Em
Araguari, Minas Gerais, algo em torno de R$ 10 a mais por arroba. Esse é
o reflexo do embargo à exportação de carne do País
feito pela União Européia. As exportações foram suspensas
em janeiro, e voltaram apenas para fazendas que estavam em regularidade com o
Serviço de Rastreabilidade da Cadeia Produtiva de Bovinos e Bubalinos,
o Sisbov.
Apenas 95 fazendas estão com o status de empreendimento
com liberação para exportação de carne aos europeus.
Esse número não chega a 0,01% do total de fazendas do País
com produção bovina, que, segundo o Censo de 2006, realizado pelo
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), é de 2.650.596
propriedades.
A carne mineira será a que mais abastecerá
o mercado de exportação. Lá foram certificadas cerca de 80%
do total. Também fazem parte da lista os estados do Rio Grande do Sul,
Mato Grosso, Goiás e Espírito Santo. A seriedade e a dedicação
com o sistema de rastreabilidade bovina renderam a esses pecuaristas um ganho
maior por arroba. Atualmente a média ultrapassa R$ 70. De acordo com Centro
de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), a média da arroba
do boi gordo no estado de São Paulo, entre os dias 6 e 13 de maio, ficou
em R$ 78,53. Especialização
na engorda Para
o pecuarista Paulo César Vieira Paiva, da fazenda São Judas Tadeu,
em Araguari, município localizado na região do triângulo mineiro,
a certificação pela União Européia trouxe uma maior
valorização ao trabalho desenvolvido na pecuária, e serve
de incentivo para se buscar a rastreabilidade no rebanho. A gente tem de
se profissionalizar, tem de fazer o melhor possível. Isso começou
com o Sisbov, e conseguimos, a partir dele, adquirir um preço melhor,
destaca. O pecuarista, que está na atividade há quase 15 anos, diz
que custo operacional tanto para implantação do rastreamento do
gado como para a adequação da fazenda não seria viável
se não houvesse o aumento pago na arroba do boi.
A produção
de Paiva chega de 17,5 a 18 arrobas por animal. O rebanho é formado pelo
gado nelore, e alguns cruzamentos industriais, do nelore com as raças marchigiana,
limousin e girolando. A propriedade é pequena, com 670 hectares e um rebanho
de 668 cabeças. O pecuarista se especializou na engorda como forma de poder
garantir a produção na propriedade. A fazenda tem uma área
pequena, então você tem de tomar um destino só. Não
adianta você fazer o processo todo, porque fica inviável, explica.
A busca de novas tecnologias e uma genética melhor para o rebanho são
os alvos de Paiva. E é partir disso que a produção terá
mais rotatividade, através da precocidade em ganho de peso nos animais,
além do tratamento sanitário adequado e o rastreamento de todo o
gado. Precisamos de incentivos para poder fortalecer, diz. Inversão
de papéis Decidir
o preço a ser pago pela mercadoria não é a prática
utilizada no mercado de commodities como a da carne. O que estabelece o preço
é o próprio mercado, dependendo do fluxo de demanda de oferta e
procura do produto. Atualmente a pecuária está bem, com a alta nos
preços da arroba. E melhor ainda quando o pecuarista está na lista
das 95 fazendas. Vanderlan Luiz Mendes, proprietário da fazenda Jordão,
também em Araguari, contou que ligava para os amigos, perguntando se os
frigoríficos da região haviam entrado em contato com eles
Se eles não ligaram, vão ligar, dizia. Eles perguntaram
para mim quanto eu queria nos meus bois.
A euforia com os preços
da arroba diante da certificação animaram mais ainda Mendes, que
planeja investir mais na propriedade em termos de estrutura e genética
que garanta maior rotatividade, e, conseqüentemente, maior lucro.
O pecuarista lembrou da dificuldade em se adequar ao Sisbov muitas regras
e normas a serem seguidas, além do investimento. E depois de ter conseguido,
o retorno inicial foi de cerca de R$ 2 a mais pela arroba, segundo ele. Era
um acréscimo pequeno, mas já era alguma coisa, e por isso decidi
seguir em frente e rastrear todo o meu gado.
O resultado da insistência
o levou, juntamente com o irmão, Ivan Luiz Mendes (proprietário
da fazenda Aquário, também na região), a ser qualificado
para a exportação de carne. A produção de Vanderlan
está baseada no cruzamento entre as raças nelore e a italiana piemontês.
Esse cruzamento trouxe um resultado excelente na região, com a aceleração
no abate e melhor rendimento de carcaça, conta. A
genética certa da produtividade Também
voltado exclusivamente para a engorda, o pecuarista procura obter mais animais
com a genética do piemontês meio sangue. Mendes adquiriu touros puro
sangue da raça e procura negociar com demais pecuaristas, voltados à
cria, a disponibilidade do touro dele para ficar com os bezerros. O sistema
de produção na fazenda Jordão é basicamente a pasto
com boa altura e de qualidade, além da utilização de sal
mineral para ajudar o desenvolvimento do gado. O controle sanitário também
é rigoroso para testificar e garantir a qualidade do produto. Tudo
é anotado, desde as vacinações até as vermifugações
no rebanho. A entrada e saída de animais, todas essas informações
estão na pasta do Sisbov, frisa. Essa pasta guarda todo o histórico
da propriedade e do manejo com o gado, e é por onde o trabalho de certificação
está comprovado, através de notas fiscais e documentações
dos animais e da própria fazenda, além do próprio certificado
de exportação. Rastrear
é preciso Logo
após o embargo da União Européia e, posteriormente, a abertura
de negociação para a exportação de carne com o grupo,
foram disponibilizadas diversas listas de fazendas cadastradas pelo Sisbov. O
Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) apresentou
inicialmente uma lista com 2.681 propriedades que não foi aceita. Uma última
lista tinha 150 fazendas, e desta, foram selecionadas 106, que logo depois viraram
95. As divergências estavam em torno de falta de documentação
e informações sobre os estabelecimentos. Em entrevista coletiva
na abertura do XVI Seminário do Agronegócio para Exportação
(AgroEx), dia 12 de maio, na Federação das Indústrias do
Estado de São Paulo (Fiesp), o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes,
destacou o trabalho mais efetivo com a rastreabilidade para o Brasil voltar se
firmar no mercado de exportação. Houve uma crítica,
de acordo com o ministro, em torno da posição tomada pelo Brasil
em relação às negociações com a União
Européia. A bancada ruralista da Câmara de deputados exigia uma posição
mais firme do governo, no entanto, o ministério acredita que a postura
tomada foi a correta. O Brasil havia assumido compromissos, havia
baixado as normas. Os ministros no passado haviam assinado essas normas, e o País
deixou de cumprir essas normas. (...) Claro que havia um problema comercial, e
há um problema comercial dos produtores de carne à União
Européia, mas isso não nos dava direito de não cumprir os
compromissos, declarou Stephanes. A preocupação do
governo era manter as negociações com os europeus para evitar uma
leitura de que o rompimento estava ligado a problemas de sanidade animal, quando
a questão era simplesmente de rastreabilidade. Essa leitura poderia
desencadear problemas com países terceiros, além da União
Européia. Países que usam-na como referência. Atualmente
há um registro de cerca de 15 mil fazendas certificadas pelo Sisbov no
País, sendo que só a metade dessas propriedades encontra-se em área
habilitada para a exportação à União Européia.
A intenção do governo é, a partir do aquecimento das exportações
e do processo de rastreamento do rebanho brasileiro, poder repensar o Sisbov.
Não estamos exportando praticamente nada. Simbolicamente, o mercado
está aberto e agora depende que nós façamos internamente
o nosso dever de casa, e aí sim, se for o caso, renegociamos e alteramos
o sistema de rastreabilidade, até onde é possível, sem perder
o foco para o qual a rastreabilidade passou a ser instrumento, conclui Stephanes.
A gente tem de se profissionalizar, tem de fazer o melhor possível.
Isso começou com o Sisbov, e conseguimos, a partir dele, adquirir um preço
melhor - Paulo César Vieira Paiva, fazenda São Judas Tadeu,
Araguari (MG) Como produtor certificado, Vanderlan Luiz Mendes, da fazenda
Jordão, consegue negociar melhor o preço da carne, algo que antes
jamais tinha feito. Para o governo, manter as negociações
com os europeus foi o caminho encontrado para evitar uma leitura de que o rompimento
estava ligado a problemas de sanidade animal, quando a questão era de rastreabilidade,
segundo o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes. |