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ARROZ - CONTRIBUIÇÃO GAÚCHA
rev 141 - novembro 2009

Responsável por 63% da produção brasileira, o Rio Grande do Sul desponta com o melhor rendimento por hectare do País e caminha para ser o Estado que poderá, sozinho, suprir a necessidade do grão na cesta básica do brasileiro, apesar do preço não auxiliar a produção. O período de plantio de arroz no Rio Grande do Sul começou desde setembro, e até o dia 23 de outubro, de acordo com o Instituto Rio Grandense do Arroz (Irga), 32,70% da área de 1.088.899 hectares (ha) já foi semeada. A porção de terra destinada ao cultivo do grão nesta safra de 2009/2010 que se inicia é 1,52% inferior em relação à da safra passada, mas, mesmo assim, pelo histórico de produtividade que o Estado vem apresentando, é bem possível que isso nem signifique uma queda na produção.

“Estamos ainda na fase de plantio e ainda é cedo para se falar em estimativas de safra”, afirma Walter Arns, orizicultor e também presidente da Associação dos Arrozeiros de Uruguaiana (RS). “O que mais está nos preocupando, nesse início de plantio, é o déficit hídrico que vem ocorrendo nos últimos anos, especialmente aqui na região, e este ano está pior que no ano passado, com o registro de chuvas abaixo do esperado, por isso estamos aguardando acumular mais água para a recuperação dos mananciais para assim, terminar a semeadura”, explica o produtor.
A falta de chuva afetou mais incisivamente a Fronteira Oeste do Estado, que compreende também os municípios de Alegrete, Itaquí, Barra do Quaraí, Santo Antônio das Missões e São Borja. Em Uruguaiana, em setembro deste ano, choveu 121,3 milímetros (mm), sendo que a média normal mensal é de 102,9 mm, de acordo com os dados do Irga. Já no mês de outubro, até o dia 28, foram só 85,6 mm (a média normal seria 162 mm no mês).
Em comparação com ano passado, com base no mês de outubro (até o dia 28), segundo o Irga, a Fronteira Oeste de RS registrou um déficit de 41% nas precipitações. Na região de Campanha apresentou uma queda de 23% nos níveis de chuva. Este mesmo índice também foi constatado na Zona Sul do Estado. Quem se saiu bem foi a região da Depressão Central, com um superávit pluviométrico de 14,42%.

O líder em produtividade

A chuva pode estar faltando, mas ainda não tira o destaque do Estado, e em especial, do município de Uruguaiana (RS), que é o maior em produtividade do Brasil. Na safra de 2008/2009, ele registrou um rendimento médio de 8.237 quilos por hectare (kg/ha), segundo o Irga, ao passo que a média estadual girou em 7.150 kg/ha e a nacional em 4.344 kg/ha, de acordo com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Em todo País, a área cultivada do grão, nesta safra de 2009/2010, pode variar entre mais de 2,8 milhões de ha e 2,9 milhões de ha, representando desde uma queda de 0,7% a um acréscimo de 0,1% em relação a área da safra passada, segundo a Conab.
O melhor desempenho com a cultura no Sul do País está associado ao sistema ser todo irrigado por inundação, além das condições climáticas e de solo que auxiliam o desenvolvimento da cultura, garantindo maior produtividade. Segundo Maurício Miguel Fischer, presidente do Irga, a medida que mais favoreceu o melhor rendimento na lavoura foi a escolha correta da época de semeadura, que atualmente vai de setembro até o final de novembro e início de dezembro. “Plantávamos muito tarde e aí a planta não aproveitava o melhor período de maior luminosidade que vai de dezembro a janeiro”, explica.
Aliada à época certa de plantio, o uso de tecnologias também foi o responsável pela excelência gaúcha no quesito arroz, como por exemplo, o uso de sementes de qualidade e melhoradas, cultivares mais produtivas, o melhor tratamento com o solo e o controle precoce de plantas invasoras.
Ao longo de 33 anos, segundo o acompanhamento feito pela Conab, a safra do grão no Estado tendeu ao crescimento. As quedas mais significativas nesse período foram na safra de 1994/1995, que registrou uma produção de 5,07 milhões de toneladas (t), para a safra de 1997/1998, que fechou com 3,6 milhões de t. Já na subsequente (1998/1999), eis que surge a recuperação histórica do grão, com aumento da produção em mais de 55% (mais de 5,6 milhões de t de arroz). O saldo da colheita de 2003/2004 também foi bem positivo, com acréscimo em 36,97% na produção em relação ao resultado anterior, ainda segundo os dados da Conab.
O império arrozeiro que se constituiu o Rio Grande do Sul se deu unicamente pelo rendimento das safras, porque, em termos de área cultivada, o arroz esteve em terceiro lugar entre os produtos agrícolas do Estado, com uma área de 1,1 milhão de ha, na safra 2008/2009, segundo a Conab. A soja foi a produção que ocupou o maior espaço, com 3,8 milhões de ha, só que uma produtividade que ficou em quarto lugar entre as cinco principais culturas gaúchas, com um rendimento médio de 2.070 kg/ha. O milho veio em segundo lugar tanto em área plantada (1,3 milhões de ha) como em produtividade (3,06 kg/ha).

Preço e custo desfavoráveis

O arroz pode até ser o rei no Rio Grande do Sul, mas a coroa que ele carrega não vale muita coisa, além de ser muito cara para mantê-la reluzente – essa é a analogia que se pode traçar a partir dos aspectos de preço pago ao produtor e custo de produção da lavoura. Na safra de 2008/2009, a média de custo da saca de 50 quilos ficou em R$ 33,35, enquanto que o valor pago ao produtor girava entre R$ 26,00 e R$ 27,00 a mesma saca, ou seja, um prejuízo de R$ 6,35 a cada fardo produzido.
Para a safra 2009/2010 os custos ficaram em R$ 28,07 a saca, no entanto os preços permaneceram nos mesmos patamares anteriores, o que desafiam os produtores de arroz do País, que ainda têm de concorrer com o produto vindo da Argentina, do Uruguai e, mais recentemente, do Paraguai. “Para uma indústria, com aumento do valor da produção, é fácil para ela repassar isso na hora venda, e isso é o que não acontece no caso de um produto como o arroz, que é um alimento, uma commodity”, analisa Luiz Antônio Queiroz, também orizicultor de Uruguaiana. “No nosso caso, para conseguirmos um bom resultado na safra, só nos resta baixar os custos de produção, e isso, aqui no Brasil, é extremamente complicado devido às altas tributações que incidem nos mais variados aspectos do desenvolvimento da lavoura, como no combustível, no maquinário, no gasto com eletricidade, e no próprio âmbito trabalhista”, pontua Queiroz.
Enquanto isso, a produção argentina, uruguaia e paraguaia, que têm o mesmo potencial climático e de solo para conseguir um nível de qualidade semelhante ao brasileiro, possuem um custo mais baixo no final das contas, além de contarem com uma maior flexibilidade, por parte dos governos daqueles países, em termos de manejo e trato com a lavoura. “No Brasil, a produção é mais rígida quanto ao uso de sementes e herbicidas, e o posicionamento do governo não é muito de baixar tributos, o que ele faz é disponibilizar mais crédito ao produtor, e essa conta depois deve ser paga... Mas como ela vai ser paga se não há remuneração por parte dos produtores? Vai ter de haver uma política que possa minimizar essa situação, e não sou otimista quanto a uma solução em curto prazo, ainda mais com esses preços praticados no País”. Apesar da insistência por parte da Revista Rural, o governo federal, através do representante, Reinhold Stephanes, ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), até o fechamento desta edição, não se pronunciou sobre a situação dos orizicultores brasileiros e o que há de políticas cabíveis que contribuam para o cultivo do grão no País.

Consumo estável e cenários futuros

Nos últimos cinco anos o consumo de arroz no País manteve-se estável, dando uma média superior a 12,8 milhões de t e a produção brasileira já está pratica-mente alcançando essa quantidade. Na última safra, segundo os dados da Conab, por exemplo, a estimativa ficou em 12,6 milhões de t – deste total, 63% vieram de terras gaúchas. “Conseguimos esse resultado porque o arroz irrigado rende mais, com isso a produtividade se torna melhor, a única questão é a baixa rentabilidade que a lavoura vem proporcionando aos produtores brasileiros”, pondera Arns.
Não bastassem os preços baixos, a concorrência com as produções vindas do Mercosul força as exportações brasileiras, que neste momento, também não oferecem um quadro positivo ao produtor em função da queda gradual que o dólar vem sofrendo desde fevereiro deste ano, que no final das contas pagou R$ 38,50 a saca – analisando o total exportado este ano, de janeiro a setembro, segundo o Mapa a um valor do dólar na casa dos R$ 1,74. Foram exportadas nesse período 505,6 mil toneladas do grão o qual rendeu mais de US$ 223,9 milhões – resultado 3,64% superior em relação ao mesmo período de 2008.
A estimativa dos estoques de arroz para a safra 2009/2010 ainda expressa a queda do resultado de 2008/2009, ficando em 752,9 mil t – quantidade 23,34% inferior em relação aos estoques de 2008/2009, que foram contabilizados pela Conab em 982,1 mil t no segundo levantamento de grãos divulgado em novembro deste ano pelo órgão estatal. Ainda segundo esse estudo, para a safra 2009/2010, a produção de arroz giraria em torno de 12,1 milhões de t, a importação, em 1 milhão de t, e a exportação, em 500 mil t.
Mesmo com estoques em baixa, o arroz não faltará nos próximos anos, e o crescimento do grão em longo prazo parece ser promissor – pelo menos este é o cenário para o arroz de sequeiro em terras gaúchas até o ano de 2070, de acordo com o estudo ‘Aquecimento global e a nova geografia da produção agrícola no Brasil’, coordenado pelos pesquisadores Eduardo Delgado Assad, da Embrapa Informática Agropecuária (Campinas/SP) e Hilton Silveira Pinto, especialista em meteorologia agrícola da Universidade de Campinas (Unicamp). “Com um aumento das temperaturas estimadas de 2°C a 5°C, o nível de chuva na região ficaria em torno de 5% a 15% superior, o que propiciaria quadros positivos para o arroz no Sul do País”, analisa Pinto. O estudo foi feito com base no arroz de sequeiro, o qual é produzido no Brasil Central, pelo fato de os pesquisadores não mais indicarem sistemas irrigados na lavoura diante desse cenário de alterações climáticas que poderá afetar a agricultura brasileira, mediante ao que se pode denominar de aquecimento global.
O alto desempenho da cultura em produtividade compensaria a produção ao longo desses cerca de 60 anos o qual compreende o estudo. No entanto, a demanda seria o fator que complicaria a oferta do grão. Segundo o trabalho dos pesquisadores, as projeções da população brasileira, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), girariam em 70 milhões de habitantes a mais no País daqui a 40 anos. O saldo nacional acerca do grão, em 2070, indicaria uma área 14% menor para o cultivo e com prejuízos que poderiam alcançar um pouco mais de R$ 600 milhões.


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