Mais
do que aceitar possíveis mudanças na atual política
econômica (improvável) ou encontrar caminhos
eficazes para contornar os principais problemas enfrentados
pelo setor, o governo federal terá que demonstrar ainda
sensibilidade às reivindicações legítimas
dos produtores rurais, evitando a demagogia, discursos evasivos,
ou tentativas de minimizar a real dimensão dos problemas
do setor. Além disso, o surgimento de novas áreas
promissoras de exploração, como o biodiesel,
por exemplo, não podem servir de fachada para esconder
ou suplantar os setores que vem encontrando dificuldade. O
sucesso de determinados setores não pode ser usado
para justificar ou amenizar o fracasso de outros. A diversificação
é bem vinda e extremamente necessária, porém,
ela só é válida se representar uma soma
de novas atividades às já consolidadas e não
a substituição de uma atividade por outra. É
hora de dar um basta definitivo numa característica
histórica da atividade agrícola em nosso país:
a monocultura.
Lista
de problemas é grande
Institucionalmente,
questões como a defesa à propriedade e a aplicação
de critérios mais técnicos e responsáveis
para a implantação da reforma agrária,
aparecem como um dos pontos principais. Outros itens mais
voltados para a viabilidade econômica da atividade,
entretanto, são apontados como mais urgentes, entre
eles, cortes nos juros e impostos, melhoria da infra-estrutura
de portos e da malha rodoviária e ferroviária
e maiores investimentos na defesa sanitária e em pesquisas.
Para o presidente da Sociedade Rural Brasileira, João
de Almeida Sampaio Filho, o novo governo terá que promover
um choque de gestão em sua estrutura e planejamento
de ações, se quiser dar o devido valor à
agricultura. O governo Lula errou mais do que acertou
com relação à agricultura. Acertou ao
apoiar o avanço da agroenergia e na regulamentação
da soja transgênica. Porém, cometeu equívocos
na questão agrária, política macroeconômica,
atribuições dos ministérios e na política
agrícola em si, avalia João Sampaio. Para
o presidente da SRB, o setor tem um peso que nenhum outro
tem, mesmo carecendo de uma agenda de políticas públicas
condizente à sua contribuição na geração
de oportunidades, emprego, renda e superávit das contas
em favor do desenvolvimento do País.
João Sampaio chama atenção para necessidade
de ajustes em três pontos-chave: segurança jurídica
(direito de propriedade e programa agrário); desafios
macroeconômicos (câmbio, juros e impostos); e
questões de ordem institucional (raio de atuação
dos ministérios). Além destes, alerta
para os gargalos da política agrícola propriamente
dita, que passam por problemas relacionados à proteção
da renda, infra-estrutura logística, defesa sanitária,
pesquisa, negociações internacionais e legislação
ambiental e trabalhista.
É consenso entre os produtores rurais e as lideranças
do setor que, neste segundo mandato do presidente Lula, será
imprescindível garantir o direito de propriedade, punir
atos ilegais, como, por exemplo, invasões de terras,
extinguir o assistencialismo e modernizar a política
agrária. O problema, afirmam os produtores, não
é falta de terra e sim o falido modelo distributivista.
Os assentados não conseguem sobreviver, quiçá
se desenvolver sem ajuda governamental. Para ser viável,
a terra requer aptidão para o trabalho no campo, infra-estrutura,
crédito, gestão, entre outros fatores. Será
preciso investir na emancipação econômica
dos assentamentos que já existem, não criar
novos, sentencia Sampaio.
Mas talvez, ações conjugadas que resultem no
corte dos juros, do déficit público e dos impostos
seja o maior, e mais temido desafio do governo nos próximos
quatro anos. Este conjunto de iniciativas, aliado à
permissão para que o exportador tenha autonomia para
internalizar parte ou total de sua receita quando entender
ser conveniente trará resultados importantes: diminuirá
a entrada de dólares, favorecendo a valorização
da moeda norte americana, atrairá menos capital especulativo
e mais investimentos diretos, reduzindo custos e facilitando
o acesso ao crédito.
Questões
institucionais
Acabar
com a dicotomia de dividir a agricultura em dois módulos
também será uma tarefa importante do novo governo.
Enxergar a produção familiar como rival da empresarial
- atividades complementares, que, juntas formam o agronegócio
- é sustentar uma estrutura ministerial burocrática,
gerando gastos supérfluos e paralisando as ações.
O ministério da Agricultura não tem alçada
sobre questões-chave para o setor (licenciamento ambiental,
questão agrária, infra-estrutura). O mais racional
será catalisar as decisões relativas a estas
e outras áreas num único posto de comando.
Uma política agrícola eficiente, reivindicação
feita em uníssono por toda a classe ruralista, passa
por investimentos no seguro, crédito e ferramentas
de comercialização, que protejam a renda do
produtor rural. No caso do seguro, serão necessários
mais recursos para subvenção, abertura do mercado
de resseguros e fundo de catástrofe. No tocante a crédito
e comercialização, mais recursos, com aumento
do Plano Safra, uso dos mecanismos de sustentação
de preços e estímulo às transações
em bolsa, a partir da diminuição das exigências
financeiras para as operações.
Rodovias precárias, poucos portos e os que existem
sobrecarregados, malha ferroviária reduzida, hidrovias
subutilizadas e falta de armazéns minam a competitividade
do setor. Como a produção agrícola é
em sua maior parte transportada por caminhões, o sucateamento
das estradas encarece o frete. Serão necessários
investimentos pesados, não paliativos, em todos os
modais. As PPPs são uma alternativa.
Além disso, investir pesado em defesa sanitária
e pesquisa rural, áreas estratégicas para competitividade
da agricultura, terá que ser a tônica do novo
governo. O corte de verbas destinadas à sanidade fez
ressurgir a febre aftosa. No caso da pesquisa, a Embrapa,
por exemplo, deverá se dedicar à agricultura
como um todo e não de forma sectária.
O Brasil terá que investir simultaneamente na corrente
de formação de acordos caso a caso, blocos comerciais
e na negociação global, desenvolvendo uma estratégia
de atuação mais voltada aos ganhos econômicos
do que o "status" político. As negociações
bilaterais são alicerce para os acordos entre blocos
comerciais, que por sua vez, funcionam como base para o multilateralismo.
Desaparecer com o viés ideológico e a burocracia
serão prioridades. As decisões terão
que ocorrer sob à luz da ciência e da racionalidade,
como, por exemplo, no que diz respeito à biotecnologia,
APPs, reserva legal, entre outros pontos. Na questão
trabalhista, será necessária uma nova legislação
que regularize a atividade de curta duração
e cíclica no campo, tapando o buraco da lei atual,
que disciplina o trabalho rural de modo análogo ao
urbano.
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