Segundo ele, a razão disso está na própria
característica dessa crise. Por ser muito grande
atingindo diversos bancos e a disponibilidade de crédito
em países considerados de economia sólida
e ampla por também comprometer a saúde
financeira de demais países. Mas eu acho que
especificamente para a bovinocultura de corte, aqui no Brasil,
esse impacto será relativamente menor do que em outros
setores do próprio setor agropecuário, e muito
menos em outros setores da economia que trabalham com produtos
mais supérfluos, analisa Ferraz.
O problema para a pecuária poderá se mostrar
mais adiante, com uma demanda menor, menos dinheiro para se
gastar, menor consumo, aumento de nível de desemprego,
projeções que são passíveis de
ocorrer em todo o mundo, segundo o especialista. Essa
é uma crise subseqüente à crise financeira.
Ela é de cunho econômico, que atinge a economia
real, a produção de bens e serviços,
propriamente dita, e essa está começando a se
manifestar, e essa, infelizmente, deve ter uma duração
longa. Não há meios que possam indiciar
por quanto tempo, mas pelo menos uns dois anos ela deve durar,
segundo Ferraz.
A pecuária não sofrerá tanto porque há
restrição de oferta atualmente. O rebanho brasileiro
vem se recompondo das perdas que teve com o abate de fêmeas
de anos anteriores. Se estivéssemos num ciclo
de pecuária baixo, com muita oferta, e tivéssemos
essa crise, aí sim seria uma catástrofe para
o setor, aponta.
De olho no mercado
Na tentativa de antever as conseqüências que podem
ocorrer no setor, que medidas cabíveis poderiam ser
adotadas para auxiliar o produtor nessa hora, o Fórum
Permanente da Pecuária de Corte da Confederação
da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), tem acompanhado
os números bem de perto para identificar essas respostas.
O que temos acompanhado até agora está
normal, sobre as exportações, o mercado interno
está comprador ainda, declara Antônio Nogueira,
que preside esse fórum, além de presidir o Sindicato
de Pecuaristas de Gado de Corte (Sindipec). Para ele, os efeitos
dessa crise também devem ser mais amenos na pecuária.
Geralmente o último a sentir os efeitos da crise,
são os setores de produção de proteína
e alimentos, porque é o último que o consumidor
começa a cortar, afirma Nogueira.
Efeito em cadeia
Em primeira instância, segundo o representante da pecuária
de corte da CNA, a crise pode ser ligações com
a alta nos custos de produção, conseqüentemente
em reformas de pastagem e menor uso de tecnologia na fazenda.
Com essa diminuição a produção
segue o mesmo caminho, e conseqüentemente a produtividade.
Depois a crise deve afetar o consumo, observa Nogueira.
Com o consumo menor, a oferta de carne tende a aumentar e
o preço fica menor, o que implica numa redução
de lucros no setor.
Em relação aos insumos, há incertezas
se eles poderão subir ou não. Atualmente a arroba
do boi está em alta, e os insumos também. Em
algumas regiões, eles chegam a ultrapassar o valor
da arroba do boi. No entanto, essa crise pode repercutir nesse
mercado, baixando os preços dos insumos pela diminuição
da compra por parte dos produtores com o corte de gastos na
produção. Isso são conjecturas
que a gente vai ter de acompanhar com as informações
do próprio mercado, diz Nogueira.
Entre as medidas para conter um quadro de alta no custo de
produção, segundo Antônio Nogueira, está
a diminuição do PIS/COFINS que incide sobre
a ração e o sal mineral, e o fim do imposto
de importação e exportação sobre
o couro. Estamos buscando tentativas para minimizar
os custos de produção desse produtor para aumentar
a renda dele.
De olho nos custos
Com um possível esfriamento no consumo, e sem deixar
de lado a qualidade do que tem de se produzir, o pecuarista
deverá se pautar pela eliminação de qualquer
desperdício, de acordo com Silvio Lazzarini, diretor
geral da Lazzarini Carnes Especiais. O empresário já
presidiu a Associação Brasileira dos Criadores
de Gado e foi membro do Conselho Nacional da Pecuária
de Corte. Houve uma forte onda nos preços da
arroba do boi gordo, vai ter uma retração de
preços inevitavelmente. (...) É evidente que
vai ter uma retração em vendas no mundo. Tem
o desemprego, ele vai gerar menor consumo. O menor consumo
afetará a renda afeta e com a economia como um todo,
descreve.
Para Lazzarini, ninguém sai de uma crise se não
trabalhar muito e forte. Não se poderá esperar
nada do governo, o produtor tem de olhar para a produção
dele e apertar os cintos com o corte de gastos. Efetivamente
tem setores que vão sofrer mais, como o setor de tratores,
máquinas e equipamentos que vinham numa evolução
muito grande e vão sofrer uma determinada retração,
mas no geral, no contexto dos alimentos, isso não vai
ocorrer, acredita Lazzarini.
Mercado da carne
Foi pela falta de crédito e pagamento que o grupo Estrela
Alimentos demitiu 700 trabalhadores de sua unidade frigorífica
em Estrela DOeste (SP), no mês de novembro. Esse
foi o lado mais extremo que essa crise trouxe para a economia
do País no setor de carne, desde então. Fora
desse enredo de perdas, a Marfrig Frigoríficos e Comércio
de Alimentos se vê fora dos efeitos dessa crise pelo
fato do grupo trabalhar com um maior número de mercados
possível de exportação, além de
ter uma participação muito grande no mercado
interno, com uma produção de carnes nobres.
Quando a crise acontece, quem está suscetível
a ela na certa vai sofrer com ela, declara Luciano Andrade,
gerente de Pecuária do Grupo Marfrig. A crise
abalou o mundo, abalou outros mercados, mas outros se mantiveram
abertos e por isso nós não sentimos o efeito
dessa crise, afirma.
É na manutenção do padrão de qualidade
de carne que o grupo tem se pautado até o momento
que é uma das bandeiras do grupo pela valorização
da carne produzida, e que, segundo Andrade, é um dos
diferenciais que deixa a empresa longe dessa crise. Tivemos,
anteriormente um problema com Sisbov [Serviço de Rastreabilidade
da Cadeia Produtiva de Bovinos e Bubalinos], há seis
meses, com o corte das fazendas, e foi um problema das próprias
fazendas, daí tivemos um problema com a exportação,
lembra. Na época, muitas fazendas tiveram a autorização
de exportação cancelada pelo governo federal,
por não seguirem as normas do Sisbov.
As vantagens sobre a crise
Taxa de juros elevadas e a manutenção de uma
política monetária bem restritiva fatores
que atraem investidores ao País são,
de acordo com Silvio Lazzarini, pontos fortes para que o Brasil
atenue os efeitos dessa crise. Outro ponto favorável
é o crescente mercado interno no País, isso
poderia influenciar melhor as vendas com um trabalho voltado
a atendê-lo.
O Brasil tem uma vocação para não
entender bem quais as vantagens que ele poder tirar de uma
crise, analisa Lazzarini. Segundo o empresário,
esse momento é importante que o País busque
acordos bilaterais. O Brasil precisa da China nesse
momento e a China do Brasil. A China precisa comprar grãos,
e o Brasil precisa vender grãos, se o Brasil entrar
nesse posicionamento, as carnes, o complexo carne, envolvido
aí o bovino, suínos, caprinos, ovinos, vai sair
com vantagens da crise.
Para Vicente Ferraz, diretor técnico da AgraFNP, vê
na desvalorização do real perante ao dólar,
o estímulo necessário às exportações
outro ponto importante. Mas ele lembra que esse efeito
servirá apenas para cobrir os gastos, podendo não
ser suficiente para isso, mas que, ao final, o saldo pode
ser positivo.
A bovinocultura de corte tem uma característica benéfica
para o Brasil diante desse quadro da crise. Ela exige muito
tempo para se produzir o que se espera dela. De acordo com
o Ferraz, o protecionismo de certos países seria um
entrave para a exportação. Essa opção
se faz para privilegiar os produtos internos e assim conter
o desemprego. No entanto, essa atitude não caberia
a uma atividade como a de criação de gado para
produção de carne. Como ela exige um tempo
maior, até o rebanho se tornar produtivo, e se chegar
e quanto chegar a ser produtivo, essa crise
possivelmente deve ter acabado, e aí esse país
terá em mãos um rebanho sem qualidade para competir
no mercado internacional, e por isso eu acho que nenhum país
deverá adotar essa medida, explica Ferraz. A
pecuária de corte brasileira consegue ser mais competitiva
em termos de custo de produção, ela tem uma
vocação mais forte que outros países,
que além do tempo que teriam para produzir, amargariam
com os custos de produção e a não vocação
para formar um rebanho de qualidade.
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