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CRISE FINANCEIRA - É A VEZ DOS PEQUENOS
rev 130 - dezembro 2008

O saldo de produção de máquinas agrícolas não poderia ter sido melhor. No comparativo de 2007 e 2008, entre os meses de janeiro a outubro, o crescimento foi de 31,4%, de acordo com dados da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea). Nesses 10 meses de 2008 foram produzidas 71.790 máquinas, entre tratores, cultivadores, colheitadeiras e retroescavadeiras. Em termos de exportação, o volume máquinas vendidas superou 7,4% o resultado do ano passado.
Todos esses dados indicariam um fechamento de ano mais do que tranqüilo para o setor produtivo de máquinas e implementos agrícolas, até a chegada de uma crise que desestruturou o sistema de crédito, fora e aqui dentro do País. Num mundo de incertezas, recessão e menos dinheiro, a disponibilidade de crédito se tornou um desafio, mas que, segundo especialistas, é uma situação que deve ser resolvida em curto prazo.
“O crédito que é efetivamente um problema agora, mas ao final é uma situação que vai voltar, até porque, é para isso que os bancos existem, para disponibilizar o crédito”, avalia Francesco Pallaro, vice-presidente da New Holland Agriculture para a América Latina.

De acordo com ele, a crise afeta todo o mundo globalizado, mas há muita informação negativa sendo repassada, e com isso ela se agrava ainda mais, espera-se ela passar, e isso gera uma redução em todas as atividades. “Tem de se olhar as coisas concretas que estão ocorrendo. No Brasil, com o plantio já feito, ao final da safra, há boas perspectivas de produção”, argumenta.
Mesmo com um olhar moderado sobre os impactos dessa crise financeira mundial, Pallaro estima reduções no crédito, e um crescimento da empresa, em 2009, igual ao de 2008. Segundo os dados da Anfavea de outubro, a New Holland teve uma superação, no comparativo de 2007-2008, de 54,1% em vendas de tratores de rodas – considerando o acumulado de janeiro a outubro. No mesmo período, o grande destaque foi no setor de colheitadeiras, com 123% de aumento no número de vendas.
Para Case IH, está cedo para se reconhecer os reflexos dessa crise, de acordo com Ari Kempenich, gerente de marketing da empresa. “Os dados consolidados em outubro ainda não refletem nenhuma mudança em nossos resultados de vendas e faturamento”, diz. “Quando a crise chegou, a maioria dos produtores já estava preparado para o plantio ou com o próprio plantio feito. Portanto, muitos deles não serão afetados pelo cenário econômico atual, mas sim pela previsão do que irá acontecer quando a colheita começar, ou seja, a partir de março do próximo ano”, declara Kempenich.
O atual problema, e que agravou uma situação que vem sendo arrastada desde 2004 (por conta da rolagem de dívidas daquela safra), é a falta de crédito enfrentado por grandes produtores da região Centro-Oeste. “Eles sofrem também com problemas de fluxo de caixa, garantias para obtenção de crédito e a ausência das linhas tradicionais das tradings. Isso provoca um duplo impacto: o alongamento das dívidas de bens que estão depreciados (ou se depreciando rapidamente) e, ao mesmo tempo, diminui a capacidade de tomar novos empréstimos”, observa. Já os produtores das regiões Sul e Sudeste não vivem a mesma situação, pois utilizam um porcentual de recursos próprios no financiamento das safras, motivo que contribui para que o impacto do crédito seja menor naquelas regiões, de acordo com o gerente de marketing da Case IH.
Ainda com os planos de investimento propostos para o próximo ano com a da fábrica de Sorocaba (SP), que chega a quase R$ 1 bilhão, a empresa se diz atenta ao mercado e estima para este ano uma superação nos índices de crescimento, em termos de vendas e produção.

A força é da agricultura familiar

Diante dessa nova realidade, a linha de tratores mais leves de até 75 cavalos (cv) deve garantir mais ânimo à produção nas fábricas, por conta da linha de crédito do governo federal, através do Programa Mais Alimentos, e também pelo Programa Pró-Trator (do governo do Estado de São Paulo) que oferecerá tratores de 50 a 120 cv, a juro zero, aos produtores paulistas – este programa está em fase de oficialização e, em breve, o governo estadual deverá divulgar as regras para se participar do programa.
Para Francesco Pallaro, da New Holland, essas iniciativas servirão para conter os impactos da crise. “Temos de adequar um pouco o nosso trabalho, reforçar um pouco mais a produção de tratores pequenos que estarão disponíveis nesses programas”, declara.
“Além disso, uma maior liberação de crédito por parte do governo e a busca de estratégias criativas para financiar máquinas também podem gerar melhorias no panorama em médio prazo”, acrescenta Kempenich.
Montadoras e indústrias, voltadas ao atendimento do médio e pequeno produtor, enquadrado como agricultor familiar, não estarão imunes, mas deverão passar um tanto longe dessa crise – pelo menos, se o quesito for disponibilidade de crédito. “Oitenta e cinco porcento do setor de máquinas agrícolas são dependentes de financiamento, e sem essa ajuda do governo fica complicado o setor”, destaca Júlio Cercal, gerente comercial da Tramontini. A empresa, localizada em Venâncio Aires (RS), fabrica tratores 100% nacionais, como microtratores, trator transportador agrícola, geradores, conjuntos marítimos, entre outros itens.
“Existe uma previsão de liberação de verbas por parte do governo federal para a agricultura. Mas [esses recursos] não chegam, os produtores estão esperando até quatro meses para a liberação da verba”, diz Cercal. Segundo o gerente comercial da empresa, pelo Programa Mais Alimentos, cerca de 500 máquinas aguardam a liberação do crédito, referentes aos pedidos feitos em toda a rede da Tramontini, no Brasil.
“Antes da crise, estimávamos um crescimento em torno de 35% para o próximo ano, agora nosso alvo é 20%. O que pode vir a significar 1.200 tratores por ano”, estima Cercal. A empresa fechou o ano de 2007 com uma produção de mil unidades.
Na mesma expectativa de aceleração de aprovação do crédito pelo programa Mais Alimentos, está a empresa Land Track do Brasil, especializada nesse nicho de mercado voltado a atender o pequeno e médio agricultor. “Até o momento não sentimos nenhum impacto desta crise que está acontecendo no mundo, a não ser que as aprovações de créditos estão um pouco mais lentas”, declara Vanessa Marquesan, sócia-gerente da empresa, localizada em Santa Cruz do Sul (RS).
A demora, de acordo com o secretário de Agricultura Familiar do Ministério do Desenvolvimento Agrário (SAF/MDA), Adoniram Sanches Peraci, partiu da necessidade de regulamentação e sistematização para se operar essa nova linha de crédito no âmbito dos sistemas de Assistência Técnica e Extensão Rural (ATER) do País e dos agentes financeiros que operam-na. “Mas essa situação já foi superada. Os créditos estão assegurados e operando com desenvoltura na maioria dos estados brasileiros”, assegura Peraci.
Os recursos anunciados em julho deste ano para a safra 2008/2009 da agricultura familiar estão garantidos, segundo Peraci. São R$ 13 bilhões que estão à disposição da agricultura familiar. “Até 2010, o volume de crédito da linha Mais Alimentos chegará a R$ 25 bilhões e vai beneficiar 1 milhão de agricultores familiares”, prevê. O balanço do programa até o final de outubro, segundo dados da SAF/MDA, mostra que cerca de 1.250 tratores e motocultivadores já foram comercializados, e outras 1.200 unidades já tinham status de negócio assegurado, com sinal verde dos bancos.
O incentivo do governo federal vem mostrando resultados nas vendas da Agritech Lavrale, que desenvolve e produz tratores e cultivadores motorizados desde 1957. “Quem estiver fora desse programa deverá sentir mais o baque da crise”, diz Nelson Watanabe, gerente nacional de vendas da Yanmar Agritech. Pelo programa a empresa já contabiliza cerca de 220 tratores destinados a agricultores familiares. Em termos de produção de máquinas, este ano deve fechar 20% superior ao ano passado. A estimativa, para 2009, é manter o crescimento da empresa de 5 a 10%.
Embalada no mesmo ritmo de otimismo com o plano de crédito do governo federal, está também a Landini, voltada à produção de tratores de 40 a 250 cv, além de pulverizadores – estes últimos, inclusos no programa. Localizada em São José dos Pinhais (PR), a empresa de origem italiana se uniu através de uma ‘joint venture’ com a empresa brasileira Montana Indústria de Máquinas, em 2005 e fabrica a linha de tratores desde 2006. Uma ‘joint venture’ – literalmente ‘empreendimento em conjunto’ – é uma associação de empresas, que pode ser definitiva ou não, com fins lucrativos, para explorar determinados negócios, sem que nenhuma delas perca sua personalidade jurídica.
Os efeitos da crise devem afetar menos a linha específica de tratores pequenos de 40 a 75 cv, segundo Edson Stefani, gerente comercial de tratores da Landini. Há uma estimativa de 10 a 15% de queda em vendas desse tipo de máquinas. “Agora, para os tratores maiores, que possuem maior valor agregado, são necessários financiamentos junto a bancos. Para esses, deverá ter uma queda maior, cerca de 30 a 45%”, estima Stefani.
Os meses de novembro a janeiro, de acordo com o gerente comercial de tratores da empresa, não são tão favoráveis para a venda de máquinas agrícolas, por isso a crise ainda não repercutiu. “Estimamos que vamos passar pelo primeiro trimestre do ano com uma baixa de demanda, mas o impacto para nós não será tão grande quanto de empresas maiores. Nós detemos uma pequena fatia do mercado de máquinas do País, e por isso o impacto deve ser menor”, conclui.

Aparentemente alheia à crise

Longe de querer comentar sobre a crise, a AGCO, fabricante e distribuidor mundial de equipamentos agrícolas, detentora das marcas Massey Fergunson e Valtra, diz-se, através de uma nota publicada pela assessoria de imprensa, otimista sobre os resultados que o grupo obteve na América do Sul, em função das condições agrícolas favoráveis no mercado brasileiro e argentino sobre as vendas no varejo. De acordo com a nota, as condições estáveis de mercado forte durante o terceiro trimestre de 2008 geraram um crescimento de vendas de mais de 58% no Brasil. Na América do Sul, as vendas das unidades de tratores aumentaram aproximadamente 36% e as vendas das unidades de colheitadeiras aumentaram aproximadamente 87% nos primeiros nove meses de 2008 em comparação com o mesmo período do ano anterior.
Até o fechamento da edição, a John Deere não deu nenhuma resposta sobre a situação da empresa diante da crise iniciada nos Estados Unidos.


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