Também
ocorreram perdas nas aviculturas, calcula-se 100 mil aves
de corte e 150 suínos morreram por afogamento,
conta o vice-presidente da Federação da Agricultura
e Pecuária do Estado de Santa Catarina (Faesc), Enori
Barbieri. Segundo ele, na horticultura, basicamente os Ceasas
de Florianópolis, Joinville, Tubarão e Blumenau
tiveram que ser abastecidos por produtores de Curitiba e São
Paulo. Em torno de 10 mil produtores hortigranjeiros foram
atingidos.
Na região de Indaial (mais conhecida como Morro do Baú),
por exemplo, existem ainda agricultores que não conseguiram
retornar para suas propriedades que estão interditadas
pela Defesa Civil (isto quatro meses após a tragédia).
Porém, há em torno de 20 delas que não
mais poderão ser habitadas e exploradas. Já
os demais retornaram à vida, mesmo perante tantas perdas.
Alguns produtores de hortigranjeiros, que é uma cultura
rápida, já retomaram a atividade, cita Barbieri.
As estimativas de perda logo após as enchentes eram assustadoras.
Nós produtores de arroz estávamos com a
cultura em fase de barrigamento (termo
usado pelos agricultores quando o arrozeiro está em fase
reprodutiva). A lavoura ficou coberta de água.
Aí então, veio o medo de perder tudo, né!,
relembra o produtor Rogério Pessi do município
de Araranguá. A região, localizada no extremo
sul do estado, foi uma das que mais sofreu com as chuvas e como
não bastasse, uma nova enchente ocorreu no início
deste ano, alagando várzeas de arroz, lavouras de mandioca
e fumo. O produtor conta que na primeira ocorrência viu
a água cobrir os 90 hectares da sua cultura. Foram mais
de 100 horas de chuvas e a água chegou a atingir três
metros de altura. No nosso caso, graças a Deus,
o prejuízo ficou em torno de 10% a 20%, da produção
total, calcula Pessi.
Luiz Alves fica a 140 quilômetros de Florianópolis.
Setenta por cento da arrecadação do município
vem da pecuária e da agricultura. Com a enchente os produtores
rurais acumularam grandes perdas. Vários hectares foram
cobertos de lama: resultado grande parte da safra perdida. Em
alguns casos, mil e setecentas sacas de arroz foram água
abaixo literalmente. Segundo os técnicos, hoje serão
necessários de dois a três anos até recuperar
a área de plantio. As
reivindicações
O Centro de Estudos e Promoção da Agricultura
de Grupo (Cepagro) foi um dos que atuaram após as enchentes,
com um trabalho voltado para a região de Itajaí,
a 94 quilômetros da capital. O principal foco era a reconstrução
de hortas comunitárias, que faziam parte do projeto Agricultura
Urbana. Antes da tragédia, os produtores da região
estavam migrando da agricultura convencional para a orgânica
e ecológica. Aproximadamente 200 famílias
eram atendidas. Do projeto, 40% estavam concluídos e
60% em fase de transição, diz o engenheiro
agrônomo Marcos José de Abreu, do Cepagro. Após
o desastre, alguns já retornaram a atividade, mas nos
municípios de Itajaí e Nova Trento (onde 10 famílias
atuavam na produção de conservas e de doces caseiros),
os trabalhos estão parados, conta Abreu.
Segundo o administrador de uma propriedade pecuária,
localizada em Joinville, Marcus Justos Fontes, os prejuízos
foram muitos, além das cercas. Houve perdas na maricultura
(ostras e mexilhões) com a mortandade provocada
pelas perdas da salinidade das águas e na piscicultura,
resultado de desmorona-mento e soterramento de terrenos. Não
existia mais uma construção em pé, cercas,
lagos, pontes e ruas. Não havia acesso aos locais de
produção e com a falta dos tratos culturais, ocorreram
os prejuízos com a banana e com o leite, diz. O
pior é que ninguém até o momento veio ajudá-los,
adverte Fontes, que teve a salvo todo o gado da propriedade.
E naturalmente, o povo daqui nunca reclamará. Vocês
podem perguntar. Eles vão dizer que agora está
tudo bem. Eles arregaçam as mangas e voltam
pra lida. Os catarinenses são genuinamente empreendedores
e tem espírito guerreiro, não se dão por
vencidos, argumenta o administrador.
Logo após a tragédia, a Federação
da Agricultura e Pecuária do Estado de Santa Catarina
contabilizou as perdas, que somaram naquele mês cerca
de 500 milhões de reais. Das 200 mil propriedades no
estado, em torno de 100 mil, de uma forma ou de outra, tiveram
prejuízos ocasionados pelas chuvas e pelas estiagens
(confira em Condições Climáticas). No caso
das enchentes, logo após as perdas, um conjunto de reivindicações
endereçadas aos governos (estadual e federal), para minimizar
os efeitos dos desastres, na região sul-catarinense,
foi encaminhada pelo órgão. Na área
atingida não havia culturas com seguro rural. A mais
atingida foi o arroz irrigado, no qual nenhum seguro cobre.
Somente houve auxílio para aqueles que tinham financiamentos
do Proagro (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura
Familiar). Quanto à infra-estrutura atingida até
agora é só promessa governamental. O governo estadual
concedeu por meio de projeto-de-Lei, um auxílio financeiro
por seis meses, no valor de um salário mínimo
mensal, aos atingidos urbanos. Infelizmente, os agricultores
ficaram de fora, esclarece Barbieri.
Na época, o governo prometeu concessão de investimento
e de novos financiamentos para os agricultores. Mas isto
está sendo feito somente para a agricultura familiar.
Não houve devolução de crédito de
ICMS; as dívidas amparadas por lei foram prorrogadas.
As demais, junto aos bancos privados não foram,
diz. Felizmente o produtor assimilou os prejuízos
e está recomeçando a vida, o problema está
naqueles que ainda não conseguiram retornar para casa
e que perderam suas propriedades. Esses estão localizados
na região de Blumenau (Indaial Morro do Baú)
e estão alojados em casas de parentes e albergues públicos,
diz.
Para o presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais do município
de Luiz Alves, Ademir Francisco Rosa da Silva, o que se sabe
até o momento, é que o governo tomou algumas medidas
para aliviar a tragédia, como a prorrogação
de dívidas até o dia 1ºde julho de 2009.
E só. Aguardamos até o momento alguma ajuda
para as regiões mais afetadas, diz Silva. O
agricultor está acostumado com os altos e baixos da atividade;
mas esta tragédia, trouxe prejuízos inimagináveis,
acrescenta o presidente do sindicato. Contabilizando as perdas
Segundo o coordenador do Projeto Safras e Mercados,
da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão
Rural de Santa Catarina (Epagri), Ilmar Borchardt, o governo
do estado concedeu uma linha especial de crédito e investimento
para os agricultores localizados nos municípios que tiveram
decretado estado de emergência e/ou calamidade pública.
A linha de crédito de R$ 100 milhões, será
financiando com juros de 1% ao ano, para valores de até
R$ 7 mil, e 2% ao ano, acima de R$ 7 mil. Serão indenizados
aqueles que tiveram animais mortos ou perdidos por afogamento.
Os recursos arrecadados pelo fundo da Defesa Civil do Estado,
cerca de R$ 33 milhões, está sendo quase integralmente
destinada à indenização de perdas no contexto
urbano, diz. Borchardt. Enquanto as reivindicações
solicitadas com a devolução dos créditos
do ICMS, o coordenador afirma que não houve nenhuma demanda
nesse sentido na área da agricultura, mas sim para a
área da produção industrial e comercial.
Segundo Borchardt, a totalização da estimativa
dessas perdas ainda está em andamento. Estão sendo
analisadas as perdas de máquinas, os estoques de insumos,
galpões, estradas internas, terras soterradas, inutilizadas
para cultivo e levadas pelos rios. Em Gaspar e Ilhota,
no Morro do Baú, há propriedades onde o retorno
dos agricultores ainda não foi liberado. E talvez não
seja, conta. Aproximadamente 39 mil agricultores tiveram
perdas significativas, com maior concentração
na parte mais baixa do Rio Itajaí. Condições
climáticas O estado de Santa Catarina sofreu com as condições
climáticas: a seca no oeste catarinense e as enchentes
no Sul. Mais de 15 municípios decretaram estado de emergência;
para a seca que durou 40 dias e trouxe prejuízos em municípios,
como São Miguel dOeste, Chapecó e Seara.
As perdas chegaram a 50% na plantação de melancias
e 30% nas safras de feijão e milho, umas das principais
atividades econômicas em vários municípios
da região.
De acordo com o meteorologista Centro de Previsão de
Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC/INPE), Lincoln Muniz
Alves, uma das respostas para o excesso de chuva no litoral
e a falta no Oeste está no mar. Esse tipo de evento
extremo climático é normalmente associado a um
fenômeno El Niño, no Oceano Pacífico.
Em anos neutros (sem El Niño) como é o caso atual
e que ocorre chuvas de grande intensidade, principalmente no
Sul do Brasil, já nos chamam atenção,
explica Alves. Para o especialista, é possível
observar alguma relação tanto de aumento de chuvas
intensas como também de secas severas aumentando na Região
Sul. O que é uma assinatura de que o aquecimento global
pode já esta atuando com mais intensidade no Sul do país.
Mas em meio à tragédia surgiram muitos boatos,
como o desmatamento indiscriminado e a ocupação
desordenada, contribuíram para os acontecimentos. Na
opinião do Enori Barbieri da Faesc, isto não é
real. Segundo ele, a tragédia só ocorreu em áreas
com mata fechada. Nestas áreas, após 90
dias de chuva, em 48 horas caiu 400 mm e o peso da mata pressionou
para o deslizamento, ressalta Barbieri.
Para Ilmar Borchardt, da Epagri/SC, estudos estão em
andamento, não só para determinar causas, mas
também para a criação de políticas
de restrição da exploração de terras.
No veredicto do meteorologista, as chuvas foram ocasionadas
pela presença simultânea de dois fenômenos:
um anticiclone (sistema de alta pressão), que se estacionou
no Oceano Atlântico, provocando ventos moderados na costa;
e a presença de um sistema de baixa pressão, que
fez com que massas de ar subissem e formasse nuvens carregadas
de chuva. Entretanto, os fatores mencionados como desmatamento
das matas ciliares, impermeabilização do solo,
ocupações desordenadas e somadas ao grande volume
de chuva, em pouco tempo tiveram sua contribuição
na tragédia. É possível que eventos
climáticos extremos venham a ocorrer novamente, já
que é natural da região. Daí a importância
de todos estarem informados para que sejam tomadas previamente
decisões para minimizar os prejuízos, já
que infelizmente não podemos evitar a chuva, ressalta.
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