Essa
expansão é mais visível a partir de 1994,
quando o segmento demonstrou ter condições de
ser usado como um dos pilares de sustentação
do Plano Real. Essa utilização foi possível
devido à assimilação de novas tecnologias
que permitiram à agricultura ampliar sua produtividade
e, em conseqüência, ganhar maior competitividade
sobretudo no comércio externo.
Tanto é verdade que as exportações agrícolas,
de uns tempos para cá, registram superávites
que cobrem os déficit gerados pelos vários setores
industriais, assegurando o saldo positivo da balança.
A conquista de espaços no mercado internacional é
evidente e dispensa comentários. Porém, essa
ocupação poderia ocorrer numa escala mais ampla,
caso o governo brasileiro superasse a timidez e mostrasse
um desempenho mais agressivo ao entabular conversações
comerciais no exterior.
Isso
é o que pensa o recém empossado presidente da
Sociedade Rural Brasileira, João de Almeida Sampaio
Filho. "Falta, aos negociadores governamentais uma atuação
pró-ativa para abrir novos mercados, inclusive nos
aspectos relacionados a preços", constata. As
autoridades "têm de agir como vendedoras. O Itamaraty
deveria atuar como um posto avançado de vendas. E,
quanto a isso, é meio devagar. A diplomacia tem receio
de entrar em contenciosos e parece confundir soberania política
(nacional) com soberania comercial", sentencia.
Usar
poder de barganha com agressividade
Para ele, no comércio externo "temos de jogar
o jogo. A agressividade é típica. Se dificultam
lá, dificultamos aqui. A imposição de
barreiras exige uma contrapartida", pondera. Sampaio
Filho é partidário da aplicação,
com ênfase, "do poder de barganha, como meio de
obter benefícios e vantagens para a agropecuária."
Como exemplo, cita as intenções de compra, pelo
Brasil, da banda digital de TV. Há uma disputa entre
japoneses e europeus para fechar a venda desse sistema. Através
dessa aquisição, "podemos forçar
uma abertura ou ampliação de cotas para a soja
ou outro produto qualquer, em troca", aconselha.
No cargo desde o final de fevereiro último, o presidente
da Rural tem o mesmo raciocínio em relação
à formação de blocos regionais. Sobre
a Alca (Área de Livre Comércio das Américas),
é favorável ao ingresso do Brasil. "Mas,
voltamos ao Itamaraty. Tem de haver uma defesa vigorosa dos
interesses brasileiros, sobretudo da agropecuária,
na qual somos muito competitivos, seja na soja, no algodão,
no açúcar, entre outros. Isso é fundamental.
O Brasil pode e deve ganhar na área agrícola,
até para compensar perdas em setores menos competitivos."
O mesmo princípio, segundo Sampaio filho, deve ser
adotado com a União Européia. Para ele, o bloco
europeu "é de suma importância para o Brasil,
pois compra mais, muito mais, que os Estados Unidos que, de
modo geral, são nossos concorrentes." Quanto ao
Mercosul, recomenda que o Brasil "assuma a posição
de líder, que realmente é." Considera um
"absurdo ser permitido que os integrantes negociem acordos
em separado. Isso enfraquece a região, enquanto bloco.
É preciso que os membros atuem em conjunto e obtenham
maiores vantagens junto à Alca e à U.E. Temos
que assumir a postura de líder", convoca.
Candidatos
à presidência preocupam
Pecuarista e seringalista em Barretos, interior paulista,
Sampaio Filho acha que o mesmo comportamento deve ser praticado
pelo governo brasileiro junto à OMC (Organização
Mundial do Comércio), até porque, em Doha, o
Brasil "foi considerado cabeça do grupo de Cairns".
Ademais, "depois de 11 de setembro (alusão ao
ataque às duas torres gêmeas em Nova York, nos
Estados Unidos, em 2001), os diálogos serão
mais difíceis, o protecionismo será maior, enfim,
surgirão mais obstáculos às negociações
que, inclusive, serão longas. Por isso, o Brasil terá
de ser incisivo", arremata. "Temos pessoal capacitado
para isso. O que precisa é uma ordem, uma determinação
de que não vamos mais meramente concordar, mas propor
e resolver", acrescenta.
Quanto à prioridade, prometida no início do
governo Fernando Henrique Cardoso, o presidente da Rural tem
reservas, mas reconhece que "foram feitas algumas coisas
pontuais." Segundo afirma, "nas primeiras ações
governamentais, de fato, não nos sentimos como setor
prioritário. No entanto, algumas decisões realmente
ajudaram, como a Lei Kandir, renegociação das
dívidas agrícolas, a implantação
do programa Moderfota, correção do câmbio,
em 1999, foram instrumentos importantes na correção
de rota."
Não obstante, "falta muita coisa. O governo Fernando
Henrique deixou muito a desejar com relação
à segurança do setor rural. As invasões
do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), foram
tratadas com leniência. Houve muita demora em fazer
cumprir a lei e isso acarretou transtornos que há muito
não se via." Porém, acrescenta, ao longo
e neste final de governo, a agricultura mostra que não
só conseguiu contornar e até solucionar os problemas,
como também "é uma importante fonte geradora
de riquezas."
Lei
Kandir inibe vendas internas
Sampaio Filho lamenta que, em oito anos, o governo não
tenha feito a reforma tributária. A Lei Kandir, aponta,
livrou as exportações agrícolas do ICMS,
"mas as vendas internas continuam taxadas. O produtor
de um determinado Estado não consegue vender para outro.
Além disso, existe o efeito cascata na cobrança
do PIS-Cofins que, em algumas cadeias chegam a ser recolhidos
quatro vezes, aumentando o preço final em até
16%. Com isso, de cada R$ 100,00 obtidos por um produto, R$
32,00 referem-se a imposto. Nos Estados Unidos são
6% apenas", compara.
Com relação aos gastos de pós-produção
e movimentação da safra, afirma que as "despesas
portuárias melhoraram muito". Mas faz uma cobrança
no sentido de que "precisam melhorar muito mais."
A questão dos impostos, mais as despesas com transportes
(hidro e ferroviário), além dos custos de armazenagem,
para o presidente da Rural, "são os maiores responsáveis
pelo chamado `Custo Brasil`, na área rural."
No que diz respeito ao próximo período eleitoral,
afirma que vê com "preocupação o
futuro governante. Seja quem for." Nenhum dos quatro
candidatos, acrescenta, "é ligado ao setor agropecuário
e isso nos deixa apreensivos, embora todos falem em ações
que possam favorecer a agricultura". Aos concorrentes
à presidência, numa quase reivindicação,
lembra que uma atuação mais atenta sobre a reforma
tributária, sem esquecer as negociações
internacionais, regulamentação dos transgênicos
e, sobretudo, o direito de propriedade, são temas que
"podem levar o setor agrícola a uma posição
de maior destaque no contexto histórico brasileiro."
Sobre seus planos de atuação à frente
da Sociedade Rural Brasileira, Sampaio Filho diz que pautará
seu trabalho na defesa "mais firme" dos interesses
macroeconômicos do setor, tanto nas questões
internacionais, quanto no âmbito interno, onde a atenção
maior será dada aos assuntos tributários e direito
de propriedade. Promete, também, "brigar"
por uma redução nos juros e, no geral, pela
diminuição do custo financeiro para produzir
no Brasil. Para isso, garante uma "atuação
lobista, com fortes pressões junto às diferentes
esferas de poder para obter as melhorias necessárias."
Além disso, afirma estar tentando formatar a Rural
para atuar junto à cadeia produtiva, "uma vez
que, nesses tempos modernos, a interação é
bem maior que antes. Não dá mais para defender
o pecuarista e atacar os frigoríficos. É preciso
fortalecer toda a cadeia." O foco, acrescenta, "é
a melhoria das condições de viver e produzir
do empresário agropecuário e, consequentemente,
do Brasil, onde somos o elo principal da corrente que impulsiona
a Nação", finaliza.
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