Pecuária

Ovinocultura: animal menor no pasto, maior ganho em escala

Pequenos proprietários encontram na ovinocultura satisfação de trabalhar na pecuária, maiores lucros, melhor aproveitamento da terra e até respostas para importantes questões familiares. A ovinocultura tem se mostrado a bola da vez na pecuária nacional. Nos últimos cinco anos assistimos a grande valorização de reprodutores, adesão de investidores importantes e o início da organização de uma cadeia produtiva mais consistente.

Será mais uma moda? Ao que tudo indica, não. O Brasil importa 80% da carne de cordeiro que consome. Apenas para se ter uma idéia do potencial deste segmento de mercado, enquanto o Estado de São Paulo possui algo em torno de 600 mil matrizes, segundo a Aspaco – Associação Paulista dos Criadores de Ovinos e Caprinos – somente para abastecer a capital, São Paulo precisaria de 6 milhões de fêmeas em reprodução.

Outro ponto importante também a favor da ovinocultura é sua permissividade quanto à utilização de pequenas áreas, em relevo acidentado e apenas com a utilização de mão-de-obra familiar. Cientes deste contexto, Benedito de Lima Filho, o Benê, sua esposa Egna Alcântara Miranda e o sócio Luiz Roberto Dias da Silva – uma reunião de capacidade de investimentos, propriedade da terra e visão empresarial, com conhecimento técnico e capacidade de gerenciamento – há pouco mais de quatro anos decidiram experimentar a atividade em uma área desocupada do Rancho do Morro Verde, propriedade situada no município de Atibaia (SP).

Trata-se de um sítio de 18 alqueires, em região de topografia bastante acidentada que, na época, servia com hotel para equinos. O trabalho já era fruto de uma parceria entre o casal e Luiz Roberto. Em terras caras, rodeadas por propriedades de lazer e com limitações de infra-estrutura, o hotel não se mostrava rentável o suficiente nem estimulante. Foi então que a parceria decidiu ocupar parte da propriedade com ovinos da raça Santa Inês. As primeiras 40 cabeças comerciais chegaram em 2004, juntamente com um reprodutor. O primeiro passo foi providenciar o registro desses animais.

Seis meses depois, mais 20 matrizes de seleção mais apurada eram incorporadas no plantel, agora já visando não só produzir carne, mas também genética de ponta. Data de 2005 o início da participação em exposições. A estréia aconteceu na primeira Feinco, no Parque de Exposições Imigrantes, em São Paulo (SP). Desde então, nunca mais abandonaram as pistas. Naquele mesmo ano, obtiveram posto de Melhor Criador e Melhor Expositor do ranking paulista, feito repetido no ano seguinte.

Nos últimos anos, os feitos do Morro Verde são muitos. Além de nove títulos de Melhor Expositor e dez de Melhor Criador, em dez mostras que participaram no circuito paulista, o criatório foi o primeiro a exportar sua genética para os estados nordestinos. Vale lembrar que a região é celeiro da raça Santa Inês e responsável por fornecer milhões de matrizes para as regiões Sudeste, Centro-Oeste e Sul, nos últimos cinco anos. A valorização da atividade, desta raça brasileira, portanto plenamente adaptada, e do produto carne de cordeiro, hoje faz com que o mercado de animais de elite pratique preços que superam, em muito, as cotações médias de muitos bovinos. O consumo percapita/ano de carne de ovinos no Brasil aumentou de 657g, em 2005, para 810g, em 2006.

O Rancho do Morro Verde também fez um outro feito importante. No primeiro Santa Inês Carpa Serrana conquistou o inédito prêmio Adir do Carmo Leonel. Trata-se de um reconhecimento transitório, cuja posse definitiva só ocorre mediante três conquistas. Entre os animais de destaque do rebanho, responsáveis por tantos feitos, está HD Atibaia 211, matriz quatro vezes Grande Campeã em exposições paulistas e também merecedora de condomínio avaliado em R$ 124 mil. Simplesmente ela é a fêmea mais valorizada já nascida no Estado de São Paulo, segundo Benê.

O negócio com ovinos

O Morro Verde possui um rebanho total, hoje, de 800 cabeças. Dessas, 450 são comerciais, voltadas exclusivamente para a produção de carne; e 350 são de elite, frequentadoras de exposições e fornecedoras de genética de ponta. As 300 matrizes comerciais produzem por ano 200 machos e 200 fêmeas. Isso significa uma receita de R$ 24 mil/ano pelos cordeiros que seguem para abate e de R$ 50 mil para as fêmeas, todas destinadas à reprodução. O preço mínimo praticado em cada uma delas é de R$ 250, entre 6 e 7 meses de idade.

Fazendo as contas, somente o rebanho comercial, neste porte de volume de matrizes, traz uma receita mensal de pouco mais de R$ 6 mil. Segundo Benê, as despesas dificilmente ultrapassam 40% da receita. Toda a produção de cordeiros do rancho vai para o Frigorífico Savana, responsável por abastecer importantes cozinhas da renomada gastronomia paulistana e que vem desenvolvendo produtos, tais como cortes e padrões de carne para alavancar seus negócios.

Na comercialização de animais de elite, o Morro Verde tem vendas próprias, em parcerias e vários convites ao longo da temporada. “Cada praça tem suas características e alcance de recursos”, explica Marcela. Mas, para se ter uma idéia, a Feinco 2007 faturou R$ 4,6 milhões em oito leilões de várias raças. A marca superou em R$ 2 milhões o faturamento da Feicon 2006. O Leilão Integração Santa Inês, que contou a organização de Luiz Roberto, um dos sócios do Rancho Morro Verde, faturou R$ 485 mil, com média de R$ 9,3 mil para fêmeas e R$ 28,5 mil para machos.

Porteira a dentro

A raça Santa Inês é conhecida como o zebu dos ovinos, em função da sua rusticidade e capacidade de adaptação. Trata-se de animais muito dóceis e de fácil manejo, sem grandes exigências. Mas para quem quer produzir qualidade, estas características não dispensam as devidas atenções às várias categorias animais e sanitárias. Os filhotes de ovinos, nos seus primeiros 30 dias de vida, são mais sensíveis, principalmente em regiões mais frias como é a Serra da Mantiqueira de Atibaia. “Procuramos oferecer maior conforto e proteção aos filhotes no primeiro mês, basicamente nas épocas do ano de temperaturas mais amenas”, explica Marcela.

Neste período, eles permanecem ao pé da mãe, 24 horas por dia. No segundo mês, são separados das matrizes durante dia – vão para o campo – mas posam com elas em baias com creep feeding. Assim, podem se alimentar de ração durante a noite. Neste esquema seguem até os 70 dias, em média, quando alcançam peso em torno de 25kg. É a desmama. A partir daí, os machos seguem para o confinamento de terminação até a faixa de peso entre 35 a 40kg, época em que estão entre 100 e 110 dias de vida. Hora do abate.

As fêmeas permanecem em baias até os mesmos 100 a 110 dias, período em que são soltas no campo em lotes exclusivos, até adquirirem 70% do peso de adultas, algo a partir de 40kg. Significa que por volta dos 10 meses de idade, elas estão prontas para a estação de monta, procedimento que no Morro verde acontece ao longo de todo o ano. Grupos de 45 fêmeas permanecem em companhia de um reprodutor durante 50 dias. Neste período, ela terá no mínimo três cios.

Neste modelo, a propriedade consegue 85% de prenhez. As fêmeas que não emprenham são avaliadas quanto a eventualidade de problemas reprodutivos. Caso não se confirmem, como é de costume, retornam a uma segunda estação de monta, de onde dificilmente saem sem emprenhar. O período de gestação de uma ovelha é de 5 meses. Cerca de 15 dias antes do parto, a dieta tem seu suprimento protéico aumentado de 18% para 20%. Da mesma forma, o energético.

Segundo Marcela, neste período, a fêmea precisa de uma suplementação, de modo a chegar ao parto menos sentida, com escore corporal mais alto e em boas condições de amamentar adequadamente seu borrego. O mesmo procedimento é feito por ocasião da desmama, época em que começam a preparar a matriz para uma nova gestação. As crias são exigentes e sugam bastante as mães. Sendo assim, melhora-se a dieta e, por ocasião da estação de monta, elas estão bastante saudáveis e férteis. Como conseqüência, o Morro Verde apresenta 70% de partos germilares, ou seja, de gêmeos. Uma fêmea Santa Inês cria, em média, até 10 anos de idade, em torno de 1,5 borrego por ano.

Sanidade é nutrição

“Rigor em saúde é base do sucesso”, afirma Benê. O rebanho conta com exame de fezes periódicos, por amostragem. Sempre que identificados números inadequados, entra-se com medicamento específico. Além disso, uma vez por ano, os animais são vacinados contra as clostridioses. Conforme vão nascendo, os ovinos recebem o mesmo medicamento e posterior reforço. Os problemas de casco foram reduzidos em 90% com pedilúvio. O procedimento conta com três banhos: o primeiro de água corrente para lavagem; um segundo de solução de formol; e o terceiro de sulfato de cobre.

A dieta dos animais comerciais difere em qualidade e volume, em relação aos de elite. Parte do volumoso vem do rodízio de piquetes de capim aruana, massai e braquiária brizanta. Toda a ração concentrada é batida na fazenda, mas os animais de produção de genética contam também com uma comercial apropriada a cada faixa etária. As matrizes de campo recebem capim e silagem, cerca de 80%; e concentrado à base de milho, soja e farelo de algodão (20% do arraçoamento). Os cordeiros têm concentrado específico, com mais proteína, do nascimento ao confinamento.

Já os ovinos de elite permanecem mais tempo em confinamento e contam com variação maior de cardápio, além de fartura. A variação de concentrado se deve a um comportamento peculiar à espécie. “Ovinos comem até por curiosidade. Portanto, quanto mais variarmos paladar, odores e quantidades de vezes de oferta, mais eles vêm ao cocho para comer”, explica Benê. Todos os animais de elite, além de silagem de capim, contam ainda com feno de alfafa no fornecimento de volumoso. Independente de elite ou comercial, todo o rebanho recebe sal mineral comum específico para a espécie. A desmama da elite é mais tardia: em torno dos 3 meses de idade.

Todo o manejo e administração da rotina dos animais ficou bastante facilitado em relação à equinocultura, atividade que cedeu seu espaço. Marcela é categórica ao afirmar que agora pode cuidar de um casca, ajudar em partos quando necessário e realizar uma série de outras tarefas dentro do rebanho. “Isso era um fator limitante na atividade anterior”, destaca. O próprio Benê sofreu grave ataque de um cavalo dentro do Morro verde, incidente que lhe custou alguns dias na UTI.

A docilidade dos ovinos atraiu os próprios filhos do casal para a lida no campo. “Estamos mais unidos e participativos do dia-a-dia de cada um, na família. As crianças estão sempre por aqui e até nos ajudam na lida, por conta própria. Em resume, a ovinocultura para nós é uma atividade bastante familiar, até como ponto de encontro, mas principalmente como uma solução para a participação de todos e das nossas condições de propriedade. Estamos muito satisfeitos e motivados ao fomento”, conclui Marcela.

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