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SERINGUEIRA - DA AMAZÔNIA AO RESTO DO PAÍS
rev 133 - março 2009

Projetos implantados por alguns estados estão aliando baixo custo e maior produção da borracha. Juntos eles, promovem uma nova história para a cultura da seringueira nativa.Imagine dedicar 38 anos da profissão, estudar e acompanhar a expansão de uma cultura pelo País. O pesquisador e responsável pelo Programa Seringueira, do Instituto Agronômico do Estado de São Paulo (IAC), Paulo de Souza Gonçalves, é o personagem desta história que começou há muito tempo atrás. Apesar do primeiro plantio de seringueira no estado de São Paulo, datado entre 1916 e 1917, ser realizado pelo cafeicultor Procópio Ferraz – no município de Gavião Peixoto, próximo à Araraquara (SP) – os trabalhos de pesquisa tecnológica só iniciaram na década de 50.

Porém, o resultado bem sucedido só chegou muitos anos depois, quando o estado paulista transformou-se no principal produtor de borracha do País [confira esta história em ‘Em terras tupiniquins’]. Parte desta conquista foi acompanhada de perto por muitos pesquisadores, inclusive por Gonçalves.
Para o especialista do ramo da heveicultura, a borracha nacional tem história e precisava ser mais valorizada. “Por ser um produto versátil, é utilizada na fabricação de mais de 50 mil artigos. Além da extração da borracha, pode-se aproveitar o óleo da semente da seringueira, usado na indústria de tintas e vernizes e a madeira também constitui boa fonte de renda para os produtores”, diz o pesquisador Paulo Gonçalves.
Na opinião dele e de vários especialistas, a heveicultura é economicamente viável por muitos motivos, entre eles, o manejo. A extração do látex (a secreção esbranquiçada) pode ser feita quase que diariamente. No entanto, muitos produtores escolhem fazer a sangria num esquema “3D”, ou seja, colhe um dia e descansa dois. Em muitas culturas, a cada 45 dias o produtor utiliza-se de uma substância estimulante, chamado ethefon (que possibilita o aumento da produção de látex de cada árvore, com a adoção de menores freqüências de sangria). O custo da implantação com 500 mudas apontam os especialistas, é estimado em R$ 7 mil por hectare (ha), até o sétimo ano de plantio, e a média de renda bruta chega a R$ 8 mil.
Segundo o pesquisador Paulo Gonçalves, por ser uma cultura permanente e que só apresentará os primeiros resultados em longo prazo, não se pode correr o risco de cultivar uma planta não adaptada à região, bem como pouco produtiva. E dependendo do desenvolvimento das árvores, até o terceiro ou quarto ano existe luminosidade suficiente nas entrelinhas o que permite o cultivo intercalar, com bons resultados. “Com isto, muitos produtores efetuam o consórcio com soja, milho, café, palmito, palmeira real australiana e banana. Essas culturas podem ser feitas nos intervalos entre as árvores – cada seringueira precisa ficar a pelo menos 2,5 metros da outra, formando ‘ruas’, que por sua vez necessitam estar distantes oito metros de outra rua”, diz.
Outra atenção necessária é com relação à compra de novas mudas, adquirindo-as de viveiristas certificados. “É necessário também o controle das ervas daninhas e proteger as plantas de ácaros, besouros, moscas brancas e percevejos-de-renda, que atacam com mais facilidade. A seringueira também não é muito exigente em adubos, mas a assistência técnica também é indispensável em muitos casos”, explica o pesquisador.
O pesquisador orienta que em um hectare pode-se plantar até 500 mudas e os picos de produção são de novembro até maio, quando a seringueira tem mais folhas. Para a extração do látex, é preciso um corte na casca, em meio-espiral, em sentido decrescente (de cima para baixo). Espera-se o látex escorrer para coletá-lo em cumbucas de plástico. O coágulo, resultado de uma borracha crua e mais escura é vendido a um preço mais barato. Já o látex, destinado para as indústrias farmacêuticas, por exemplo, utilizado para a confecção de luvas e drenos cirúrgicos – e que quando extraído requer maiores cuidados, para manter a aparência – alcança preços maiores. “Vergonhosamente, apesar da seringueira ser originária da América do Sul, o Brasil importa 200 mil toneladas de borracha por ano, sendo que o consumo total do país é mais de 300 mil toneladas”, diz o pesquisador do IAC, Paulo Gonçalves.

Além do café

Um estado que apostou nas seringueiras foi Minas Gerais. Com condições naturais e uma posição geográfica privilegiada para incorporar o cultivo da seringueira – em grande escala – a heveicultura é praticada em todo o território mineiro, segundo estudos realizados, nos últimos quatro anos, pela Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig), vinculada à Secretaria da Agricultura do Estado.
Na década de 80, a Epamig foi pioneira na implantação da cultura no estado. “Ao iniciarmos nossos trabalhos de avaliação da capacidade da cultura em sequestrar carbono atmosférico em 2003, na Fazenda Experimental da Epamig, no município de Oratórios, na Zona da Mata mineira, verificamos o grande potencial do estado no cultivo da seringueira”, diz Antônio de Pádua Alvarenga, engenheiro agrônomo e pesquisador que coordena o projeto “Avaliação da Capacidade dos Clones de Seringueira de Minas Gerais”, no Centro Tecnológico Zona da Mata da Epamig, em Viçosa.
O pesquisador lembra que quanto à renda dos produtores, há uma variação quanto ao tamanho do produtor, pois aqueles que usam a mão-de-obra familiar são os que obtêm e obterão sempre a melhor receita. “A preços atuais, o rendimento econômico de uma família explorando cinco ha de seringueira e que demanda apenas o trabalho de um chefe de família de quatro pessoas está em torno de aproximadamente R$ 2.500/mês. Este valor representa a receita líquida da atividade”, calcula o pesquisador.
Em Minas Gerais praticamente ainda não existem viveiros adequados. A Epamig está montando, em algumas fazendas experimentais, viveiros com produção de mudas realmente certificadas. Segundo dados, a produção de borracha no estado de Minas Gerais está distribuída em nove regiões: Central, Rio Doce, Zona da Mata, Sul de Minas, Triângulo, Alto Paranaíba, Centro-Oeste, Noroeste e Jequitinhonha. O rendimento médio das seringueiras nessas regiões varia de 750 quilos a 2,8 mil quilos por hectare, sendo os melhores resultados obtidos nas áreas do Centro-Oeste e do Alto Paranaíba. O Triângulo Mineiro se destaca com a maior produção, com cerca de 3,5 mil toneladas anuais. “Tenho contato com vários produtores que investiram na cultura na década de 1980 e hoje estão arrependidos de não terem cuidado melhor das suas áreas, bem como não terem plantado mais”, conta Alvarenga.

Em terras tupiniquins

A introdução da seringueira no estado de São Paulo foi conduzida entre 1916 e 1917, pelo Coronel José Procópio de Araújo Ferraz, proprietário da Fazenda Santa Sofia, localizada no antigo município de Boa Esperança, hoje Gavião Peixoto. Interessado na cultura, o coronel recebeu sementes do então Marechal Cândido Rondon, que percorria a Amazônia em expedições. Entre as remessas recebidas compostas por algumas centenas de sementes, apenas 27 germinaram.
Em função da demanda mundial, o Brasil iniciou a exportação de borracha natural extraída dos seringais nativos da região norte, em 1827. No período de 1827 a 1912, o País detinha uma grande importância no mercado mundial de borracha. A partir de então, surgiram como fortes competidores os países asiáticos, que, com a coleta de sementes na Amazônia pelos ingleses, desenvolveram o cultivo da seringueira com sucesso, dado que a região asiática não era fonte do fungo do mal-das-folhas (Microcyclus ulei). Assim, a partir de 1912, as exportações brasileiras de borracha natural foram caindo continuamente até serem praticamente paralisadas no final da década de 1940. Só na década de 1960, o País elaborou planos ambiciosos para expandir o cultivo da seringueira.
A despeito de ser o berço das seringueiras, o Brasil contribui com apenas 1% da produção mundial de borracha. Em 2001, a produção nacional chegou 1,50% da produção mundial de 7,13 milhões de toneladas e consumiu em torno de 3,50%, de um total de 7,03 milhões de toneladas, segundo dados de 2002, do IAC. Em 2007, São Paulo contribuiu com 53% da produção, seguido pelos estados de Mato Grosso (25%), Bahia (11%), Espírito Santo (1,7%) e demais (7,1%) incluindo grande expansão de Minas Gerais [confira no mapa].

O avanço no Paraná

Em novembro de 2008, o governo do Paraná lançou o “Programa Seringueira do Paraná”. O programa contará inicialmente com linha de crédito no valor de R$ 40 milhões. Segundo o Instituto Agronômico do Paraná (Iapar), a intenção é aumentar dos atuais 800 para cerca de 10 mil ha a área cultivada em 10 anos. “A expansão da cultura vem de encontro também para recuperar as áreas degradadas daquelas regiões e preservar áreas de reserva legal, conforme prevê a legislação ambiental”, diz o pesquisador do Iapar, Jomar da Paes Pereira.
Segundo o engenheiro florestal da Secretaria de Estado da Agricultura e do Abastecimento (SEAB/PR), Bruno Sânder, hoje existem no estado dois viveiros particulares com aproximadamente 300 mil mudas de seringueiras enviveiradas, que estarão disponíveis para o plantio, até o fim de 2009.
Para Sânder, o Estado poderá ser tornar um grande produtor, em decorrência das condições climáticas favoráveis, empreendedorismo dos agricultores, desenvolvimento tecnológico e conjunção de esforços dos parceiros. “Sabemos, por meio do levantamento preliminar realizado pela Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater/PR), que atualmente existem em torno de 1.000 ha de seringais já implantados, dos quais aproximadamente 380 ha pertencem às empresas do setor”, diz o engenheiro.
A Companhia Melhoramentos Norte do Paraná é um bom exemplo disto. Foi a primeira a apostar na seringueira no Estado. “As primeiras mudas vieram de São Paulo”, conta o engenheiro agrônomo e gerente da área de pesquisa, Mauro Rosseto.
Hoje a empresa possui uma fazenda com 375 ha e 174 mil árvores no município de Paranapoema (PR).“O mercado comprador está muito próximo de nós”, diz Rosseto. Ali, o empresário diz não ter problema de comercialização. “Atualmente, a entrega do látex é para uma empresa paulista que vem buscar toda a nossa produção”, conta.


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