Embrapas
criam sementes com mais nutrientes do que as convencionais,
visando diminuir a desnutrição mundial. Um projeto
pioneiro no mundo desenvolvido por diversas unidades da Embrapa
começa a ser colocado em prática nas lavouras
brasileiras. É o processo da biofortificação,
um aumento da qualidade nutricional dos alimentos básicos,
apresentado com orgulho pelos pesquisadores. A intenção
do projeto é diminuir a desnutrição alimentar
enfrentada principalmente pela população de
baixa renda. Em 1996, 10,4% das crianças brasileiras
estavam abaixo da altura esperada para a idade, e este é
um dos fatores de medição da desnutrição
infantil. Oito culturas já possuem amostras de cultivares
com maior teor de ferro, zinco ou betacaroteno pigmento
que se transforma em vitamina A, no sistema digestivo. Os
estudos da Embrapa começaram em 2003, com a mandioca,
tendo a sua quantidade de betacaroteno alterada. As outras
culturas que estão sendo estudadas são: a batata-doce,
o arroz, o feijão, o feijão-caupi, a abobrinha,
o trigo e o milho. A mandioca foi a primeira a ser idealizada,
porque é uma cultura presente em todo o mundo na faixa
tropical e subtropical do globo. Assim, ela atende ao desejo
de ser plantada em diversos locais e cumprir o papel de suprir
a deficiência alimentar das populações,
explica Wania Fukuda, da Embrapa Mandioca e Fruticultura (BA).
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A
intenção é que a população
rural seja atendida o quanto antes devido à desnutrição
alimentar existente no Brasil e em outras regiões,
como a África e a Ásia. Números da Pesquisa
Nacional de Demografia e Saúde da Criança e
da Mulher, divulgados pelo Ministério da Saúde,
mostram que 25,2% das crianças estavam desnutridas
na zona rural do Nordeste, em 1996, enquanto em áreas
urbanas na mesma região esse número não
atingia os 15%. Os nutrientes selecionados para elevar o grau
de nutrição, são: o ferro, que combate
a anemia (doença resultante pelo baixo teor de hemoglobina,
que tem a função de transportar o oxigênio
dos pulmões para os tecidos); o zinco, que contribui,
entre outras funções, com o sistema imunológico;
e o betacaroteno, que se transforma em vitamina A, (nutriente
essencial para os olhos, podendo deixar a pessoa cega em caso
de escassez no organismo).
Pesquisas
A linha de pesquisa trabalha com a identificação
das plantas potencialmente aproveitáveis, ou seja,
aquelas que possuem alto teor de nutrientes. O trabalho começa
no laboratório, que identifica as qualidades e, a partir
daí, são realizados os cruzamentos das melhores
mudas. Podemos usar até 1.000 plantas para chegarmos
a uma que tenha maior quantidade de ferro, zinco ou betacaroteno,
explica Marília Nutti, da Embrapa Agroindústria
de Alimentos (RJ), e coordenadora nacional do projeto de Biofortificação.
Além da planta conter boa quantidade de nutrientes,
é fundamental ter produtividade. Não podemos
elaborar uma planta com alto teor de ferro e zinco só
que não ter boa produtividade, porque assim nenhum
agricultor terá interesse em plantá-la,
afirma José Luiz Viana de Carvalho, pesquisador da
Embrapa Agroindústria de Alimentos. Por este motivo,
todos as cultivares terão, no mínimo, a mesma
produtividade que as convencionais, já que esses atributos
também foram identificados no laboratório.
Entretanto, o arroz e o feijão estão recebendo
trata-mento especial por comporem grande parte da alimentação
do brasileiro. As pesquisas foram desenvolvidas para que ambos
sejam nutritivos, com teor de ferro e zinco elevados, e também
tolerantes a seca. Em ambos os casos, os pesquisadores acreditam
que podem dobrar a concentração dos nutrientes
nos grãos.
Mandioca
A raiz é um caso a parte já que entre todas
as culturas estudadas, é a que tem o ciclo mais demorado,
cerca de um ano. Em comparação, o milho tem
um ciclo de quatro meses, o que facilita a evolução
das pesquisas, já que a checagem de resultados e os
cruzamentos podem ser realizados com maior frequência.
Um aipim amarelo convencional apresenta teor de betacaroteno
de um a dois microgramas por quilograma (kg), e com a biofortificação
os pesquisadores já atingiram raízes de nove
microgramas por kg, que inclusive estão sendo cultivadas
em Sergipe por produtores familiares, como forma de teste
de produtividade e aclimatação. Nós
precisamos ver se na prática a mandioca apresenta todas
as características da raiz convencional para declararmos
que a nova variedade é viável economicamente.
É bom trabalharmos com pequenos produtores porque eles
estão vendo de perto a lavoura e se tivesse qualquer
problema com a produção, eles falariam o quanto
antes, já que a renda deles depende daquilo,
explica José Luiz Carvalho.
Um dos produtores que está testando a macaxeira biofortificada
pela Embrapa é Manoel dos Santos, o Dedé,
que produz há seis anos diferentes variedades. Eu
percebo que essa variedade que eles me trouxeram é
mais resistente a pragas do que as outras que eu plantava
antes. A aceitação na hora da venda é
boa sim. Por ser diferente, o pessoal quer comprar para experimentar.
Ela tem um sabor diferente e o pessoal aqui gosta, comenta
o produtor do Assentamento Bela Vista, em Sergipe. O próximo
passo é chegar ao teor de 12 microgramas de betacaroteno
por kg na mandioca e por fim aos 15 microgramas. Realmente
15 é o limite, não acreditamos que possa passar
desse número. Chegar lá já será
bem complicado, mas vamos continuar com as pesquisas até
atingir a meta, comenta José Luiz.
Arroz
e feijão
Atualmente o arroz está sendo plantado com seis microgramas
de ferro por kg de alimento. Infelizmente nós
retiramos a casca do arroz antes de chegar ao prato, o que
reduz muito a quantidade de ferro no grão. Nossa meta
é chegar a 15 microgramas de ferro por kg de arroz,
explica José Luiz.
Já o feijão é uma das culturas mais avançadas,
assim como a mandioca. Já estão sendo plantados
grãos com 80 microgramas de ferro por kg, e a meta
é que esse número chegue a 100. Estamos
distribuindo sementes de dois tipos de feijão. Apesar
de já estar com alto índice de ferro, sabemos
que podemos melhorar ainda mais, analisa o pesquisador
da Embrapa.
Além do feijão tradicional, está sendo
estudado o feijão-caupi, conhecido também como
feijão de corda. Um grão convencional tem cerca
de 30 microgramas de ferro, mas a Embrapa Meio Norte, responsável
por este grão, já conseguiu dobrar a quantidade,
chegando a 60 microgramas. A meta é atingir cerca de
100 microgramas, mais do que o triplo da quantidade original.
Batata-doce
e milho
Para a batata-doce, a Embrapa importou uma nova variedade
da raiz, que possui a polpa alaranjada e que pode render melhores
resultados aos pesquisadores. A ambientalização
foi muito tranquila porque a batata-doce é muito rústica.
Hoje, ela já é plantada com 100 microgramas
do pigmento betacaroteno por kg, sendo que a meta da Embrapa
Hortaliças (DF) é atingir os 200 microgramas,
comenta José Luiz.
O milho é outra cultura em que se investe no betacaroteno.
O alimento convencional possui entre um e dois microgramas
do pigmento por kg, e hoje a pesquisa já atingiu seis
microgramas com a meta de chegar a 10. A responsável
pela pesquisa é a Embrapa Milho e Sorgo, de Minas Gerais.
Já para as cultivares como a abóbora e o trigo,
as pesquisas ainda estão apenas no início. Não
há nenhuma perspectiva de quanto existe de ferro e
zinco nos alimentos e muito menos qual a meta para cada um.
Futuro
Os pesquisadores acreditam que esses cultivares deverão
ser largamente plantados nos próximos anos, já
que possuem, no mínimo, as mesmas condições
de produtividade e por conterem maior quantidade de nutrientes.
O arroz e o feijão, além dos nutrientes,
contêm tolerância à seca. Todas as plantas
usadas para realizar os cruzamentos foram selecionadas analisando
prioritariamente os nutrientes, mas em nenhum momento foi
deixado de lado a questão da produtividade e climatização,
porque são fatores importantes para os produtores.
Se o agricultor não for favorecido financeiramente,
ele não vai plantar. Tivemos essa preocupação
desde o início do projeto, explica Wania Fukuda,
da Embrapa Mandioca e Fruticultura.
Já a possibilidade dos agricultores de conseguirem
vender o produto biofortificado por um preço maior
é menosprezada pelos próprios pesquisadores.
Alguns desses produtos são commodities e não
há condições de conseguir valorização
devido a maior quantidade de nutrientes. Já outros
produtos, como a mandioca, o que percebemos hoje é
que ele tem uma saída mais rápida do que os
convencionais, mas mesmo assim não acredito que venha
a valer mais, comenta o pesquisador da Embrapa, José
Luiz Carvalho.
São oito unidades participantes do projeto, tais como
a Embrapa Milho e Sorgo (MG), com pesquisas do milho. Embrapa
Trigo (RS), com pesquisas no cereal que leva o nome da unidade.
Embrapa Hortaliças (DF), com pesquisas sobre a batata-doce.
Embrapa Mandioca e Fruticultura (BA), com análise em
aipim. Embrapa Arroz e Feijão (GO), com pesquisas em
ambos os cereais que levam o nome da unidade. Embrapa Tabuleiros
Costeiros (SE), com investimentos em abóbora. E a Embrapa
Meio-Norte, com pesquisas com o feijão-caupi.
Agricultores interessados em adquirir amostras dos cultivares
podem entrar em contato com a Embrapa responsável pela
pesquisa da cultura interessada, ou ligar na Embrapa Sede
(DF) no telefone (61) 3448-4433 e solicitar informações.
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