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HORTICULTURA - DO EXÓTICO AO TRADICIONAL
rev 133 - março 2009

Produção diferenciada de legumes, condimentos e frutas é garantia de espaço em um mercado decidido no que quer: alimentos em quantidade, qualidade e tamanho certos. Oito cores de pimentões, oito variedades de berinjelas (vindas de diversos países), 12 tipos de tomates (entre eles, os do tipo ‘gourmet’ – pequenos e saborosos), uma coleção de 40 pimentas ardidas (entre elas, a mais ardida do mundo, vinda da Índia), pepino, miniabóbora, minimelão, minimelância, alface hidropônica, e entre outros 40 minilegumes compõem a produção da Fazenda Ituaú, em Salto (SP).Produtos exóticos – como a abóbora Mini Pumpkino (vendida em embalagens especiais, e nelas já há uma indicação de receita para saborear o alimento) – e convencionais, como o tomate, são a especialidade da fazenda, mas a grande vantagem é que todos esses produtos já têm um destino certo: o cliente – seja um supermercadista de grande porte ou uma rede de restaurantes da alta gastronomia de São Paulo, por exemplo.

Produtos exóticos – como a abóbora Mini Pumpkino (vendida em embalagens especiais, e nelas já há uma indicação de receita para saborear o alimento) – e convencionais, como o tomate, são a especialidade da fazenda, mas a grande vantagem é que todos esses produtos já têm um destino certo: o cliente – seja um supermercadista de grande porte ou uma rede de restaurantes da alta gastronomia de São Paulo, por exemplo. Não há produção excedente, tudo que é colhido já foi previamente vendido – e se não há venda, o fruto não é retirado da planta.
Para um trabalho como esse, foi necessário um planejamento bem detalhado, que começou com uma análise da potencialidade da área e se o clima permitia agricultar, qual era a variedade a ser cultivada e, o mais importante, a real necessidade do cliente sobre o tipo de produto que desejava – satisfazendo-o, o produtor ganhava a fidelização dele. “Esse pra mim”, analisa Cyro Cury Abumussi, produtor, “é o grande segredo da agricultura: Quem vai comprar? Quanto compra? Tem preço? Eu consigo produzir na minha condição, na minha estrutura, na minha região, na altitude em que estou? Com o que eu tenho de ferramentas? Se eu puder produzir, legal, caso contrário, tenho de mapear e planejar outra atividade, porque senão a perda vai ser certa”.
É por essa filosofia de mercado – de estar sempre preocupado com o que o cliente precisa – que norteia a atividade da fazenda atualmente. A propriedade existe desde 1972, mas foi a partir 1991 que a produção de hortaliças e olerícolas começou a se pautar mais fortemente pela linha de pensamento da clientela. O que antes era produzido a campo aberto, foi gradualmente passado a ambientes protegidos de chuva, vento e insetos (estruturas semelhantes a estufas) – com exceção da cultura de berinjelas que precisa de agentes de polinização e, por isso, continua a céu aberto.
A fazenda também era fornecedor a granel de hortaliças e legumes, e com nova estruturação da propriedade pôde-se iniciar a produção dos exóticos. Atualmente, 60% do que é cultivado são caracterizados como exóticos, os 40% restantes são as cultivares tradicionais. “No mercado de oferta e procura, a nossa analise é, quanto mais a gente plantar de um produto, menor será o preço que podemos ter na hora da venda. Tudo vai ter de estar adequado ao consumo do cliente e o quanto ele está disposto a pagar. Plantar custando R$ 10, para vender por oito reais, a atividade não vai durar. Então o planejamento hoje de você saber aonde vai o seu produto, e o quanto aquele mercado consome, é o grande segredo para um início de sucesso”.

Planta confinada

Desde a implantação das ‘estufas’ – hoje, 112 no total, cada qual com 30m² – Cyro aos poucos adequou a produção com o que havia de novidade no sentido de potencializá-la. Três sistemas conduzem a produção de hortifruti: no solo, por hidroponia, e por vaso, tecnologia mais recente. Todo o referencial para o desenvolvimento da atividade veio de pesquisas de universidades, institutos como a Embrapa, e livros, que diziam a respeito tanto do cuidado com o solo, como de variedades resistentes e até acerca do manejo consciente dos recursos hídricos para a irrigação da lavoura. “Toda essa complexidade do nosso mercado é importante sabermos para aplicarmos na melhor maneira possível”, afirma Abumussi. “Ser produtor hoje não é ter um pedaço de terra e ter vontade, é ser profissional; é poder fazer da sua atividade, da sua propriedade uma empresa, porque senão você só vai rasgar dinheiro”, adverte.
Um exemplo disso, foi a implantação do cultivo em vasos – uma tecnologia vinda de Israel na qual a planta se desenvolve fora do solo, numa terra fertirrigada com os nutrientes necessários (como Cálcio, Potássio, Magnésio, Zinco e Manganês) que garante maior produtividade. “No sistema convencional de plantio em campo aberto [no caso do tomate], o manejo é que a planta chegue ao arame, mais ou menos dois metros, ou de oito a 10 pencas, daí o produtor castra a ponta da planta, para o enchimento dos frutos”, explica Abumussi, “Nisso, ele já deu um limite para aquela planta. Então, nas dez pencas, quando ele colher, não vai sair mais nenhum fruto. Ele vai ter de arrancar a planta e reformular novamente toda a plantação. No vaso, em vez de 10 pencas, a gente chega a produzir 35 pencas [por planta]”.
Nesse sistema, a produção estende-se dois meses a mais que no sistema convencional, no qual o ciclo produtivo do tomateiro gira em torno de cinco a seis meses. De acordo com o produtor, no vaso, o tomateiro chega a um ciclo de oito meses. Com o uso da tecnologia israelense, numa estufa com 560 vasos (plantas) – que é a capacidade atual da estufa da propriedade – dentro de um ciclo de oito meses, são produzidos 3,5 a 4 toneladas (t) de tomate. “Então se você tiver três vezes a produção, por um prazo 50 vezes maior, você tem um resultado muito melhor”, avalia Cyro.
A pesquisa foi essencial para implantar esse sistema, e tudo que havia de informação sobre esse tipo de cultivo só estava em livros. E além de ter de traduzi-los, o produtor tinha de conhecer bem a produção que seria desenvolvida, para traçar todo o planejamento da área, o manejo adequado, e climatização necessária dentro da estufa. “Então produzir numa estufa, num ambiente protegido, num vaso, é como criar um boi num confinamento”, faz uma analogia Abumussi. “Você faz uma boa alimentação pra ele, ele ganha peso mais rápido, te deixa um retorno melhor e com mais segurança do que pastando, gastando energia, comendo um pouquinho aqui, um pouquinho ali, e isso acaba em perda de tempo”. Além de garantia de produtividade, o sistema produz uma planta mais forte e sadia, capaz de resistir melhor ao ataque de pragas.
Para o produtor, não há despesas nesse sistema de produção em vasos, se considerar o fato de que não há tratamento de solo, enxertia, além de ser menor o risco de pragas, fungos e bactérias.
Na propriedade, oito estufas foram estruturadas para esse tipo de produção – com um controle periódico de umidade e fertirrigação por gotejo – e, segundo o produtor, em termos de custo-benefício, o investimento foi amortizado em apenas dois anos. Isso considerando a cultura do tomate, e as variedades dele que garantem maior preço na hora da venda – os do tipo gourmet.

Irrigação gota a gota

Nas demais 104 estufas, o solo é o responsável pela de produção. E nessas estruturas, outra inovação foi introduzida na fazenda que, além de garantir qualidade no solo, trouxe uma economia brutal no uso da água: a técnica de gotejamento – outra tecnologia trazida de Israel, segundo o agricultor.
Uma tubulação de água, feita a partir de uma fita de material plástico (na qual há micro canais e orifícios) ligada à rede de distribuição de água, molha a planta justamente onde ela necessita – a raiz dela. “Porque é que eu vou molhar tudo se eu preciso só molhar perto da raiz?”, indaga Cyro. Com esse sistema de gotejamento foi possível economizar até 95% de água, comparado ao sistema de irrigação tradicional. “A estimativa do nosso uso de água sem gotejo girava em torno de 1 milhão a 1,2 milhão de litros d’água por dia. Com o gotejo passamos a gastar 60, 70, 80 e até 85 mil litros/dia”, contabiliza.
Além do uso racional da água e toda economia que envolve a irrigação, a técnica permite um maior controle fitossanitário da lavoura. De acordo com o produtor, pela água também são disseminados fungos e bactérias – dependendo da qualidade dela e se estiver distribuição abundante, maior será a incidência de doenças. Além disso, a água, como condutora de temperatura, no frio, baixa a temperatura que chega à raiz e impede o desenvolvimento da planta, prejudicando a produção.

Cuidados com solo

O manejo de uma produção em estufas requer um cuidado especial com a terra a ser agricultada – isso não quer dizer que em outro sistema produtivo o cuidado não seja tão necessário. É pelo fato da impossibilidade de se mudar uma estufa de um local para o outro que limita a produção a um local fixo. Por essa razão, o solo, dentro da estufa, tem de permanecer o mais rico possível para garantir a produtividade.
No sentido de dar maior vida a ele, a fazenda pauta-se por uma adubação própria, feita a partir de um composto orgânico, no qual entram estercos suíno, bovino e avícola, galhos e folhagens da própria fazenda, fermentações e bactérias benéficas que transformam todo esse material num alimento pronto para a planta.
Além do adubo, é feita uma cobertura de matéria morta (como grama, sapê, ou até mesmo folhagens da própria cultivar) por cima desse adubo orgânico. “Com essa cobertura morta há proteção do solo”, explica Cyro. “Como somos um País tropical, em dias de muito calor essa cobertura impede que seja morta a matéria orgânica, presente de três a cinco centímetros abaixo do solo, além de manter a retenção de água na terra”.
Os resultados com esse trato especial com a terra garantem a sanidade e a qualidade da plantação. “A planta tem um desenvolvimento frondoso muito bom, com os frutos começando a sair com um intermédio baixo, logo depois da primeira forquilha”, descreve o produtor em relação à cultura do pimentão.
O sistema de gotejamento está abaixo dessa cobertura morta – preservando-o – e com o passar do tempo esse material orgânico se converte em alimento para a planta, por isso a importância de se manter uma boa cobertura morta por toda extensão do canteiro, para garantia de maior qualidade do solo e alimento para a cultura. “A maior riqueza que temos é o solo. Manter esse solo vivo é mais importante do que qualquer outra ferramenta existente hoje na agricultura. Com um solo sadio, a planta fica sadia; uma planta sadia é mais produtiva, e a produtividade é o que mais importa nesse processo da atividade agrícola”, enfatiza Cyro.

Ao gosto do cliente

Após a colheita, a separação de cada produto por cor, tamanho e grau de maturação. Daí os legumes e frutos já são embalados e etiquetados no setor de empacotamento da propriedade. De lá seguem prontos para a disposição nas gôndolas dos supermercados. O próprio agricultor ia conferir de perto o momento em que o cliente pegava os alimentos produzidos pela fazenda. Ele sondava se as pessoas já conheciam o produto, se gostavam, se tinham algum tipo de preferência.
Por esse trabalho, Abumussi foi desenvolvendo melhor a distribuição dos legumes nas embalagens. Há, por exemplo, embalagens menores com uma mistura de vários itens (tomate, pepino, pimentão) que serve uma pessoa ou duas. Uma salada pronta – basta retirar da embalagem, lavar e temperar. É a praticidade a serviço do consumidor.
Outro exemplo é a atração dos clientes pelo sabor. A miniabóbora é um exemplo – ela é um item de luxo, serve uma pessoa, e tem mercado por conta da demanda de restaurantes finos do País. A produção mais recente – que deverá agradar tanto quanto a miniabóbora – é uma variedade híbrida de melão, vinda do Japão – a mais doce entre todas as variedades da fruta. A cultivar se adaptou bem à região de São Paulo, o teste com os consumidores foi positivo e a potencialidade da comercialização estava certa. Não houve dúvidas: Cyro já deu início à produção para atender essa demanda.
Outro produto, que deverá ser um dos carros chefes este ano, será o jambu, uma planta da região Norte do País. “Ela tem uma característica muito particular, você comendo a folha dela [ou até mesmo a flor], que pode ser preparada numa pizza, num pato no tucupi, refogados, peixes, enfim, você tem uma sensação de amortecimento da boca. Então isso se torna uma comida exótica. E por isso ela vai tomar conta do Brasil, principalmente em São Paulo, que é realmente a capital da gastronomia”, afirma. O jambu foi até um pedido de um chefe de cozinha, cliente de Cyro. Ele conta que foi questionado se a fazenda tinha, ou onde era possível conseguir a planta. Numa viagem que o agricultor fez pela região amazônica, conseguiu encontrá-la, e a trouxe, reproduzindo-a no sistema de hidroponia. Mais um produto com um mercado garantido, e, novamente, o olho voltado sempre para as necessidades da clientela.

De portas abertas

Entre os projetos desenvolvidos pela fazenda Ituaú, pode-se destacar o ‘Porteira Aberta’, que funciona como um dia de atualização para qualquer agricultor interessado em técnicas de manejo da lavoura, bem como de planejamento consciente do negócio. O dia é programado conforme a necessidade do produtor que quiser entrar contato com a propriedade. Há cursos de polinização artificial, comercialização, irrigação, hidroponia, tratamento de solo, cultivo no solo, enxertia e produção de alternativos. O produtor interessado pode entrar em contato pelos telefones (11) 4027-9045 ou 4027-9018, ou pelo sítio de Internet pelo endereço www.fazendaituau.com.br.

Pioneirismo no cultivo em água

Foi em 1991 que, a partir de pesquisas, que a fazenda Ituaú implantou um sistema novo de plantio para a época. Era a hidroponia, um sistema no qual a planta se desenvolve só sob uma água corrente, em tubulações. A água, enriquecida com todos os nutrientes necessários ao desenvolvimento da planta, é distribuída às raízes da cultivar – a alface, nesse caso – e garante melhor desenvolvimento da cultura. “A gente montou uma estrutura, com tubos de PVC, num espaço de 250 m², e temos uma produção de 4.000 a 4.500 plantas por mês”, calcula Cyro Abumussi.
Foi uma tarefa inicialmente complicada, segundo o produtor. Naquela época não havia modelos prontos ou estruturas próprias para esse tipo de cultivo. A pesquisa em livros foi mostrando como tinha de ser montado o sistema de hidroponia. “Depois de pronto, convidamos alguns professores de universidades e centros de pesquisas que já tinham esse método de produção, de cultivar na água. Surpreendemos-nos quando eles vieram e falaram que nós havíamos começado muito avançado”, declara. “Foi um desafio, porque a referência que nós tínhamos era de livros, que além de ter de traduzi-los, a gente tinha de entender o que realmente seria cultivar na água. E produzir nela não é fácil. Na terra, por exemplo, caso dê alguma alteração climática, a planta dá um jeito de se adequar, na hidroponia é mais sensível em função da planta estar contato somente com a água. Então no começo a gente precisa entender como seria o comportamento dessa planta”. Apesar das dificuldades iniciais a produção mostrou-se mais acelerada – uma receita de sucesso da propriedade. “E cada produtor tem de fazer a própria receita para ter um bolo formado e daí ter a melhor qualidade possível na produção. Estando aqui no Sudeste, é diferente do Norte. O meu vizinho é diferente, em termos de qualidade de terra e altitude. Então é importante todos os produtores se dedicarem à pesquisa, para minimizarem riscos e, consequentemente, terem o melhor resultado”, aconselha.


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