Uma das propriedades descrita acima é o Sítio
São José, localizado no Distrito de Coronel
Macedo (SP), na região de Itapeva, que mantinha 30
vacas pastando, em 10 alqueires e vendendo o litro do leite
a R$ 0,28. Não dava lucro, a gente sobrevivia,
mas não tinha renda suficiente para investir na propriedade,
no rebanho, lembra Pedro Geraldo Oliveira, o proprietário
do sítio.
Oliveira não pretendia seguir com o trabalho na fazenda
até o dia em que as perspectivas, inexistentes até
então, começaram a melhorar. Não
pretendia trabalhar aqui na roça. Estava pensando em
procurar emprego na cidade porque aqui não dava para
tirar uma renda, no final do mês. Mas com a mudança
de diversas práticas, começou a sobrar um pouquinho
e vi que poderia melhorar a cada dia, lembra.
As mudanças começaram por meio do Projeto de
Desenvolvimento da Pecuária Leiteira do Serviço
Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae)
de São Paulo, que visa prioritariamente unir o pecuarista
leiteiro em formato de associação, buscando
excluir o atravessador e propiciando investimento de melhoria
da qualidade e, consequentemente, aumentando a remuneração.
A principal intenção do projeto do Sebrae
é manter o produtor na atividade, porque muitos estavam
tirando 40 litros por dia, o que não chega nem a sustentar
a atividade. Muitos estavam mudando de ramo, explica
Murilo Rodrigues, analista de projetos do Sebrae.
Início
do projeto
Em 2006 os produtores começaram a receber as primeiras
instruções, por meio de visitas técnicas,
Dias de Campo e palestras. O primeiro passo foi coletar dados
das propriedades como quantidade e tempo de parição
dos animais, além de quantidade de litros de leite
por vaca. Uma vaca que dá 20 litros de leite
em um dia pode ser pior do que a que deu 10 litros. O que
realmente temos que reparar é a quantidade de leite
durante o ano, porque algumas têm período de
seca muito grande, apesar de produzir 20 litros em um dia,
comenta Rodrigues.
Como eles não trabalhavam com inseminação
artificial e muitas vacas não tinham aptidão
leiteira, algumas só traziam prejuízos ao negócio.
Lembro quando começamos a marcar a quantidade
de leite que tirávamos de cada uma, e teve uma vaca
produzindo 800 mililitros (ml). A minha esposa se recusou
a marcar, lembra Pedro Oliveira, do Sitio São
Francisco.
Muitos produtores tinham apego aos animais, o que dificultou
o descarte. Era necessário vender cerca de seis vacas
para adquirir uma, o que dificultava ainda mais convencer
o pecuarista. Outros problemas apontados no início
do projeto era a intenção dos produtores de
trabalhar com o gado de corte e leite. Apesar de produtores
de leite, eles não descartavam os machos, o que traziam
prejuízos por passar oito meses mamando quatro litros
por dia. Somando o custo desses oito meses de leite, sendo
R$ 0,58 (preço médio do litro em 2008), eram
cerca de R$ 960 reais, sendo que não se pagava mais
de R$ 400 por um animal sem raça.
Os produtores também tiveram de anotar todas as informações
sobre sanidade, o que foi muito difícil, porque muitos
nem chegavam a vacinar o gado. O passo seguinte foi juntar
os produtores em cooperativas, para que pudessem vender o
leite em conjunto, retirando o atravessador e tendo mais condições
de negociar o preço com o laticínio. Além
disso, unidos, os produtores poderiam realizar investimentos
em infraestrutura e tecnificação das propriedades,
já que teriam o crédito mais facilmente. Por
último, os pecuaristas receberam apoio para análise
de solo da propriedade, o que garantia um trabalho de pastagem
mais intenso, buscando intensificar a produtividade e o manejo
do gado.
O suporte técnico veio de trabalhos publicados pela
Embrapa Gado de Leite (Juiz de Fora/MG), que indicam ao produtor
a melhor forma de cuidar do pasto. O produtor deve determinar
uma área para irrigar e adubar, formando piquetes com
alto volume de massa verde para pasto. Cada propriedade tem
suas características que variam a quantidade de piquetes
e tamanho de cada um, além de fatores climáticos.
Não há regra, mas o produtor Sebastião
Neves Ariel, de Riversul (SP), utiliza dois hectares de terra
para os 25 piquetes que possui, com capim, aveia e azevém,
oferecendo nutrição a 11 vacas. Cada noite o
rebanho é manejado em um piquete e depois de passar
pelo último, volta a pastar no primeiro. Durante o
dia, o animal recebe cana-de-açúcar picada com
ureia, como suplementação.
O ideal é que cada piquete possa descansar em torno
de 25 a 35 dias, dependendo da época de chuvas e da
duração do sol. Já a lotação
varia devido ao estabelecimento da forrageira, época
do ano, adubação e irrigação de
cada propriedade. Já a escolha do capim depende da
área, se for de baixada e de meia-encosta, que apresenta
boa fertilidade natural, pode-se utilizar espécies
de maior fertilidade e qualidade, como capim-elefante e o
croast-cross. Áreas de baixada, com encharcamento,
recomenda-se espécies forrageiras e tolerantes a essas
condições, como setária, capim-angola
e canarana. Já em áreas de declive acentuado,
com menor fertilidade natural ou de maior risco de erosão,
deve-se escolher forrageiras mais rústicas, usando
as braquiárias, que cobrem o solo rapidamente.
Com
os dois pés atrás
No início, foi muito difícil do pecuarista acreditar
no sistema de rotação de piquetes, porque não
acreditava na irrigação de pasto. Para
o produtor que há anos fazia tudo da mesma forma, é
complicado mudar o costume, ainda mais falando para irrigar
capim, comenta Rodrigues.
Logo nos primeiros meses de projeto, eram apenas 23 produtores
interessados, hoje, são 70 só na cidade de Riversul
(SP) a pioneira a entrar no projeto. Além dela, Itapeva
e Itararé também participam com 46 e 54 produtores,
respectivamente.
Com o manejo do pasto rotacionado, sobra área da propriedade
para outras atividades ou para arrendamento, como é
o caso de Teresa Bizam, proprietária do Sítio
São Luiz. Antigamente, eram 26 alqueires de pasto,
que produzia 70 litros com 17 vacas, vendendo o litro a R$
0,28. Hoje, são 12 alqueires de pasto, produzo 180
litros com 10 vacas e vendo o litro a R$ 0,69, afirma
a pecuarista. Dona Teresa foi uma das pioneiras a acreditar
que entrando na Associação dos Produtores Rurais
de Itararé e, unindo-se aos pecuaristas, teria resultados
importantes para o negócio. Anos atrás o mercado
pagava mais para quem tinha mais leite para vender, mas com
a Associação, o preço é o mesmo
para o pequeno e para o médio produtor. Atualmente,
não são os produtores que vão vender
o leite, mas as grandes empresas é que procuram a associação
para comprar o produto.
Cada uma das cidades paulistas Itararé, Itapeva
e Riversul têm uma associação de
produtores, com diversos tanques de mil e 500 litros distribuídos
pela região para facilitar o armazenamento e a coleta.
O investimento foi em torno de R$ 250 mil, financiado junto
às associações, o que seria inviável
sem as entidades. Os tanques ficam nas propriedades dos pecuaristas,
como é o caso de Sebastião Ariel, que é
o responsável por um tanque de mil litros. Como
o tanque está aqui, tenho de verificar a qualidade
do produto fazendo os testes básicos. Se der algum
problema no leite lá na frente, a culpa cai em cima
de mim, explica o pecuarista. O exemplo do sítio
de seu Sebastião, ilustra exatamente toda a mudança
na vida dos pecuaristas leiteiros da região.
Há quatro anos, seu Sebastião tinha 15 vacas
com a produção média de 4 litros/dia
cada uma. Hoje, tem 11 vacas com média de 14 litros/dia,
sendo que só usa dois hectares para os piquetes, dos
nove que possui. O restante, além de arrendar, planta
milho, cana e tremoço. Com o lucro resultante do aumento
do preço do leite e da quantidade vendida, o produtor
investiu na ordenha, mecanizando o sistema. Fez o fosso, adquiriu
os bicos e ainda suplementa o gado com ração
após a ordenha. Tudo mudou. Antes, não
tinha renda com as vacas, tinha mais vacas, elas comiam mais,
em uma área maior e davam menos leite. Hoje, a produtividade
do meu sitio é muito maior, tenho como investir na
propriedade e ainda tirar um valor maior por mês,
sintetiza.
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