Até
mesmo antes de a crise financeira mundial ter início,
a agricultura já sofria com os preços dos insumos,
que estavam 100% mais caros dos praticados em 2007. Quem comprou
nesta época acabou duplicando os custos. Nós
plantamos a safra mais cara da história, afirma
o Presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB), Cesário
Ramalho da Silva. Com os passar dos meses os preços
mundiais dos insumos chegaram a diminuir, mas o dólar
iniciou a elevação em relação
ao real, o que manteve o alto custo de produção
no Brasil.
Nesta época, a crise financeira global já aterrorizava
todos os setores da economia. As tradings empresas que
costumeiramente compram parte da lavoura antecipadamente
deixaram de atuar no mercado e, sem dinheiro, alguns agricultores
passaram a vender parte da safra 2009 para as revendas de
insumos. Caso contrário, muitos não teriam como
plantá-la.
A ausência das tradings nas negociações
reduziu radicalmente o potencial financeiro dos produtores.
Para se ter uma idéia, a Vanguarda do Brasil, uma das
maiores produtoras de grãos do País, está
com apenas 25% da lavoura travada termo usado para separar
a parcela da lavoura já comercializada enquanto
no mesmo período do ano passado tinha mais de 50%.
Segundo o Presidente da Comissão de Cereais, Fibras
e Oleaginosas da Confederação da Agricultura
e Pecuária do Brasil (CNA), José Schreiner historicamente
as traidings financiam cerca de 45% da safra e este ano esse
número não chega a 15%. Para o produtor de soja
de Rondonópolis (MT), João Carlos Diel, a situação
se repete. As traidings sempre me financiaram, mas neste
ano tive que usar recursos próprios para plantar a
soja, afirma.
Muitos produtores acabaram diminuindo a tecnologia empregada
na lavoura, comprando menos adubo, menos herbicida, entre
outros produtos, o que deverá resultar em menor produtividade.
Ano passado eu coloquei entre 450 e 500 kg de adubo
por hectare, esse ano ficou entre 280 e 350 kg. Isso me trará
um impacto na produtividade, mas plantei com o que foi possível,
explica o produtor de soja de Rondonópolis.
Neste cenário, os agricultores estavam plantando e
vendo os preços das commodities caírem. Muitos
estavam com lavoura de baixa produtividade, sem crédito
e sem esperança. Mas ainda tinha mais um problema que
rondava a mente dos agricultores: uma parcela de R$ 1 bilhão
do financiamento das máquinas agrícolas, em
15 de outubro.
Sem crédito dos bancos e das tradings, os agricultores
não tiveram condição de arcar com o vencimento
e 70% deles ficaram inadimplentes, segundo a Federação
da Agricultura e Pecuária do Estado do Mato Grosso
(Famato).
Sem receber, as instituições financeiras passaram
a tomar as máquinas nas fazendas o que causou muito
descontentamento do setor agrícola O que os bancos
estão fazendo são contra os próprios
interesses, porque sem máquina não há
condições dos agricultores plantar o final da
safra e sem plantar eles não terão como pagar,
explica Carlos Eduardo Tavarez, superintendente da Companhia
Nacional de Abastecimento (Conab). Na época, a cultura
de soja já tinha sido plantada, mas ainda faltava a
plantação de culturas como o algodão
e o milho.
Com a ação dos bancos, o governo exigiu que
a dívida fosse arrastada até 30 de dezembro
na tentativa dos agricultores conseguirem crédito até
lá. Se o agricultor não tem dinheiro hoje,
não terá também nos últimos dias
do ano, opina o produtor de soja de Rondonópolis,
João Carlos Diel, que também não pagou
a parcela do maquinário de outubro. Os bancos
estão segurando o crédito, a situação
está caótica, as lavouras vendidas para as revendas
de insumo, commodities baixas e os produtores com nome protestado
no Serasa como mal pagador. Qual banco irá emprestar
dinheiro?, pergunta o produtor.
O preço da commodity da soja, que era de 16 dólares
no meio do ano, chegou a casa dos nove dólares em novembro.
O mais desesperador é que historicamente o final do
ano apresenta o pico dos preços devido à entressafra.
Mesmo assim o Vice-Presidente da Vanguarda do Brasil, Leonardo
Slhessarenko, declarou esperar um aumento nos preços
no próximo ano. Mas a gente espera que o preço
suba, disse. Ao ser perguntado sobre a esperança
do preço subir na época da safra ao invés
de descer, como normalmente acontece, respondeu: não
tem nada garantido, é a gente que é otimista
mesmo. Na verdade, nós estamos muito apreensivos.
Com os custos em alta e os preços em baixa, a diminuição
dos custos é a primeira alternativa que os produtores
procuram. Tivemos uma redução no pessoal
para tornar a companhia viável. Neste momento a criatividade
entra forte, temos que cortar custos, mas com responsabilidade,
afirma o Vice-Presidente da Vanguarda do Brasil. E a prática
não é exclusiva de grandes corporações.
João Diel, de Rondonópolis, também teve
que diminuir a folha de pagamento. Fui obrigado a reduzir
o número de funcionários fixos. De 13 para oito.
Estou economizando em outros setores da fazenda também,
como o diesel para cortar os custos até que venha a
plantação e a venda dos grãos,
afirma.
Preços
baixos, custos altos
Mesmo com os preços em baixa, não há
interessados em comprar. Para os produtores não sofrerem
com preços irrisórios que podem vir quando a
safra começar a ser colhida e os produtores serem obrigados
a vender os grãos por falta de armazém, o Ministro
da Agricultura garantiu a atuação do governo
no momento de venda da safra. O governo vai usar todos
os instrumentos para facilitar a comercialização.
Compraremos a preços mínimos e, se preciso,
formaremos estoques. Faremos o possível para possibilitar
que a agricultura continue rodando, explica Reinhold
Stephanes. Mas para o integrante da CNA, José Schreiner,
os preços estipulados pelo governo não atendem
aos custos. Não adianta apoiar a comercialização.
Muitas vezes os custos superam os preços mínimos
do governo. O mais importante é disponibilidade de
recursos para o produtor, afirma. Para ele, há
produtores que não têm condições
financeiras de controlar pragas durante o crescimento da lavoura.
Se um agricultor precisar de defensivos e não
tiver como comprá-los, por cerca de 0,5% do valor total
da lavoura ele pode perder uma quantidade muito significativa
da produção, explica Schreiner.
O governo já tomou diversas medidas tentando atenuar
o problema de crédito. Ao todo, foram liberados 13
bilhões de reais em 2008 através do Banco do
Brasil e da Poupança Rural. Mas esse dinheiro
não chegou aos produtores, reclama José
Schreiner. Além desse montante, no final de novembro
o governo anunciou a disponibilidade de mais R$ 1 bilhão
à agricultura. Um milhão não resolve
o problema. No mínimo, a agricultura necessita de R$
4 bilhões, analisa Schreiner.
Plantação
Safra e Safrinha
A queda da área plantada da soja será
de 2 a 3%, do milho deverá ficar entre 10 e 12% e do
algodão por volta de 15%, explica Schreiner.
Segundo ele, os agricultores escolheram diminuir o milho e
o algodão porque a soja tem mais saída para
exportação e o dólar alto pode compensar
todos os problemas enfrentados pelos agricultores brasileiros.
Mesmo assim houve diminuição na área
porque muitos produtores preferiram manter a tecnologia e
diminuir a área plantada.
E quem priorizou a soja pode ter se dado muito bem. Há
um excedente de milho no mercado. Esperávamos que o
Brasil fosse exportar 10 mil toneladas de milho, mas não
vamos chegar nem a cinco mil, afirma o superintendente
da Conab, Carlos Eduardo Tavares. Segundo ele, um dos problemas
que o milho brasileiro sofrerá será a forte
concorrência com o milho norte-americano, já
que a baixa no preço do petróleo deverá
deixar o milho, usado para a produção de etanol
nos EUA, sobrar no mercado externo.
A safrinha 2009 poderá ser muito menor que a 2008.
Segundo o integrante da CNA, José Schreiner, teremos
uma redução da safrinha de 30% para o próximo
ano. Para o Vice-Presidente da Vanguarda do Brasil, Leonardo
Slhessarenko, disse que ainda não sabem se vão
plantar a safrinha.
Com diminuição da área plantada, a certeza
de menor produtividade devido à baixa tecnologia empregada
no campo e a incerteza da safrinha, a safra brasileira deverá
reduzir drasticamente, apesar dos dados da Conab indicarem
uma redução de 1,4% em relação
à safra passada (143,8 milhões de toneladas
contra a perspectiva de 141,8 milhões de toneladas
para 2009). Os números da Conab ainda sofrerão
reajuste e a estimativa é que caia mais um pouco. Apesar
disso, não há risco em produzirmos abaixo das
nossas necessidades de consumo. Mas não há
nenhuma dúvida que o Brasil será abastecido
normalmente, sem faltar alimento, assegura Schreiner.
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