aditivado com produtos orgânicos,
a composição da gordura também é
diferenciada com maior presença de ômega 3.
Melhoramento genético
É possível falarmos de ovinos provados para
produção de carne? A resposta é sim.
Se na bovinocultura já se consegue quase que projetar
um programa de melhoramento genético, com baixas margens
de erro, na ovinocultura o caso não é diferente.
Na opinião de Octávio Rossi de Morais, pesquisador
em Melhoramento Genético Animal também da Embrapa
Caprinos e Ovinos, no comparativo entre as duas atividades,
deve-se levar em conta que a ovinocultura fora do Brasil,
especialmente na Nova Zelândia e no Reino Unido, está
num patamar até mais avançado que a bovinocultura
mundial.
Segundo ele, no Brasil existem as ferramentas e profissionais
gabaritados para executar os trabalhos de melhoramento dos
ovinos, mas infelizmente não avançamos muito.
"Temos na Embrapa o GENECOC (Programa de Melhoramento
Genético de Caprinos e Ovinos de Corte), que é
um programa pronto para dar as respostas em termos de avaliações
genéticas e diretrizes para o melhoramento de ovinos.
Os programas precisam de dados gerados nas fazendas, em especial
naquelas que realizam seleção. Infelizmente
há pouco envolvimento dos criadores, especialmente
porque o criador do ovino de elite está totalmente
desvinculado do produtor comercial, os interesses não
são comuns. Isto é o reflexo de uma cadeia produtiva
que ainda precisa de muitos ajustes", diz.
Ele afirma que o os ovinos podem rapidamente alcançar
o que foi feito nos bovinos e até superar seus resultados,
desde que os criadores se conscientizem da necessidade de
se abandonar a velha fórmula da avaliação
de pista e se envolvam nas avaliações zootécnicas
objetivas. "É preciso lembrar que os ovinos têm
um intervalo de gerações muito inferior ao dos
bovinos, e isto faz muita diferença para se alcançarem
os ganhos genéticos", pontua, enfatizando ainda
que carne ovina de boa qualidade é a oriunda de animais
jovens, com boa musculosidade e cobertura de gordura suficiente
apenas para manter o sabor e a maciez, ou seja, não
difere dos padrões de qualidade da carne bovina, apenas
é outra carne.
"O que tem sido aprimorado é exatamente o tipo
de animal que se entrega para o abate quando se trata do consumo
de carne não processada. Antigamente comíamos
carne de carneiro, de capões (animais castrados para
engorda) e de ovelha, hoje o produto é o cordeiro,
ou seja, é um 'novilho', que de preferência deve
ser bem acabado", compara.
Aposta no mercado
De olho nas perspectivas e possibilidades de expansão
do setor, uma vez que a oferta da carne de cordeiros no Brasil
não atende a demanda atual, o Grupo Marfrig tem realizado
um trabalho de incentivo à ovinocultura brasileira,
visando aumentar a oferta e a qualidade dos animais. O coordenador
de ovinos do Grupo, Gustavo Martini, conta que a companhia
é hoje a maior fornecedora de carne congelada de cordeiro
no mercado nacional, tendo iniciado a produção
na unidade de Promissão (SP) em abril de 2009. Além
dessa unidade, com capacidade de abate de mil ovinos por dia,
foram instalados em outubro do mesmo ano dois confinamentos
de ovinos, um em Getulina (SP), com capacidade estática
de 2.500 cordeiros e outro em Marília, em parceria
com a Universidade de Marília (Unimar), com capacidade
estática de mil cordeiros. Em janeiro de 2011 foi iniciado
outro confinamento de ovinos com capacidade estática
de 3.000 no município de Birigui (SP).
No Rio Grande do Sul, as operações com ovinos
começaram em outubro de 2009, quando a Marfrig ampliou
suas atividades no Estado com o arrendamento das unidades
de Mato Leitão, Alegrete e Capão do Leão
I, do Frigorífico Mercosul, com capacidade total de
3.500 animais/dia. Assim como em São Paulo, lá
também foi instalado um confinamento de ovinos com
capacidade estática de 6.000 animais.
"Este é um mercado promissor no qual temos investido
em genética de ponta, saúde, nutrição
e manejo adequado nos sistemas de produção através
de equipe técnica oferecendo suporte no campo aos fornecedores,
contribuindo para aumento da eficiência e lucratividade
da atividade", analisa Martini, salientando que a Marfrig
incentiva todas as raças que produzem carnes de qualidade,
porém comercializa duas combinações:
o Primera, formado pelas raças Suffolk, White Suffolk
e Pool Dorsete, e o Highlander, um composto Materno, formado
pelas raças Texell, Finn e Romney.
Trabalho de seleção
Em Jarinu, cidade próxima a Jundiaí (no interior
de São Paulo), um criatório tem incentivado
outras propriedades a realizarem a seleção genética
de ovinos, fazendo com que a região, que conta com
um abatedouro especializado, homologado pelo SIF (Serviço
de Inspeção Federal), com capacidade de abate
para 1.500 animais/mês, se estabeleça como um
dos principais pólos de excelência genética
do Estado. Trata-se da Dorper Campo Verde, projeto que está
no mercado desde 2006 selecionando carneiros e ovelhas das
raças Dorper e White Dorper, de linhagem sul-africana.
Lucas Heymeyer, responsável de vendas da Dorper Campo
Verde, relata que o objetivo da seleção é
oferecer ao mercado animais de excelência genética
e também reprodutores comerciais, com produtividade
e fertilidade comprovada. Outra ponta do projeto é
fomentar a atividade, mostrando as vantagens proporcionadas
por essas raças em programas de seleção
genética e cruzamento industrial. Cerca de 1/3 de seus
clientes são novos criadores, fato que ele diz ser
algo fundamental ao desenvolvimento da atividade. "Em
sistemas de cruzamento industrial que usam Dorper e White
Dorper PO, cordeiros são abatidos com até 150
dias de idade e peso vivo próximo ou superior a 40
quilos (kg). O carneiro sul-africano também agrega
ganhos de até 25% em precocidade de terminação,
velocidade de ganho de peso e rendimento de carcaça",
assegura.
No trabalho de melhoramento da propriedade eles preconizam
que as fêmeas devem emprenhar facilmente, serem boas
mães e desmamar borregos pesados no menor tempo possível.
Já os machos devem desempenhar perfeitamente seu papel
de reprodutor, cobrindo um grande número de fêmeas
e imprimindo as características raciais e produtivas
desejáveis.
Heymeyer evidencia que a seleção é uma
das pioneiras na comercialização de reprodutores
e matrizes com produtividade atestada pelo programa de melhoramento
genético da USP/Pirassununga. Todo o rebanho participou
de testes de progênie e possue DEPs (Diferença
Esperada na Progênie) para as características
de real interesse dentro da atividade, como ganho de peso,
precocidade, fertilidade e habilidade materna. "Outra
ferramenta que ganha espaço na seleção
Campo Verde é a avaliação de carcaça
por ultrassonografia. Com ela, são identificadas, precocemente,
características de grande impacto na produção:
acabamento de carcaça, acabamento de gordura e peso
ao abate. A leitura de carcaça com ultrassonografia
permite a separação do rebanho em lotes por
grau de precocidade, com confiabilidade acima de 93%. São
especialmente analisadas Área de Olho de Lombo (AOL
- região do contrafilé), Espessura de Gordura
Subcutânea (EGS) e Peso Vivo (PV)", finaliza.
Ovinocultura Brasileira
O Brasil apresenta grande possibilidade de crescimento nesse
segmento. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística (IBGE), o rebanho ovino brasileiro está
em torno de 16 milhões. O Nordeste detém o maior
número de cabeças - 56,4%; em seguida está
o Sul com 29,1% e o Sudeste está em quarto com 4,6%.
O País detém menos de 1% da produção
mundial de carne ovina, com abate médio anual de 970.000
cabeças. O consumo per capita da carne é de
700 gramas por habitante por ano, enquanto em países
como Nova Zelândia são consumidos 30 kg e na
Austrália 20 kg.
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