Na caprinocultura, atividade que se desenvolve em grande parte do país dentro de sistemas de semi-confinamento ou de confinamento total, a preocupação com o bem estar dos animais é constante. Se o controle não for feito de forma sistemática, a mortalidade pode ser alta ou afetar a produtividade durante vários dias.
A médica veterinária Priscila Moreira de Souza e Silva, proprietária do Capril Rancho Querência e inspetora da Capripaulo – Associação Paulista dos Criadores de Caprinos, ratifica a importância do criador manter um manejo sanitário periódico, não só sobre os animais, mas em toda a propriedade. Ela, que mantém um plantel de 27 animais na cidade de Santo Antônio do Pinhal, região próxima a Campos do Jordão, SP, faz questão de cuidar do manejo sanitário do rebanho pessoalmente, função que, na sua ausência, só é delegada ao gerente Dimas Ferreira dos Santos, que há seis anos a ajuda no trato dos animais.
O rebanho está dividido em animais elite da raça Toggem Burg para seleção genética, Alpina para uso na produção de leite e Bôer que está sendo usado num experimento de cruzamento industrial para produção de carne.
O clima frio e a umidade, característicos da serra, formam um ambiente bastante propício ao desenvolvimento desses agentes. Isso faz elevar o cuidado com seus animais. Segundo ela, o cuidado começa antes mesmo dos cabritinhos nascerem.
As matrizes e os reprodutores passam constantemente por avaliações e pelo exame de OPG, (exame de fezes). Quando é verificada alguma contaminação os animais recebem uma dose de vermífugo que ajuda a melhorar sua imunidade. “Assim, o cabritinho já vai nascer com uma certa resistência contra o ataque dos vermes”, explica. Os caprinos podem ser acometidos por várias doenças, entre as quais, a linfadenite caseosa (mal-do-caroço), o ectima contagioso (boqueira), a pododermatite (frieira), além das doenças causadas por ectoparasitas, como piolhos, miíases (bicheiras) e sarnas e, principalmente, aquelas causadas por endoparasitas (verminose).
Para saber se uma situação é endêmica ou não o criador deve conhecer as condições de clima, solo, tipo de pastagem da sua propriedade e a espécie que ele vai criar. O exame de OPG (exame de fezes) deve ser feito pelo menos uma vez por mês. Caso a situação econômica do capril não permita, esse prazo pode ser estendido por dois ou até três meses. Tudo isso vai depender do grau de imunidade do rebanho e das condições da propriedade. É muito comum o verme desenvolver resistência contra o principio ativo de algum medicamento e nesses casos somente um veterinário vai poder determinar uma mudança no tratamento, explica Priscila Moreira que fala que não existe uma fórmula pronta para determinar um tratamento eficaz contra as verminoses.
Priscila afirma que cabe ao produtor evitar todos os riscos de contaminação do rebanho. Isso inclui não permitir a entrada de pessoal não autorizado no curral. Mesmo com os funcionários, o controle tem de ser rígido para evitar, por exemplo, que um peão que esteve próximo das áreas de risco entre em contato os animais sadios.
A divisão por idade é um procedimento adotado por muitas fazendas e que os especialistas recomendam. No Capril Rancho Querência as baias são divididas desde a maternidade, onde as fêmeas ficam separadas para a parição. Assim que nascem, os cabritos são apartados da mãe e seguem para uma outra baia, onde vão receber o colostro da mãe, já pasteurizado. Como nesta fase não existe o contato dos animais com a pastagem, o cuidado maior é com a limpeza do curral. Já na hora de construir as instalações do capril, o criador deve planejar e dar prioridade aos animais menores. De preferência pegar um local da propriedade onde o sol incida logo nas primeiras horas do dia e que nos casos de chuva e frio os filhotes fiquem protegidos.
A cama feita com serragem ou outra forrageira serve como acomodação aos animais. Ela precisa ser trocada com certa freqüência para diminuir o contato dos cabritos com suas fezes ou mesmo com a urina, que pode transmitir doenças. Dentro de uma situação de confinamento, as infecções ocorrem normalmente em escala. Isso porque os animais ficam muito próximos e o contágio acontece antes mesmo do criador identificar o primeiro caso.
A cama feita com estrado de madeira funciona como uma alternativa para que o criador diminua seu trabalho e elimine alguns focos de contaminação. Alguns cuidados, no entanto, precisam ser tomados para evitar acidentes com os animais. O espaçamento entre ripas deve respeitar 1,5cm a 2cm para que os animais mais novos não se machuquem. A limpeza é feita varias vezes por dia para não permitir que as fezes fiquem acumuladas. Os cochos de alimentação e água devem ficar sempre num lugar protegido do acesso das cabras.
Uma medida adotada para amenizar esse problema é evitar a superlotação das baias. A médica recomenda que seja respeitado um espaço de 1,5 m² a 2 m² para cada animal adulto. Assim diminui a competição dentro do grupo, evitando o stress das cabras. Outro erro que acontece com freqüência nas fazendas é a chegada de animais novos no plantel sem respeitar o período da quarentena. Esse isolamento é obrigatório para o criador saber se o animal vai ou não apresentar sintomas e, nos casos positivos, para que ele seja tratado antes de se juntar ao rebanho saudável.
A saída de animais da propriedade para feiras, exposições é outro ponto crítico para entrada de vermes no rebanho. Toda vez que um animal sai do curral para um outro ambiente é indicado que ele sofra vistoria e se possível que seja coletada uma amostra das fezes para exame laboratorial. Um tratamento é sempre mais trabalhoso e oneroso que o controle, destaca a proprietária do Rancho Querência. “Sempre que um animal é acometido por uma verminose sua resistência imunológica diminui bastante”. Isso abre espaço para as chamadas doenças oportunistas que, uma vez instaladas no organismo, são muito mais difíceis do criador combater”.
Para se ter uma idéia do tamanho da diferença, um procedimento de controle feito através do exame de OPG, mais a aplicação do vermífugo custa em média ao produtor entre R$ 14,00 e R$ 15,00. No caso de uma doença mais grave como uma pneumonia ou uma linfadenite, por exemplo, esse custo pode subir até três vezes. Isso sem falar nos prejuízos com a parada na produção que pode ser de até 48 horas, pois, o tratamento é feito com antibióticos que deixam resíduos no leite. Esse leite não pode nem mesmo ser oferecido aos filhotes por oferecerem risco de contaminação. “Na produção leiteira onde os resultados são medidos diariamente qualquer falha dessa natureza pode significar prejuízos sérios ao caprinocultor”, afirma.
Cuidado com a pastagem deve ser redobrado
A pastagem é a principal via de contaminação do rebanho por verminoses e outros parasitas que causam prejuízos ao produtor nas atividades de criação. Nos sistemas de criação semi-extensiva ou extensiva, mais comuns na caprinocultura de corte, o contato do animal com a pastagem é diário e por isso o cuidado deve se redobrado. Muitos especialistas reconhecem que é muito difícil um rebanho totalmente livre de contaminação. Por isso, eles falam que a melhor estratégia também é o monitoramento seguido do controle.
A quantidade de erros que os criadores cometem no manejo é apontado como a maior causa de contaminação nos rebanhos. É comum se colocar os animais para pastar logo nas primeiras horas da manhã, quando a pastagem ainda apresenta aquele orvalho da madrugada. Essa umidade é favorável para as larvas dos vermes, que, nesse horário, eclodem numa velocidade incrível. Os veterinários recomendam que o criador espere o sol se firmar antes de colocar os animais no pasto, fazendo o mesmo na retirada dos animais no final do dia.
A rotação de pastagem é outra alternativa que o produtor pode usar para evitar o contato prolongado dos animais com os parasitas. As cabras pastam por um período de dois ou três dias e depois são retirados para um outro piquete. Nessa área onde ficou uma grande quantidade de fezes é recomendado que o criador deixe em descanso ou que ele use um outro animal de porte grande para fazer a roçada completa. A superlotação dos piquetes também deve ser evitada para combater o stress do animal e também para diminuir o número de animais defecando e urinado no mesmo lugar. É indicado que o criador respeite a mesma proporção de 2 m² por animal adulto, como medida padrão.
No Rancho Querência, os únicos animais que tem contato com o pasto são os dois reprodutores do plantel. A médica diz que eles ficam apartados das fêmeas para melhorar a fertilidade na estação de monta. No entanto, Priscila diz que, por conta disso, o cuidado com eles é maior: “Não é só por causa dos vermes. O risco de infestação por carrapatos, bernes e piolho, que residem nas pastagens durante uma fase da vida é bastante grande”, explica.