Agricultura

Palmito – a sua lucratividade

Esse enfoque tangencia a negligência, mas contempla, com o mínimo necessário, culturas com potencial de, pelo menos, iniciarem o resgate da famosa dívida social, sobretudo se for levado em conta que podem ser exploradas através de métodos ecologicamente corretos.

Apesar de ostentar a condição de principal fornecedor da iguaria, o Brasil carece de estatísticas sobre o total que produz e exporta, em especial a variedade açaí, a mais solicitada. Até o final da década de 80 e início dos anos 90, do século passado, não havia uma técnica de produção padronizada. A palmeira é uma planta nativa da floresta amazônica, no caso da açaí, ou da mata atlântica, em se tratando da juçara. Dessa forma, a colheita, na verdade, “era uma extração predatória ao meio ambiente, configurando roubo mesmo”, segundo a pesquisadora do IAC-Instituto Agronômico de Campinas (SP), Marilene Bovi. Sob esta ótica, os dados divulgados “não são confiáveis.” Não obstante, os números citados com mais freqüência indicam “200 mil toneladas e R$ 180 milhões.”

A última menção ao volume de palmito exportado, data de 1995, e é atribuída ao pesquisador do IEA-Instituto de Economia Agrícola, Salomão Schattan, segundo quem os embarques fecharam, naquele ano, em 6 mil toneladas, a um preço de US$ 4,85/kg.Schattan (já falecido), também observou um declínio nas vendas externas ao apontar que, em 1993, “o total chegou a 11 mil/t, com US$ 3,13/kg de cotação.” Constatou, ainda, a falta de uma política específica para o palmito, sobretudo a juçara, no Vale do Ribeira (SP). Para ele, “propriedades privadas, áreas devolutas, terras públicas, todas compartilham de igual forma do vandalismo contra a juçara, de grande importância no ecossistema da mata atlântica, onde as sementes alimentam toda uma cadeia de vida animal (inclusive o homem).”

Além da destruição, o pesquisador também detectou ilegalidades na extração do produto. Pequenos empresários da região, ou não, recrutavam os pobres da periferia que, sem emprego, eram transformados em “palmiteiros” ocasionais, dedicados a “furtarem o palmito, onde quer que estivesse, estabelecendo a lei da terra arrasada.” Esse pessoal, acrescenta, entrava na mata e “cortava, indiscriminadamente, do ‘pé-de-cabrito’ ao porta-sementes, destruindo o ciclo natural de regeneração da planta.” Quando eram pegos, sofriam “o peso da justiça. Porém, os mandantes ficavam impunes.”

Pupunha para inibir roubos

Para inibir o avanço predatório, no Vale do Ribeira, foi introduzida a pupunha, no começo dos anos 90, uma espécie pesquisada pelo IAC desde a década de 70. Essa variedade, conforme o engenheiro agrônomo da Cati-Coordenadoria de Assistência Técnica Integral, da Secretaria de Agricultura, Luiz Gustavo de Souza Ferreira, é originária de um “banco de sementes” da amazônia peruana, se adaptou bem no Brasil “e sua touceira permite 1,5 corte por ano.” É uma cultura perene e está espalhada por vários Estados como Santa Catarina, Rio de Janeiro, São Paulo, Mato Grosso, Acre, Pará, entre outros, “um pouco no Paraná, além do Espírito Santo, onde é irrigada.”

Segundo ele, o açaí é nativa da floresta amazônica, “possui um banco com, mais ou menos, 2 milhões de hectares. Somos o maior produtor e exportador, do mundo, dessa variedade.” A planta, acrescenta, “demora de seis a sete anos para brotar.” Já a juçara, é característica da mata atlântica, tendo maior concentração no Paraná, Rio de Janeiro, Santa Catarina e São Paulo e, depois de cortada, “leva entre sete e oito anos para surgir uma nova palmeira.” Existe, ainda, alguma coisa de indaiá, guariroba, “amargos e comuns no centro-oeste”, além da palmeira real, “que necessita até quatro anos para rebrotar e veio da Austrália.”

Em termos de viabilidade econômica, a mais adequada, de acordo com Ferreira, é a pupunha, pois “começa a produzir depois de 18 meses.” Essa espécie, mais a juçara e a palmeira real “têm sua industrialização legalizada.” A pesquisadora Marilene Bovi observa, a propósito, que o Ibama autoriza a exploração da juçara “desde que haja manejo sustentado”. Quanto a açaí, “apesar da existência de muitos bancos, a oferta é reduzida, embora seja o mais consumido, inclusive como refresco,” diz Ferreira.

O habitat dessas plantas, preferencialmente, são áreas litorâneas que, normalmente, apresentam boa incidência de chuva e altas temperaturas. Fora daí, a produção pode ocorrer, “mas só com irrigação, acarretando uma elevação nos custos”, afirma Marilene Bovi. São Paulo, que ocupa 20 mil hectares de área, tem seu principal ponto de produção no Vale do Ribeira. Mas existe o plantio em terras do Norte e Noroeste do Estado, em cidades como Adamantina, Dracena, Mocóca, entre outras, onde a cultura é tocada por pequenos e grandes produtores. A espécie predominante é a pupunha “cuja expansão tem por objetivo coibir o roubo e a extração predatória”, afirma.

No Vale do Ribeira, formado por 23 municípios, os produtores ocupam cerca de 3 mil hectares, com aproximadamente 13,5 milhões de pés, numa média de 5 mil mudas/ha, com o plantio da pupunha. Os cálculos são da presidente da Apuvale-Associação dos Produtores de Pupunha, da região, Silvia Aparecida Margato Prado, ao assinalar que a colheita chega a “3,3 mil quilos/ha.” Ao que diz, a variedade surgiu no Vale por volta de 1990, mas “a adesão com maior intensidade aconteceu somente a partir de 1997.” Na ocasião, acrescenta, a prefeitura de Pariquera-Açu lançou um programa de integração, incentivando o cultivo desse palmito entre os agricultores locais. “Porém, não houve avanços. Depois de um certo tempo, muita gente desistiu.”

Setor pede crédito para expandir

Essa desistência é confirmada pela pesquisadora do IAC, Marilene Bovi, e pode ser vista como uma das dificuldades para a elaboração de estatísticas. Para ela, cultivar pupunha “é muito complicado. Existe muito plantio abandonado.” Uma das causas do abandono pode ser o investimento. Ferreira estima a necessidade de “R$ 10 mil por hectare, até o segundo ano, dependendo da tecnologia a ser aplicada. Se for com muda, o custo será maior, se usar semente, a despesa cai um pouco.” Para Silvia Prado, os valores ficam bem mais abaixo. “R$ 5 mil são suficientes para o preparo do solo, aquisição de mudas e manejo até a colheita, entre 2 e 3 anos depois.”

O retorno, conforme Silvia Prado, pode ser considerado razoável, pois o agricultor recebe, pelo produto a ser industrializado, “R$ 1,50, posto na fábrica, e R$ 2,00, pelo in natura. Nos dois casos, o pagamento é por cabeça.” Já Marilene Bovi, afirma que o produtor “é pago de R$ 0,80 a R$ l,04, pela haste, ou seja, o palmito bruto.” Esses valores oscilam de acordo com a demanda de consumo, “que é sazonal”, isto é, tem seus maiores picos no verão e nas festas de final de ano. De acordo com a pesquisadora, o Brasil não é apenas o maior fornecedor mas, também, “um grande consumidor, com ênfase na região Sudeste. No geral, a distribuição é feita em grandes centros, pois a iguaria é dirigida à classe média. Norte e Nordeste consomem muito pouco vegetal.”

A presidente da Apuvale compartilha dessa visão e afirma que “o nível atual de produção é insuficiente para atender a demanda. Hoje, existem seis fábricas no Vale, que recebem 75% do total produzido e mostram ociosidade. Os restantes 25% são consumidos in natura.” Levando em conta a procura interna e externa, Silva Prado diz que “80% do que é colhido ficam no País e 20% são exportados.” Ferreira confirma e reforça afirmando que “a oferta está abaixo das necessidades do mercado, seja nacional ou internacional.” Ele atribui essa defasagem à falta de financiamento.

Silvia Prado é da mesma opinião e assegura que o agricultor está estimulado, conta com orientação e assistência técnica da Cati e da Apuvale. Portanto, está preparado para ampliar a produção. Para isso, é necessário mais crédito, pois os volumes oferecidos “são insuficientes, apesar das disponibilizações do Pronaf, Nossa Caixa, bancos em geral.”. Tanto ela, quanto Ferreira, acreditam que uma linha de empréstimos específica pode alavancar o crescimento e afirmam que uma reivindicação, neste sentido, está sendo encaminhada ao governo, pelo setor.

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