O ano de 2004 foi para o segmento um período de resultados
bastante positivos no que envolve a comercialização
de derivados lácteos, inclusive com a abertura de novos
mercados. O trabalho do ministério da Agricultura Pecuária
e Abastecimento, através da Câmera Setorial do
Leite, em parceria com a CNA Confederação Nacional
da Agricultura, além das varias entidades ligadas a
cadeia leiteira, proporcionaram ao Brasil um crescimento de
106% nas exportações de produtos derivados do
leite. Além disso, pela primeira vez na história,
a balança comercial do setor fechou o ano superavitária,
um fato impar segundo representantes e produtores.
Um
mostra de que o Brasil deve entrar, definitivamente, no cenários
mundial da produção de leite e derivados, pode
ser medido pelos últimos resultados conseguidos no
âmbito da OMC, Organização Mundial do
Comércio. A imposição pelo país
de alíquotas compensatórias para os produtos
da comunidade européia, por exemplo; as quais fecharam
por dois anos nosso mercado para os laticínios do bloco,
marcou pela primeira vez, uma vitória brasileira nas
rodadas de negociações com o comércio
exterior. Outro ponto importante e que contribuiu para o aumento
da participação brasileira junto a esses mercados,
foi a comprovação num processo de direito internacional
que as grandes nações exportadoras praticavam
o "dumping" (vender um produto abaixo do preço
de custo), obtendo a importante vitória de cobrar direitos
"antidumping" nos produtos que vendem para o Brasil,
aplicáveis na forma de sobretaxas e de acordos de preços
mínimos. Em 2002, outra conquista de peso foi a contenção
das importações desenfreadas de soro de leite,
organizadas por laticínios desonestos, que usavam esse
derivado para adulterar a composição de seus
produtos. Com a fixação da taxa de 27% nas importações
do soro, o governo eliminou a fraude, deixando de prejudicar
consumidores, produtores, laticínios idôneos
e as finanças públicas, já que está
prática permite a sonegação fiscal.
No
cenário nacional, algumas ações também
foram preponderantes para garantir os resultados do setor
lácteo brasileiro no ano de 2004. A criação
da Câmara Setorial do Leite, formada para cuidar, exclusivamente,
dos interesses da produção leiteira, garantiu
o fôlego necessário para o produtor aumentar
sua representatividade. As parcerias público x privada,
também vêem garantindo uma participação
bem mais pró-ativa por parte das empresas fornecedoras
de insumos. Através de verdadeiros pacotes tecnológicos
em produtos e serviços, esses grupos oferecem ao produtor
o suporte necessário para garantir os aumentos nos
índices de produtividade das fazendas. Com isso, a
produção brasileira de leite, que em 2003 era
de 22 bilhões de litros, passou este ano para 23,5
bilhões, com uma média por vaca de cerca de
5 litros. Só para se ter uma idéia há,
aproximadamente, dez anos este volume era de 2,4 litros por
animal. Outro dado interessante mostra que o Brasil no acumulado
dos últimos da última década, a produção
leiteira, sofreu uma variação de 45% no equivalente
produzido.
A
instrução normativa número 51 do MAPA,
seguindo suas novas deliberações, estabelece
um regulamento técnico de produção, identidade
e qualidade para os leites tipo A, B e C, leite pasteurizado
e para o leite cru refrigerado, abrangendo, inclusive, a parte
da coleta do leite cru refrigerado e seu transporte a granel.
Aprovado no dia 18 de setembro de 2004, o texto entrará
em vigor após sua publicação no Diário
Oficial da União. De acordo com o parágrafo
2°: a secretaria de Defesa Agropecuária (SDA) expedirá
instruções para monitoramento da qualidade do
leite aplicáveis aos estabelecimentos que se anteciparem
aos prazos fixados para a vigência da presente instrumento
normativo. Segundo Jorge Rubez, presidente da Leite Brasil
e produtor de leite no Vale do Paraíba, interior paulista,
há mais de 40 anos, os problemas internos são
alvos de intensos trabalhos da Leite Brasil. "Graças
às inúmeras ações, o país
finalmente tem hoje normas de produção iguais
às do Primeiro Mundo, indispensáveis para que
nosso leite possa ter qualidade, e num futuro próximo
entrar e vencer no mercado mundial", declara.
Números
animam
Segundo
dados da Comissão Nacional da Pecuária de Leite
(CNPL) e da Confederação da Agricultura e Pecuária
do Brasil (CNA), na comparação de setembro deste
ano com setembro do ano passado, as exportações
de produtos lácteos cresceram 106%, movimento este
que vem acompanhado de queda nas importações
de 27,6%. Em valores, somente ao longo dos trinta dias, o
Brasil reuniu um acumulado de US$ 8,046 milhões, resultado
de uma remessa de 6,4 mil toneladas de produtos do setor ao
exterior. Com esse fôlego em exportações,
e com importações em queda, de US$ 7,226 milhões
no mês, a balança comercial de lácteos
encerrou setembro com superávit de US$ 820 mil, em
situação oposta à verificada em 2003,
quando a diferença entre exportações
e importações era deficitária em US$
7,5 milhões; resultado de US$ 3,9 milhões e
US$ 11,4 milhões, respectivamente.
Os
principais produtos exportados em setembro foram leite em
pó, que rendeu receitas de US$ 3,8 milhões e
leite condensado, com US$ 3 milhões. Os maiores compradores
do leite em pó brasileiro no mês passado foram
Venezuela, Senegal e Argélia. Já os principais
destinos do leite condensado produzido no Brasil foram Angola,
Trinidad Tobago e Venezuela. Segundo George Rubez, um fator
que ajudou a elevar as exportações de lácteos
é a alta dos preços no mercado internacional,
tornando os lácteos brasileiros mais competitivos no
cenário internacional. No começo do ano, a tonelada
do leite em pó integral era negociada por preços
entre US$ 1.900 e US$ 2.050 na Europa. Atualmente, o produto
é negociado em valores que oscilam entre US$ 2.250
e US$ 2.400 por tonelada.
Frente
aos mais recentes resultados de exportações
e importações de lácteos, o presidente
da Comissão Nacional da Pecuária de Leite (CNPL)
da Confederação da Agricultura e Pecuária
do Brasil (CNA), Rodrigo Alvim, acredita que para todo o ano
de 2004 há expectativa de leve superávit na
balança do setor, historicamente deficitária.
No ano passado, a balança comercial de lácteos
teve saldo negativo de US$ 63,8 milhões. Os resultados
acumulados dos primeiros nove meses do ano indicam exportações
de US$ 57,5 milhões e importações de
US$ 61,6 milhões, gerando saldo negativo de US$ 4 milhões.
Em igual período do ano passado, as exportações
somaram US$ 28 milhões e as importações,
US$ 85 milhões, provocando um déficit muito
mais elevado, de US$ 57 milhões.
Uma
das estratégias para permitir esse crescimento é
a criação do Fórum Mercosul do Leite,
grupo que está sendo formado e envolve entidades que
representam o setor de produção primária
e indústrias de laticínios de todo os países
do bloco. Segundo explica o presidente da CNPL/CNA, o grupo
irá subsidiar os governos dos quatro países
com propostas que visem à produção leiteira
na América do Sul aproveitando as novas oportunidades
no mercado internacional. Uma das principais metas é
avançar nas negociações comerciais com
outros blocos econômicos, lutando por acesso a mercados
e eliminação de subsídios, que causam
distorções comerciais e limitam a capacidade
exportadora do setor lácteo do Mercosul. O Fórum
Mercosul do Leite tem como integrantes a CNA e entidades como
o Centro da Indústria Leiteira da Argentina, a Sociedade
Rural Argentina (SRA) e a Cooperativa Nacional de Productores
de Leche (Conaprole), do Uruguai.
Adequar
a infra-estrutura
As
mudanças que vão ocorrer no dia a dia das fazendas
leiteiras com o entrada em vigor da IN 51, na opinião
dos próprios produtores entrevistados pela revista
rural durante a Expomilk 2004, realizada em São Paulo
de 26 a 30 de Outubro, vai depender do grau de tecnificação
de cada um. No caso do leite tipo A, as próprias exigências
do SIF, Serviço de Inspeção Federal para
o processo de produção e movimentação,
imprimem às propriedades um grau de tecnificação
industrial, análogo ao dos países do primeiro
mundo. Já com os produtores de leite dos Tipos B e
C, a quantidade de exigências aumenta devido o caráter
das fazendas que não dispõem de estrutura para
beneficiamento e envase do produto. Laércio Souza Campos
presidente da Associação Paulista de Gado Holandês,
fala que no estado existem, hoje, cerca de 190 criadores de
gado holandês registrados, no entanto, apenas 80 realizam
o controle leiteiro. Segundo ele, é muito importante
que todos os criadores corram atrás de profissionalização,
só que para isso a participação do governo
é fundamental.
Campos
fala que da região Sudeste, São Paulo é
o estado que mais sofreu com o êxodo dentro da atividade
de produção de leiteira. "Muita gente deixou
de produzir ou migrou para o corte devido aos baixos preço
praticados pelas cooperativas nos últimos anos. Para
o produtor, o perfil das fazendas não ajuda muito,
pois são na grande maioria rebanhos de pequeno e médio
porte, com produção média de 200 a 2,5
mil litros por dia, totalmente, dependentes do programa de
financiamento do governo federal para agricultura familiar
(Pronaf) para viabilizar sua infra-estrutura. Ainda no Vale
do Paraíba, SP, o cooperado Manoel Cavalcante, proprietário
da fazenda Piedade e produtor na região há mais
de 60 anos, mantém uma produção atual
de leite do tipo B de, aproximadamente, 2,5 mil litros/dia.
Segundo ele, a propriedade que possui 212 hectares, sendo
100 ha aproveitados para o leite precisa de uma manutenção
constante para se manter dentro das normas.
Preço
justo
O
custo para atender a todas as exigências do Ministério
da Agricultura quanto ao padrão de comércio
do leite é grande segundo o produtor. No entanto, ele
aguarda com muita expectativa a entrada em vigor das novas
regulamentações. Na opinião do produtor,
a partir do momento que as cooperativas começarem a
fazer o pagamento do leite não só por quantidade,
mas por qualidade também quem estiver enquadrado nas
normas vai receber melhor pelo leite produzido.
Para
o produtor essa mudança de paradigma deve ocorrer com
a vigência da instrução normativa 51 que
substitui o pagamento deixar de ser considerado por colônia
de bactérias e passa para células somáticas
(1 milhão por ml de leite). Com um rebanho de aproximadamente
300 animais, sendo que 130 vacas em lactação,
a propriedade depende de outras atividades como, a venda de
animais de bezerros e animais cruzados para viabilizar as
contas. Cavalcante mostra a tabela de preços da cooperativa
do mês de outubro que traz um decréscimo no preço
por litro de R$ 0,02,2 centavos com relação
à Setembro. "O problema do pagamento feito pela
quantidade é que quem produz mais ganhas mais".
Como exemplo, o produtor assina-la na mesma tabela que fazenda
com produção acima de 5mil litro/dia, o preço
pago pula para R$ 0,61,6 centavos/ litro, preço que
segundo Cavalcante, estaria ótimo para ele.
O
pagamento por sólidos totais é outro caminho
que o país deve seguir em breve, pegando rabeira no
modelo praticado pela Nova Zelândia e Austrália,
para se consolidar no mercado mundial. A Argentina também
já começou a fazer esse trabalho. De acordo
com o presidente da Leite Brasil, países como EUA e
Europa não seguem essa sistemática. Lá
ainda está em vigor o pagamento por volume de leite.
Quanto maior a quantidade, mais dinheiro na conta. Mas, segundo
ele, há uma explicação. Os produtores
abriram mão desse sistema porque não dependem
das exportações para serem melhores remunerados,
pois têm os subsídios como compensação
que em alguns casos chega a mais de 560 do custo de produção.
Para
o produtor, para o pagamento por sólidos totais ser
implantado com sucesso no Brasil, os produtores têm
que tomar algumas medidas. São em três áreas:
genética, alimentação e manejo. Na genética,
usar animais direcionados para a produção de
sólidos totais e não mais para produção
de maior volume de leite, como tem sido a regra. Na alimentação,
usar mais volumosos do que rações concentradas.
No manejo, fazer tudo que é possível para que
as vacas tenham menor estresse. Normalmente um leite tem 87,5%
de água e 12,5% de sólidos, na forma de proteínas,
lactose, gordura, sais minerais e outros componentes de menor
presença. "Daqui para frente, são esses
sólidos o alvo que temos a perseguir. Os derivados
finais lácteos, com exceção do leite
fluído e do leite de longa vida, precisam muito dos
sólidos totais, para renderem maiores quantidades de
produtos acabados. É o caso dos queijos, dos iogurtes,
da manteiga, leite em pó e outros" conclui.
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