Algumas indústrias apareceram no mercado interno nos
últimos anos, mas a preferência do público
é pela cachaça de alambique, produzida em pequenas
propriedades rurais. Nos últimos anos, o aumento
do consumo dessas cachaças diferenciadas é de
10 a 15% ao ano, afirma César Rosa, presidente
da diretoria executiva do Instituto Brasileiro da Cachaça
(Ibrac).
Popularmente o estado de Minas Gerais é o mais conhecido
por produzir boas aguardentes, mas há quem garanta
que é questão de fama. Realmente existem
ótimas cachaças em Minas, mas São Paulo
também tem, assim como Pernambuco e Bahia, explica
Ana Lúcia Santiago, coordenadora de projetos com derivados
da cana-de-açúcar do Serviço Brasileiro
de Apoio às Micro e Pequenas Empresas de São
Paulo (Sebrae-SP). Inclusive o Rio Grande do Sul trabalha
para fazer da cachaça a mesma coisa que fez com o vinho.
São Paulo é um estado que tem uma tecnologia
de produção muito boa entre os pequenos produtores.
Como muitos produtores não têm o registro no
Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento
(MAPA), os números oficiais não contabilizam
a real produção nacional da bebida.
Os motivos que levam os produtores a não se certificarem
são inúmeros, mas o principal é por não
ter necessidade, já que vendem para conhecidos da região
em que produzem. Mas é muito bom quando a gente
vê o nosso produto em uma prateleira de supermercado.
É gratificante para gente que trabalha mais de um ano
para chegar ao produto final, afirma João Evangelista
Vaz de Lima, produtor da cachaça Pioneira, de Socorro
a 130 quilômetros da capital paulista.
O produtor buscou registro no MAPA e também certificou
o produto como orgânico e chegou a ser chamado de louco,
no início. Quando inventei de fazer a cachaça
orgânica, todo mundo não acreditou que daria
certo. Fui um dos primeiros, por isso que o nome é
Pioneira, explica Vaz Lima sobre a marca que ele registrou.
Com uma plantação de sete hectares de cana,
o produtor tem dois empregados fixos e com carteira assinada,
como exige a certificação. O Sítio Santo
Antonio já era símbolo da aguardente antes mesmo
da produção da Pioneira. Meu irmão
começou a fazer a cachaça, aí eu entrei
com ele e mais para frente eu comprei a parte dele. Mas não
era esse tipo de cachaça não, era uma de qualidade
inferior, que a gente vendia mais barato, explica Vaz
de Lima. Até que um dia ele percebeu que o negócio
não evoluía e resolveu produzir menos, mas com
mais qualidade e, assim, vender a preços mais elevados.
Deu certo. Com a mudança do produto o público
alvo também mudou. João Vaz de Lima buscou certificar
como orgânico, melhorou o processo de envelhecimento
e a distribuição. Também passou a produzir
outros derivados como melado (destinado à indústria
alimentícia da região) e açúcar
mascavo, também certificados como orgânico. Mais
para frente o produtor começou a produzir a Canelinha,
marca do produto que nada mais é que a própria
cachaça aromatizada com cascas de canela ao final do
envelhecimento e açúcar.
A demanda por produtos naturais é cada vez maior pelo
consumidor com melhor poder aquisitivo. E é nesse mercado
que atua os produtos orgânicos. Hoje eu tenho
uma encomenda de mais de seis mil garrafas de Canelinha
que vão para os Estados Unidos (EUA). A minha cachaça
é vendida a mais de R$ 60 em São Paulo, capital,
sendo que aqui na região comercializo a R$ 13 a garrafa,
explica o produtor.
A ideia do produtor é de crescimento da venda no mercado
interno e na exportação das bebidas já
que existe o planejamento de uma nova marca. Eu to iniciando
uma nova marca para a minha bebida. Terá um novo rótulo,
outra garrafa, é uma forma de agregar valor. E a exportação
das canelinhas é a primeira remessa, se der certo,
quem sabe não começamos a exportar cada vez
mais, se entusiasma Vaz de Lima, que produz 15 mil litros
de cachaça por ano.
1ª
rotulada como orgânica
Outro produtor que está lucrando com a produção
de cachaça no interior de São Paulo é
Marcos Macedo, proprietário do Sítio São
Bendito, localizado no distrito de Jacuba, município
de Aurealva, no interior do estado de São Paulo. O
início da produção foi em 1996 e a certificação
chegou em 2000. Fui o primeiro produtor de cachaça
a usar o selo de produto certificado orgânico no rótulo,
lembra Macedo.
A certificação foi muito bem vinda e trouxe
novos mercados ao produtor que atualmente exporta para a Bélgica,
a Alemanha, a França e os EUA. O preço da garrafa
de 750 ml é de R$ 30, mas Macedo disse que já
viu ser vendida por R$ 150,00 em lojas da capital paulista.
Com a crise os pedidos do exterior diminuíram
bastante, mas espero que esse problema passe logo e a gente
volte a mandar bastante cachaça para fora do País,
afirma o produtor.
Os três maiores problemas enfrentados pelos produtores
decorrem da falta de apoio do governo. Imagina se nós
pudéssemos concorrer com os grandes players [empresas]
do mercado externo de vodka, por exemplo. É difícil
fazer o europeu trocar a vodka pela cachaça sem grande
publicidade. Então estamos fazendo um trabalho de formiguinha
ainda, explica César Rosa, presidente da Ibrac.
Existe um projeto de exportação, segundo ele,
que não foi aprovado pela Agência Brasileira
de Promoção de Exportações e Investimentos
(Apex) e que ajudaria muito a divulgação da
bebida no exterior. Hoje, a única coisa que temos
são pessoas que já experimentaram a cachaça
e conhecem a qualidade, diz Rosa.
Impostos
altos
Outro grande entrave da bebida no Brasil é o alto imposto
cobrado, que pode chegar a custar 80% de uma garrafa. O
governo americano incentivou o rum, outros países que
tem uma bebida símbolo também ajudam os produtores
e dão mais oportunidades para a produção
da bebida, mas o Brasil não, reclama Rosa. João
Vaz de Lima, produtor de Socorro, também reclama e
diz que prefere exportar a bebida porque paga muito menos
impostos do que se vender no mercado interno.
A tributação é muito pesada para
o micro e pequeno produtor. Ele paga imposto como se fosse
uma grande companhia. Já não tem capital de
giro para desenvolver sozinho, imagina para pagar tudo isso
de registro. Muitas vezes é um produto familiar e paga
como se fosse gente grande, afirma Rosa, já tocando
no terceiro problema: dinheiro para girar a produção.
Faltam linhas de crédito para o produtor poder melhorar
o processo de produção, ampliar a lavoura, melhorar
o rótulo, entre outras coisas. O que precisa
hoje para fechar o ciclo é uma linha de crédito
para apoiar o pequeno produtor. Como é uma produção
familiar, os produtores não têm condições
de fazer grandes investimentos no alambique, explica
Ana Lúcia Santiago, do Sebrae-SP.
Apesar de todos os problemas enfrentados pelos pequenos produtores
a exportação da cachaça vem crescendo
nos últimos anos. Se em 2004 recebemos US$ 11.087.500
das vendas ao exterior, em 2008 foram US$ 16.418.978, representando
um crescimento de 48% ao longo desses quatro anos.
Auxílio
ao pequeno produtor
O Sebrae-SP iniciou um programa de auxílio aos produtores
visando atuar em duas frentes. Uma seria ajudar na regularização
dos produtores que ainda não possuem licença
do MAPA e que produzem a bebida sem o mínimo de qualidade,
desrespeitando as normas sanitárias. O Sebrae
busca dar suporte aos agricultores nas áreas de saúde,
higiene, qualidade, tecnologia, embalagem, informação,
capacitação e mercado. Hoje, a maioria dos alambiques
no Brasil é muito precária ainda, afirma
Santiago.
A outra frente de trabalho é referente a formação
de marca, exportação, marketing do produto.
Uma das ações é reunir produtores de
regiões próximas e formar uma única marca
e assim ter grande quantidade podendo exportar ou ter demanda
para grandes fornecedores. O Sebrae trabalha atualmente
com 372 propriedades e, destas, 20% é legalizada. Até
o final de 2009, imaginamos que esse índice suba para
60%, explica Santiago.
Caso o produtor tenha interesse em receber auxílio
do Sebrae-SP entre em contato com o escritório da unidade
mais próxima ou entre no sítio de Internet do
órgão, pelo endereço www.sebraesp.com.br.
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