A história é simples, e previsível: a ocupação das terras no Brasil Central para o desenvolvimento da atividade agrícola e pecuária, provocou uma drástica redução nas áreas de floresta do cerrado. Sem ter mais para onde fugir e, com escassez de alimento causado por um desequilíbrio na fauna da região, animais como a onça pintada, correm sério risco de ter sua população reduzida a níveis alarmantes.
Mas, os problemas decorridos da falta de cuidados com a preservação ambiental não param por aí. Sem comida, a onça acaba encontrando nas pastagens próximas ao seu habitat a oportunidade atacar rebanhos bovinos, provocando prejuízos que levam os pecuaristas a temer a vizinhança a caçá-la sem dó.
Atenta a questão, o Fundo para a Conservação da Onça-Pintada desenvolve linhas de pesquisa que têm como focos centrais o monitoramento contínuo de populações de onças-pintadas na natureza e a aplicação de manejo em áreas onde esses animais atacam rebanhos domésticos, causando prejuízos aos pecuaristas. O FCOP é a primeira ONG brasileira a trabalhar com compensação financeira para reparar prejuízos causados a rebanhos domésticos por onça-pintada.
De acordo com o biólogo Leandro Silveira, presidente do Fundo, o monitoramento de populações permite avaliar, ao longo do tempo, se as populações estão aumentando, diminuindo ou estão estáveis. Este monitoramento é desenvolvido atualmente em três áreas dos biomas Amazônia, Cerrado e Pantanal.
O Fundo para a Conservação da Onça-Pintada foi criado em junho de 2002 e tem como missão conservar este felino, suas presas e habitats ao longo de sua área de distribuição, assim como promover sua coexistência pacífica com o homem. É a primeira e única ONG dedicada especificamente a conservação da onça-pintada no Brasil. A entidade tem sede na região do Parque Nacional das Emas, em Goiás, onde se encontra a base de pesquisa com a espécie no Cerrado.
Além da Fundação Monsanto, a entidade tem como parceiros a Conservação Internacional (CI), Memphis Zoo-USA, US Fish and Wildlife Service e Earthwatch Institute, entre outros. Animados com a recente ajuda financeira da Monsanto que, no primeiro ano, fez um aporte de US$ 83 mil, a ONG faz planos ambiciosos para o futuro. Segundo Leandro Silveira, o recurso será aplicado no levantamento de informações históricas e atuais sobre a distribuição da onça-pintada no Brasil e permitirá, através de seu mapeamento, traçar estratégias de conservação para a espécie. “Parcerias como a da Fundação Monsanto são essenciais para o desenvolvimento de projetos como este, já que os recursos do Governo são limitados e extremamente burocráticos”, declara.
A onça-pintada pode atingir até 130 quilos, e precisa de um território de 25 a 50 quilômetros quadrados para viver. Grande predadora, a onça-pintada inclui em sua cadeia alimentar animais como gado bovino e cachorro doméstico, anta (Tapirus terrestris), cervo-do-Pantanal (Blastocerus dichotomus), ariranha, macacos, porcos-do-mato (Tayassu tajacu), cágados, jacarés e capivaras (Hydrochaeris hydrochaeris). A grande maioria dos casos de predação de animais domésticos por felinos selvagens refletem o desequilíbrio no ecossistema local. Os felinos não têm como hábito natural atacar animais domésticos. Se o ambiente onde vivem lhes oferece áreas suficientemente grandes para sobreviver, com recursos alimentares suficientes e pouca ou nenhuma influência humana, eles tendem a evitar o homem e seus animais domésticos. Sendo assim, a ausência ou diminuição das presas naturais podem resultar no início dos ataques por grandes felinos aos animais domésticos em áreas limítrofes entre unidades de conservação e propriedades rurais.
Na América Latina, a predação de animais domésticos (bovinos, em particular) causada por grandes felinos – onça-pintada e onça-parda – tem como conseqüência uma intensa perseguição dos mesmos por parte dos fazendeiros. Este fator, juntamente com a perda de habitat, afeta mais diretamente a sua sobrevivência. A perseguição aos grandes felinos por seus ataques ao gado ou pelo perigo em potencial que representam às vidas humanas é o passo final no processo de seu desaparecimento fora das áreas protegidas, o qual começa com a perda e fragmentação do habitat. Esta perseguição acontece inclusive dentro de unidades de conservação, o que faz com que atualmente as onças ocorram em áreas bastante inacessíveis, onde existam dificuldades em serem caçadas.
Destas espécies, a onça-pintada é a que tem um futuro mais ameaçado por ter uma distribuição mais restrita, tanto do ponto de vista geográfico quanto da diversidade de habitats utilizados, sendo a onça-parda uma espécie muito mais adaptável e de ampla distribuição. Até a década de setenta, as populações de onça-pintada se viram fortemente afetadas pelo comércio internacional de peles. Atualmente, a expansão humana, com suas consequentes pressões de utilização de terras, perda de habitats e caça oportunista têm limitado a onça-pintada a uma fração de sua distribuição original. A onça-pintada já se extinguiu nos Estados Unidos, El Salvador, Uruguai e grande parte do Panamá, Nicarágua e Argentina, ocupando em 1989 apenas 33% da sua área de distribuição original na América Central e 62% na América do Sul. Parte do problema se deve a percepção de que a mera presença destes felinos implica necessariamente em ataques ao gado, tornando conveniente seu extermínio mesmo na ausência de casos de ataques na região.
Cristina Rappa, responsável pela Fundação Monsanto, destaca a importância da parceria firmada com o Fundo para a Conservação da Onça-Pintada. “A Monsanto tem como uma de suas missões contribuir para preservar o meio ambiente e a população da onça-pintada, um importante predador no Brasil, é um termômetro de desequilíbrio do ecossistema”, declara.