As informações foram obtidas a partir do sequenciamento
de uma vaca da raça Hereford e o estudo levou sete
anos para ser finalizado.
Agora, os bovinos fazem parte de um pequeno grupo de animais
entre eles, os humanos, outros primatas e roedores
que tiveram seus genomas decodificados. A partir
de agora, diversos projetos e pesquisas serão dedicados
a desvendar outras características do genoma bovino.
Esse foi só o começo, argumenta o pesquisador
da Unesp de Araçatuba (SP), José Fernando Garcia,
especialista em genômica e integrante do consórcio
internacional.
O pesquisador compara o sequenciamento a uma abertura de uma
caixa-preta, repleta de informações anteriormente
desconhecidas. Os benefícios desta descoberta
são inúmeros. Isso funciona como uma lista telefônica,
no qual sabemos o nome e número de cada gene, mas sem
saber sua funcionalidade. O desafio a partir deste momento
é conhecer esta função e, principalmente
como as diferenças entre os indivíduos alternam
nesses genes e causam a grande variedade de fenótipos,
aquelas características, que observamos no rebanho,
diz.
De acordo com o pesquisador, conhecendo essas diferenças
é possível explorá-las na seleção
daqueles animais que possuem características de grande
interesse ao pecuarista, como ganho de peso e produção
de leite. Além de que a tecnologia favorecerá
na avaliação de traços de difícil
mensuração, como: maciez e sabor da carne, conversão
alimentar, resistência a doenças, entre outros.
Do campo à mesa, a pesquisa pode trazer avanços
para toda a cadeia. Hoje, existe muita variação.
Se você compra uma peça de picanha, no mesmo
lugar, para fazer um churrasco para os amigos, você
pode ter uma que está muito boa e outra que está
dura demais. Não existe uniformidade, argumenta
Garcia. Com essa informação genética,
será possível elevar a qualidade e trazer para
o Brasil essa uniformidade que já existe em outros
países, como a Argentina, famosa por sua picanha. A
cadeia de leite poderá ter suas vantagens, uma vez
que é possível selecionar vacas resistentes
às mastites, evitando assim o uso de antibióticos,
outro benefício para o consumidor, esclarece.
Com isso, explica Garcia, será possível elevar
a qualidade do gado de corte e leiteiro e transformar o que
já é um grande produto de exportação
numa mercadoria de alto valor agregado.
Para o pesquisador da Unesp de Araçatuba (SP), o mapeamento
do genoma bovino também pode ajudar em pesquisas sobre
a saúde humana e doenças. Descobrimos
que os bovinos são muito mais parecidos conosco. A
semelhança e as particularidades dos genes do sistema
imunológico podem de alguma ajudar no entendimento
dos processos que regulam a defesa imunológica de seres
humanos. O bovino pode ser utilizado como modelo para o estudo
de doenças genéticas humanas e vice-versa. O
boi como ruminante, precisa conviver pacificamente
com a flora microbiana ruminal. Os humanos não têm
essa resistência, mas agora a chave da resistência
pode ser procurada em meio ao genoma do boi, exemplifica.
Do
campo ao laboratório
Na prática, com a decodificação do genoma
é possível também identificar com precisão
as pequenas diferenças genéticas que determinam
porque um animal é mais resistente a doenças
e outro não, por exemplo. As informações
moleculares conhecidas como marcadores de DNA, a variação
que ocorre na sequência de nucleotídeos do DNA
de um indivíduo, permitem a avaliação
dos animais a partir de um único exame, explica
o pesquisador José Fernando Garcia.
O conhecimento desse mapa sequenciado poderá determinar
as características do boi, a serem usadas como uma
ferramenta poderosa para aumentar a produtividade, e baratear
o custo de programas de seleção genética.
No melhoramento genético clássico, as informações
de cada animal são geradas a partir da observação
fenotípica e do resultado da produção
de seus filhos. Os dados levam algum tempo para a conclusão
e existem gastos para o sustento de todos os animais e de
suas crias. A junção dos programas de
melhoramento com esta nova descoberta poderá fortalecer
ainda mais a seleção genética. As provas
de ganho de peso e as DEPs ponderais, as diferenças
esperadas na progênie, vão se tornar uma ferramenta
indispensável. Creio que ocorrerá mudanças
nos procedimentos adotados atualmente. Talvez será
possível usar um menor número de animais para
testes.
Não é a primeira vez que o genoma do boi tenta
ser desvendado. Algumas empresas do setor já realizavam
pesquisas. A diferença em relação ao
feito está no detalhamento de informações.
Até o momento a comunidade estava apenas estudando
pontos do genoma. Mas, essa força tarefa permitiu a
compreensão do conjunto como um todo. O esforço
foi muito bem sucedido, conclui o pesquisador.
Na qualidade de maior rebanho, o Brasil poderá sair
à frente na seleção de características
de interesse econômico e padronização
da produção de carne. Só esperamos
que a cadeia da carne como um todo entenda o que pode obter
com essa tecnologia e, portanto, a insira na cadeia de forma
a beneficiar a todos, de forma equilibrada. Se não
for assim, corremos o risco de não nos posicionarmos
no setor, conclui o pesquisador José Fernando
Garcia.
Passo
a passo do sequencimento:
1) Escolhido o animal Hereford;
2) Retirada amostra para purificar o DNA;
3) O DNA é picotado em pedaços grandes
e distribuído entre laboratórios do mundo;
4) Redução em pedaços menores e redistribuição
para o sequenciamento;
5) Cada pedaço é sequenciado, sendo feita nova
verificação em diferentes laboratórios;
6) Informações são reunidas com auxílio
da bioinformática para a montagem do quebra-cabeça.
7) Conclusão do genoma após seis anos.
|