Segundo
os especialistas isso acontece com maior freqüência
no segmento de frutas de mesa, que tem como característica
oferecer produtos in-natura ao consumidor final. O excesso
de exposição e a fragilidade das frutas contra
a ação de pragas, fungos, nematóides,
além dos muitos danos causados pelo clima e que podem
depreciar sua qualidade para o mercado, são apontados
como a causa desse verdadeiro bombardeio feito contra os pomares
diariamente.
Lideranças de movimentos sociais e ONG ambientalistas,
no entanto, dizem que nisso tudo, o que mais causa perplexidade
é que até pouco mais de quarenta, cinqüenta
anos, grande parte dos produtos que hoje são descritos
nos receituários agronômicos, sem nenhuma restrição,
nem sequer eram conhecidos. Apesar de existir a muito mais
tempo, o conceito de agricultura orgânica viveu muito
tempo a margem do sistema de produção. Só
de uns 15 anos para cá que os grupos de agricultores
se uniram num trabalho de conscientização para
mudar o pensamento que ra comum entre produtores e consumidores
de um modo geral, destaca Tiago Biusse, diretor financeiro
da AAOcert, ONG ligada a Associação de Agricultura
Orgânica AAO.
Biusse que é uma liderança importante dentro
do setor fala que o trabalho da AAO, principal entidade que
representa a produção orgânica, no sentido
de tornar a certificação dos produtores uma
realidade em todo o país tem sido decisivo. Hoje
a preocupação do setor não é apenas
quanto ao não uso de adubos químicos e agrotóxicos.
As normas de maneira geral são bem mais amplas,
esclarece o diretor financeiro da ONG.
A lei dos orgânicos, criada para regulamentar a produção
e coibir eventuais ilegalidades, é vista como um divisor
de água. A lei já passou pela apreciação
do legislativo e aguarda regulamentação para
entrar efetivamente em vigor. Entre suas principais deliberações
a lei estabelece o respeito às questões sócio-ambientais,
além de toda uma quantidade enorme e conceitos agronômicos
ligados ao cultivo ecologicamente correto.
O preparo do solo, o uso consciente dos recursos da propriedade,
a minimização na aplicação de
insumos externos à propriedade, são apenas algumas
normas que o produtor tem que obrigatoriamente seguir. O conceito
de sustentabilidade da produção agropecuária
é outro ponto bastante destacado entre os produtores
e representantes do setor. Para eles, a permanência
do lavrador, numa mesma área, durante varias gerações
é o que vai garantir a continuidade dos recursos necessários
à continuidade da produção no campo.
O líder da ONG AAO cert, chama atenção
para o fato de que na agricultura convencional isso não
gera preocupação e explica o porquê.
No modelo de agricultura usado na atualidade e que se praticou
durante séculos no Brasil, o agricultor não
se vê muito comprometido em explora uma determinada
área de maneira sustentável. A terra é
usada durante um período, que pode durar de quatro
a cinco anos e depois é, simplesmente abandona. É
esse uso extrativista da terra que faz da produção
orgânica um mau negócio para a maioria dos grandes
agricultores brasileiros, desabafa Biusse.
Um dado do Ministério da Agricultura, Pecuária
e Abastecimento, MAPA, corrobora com a colocação
do representante dos produtores. Um levantamento feito para
medir o nível de degradação das terras
agricultáveis do país mostra que um universo
de 50 milhões de hectares, o que equivale a um terço
do total de 150 milhões hectares, já apresenta
algum tipo de degradação. Dentro de um país
que tem as dimensões de um continente, como é
o caso do Brasil, uma área igual ou superior a muitos
países da Europa, Ásia e até mesmo da
América do Sul, pode estar sendo desperdiçada.
Recentemente o próprio ministro da agricultura Roberto
Rodrigues admitiu que a situação é bastante
grave.
Orgânico
bem manejado garante produção
Uma
dúvida que se instalou no campo, sabe-se lá
porque, e que permanece até hoje entre os agricultores
é sobre não uso de produtos químicos
nas lavouras como principal motivador da redução
nos índices de produtividade das culturas. Neste ponto
os especialistas e até mesmos os produtores reconhecem
que essa relação não é muito direta.
Agricultores que trabalham no sistema orgânico já
manejam áreas de cana-de-açúcar, num
total de 18 mil hectares.
Outras lavouras como é o caso da soja, milho, trigo,
feijão, arroz, também crescem e hoje já
disputam espaço com os convencionais nas gôndolas
dos principais supermercados. Na linha de hortaliças
e frutas em geral, as vezes é mais fácil o consumidor
encontrar produtos orgânicos do que o convencional.
Adenilson Roncaglia que há sete anos trabalha com frutas
no sistema orgânico é perfeitamente possível
o agricultor trabalhar sua terra sem nenhum tipo de agressão
externa e tirar dela um resultado igual ou a até superior
ao sistema convencional. O fruticultor que é sócio
proprietário no Sitio São José, que ele
administra em parceria com o irmão, Adilson Rocaglia,
defende a viabilidade comercial da fruticultura orgânica,
porque se diz um exemplo vivo.
Nas suas terras o conceito de produção agrícola
sem nenhum tipo agente químico externo é levado
a sério. Talvez se não fosse por isso
nossa produção não tivesse atravessando
a quatro geração, ele fala.
Adenilson, responsável por manejar os pomares de figo,
goiaba e serigüela do sítio, conta que numa outra
propriedade, mantida pela família, em Jarinú,
SP, cidade próxima a Serra da Cantareira, eles mantém
uma produção de maça no sistema orgânico.
Para agricultor, manejar a lavoura nesse sistema, onde nenhum
tipo de produto químico é permitido dá
mais trabalho ao agricultor. No entanto, a quantidade de técnicas
para isso é grande.
Controle
de pragas e doenças é biológico
O
manejo fitossanitário do pomar é feito usando
o controle biológico de pragas e doenças e a
criatividade dos produtores para desenvolver ferramentas alternativas,
em alguns casos, surpreende. Uma praga conhecida como broca,
que ataca as lavouras de figo e, se não cuidada, pode
vir a matar a planta conta com um controle quase artesanal.
O processo consiste em retirar o inseto da planta, utilizando
um pedaço de arame liso. Esse é introduzido
no galho pelo produtor para fisgar o inseto. O agricultor
observa que em lavouras comuns, onde são feitas pulverizações
periódicas, essa praga nem é muito conhecida.
A mosca da fruta outro inseto também bastante temido
e combatido dentro da fruticultura, no sistema orgânico
é combatido de diferentes formas. Na goiabeira, por
exemplo, os frutos são envolvidos em sacos de papel,
evitando assim o contato direto da fruta com a mosca. Além
disso, uma parte dos frutos é derrubada do galho, logo
do inicio da brotação, na intenção
de que sirvam de iscas para os insetos, explica Adenilson.
Já com a figueira, plantas que tem um fruto bastante
sensível, o controle da mosca é feito de duas
maneiras. A primeira usa tecnologia mais avançada e
é feito através de um selo, colocado na parte
posterior do fruto, por onde as fêmeas adultas costumam
botar seus ovos. Esse selo que segundo o produtor não
é tóxico para quem consome a fruta, geralmente
a acompanha até a casa do consumidor.
Uma outra forma usada pelos agricultores para atrair a mosca
é através de uma isca feita com uma garrafa
Pet de refrigerante, onde o eles colocam suco
de figo batido no liquidificador. O produtor diz que o truque
é simples. Depois de encher a garrafa com uma quantidade
de suco de frutas, faz-se um furo na garrafa, numa altura
próxima ao nível do suco e depois a deixa no
pé da planta. A mosca é atraída pelo
cheiro forte da fruta e quando entra na garrafa se lambuza
e não consegue mais sair.
O fungo causador da ferrugem nas folhas, tanto do figo como
da goiaba é controlado com a aplicação
de uma calda feita com enxofre e cal de construção.
O produto deve ser aplicado conforme a necessidade, explica
Adenilson. Mas é preciso ter critério
no uso da calda para evitar problemas de toxidade nas plantas,
ele conclui.
Fertilidade
tem papel importante
O
manejo da fertilidade também segue critérios
rígidos do não uso de produtos químicos
e prega um manejo voltado ao uso dos recursos naturais disponíveis
no próprio local. Os cuidados para não faltar
nutrientes no solo são, basicamente, os mesmos do sistema
convencional, usando análise do solo como procedimento
padrão, antes de iniciar qualquer plantio. Caso a análise
mostre algum tipo de deficiência de nutrientes, a correção
do terreno é feita utilizando um esterco, de compostos
orgânicos que pode ser de origem animal ou vegetal.
No sitio São José, além de do composto
eles praticam uma adubação verde em toda a área
Esse é o diferencial que mantém a longevidade
da produção no sistema orgânico,
enfatiza o agricultor que destaca a importância vital
desse trabalho.
A espécie usada vai depender do resultado da análise.
A quantidade de opções é ilimitada. No
sitio São José foram usadas varias culturas.
Adenilson destacou, o Nabo Forrageiro como uma cultura ótima
na retenção de nitrogênio no solo. Outra
espécies são plantadas no sistema de consórcio,
caso da Crotalária, Tremoço, Labi-Labi, Ervilhaca,
Aveia, Mucuna, que aparecem segundo ele, em determinada época
do ano.
Como o uso de herbicidas de qualquer espécie é
proibido a roçada é obrigatória para
depositar material orgânico no solo. De acordo com o
fruticultor isso deve ser feito a cada 20 ou 30 dias, dependendo
das chuvas. Para corrigir as deficiências de nutrientes
mais específicos como, ferro (P) Potássio (K),
além dos micro-nutrientes, existe toda uma variedade
de rochas e outras fontes extraídas da natureza. Antes
de usar qualquer produto que o produtor não tenha certeza
da sua aplicação a AAO recomenda que o produtor
procure a entidade para esclarecimentos. Para isso a entidade
mantém uma equipe de técnicos para dar todas
as orientações.
FEIRA
É SUCESSO
O
aumento no interesse dos consumidores por uma alimentação
mais saudável e a consciência de que a preservação
do meio ambiente é vital para a continuidade da vida
no planeta está fazendo crescer a procura por produtos
orgânicos, principalmente nas grandes cidades.
Um exemplo que ilustra bem essa realidade é uma feira
que acontece todas as terças-feiras e sábados,
no Parque da Água Branca, zona Oeste da capital e que
atrai uma quantidade enorme de pessoas, vindas de todos os
cantos da cidade. O evento que acontece, regularmente, há
quase 20 anos, reúne produtores de várias regiões
de São Paulo, inclusive de outros estados e movimenta
uma grande quantidade negócios.
Dados do Banco Nacional de Desenvolvimentos Social, BNDES,
mostram um faturamento para o setor de orgânicos de
US$ 300 milhões por ano. Para o casal de agricultores
Jorge e Hute Horita que participam da feira, há 14
anos, a relação entre eles e seus clientes é
de total confiabilidade e recíproca troca de conhecimento.
A família Horita, mantém uma produção
de legumes e verduras, na cidade de Mairinque, SP, com mais
de 40 variedades diferentes, além de legumes e alguns
grãos, soja, milho, feijão.
Adepto da filosofia oriental, Jorge Horita busca aplicar esses
conceitos no dia-a-dia do seu negócio. Para o agricultor,
da mesma forma que acontece com os seres humanos, o desequilíbrio
é geralmente a causa principal das doenças físicas
e perturbações. Na natureza não é
diferente.
A família Roncaglia que comercializam suas frutas na
feira de orgânicos, buscam diversificação
através de um sistema de parcerias com outros produtores.
Com isso é possível ampliar o leque de produtos,
além de manter uma constância de produtos nos
períodos de entressafra, explica Adilson Roncaglia.
Já o produtor Marcos Camparini, proprietário
do sitio Jatobá, de Ouro Fino, Sul de Minas Gerais,
aposta na fabricação de produtos processados
para se diferenciar no mercado. Segundo ele, a procura ainda
é pequena, mais com forte tendência para um crescimento
rápido. Hoje o produtor enfrenta algumas dificuldades
para conseguir outros nichos de mercado para seus produtos.
Com a regulamentação da lei de orgânicos,
que deve acontecer em breve, ele espera que as coisas mudem.
Agora uma coisa que chama atenção dentro do
negócio de produção orgânica são
as lições de vida passadas, tanto por produtores
como consumidores. Como a história da técnica
em informática Cleuza dos Reis Este, de 57 anos, que
por um problema de saúde do marido foi levada para
consumir produtos naturais e não parou mais. Ela Conta
que, há cerca de quatro anos, seu marido sofria de
um câncer raro no intestino, e que um amigo recomendou
a mudança radical na dieta das família. Ela
não só aceito a mudança, como hoje, depois
de uma cirurgia e do marido já curado, todo o consumo,
desde verduras, frutas e legumes até produtos que normalmente
são comprados no supermercado, são comprados
de fornecedores orgânicos.
Do outros lado do balcão também tem história
de gente que por motivos de saúde teve de abandonar
os produtos convencionais e começar a buscar fontes
de alimentos naturais. A produtora Rita Brambila Maronesi,
dona do sitio Santa Madalena, em Cordeirópolis, região
próxima a Campinas, SP, sofria com reações
alérgicas causadas por má alimentação
e foi obrigada a revolucionar sua dieta para preservar sua
saúde. A melhora foi radical ela lembra. Hoje não
sente mais nada e não toma nenhum tipo de medicamento
anti-alérgico. Rita que é bióloga de
formação sempre praticou uma agricultura preservacionista
na propriedade. Assim que se viu curada da moléstia,
a produtora, que já cultivava uma quantidade enorme
de culturas nas suas terras, pensou: Porque não transferir
os benefícios que os produtos orgânicos me trouxeram,
para os consumidores de meus produtos? Daí em diante
foi só uma questão de tempo para transferir
toda sua produção para o sistema orgânico.
Hoje ela diz que os negócios vão muito bem e
a procura pelos mais de 50 itens que ela comercializa é
crescente.
|