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SAFRA - MAIS TRIGO, MAS NÃO O SUFICIENTE
rev 51 - março 2002

Dados estimativos da Conab – Cia . Nacional de Abastecimento, indicam que, neste ano, o Brasil vai produzir 2,7 milhões de toneladas de trigo. Esse volume mostra um crescimento de 66,7% sobre a colheita anterior (2001), que foi de 1,6 milhões/t. Porém, o País consome cerca de 10 milhões de toneladas, sendo obrigado a buscar no mercado externo algo entre 7 e 9 milhões/t, para suprir a demanda, com gastos aproximados de US$ 1 bilhão.

A indústria paulista de moagem é responsável por 30% do grão processado no País, pois o Estado de São Paulo concentra os principais segmentos da cadeia produtiva do trigo, como panificação, pastífícios, bolachas e biscoitos entre outros. Contrastando com essa demanda, a produção tritícola em terras paulista é muito baixa, pois a área de plantio está em torno de 14 mil hectares e a safra, quando é boa, bate em 16,2 mil toneladas, conforme dados do IEA- Instituto de Economia Agrícola.

Essa baixa produção, aquém das reais necessidades, é atribuída á existência de uma desmotivação dos agricultores, que alegam haver uma política inadequada para esse tipo de cereal. Além disso, Argentina, Canadá e Estados Unidos exportam o produto a preços bem acessíveis, quase que consolidando o desinteresse. Além do trigo, os engenheiros agrônomos do IEA, José Roberto da Silva e Sebastião Nogueira Júnior, fizeram um trabalho mostrando os “pontos de estrangulamento” da aveia, cevada, centeio e triticale. Para eles, esses entraves estão relacionados com a falta de divulgação das práticas culturais, produtividade, oferta de semente, custo de produção, rentabilidade e informações de mercado, sobretudo preços.

Cereais alternativos têm viabilidade econômica

Mesmo com os obstáculos, eles afirmam que o trigo ocupa a maior área de plantio das culturas de inverno, cerca de 1,5 milhão/ha, contra 220,9 mil de aveia, 150,2 mil de cevada e 6,9 mil hectares de centeio. Notam, ainda, que São Paulo sequer figura nas estatísticas do IBGE sobre aveia, cevada e centeio que, também, são desconsiderados nos levantamentos realizados pela CATI (Coordenadoria de Assistência Técnica Integral). Não obstante, essas lavouras têm as mesmas exigência de solo e clima semelhantes ás do trigo e o plantio poderia ser ampliado, pois “há um estoque razoável de pesquisa conduzido pólo Instituto Agronômico contemplando esses cereais”.

Com relação ao trigo, os agrônomos afirmam que o Rio Grande do Sul é o maior produtor do País, responsável por 55,8% da safra nacional, superando o Paraná que perdeu essa hegemonia devido a ocorrência de geada. Na colheita de 2000, 56,89% do volume de aveia produzido tiveram origem no Paraná. Os gaúchos, por sua vez, produziram 72,57% da cevada e 85,03% do centeio, no mesmo período.

Silva e Nogueira afirmam que a cevada é a quarta cultura do mundo, superada apenas pelo arroz, milho e trigo, com um volume de 138,8 milhões de toneladas, conforme estatísticas de 1998, da FAO. O Canadá é o maior produtor mundial e, junto com a Alemanha e a Espanha, respondem por quase 1/3 do total. A participação do Brasil, acrescentam, ainda é “insignificante”, embora a produção interna venha ocorrendo sistematicamente nos Estados sulinos, “em substituição ao trigo.”

Grande produtor de cerveja, mas importa malte.

O IBGE, em 2000, estava prevendo uma safra de 336,8 mil toneladas, numa área de 150,3 mil hectares, correspondendo a uma produtividade média, de 2,441 kg/ha, bem abaixo de países produtores importantes. As produtividades médias da Alemanha e da França estavam em 5,7 mil kg/ha e 6,2 mil kg/ha, na ocasião. O preço mínimo da cevada cervejeira foi de R$ 169,54/t nas regiões Centro-Oeste, Sudeste e Sul, valor idêntico ao concedido para o trigo.

O malte, no entanto, é importado em maiores qualidade do produto do exterior. “Isso, de certa forma, inibe a expansão da atividade no Brasil, embora o País seja importante na produção mundial de cerveja. Existe alguma iniciativa de algumas cervejaria, com o objetivo de suprir parte da demanda, “mas ocorre em pequena escala.”

O Brasil, acrescentam, consome, anualmente, 1 milhão/t de malte, das quais apenas “270 mil toneladas” são produzidas internamente. Embora haja um grande espaço a ser conquistado, “a limitação fica por conta da capacidade industrial. “Daí os elevados volumes de importação e a evasão de dívidas, “de US$ 175 milhões, em 2000, segundo a Conab”. Lembram, ainda, que a recente implantação da Matéria do Vale, em Taubaté (SP), a partir de uma associação de capitais chileno e brasileiro, “abre boas perspectivas para a cultura, em São Paulo.

Para amenizar as dificuldades da cultura, Nogueira e Silva afirmam que cabe ao setor de pesquisa dar uma contribuição para o desenvolvimento de variedades que proporcionem elevado teor de malte, pois se trata de uma atividade nova no Estado e com poucas informações disponíveis, sobretudo de ordem econômica como custos de produção agrícola e industrial.

Aveia e triticale, alternativas ao milho da ração

Com relação á aveia, dizem que o produtor, há algum tempo, era utilizado no consumo humano. Atualmente, sua destinação principal é o arraçamento animal, sobretudo para cavalos de corrida. Pode substituir o milho na elaboração de rações e “ainda apresenta amplas possibilidades para o uso na alimentação humana, devido ao apelo anticolesterol. “Essa cultura não apresenta grandes exigências quanto ao solo, podendo ser estabelecida tanto no plantio convencional como no direto. Mas “a lavoura é atacada por uma série de doenças, principalmente a ferrugem. A colheita pode ser feita com os mesmos equipamentos utilizados para o trigo, desde que adaptados.”

A aveia ocupa o sétimo lugar entre os principais cereais produzidos no mundo, com 25,8 milhões de toneladas, segundo dados da FAO. A Federação Russa é o principal produtor, seguido do Canadá e dos Estados Unidos. A participação do Brasil é muito pequena, cerca de 194 mil toneladas, numa área de 221,9 mil hectares, com rendimento médio de quase 1,3 mil kg/ha. Nos principais produtores, esse rendimento bate em 2,3 mil kg/ha.

Também para essa cultura, os agrônomos sugerem que o setor de pesquisa desenvolva variedades mais resistentes á ferrugem e avalie quais entraves dificultam o benefício industrial da aveia, sobretudo em termos de capacidade instalada ou equipamentos utilizados. A tecnologia industrial, indicam, “é pouco divulgada e a produção está concentrada em poucas empresas.”

Eliminar os entraves, desafio à pesquisa

Quanto ao triticale, afirmam que o cereal é um híbrido que combina a rusticidade do centeio com a qualidade do trigo. É cultivado principalmente para alimentação animal, substituindo o centeio em solos pobres. Pode, ainda, ser usado na panificação, misturando com o trigo. No Brasil, essa lavoura é explorada em áreas ocupadas com trigo e corresponde, em termos de preço, a 90% do seu valor.

Silva e Nogueira assinalam que alguns aspectos negativos, em comparação ao trigo, inibem a ampliação dessa cultura. Entre eles, apontam o peso hectolitro mais baixo, que implica menor rendimento industrial e incidência de doenças, além do desconhecimento de ouras tecnologia (secagem e armazenagem). Essa planta é pouco conhecida no Brasil e não existe dados disponíveis de produção, consumo, preços e comercialização. “Isso também acontece em nível mundial”, observam.

O setor de pesquisa, nessa área, ainda é incipiente, embora seja conhecida a resistência desse cereal á seca, o que é uma vantagem. No geral, é uma atividade com potencial para suprir o segmento de rações, em eventuais problemas de abastecimento de milho.

Com exceção do trigo, esses cereais “alternativos” são cultivados em áreas pontuais e com pouca expressão, diante das principais atividades agrícolas estaduais e nacionais. Os obstáculos existentes á ampliação dessas lavouras devem ter uma solução a partir dos centros de pesquisas, no sentido de colocar á disposição dos agricultores inovações tecnológicas que viabilizem a competitividade dos produtores frente aos oriundos do exterior ou de outros Estados.

Lembram, ainda que no conceito da FAO, os cereais secundários “pouco representam, mesmo em termos mundiais, frente ás culturas do arroz, milho e trigo que, juntos, respondem por 85% da produção de grãos, no planeta, finalizam.


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