Com vistas a garantir um lugar dentro da moderna pecuária de corte, os criadores de Canchim estão buscando, no rigor de seleção com seus animais, o caminho para manter a excelência conquistada no fornecimento de tourinhos e genética para o mercado de cruzamento industrial, além de vislumbrar novos horizontes na produção de carne super precoce.
A funcionalidade sempre foi um ponto muito preconizado no trabalho de seleção dos criatórios por se tratar do principal desígnio da raça, lembra Irineu Lopes Machado, proprietário da Ilma Agropecuária, de Angatuba, SP. Selecionador da raça, há 17 anos, o criador que mantém um plantel de cerca de 500 matrizes, 300 novilhas, além de alguns reprodutores premiados fala que, a maior preocupação da seleção sempre foi desenvolver animais com umbigo forte para aguentar as altas pastagens de clima tropical; animais de pigmentação mais escura, principalmente, ao redor dos olhos; pelagens mais curtas para enfrentar o calor e cascos firmes para acompanhar as fêmeas no pasto. “E, mais importante do que isso é fazer com que esses progenitores imprimam nos seus filhos essas características desejáveis”, conclui o pecuarista.
Segundo o proprietário da Ilma Agropecuária, o manejo é um ponto estratégico para o sucesso de qualquer projeto de criação. “O conforto dos animais depende fundamentalmente do planejamento das instalações, sobretudo, da mão-de-obra que precisa ter qualificação profissional para efetuar a tarefas do dia-a-dia” enfatiza o criador.
O trabalho de seleção é um processo que nasce na inseminação artificial das vacas ou na escolha dos touros no caso de monta natural, explica Eloísa Almeida Cezere, engenheira agrônoma e gerente da Fazenda Paraíso, de São Miguel Arcanjo, SP. Eloísa fala que a escolha começa na seleção das DEPs (Diferença Esperada na Progênie) dos pais, priorizando DEPs positivas tanto para machos quanto para fêmeas. A habilidade materna é um ponto importante no caso das fêmeas, pois mãe que não dá leite no consegue criar touros e matrizes.
Há cinco anos trabalhando, exclusivamente, com rebanho Canchim, a Fazenda Paraíso, tem sua base genética formada a partir do plantel da Embrapa, Fazenda Santa Luzia, Ilma Agropecuária, Canchim FJ, entre outros criatórios importantes. A propriedade que mantêm um plantel de 250 cabeças de gado Canchim PO, tem na administração e gerenciamento internos das ações, um ponto estratégico na obtenção de seus resultados.
Os animais ficam no máximo 24 meses dentro do projeto. Caso eles não atinjam índices que permitam seu aproveitamento, o destino é o frigorífico. Atualmente, cerca de 30% dos machos e 50% das fêmeas são aproveitados para plantel da fazenda, sendo que apenas 5% desses são selecionados para as pistas. Os descartes que significam 70% dos machos e 50% das fêmeas, também possuem genética de qualidade por esse motivo são aproveitados no projeto do novilho Canchim super precoce, enfatiza Eloísa.
De acordo com a coordenadora do projeto, a desmama é uma idade chave para o destino do animais. Por isso, os bezerros precisam chegar nessa fase, pesando de 210 Kg a 230 Kg. Segundo ela, isso só é possível graças às tecnologias para uso na nutrição animal disponíveis no mercado. “O Creep-Feeding entra na dieta da bezerrada logo aos 2 meses de vida. Assim é possível desmama-los com o peso suficiente para, caso não sirvam ao projeto de seleção da fazenda, estão aptos para o projeto do novilho super precoce”.
A gerente da fazenda Paraíso lembra ainda que os acasalamentos são feitos pelos técnicos da ABCCAN, o que confere maior segurança ao trabalho do criatório. “A genética precisa ser trabalhada de forma equilibrada para garantir bom ganho de peso, mas sem perder de vista a rusticidade dos animais fator importante, por exemplo, nas parte sanitária como a resistência aos carrapatos” conclui.
Luiz Adelar Scheuer, proprietário da fazenda Calabilú, de Capão Bonito, SP, analisa que a evolução genética da raça Canchim vem de um processo crescente e sustentável de décadas e isso é muito positivo. Scheuer mantêm numa área de 650 hectares, um projeto de seleção que reúne mais de 1300 reses, sendo que metade são fêmeas criadas a campo. Deste plantel, o criador contabiliza cerca de 450 matrizes PO e 150 receptoras do projeto de Transferência de Embriões e FIV, mantidos pela fazenda.
O criador tem nas exposições um ponto estratégico para divulgação de seu trabalho. Para isso, ele mantêm uma participação ativa nas principais pistas do circuito da raça e diz que isso traz resultados muito bons para as vendas de animais. Segundo ele, nos últimos anos vem crescendo a demanda por tourinhos comerciais Canchim, e isso pode ser atribuído à retomada do cruzamento industrial na produção de carne.
O criador Valentin Irineu Suchek, proprietário da Estância Canta Galo, de Itapetininga, SP, desenvolve um trabalho de seleção com a raça Canchim, buscando orientar seu manejo para desenvolver animais de campo. O objetivo, segundo ele, é preconizar os atributos naturais da raça de rusticidade e precocidade, no sentido de otimizar a genética do plantel para o mercado. “O direcionamento comercial do projeto da Estância Canta Galo, te, seu foco na produção de reprodutores de campo para abastecer o cruzamento industrial”, enfatiza o criador. Com um plantel atual de aproximadamente 900 cabeças de animais Canchim registrados, o pecuarista diz realizar uma estação de inseminação artificial por ano e uma estação de monta natural. Parte da produção anual é direcionada para um projeto de produção de novilhos precoces.
Segundo Suchek, os animais são abatidos entre 18 e 20 meses, pesando entre 450Kg e 500Kg e aproveitamento de carcaça de 56% em média e a cobertura de gordura dos animais na terminação enquadra-se no desejável pelos frigoríficos. O manejo nutricional do rebanho é feito a pasto até a terminação, quando os animais passam a receber alguma suplementação. “Este remajemento do rebanho para produção de carne precoce ocorre por dois motivos, explica o pecuarista. Primeiro porque o mercado de tourinho comerciais no Brasil não atravessa um momento muito favorável. E, em segundo lugar, o bovino Canchim possui ótimos atributos de conformação frigorífica, o que o torna uma excelente opção para o corte”, conclui
Uma parte pequena do plantel é retirada do pasto, já na ocasião da desmama, para servir ao propósito de exposições. Entretanto, o pecuarista diz que, este trabalho serve apenas como fonte de divulgação da genética do criatório para o mercado. “Mas, isso não impede que, as vezes, um animal nosso ganhe alguma premiação dentro do circuito”, ressalta. Na exposição agropecuária de Itapetininga, SP, este ano, a Estância Canta Galo ganhou o primeiro prêmio na 37ª categoria, touro adulto, com o animal Mambo da Canta Galo. O touro Motivo da Canta Galo, foi outro animal premiado na ocasião com a 3ª colocação entre os touros adultos. Nabado da Canta Galo ficou com o segundo prêmio na 33ª categoria para torios jovens. “Essas premiações são importantes porque atestam o trabalho de seleção desenvolvidos pela Estância Canta Galo”, conclui o pecuarista.
ABCCAN tem papel estratégico
O trabalho realizado pela ABCCAN, Associação Brasileira dos Criadores de Canchim, no sentido de estabelecer um padrão mínimo de desenvolvimento ponderal para o rebanho Canchim, como condição para que os animais participem do time de reprodutores da raça é um fator de importância fundamental na opinião dos criadores. Os bovinos, machos e fêmeas, são avaliados periodicamente pela equipe técnica da associação que visita as fazendas, faz coleta de dados zootécnicos, para daí, emitir um certificado de registro oficial.
Outra ação considerada estratégica é a realização do controle da genealogia do rebanho. Na ocasião do registro dos animais é expedido um certificado numerado com a discriminação dos ascendentes até a 4ª geração. Essa é uma atividade oficial, onde a associação age como delegada do Ministério da Agricultura para evitar que animais de origem duvidosa possam ser credenciados e se tornarem reprodutores da raça, observa Cristiano Campbell, responsável técnico da associação.
Além das ações preventivas, a associação mantêm inúmeras parcerias para realização de provas de desempenho funcional do rebanho, nos principais órgãos de pesquisa do país, caso da UNESP de Botucatu, SP, Esalq USP, de Piracicaba, SP, além das unidades da Embrapa Gado de Corte, de Campo Grande, MS e Embrapa Pecuária Sudeste, de São Carlos, SP. Os testes de performance reprodutiva e de desenvolvimento ponderal do rebanho Canchim, feito todos os anos pelos próprios criadores, ajuda a formar o conjunto de ações que tem como objetivo adequar a raça às necessidades da pecuária de resultados. “Todos os anos, dezenas de touros e matrizes oriundos das mais diferentes regiões do país, participam de testes de performance, para auferir o desempenho dos mesmos, em condições de criação específicas”, observa Campbell.
O programa GenePlus, realizado pelo CNPGC, com o aval do ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento é outro exemplo do empenho dos criadores para melhoramento da raça. Os dados extraídos servem como importante fonte de informações para gerar o sumário de touros oficial da ABCCAN. Segundo dados do programa, a avaliação utiliza dados relacionados ao ganho de peso, perímetro escrotal, notas de conformação frigorífica e idade ao parto, das progênies de touros que se destacam nas exposições da raça e constam no arquivo zootécnico da associação. Com base nesses números, os pesquisadores calculam os pesos à desmama (210 dias) e ao sobreano (420 dias), os perímetros escrotais à desmama e ao sobreano e o peso da mãe à desmama de sua cria.
As avaliações consideram ainda, o peso ao nascimento, as idades ao primeiro e ao segundo parto e as notas de conformação frigorífica à desmama e ao sobreano. Para o responsável técnico da ABCCAN, assim é possível predizer as diferenças esperadas na progênie (DEPs), tanto para o efeito direto quanto para o efeito materno, quando necessárias. No último ano, participaram da avaliação 3.703 reprodutores da raça Canchim, sendo 131 MA, 608 da raça Charolesa e 210 touros 5/8 Charolês-Zebu, segundo dados do CNPGC.
A busca por novas linhagens
Processo iniciado a partir da metade dos anos 80 e que ganhou força ao longo da década de 1990, a busca por linhagens de Charolês e Nelore, diferenciadas para formar características dominantes no Canchim é um fenômeno que está ajudando ampliar as bases genéticas do rebanho, além de contribuir para um direcionamento mais focado do trabalho de seleção no sentido de atender as exigências do mercado de carne.
O CPPSE, Embrapa Pecuária Sudeste, de São Carlos, SP, desenvolve um trabalho pioneiro com linhagens mochas de touros Charolês, oriundas dos EUA e Argentina e Nelore de várias regiões do país, buscando formar touros Canchim mochos naturais. Pedro Francklin Barbosa Pesquisador do CPPSE e um profundo conhecedor da raça Canchim observa que assim a raça ganha dos dois lados, primeiro porque imprime no rebanho características que são desejáveis mais, melhor do que isso, é aumentar a possibilidade para o rebanho Canchim dentro da pecuária, enfatiza o pesquisador. Por ser uma raça sintética, fruto de cruzamentos entre duas raças, o Canchim leva vantagem nesse tipo de trabalho, pois, as bases podem ser ampliadas tanto com Nelore quanto com o Charolês. Barbosa mostra que a procura por touros mocho homozigotos está grande nos leilões da Embrapa devido sua facilidade de manejo.
O pesquisador observa ainda que, na atualidade, o principal foco na seleção das raças que se destinam a produção de carne, está no acabamento de carcaça dos animais com cobertura de gordura acima de 5 mm, podendo chegar até a 10 mm em alguns casos. “O mercado é mutante e por isso as raças precisam estar em constante evolução para se manter atuantes”, conclui.
TALHADA PARA PRODUZIR CARNE
O aperto na seleção do gado Canchim, fato ocorrido há cerca de três e motivado, principalmente, pela queda acentuada na venda de tourinhos comerciais destinados para o cruzamento industrial, abriu margem para que os principais selecionadores da raça, olhassem para um novo nicho de atuação. As potencialidades do rebanho Canchim como produtor de carne, sempre foi um fato conhecido dentro da raça, entretanto, a alta demanda pelos animais de campo, sempre relegou essa atividade a uma condição secundária dentro das fazendas.
João Paulo Canto Porto, proprietário da Ipameri Agropecuária e um dos pioneiros na utilização do gado Canchim para produção de carne lembra que, a partir do momento que a procura pelos tourinhos começou a diminuir, vários criadores do estado de São Paulo, se entusiasmaram com a idéia de produzir carne precoce, a partir dos novilhos Canchim, animais que tinham uma genética diferenciada. O criador conta que produtores que vendiam 80% dos seus animais de uma hora para a outra começaram vender um terço disso. “Os pecuaristas precisavam pensar numa forma de desovar sua produção e a carne foi um caminho natural. “Um fenômeno que nasceu da crise do setor pecuário e que abriu uma porta para um caminho muito promissor para o futuro da raça” enfatiza.
Porto observa ainda que o novilho super precoce é uma opção mais que viável na pecuária moderna, pois aumenta substancialmente a taxa de desfrute das propriedades, eliminando a fase de recria, que dura em média seis meses. Além disso, ele chama a atenção para o preço diferenciado dessa carne super precoce no mercado, constituindo mais uma vantagem para tornar o segmento mais competitivo no mercado”.
Atualmente, vários criatórios de Canchim, no interior paulista, estão desenvolvendo estruturas para confinamento, visando começar uma produção em escala da carne super precoce. Na visão do criador o volume que sai das fazendas ainda é insciente se comparado com o tamanho da demanda interna e mundial por essa carne de grife. Entretanto, ele diz essa é uma tendência dentro dos criatórios de Canchim e que não tem amsi retorno.
Assim que começaram os trabalhos, foram enviados um lote de animais para a Faculdade de Melhoramento e Nutrição Animal da UNESP, em Botucatu, SP, para avaliação e tipificação da carcaça. Mário de Beni Arrigoni , pesquisador da Unesp e responsável por acompanhar e documentar os estudos diz que os resultados foram bastante satisfatórios.
O pesquisador mostra que o padrão do novilho Canchim super precoce é de um animal entre 12 e 15 meses, pesando entre 450 e 520 quilos no caso dos machos e 360 a 400 quilos para fêmeas. O peso de carcaça dos animais gira entre 17@ e 19@ nos novilhos e 12,5@ e 13@ nas fêmeas. A conformação apresentada tem um perfil retilíneo/subconvexo e acabamento mediano.
Os parâmetros usados na avaliação, no que se refere ao desempenho funcional, partiu do peso vivo aos 28 dias de confinamento com mensuração diária (peso e acabamento). Além disso, foram avaliadas a conversão alimentar segundo a quantidade de dias no confinamento e o custo da alimentação. O ganho de peso médio durante os 143 dias de duração dos trabalhos foi de 1,5 Kg/dia. A alta demanda energética necessária para que ocorra a deposição de gordura nos animais tem reflexo direto no tempo de confinamento, explica o professor. Sendo assim, a alimentação é o principal aspecto a ser considerado pelo pecuarista na produção do super precoce.
A dieta oferecida aos animais foi de alfafa pré-secada, silagem de milho, milho úmido e concentrados. O custo diário da ração foi de R$ 3,16,00/cab/dia. Os animais entraram no confinamento recém desmamados, pesando em média 295 Kg e saíram com 503,3 Kg. de peso vivo. A taxa de crescimento da área de olho de lombo AOL teve variação de 70,85 a 110,81 cm² espessura de gordura subcutânea, desejável segundo o pesquisador EGS de 3 mm a 7,5 mm.
Após o abate o peso das carcaças quentes apresentaram peso médio de 19@, sendo que a classificação das carcaças por grau de acabamento apresentou perfil 69,23% subconvexo; 26,92% convexo e 3,85% retilíneo. O rendimento de carcaça foi superior a 56% na média geral, variando de 53,6 a 60,7 em alguns casos.
A Ipameri Agropecuária mantêm uma parceria de quatro anos com o confinamento Marca Agropecuária, de Barra do Garças, MT, e com o frigorífico Friboi, também no Mato Grosso para a produção do novilho Canchim precoce e super precoce. Os rebanhos das fazendas Kenia, em Barra do Garças, MT e Santa Helena, em Juçara, GO, são utilizados para manutenção dos projetos. A Ipameri mantêm uma taxa de abate de 2600 animais por ano, sendo que destes 60% são super precoce e 40% precoces. O criador diz fazer cruzamento rotacionado direcionando a produção de acordo com as necessidade do mercado. O projeto produz 5 mil matrizes/ano. Deste total 30 % segue para o abate 30% se torna receptora e 40% e para repor o plantel, mostra.