Agricultura

Irrigada – água para produzir mais e melhor

Embora o Brasil seja um dos cinco maiores produtores mundiais de frutas, com uma produção anual que ultrapassa as 43 milhões de toneladas, seu desempenho no cenário mundial é ainda pouco expressivo, com uma exportação de apenas 720 mil toneladas. Segundo dados da Companhia Nacional de Desenvolvimento do Vale do São Francisco, CODEVASF, a demanda nacional por frutas de maior importância econômica cultivadas no Nordeste como, abacaxi, melão, mamão, manga, uva, melancia e limão, deve aumentar na próxima década, o que vai gerar um déficit de 1,4 milhão de toneladas e criar espaço para um incremento ainda maior na atividade na região. No entanto, para que isso ocorra, tecnologias como os sistemas de irrigação artificial e o manejo integrado, devem se incorporar cada vez mais ao cenário da fruticultura nordestina.

Projetos no sertão alagoano, por exemplo, região com baixa umidade, luminosidade elevada e calor constante, condições que beneficiam sobremaneira o cultivo de frutas, fizeram do Vale do São Francisco, o principal pólo de fruticultura do país. A insolação anual média perto de 3 mil horas, aliada ao baixo índice pluviométrico, reduzem bastante a incidência de doenças nos pomares, o que ajuda, ainda mais, a elevar a produtividade e a qualidade dos frutos. Dados da Embrapa Semi-Árido de Petrolina, PE, mostram que com irrigação, frutas cultivadas no semi-árido podem produzir cerca de 2,5 safras/ano, o que favorece a colocação do produto nos mercados internacionais nos períodos de entressafra.

No Brasil, existem exemplos de culturas como acerola e manga no sertão nordestino, que só tem sido cultivada sob irrigação. Eugênio Ferreira Coelho, pesquisador da Embrapa Mandioca e Fruticultura de Cruz das Almas, BA, conta que em regiões onde ocorre déficits hídricos significativos durante longos períodos do ano, com precipitações abaixo de 800 mm e que as culturas não são irrigadas, a deficiência de água nos solos constitui-se na principal razão dos baixos rendimentos das lavouras. “Na acerola, a irrigação apresenta-se como um componente indispensável no manejo, sobretudo em regiões de caatinga e cerrado”, observa. Na opinião do técnico, apesar dos projetos que estão em andamento mostrarem que a irrigação traz resultados surpreendentes, existe muita resistência por parte de alguns produtores em adotar estes sistemas. Segundo ele, o imediatismo é o grande vilão dessa história, pois, a maioria dos fruticultores ainda não fez as contas dos custos de implantação da irrigação e o retorno em produtividade.

Segundo Coelho, para cada hectare implantado com o sistema de gotejamento ou micro-aspersão, o produtor desembolsa em média de US$ 1.800 a US$ 2.500, no entanto, estudos mostram que a produtividade em grande parte das culturas mais que dobrou, já no primeiro ano, após a colocação do sistema. “Outro aspecto positivo do sistema, está relacionado ao aproveitamento de água dentro da propriedade. No sistemas fixos de irrigação localizada o aproveitamento é de até 85% da água disponibilizada. Em outros sistemas talvez um pouco menos, porém, o aproveitamento é sempre igual ou superior a 20% da oferta de água”, observa. O uso da irrigação artificial deve ser feito apenas para suprir eventuais deficiências hídricas que possam se apresentar na propriedade, observa. ” Essa é uma tecnologia onde a água é disponibilizada ao solo na quantidade necessária para o desenvolvimento da planta”, conclui.

No caso da acerola, o agrônomo diz que a irrigação implica em acréscimos de produtividade de no mínimo 560, além aumentar o número de safras por ano, acabando com a sazonalidade das culturas e garantindo um aumento no tamanho dos frutos. Em localidades onde a temperatura média durante o ano é de 20 a 25C° pode-se chegar a nove safras por ano com uso desse sistema. No entanto, o excesso de florada, também deve ser evitado por uma questão de preservar a planta, explica o técnico. Segundo ele, isso ocorre porque a necessidade de água da planta muda de acordo com as fases de desenvolvimento. Se houver uma aplicação excessiva de água em épocas próximas à colheita, quando o fruto já atingiu seu ponto máximo de enchimento ( maturação), a qualidade pode ser comprometida. Outro exemplo ocorre com a cultura do mamão, que, se durante o planejamento não forem considerados aspectos relacionados à umidade do solo, o ataque de fungos pode ser devastador.

Aplicabilidade dos sistemas

Além do fator clima, a escolha do método e do sistema de irrigação depende de uma análise mais detalhada da área, onde aspectos como, recursos hídricos disponíveis na propriedade, topografia do terreno, tipo de solo e a disponibilidade de recursos financeiros do produtor, são pontos a serem observados. Por exemplo, locais considerados regulares, onde a limitação de água não constitui impedimento para a aplicação do sistema e a textura do solo é argilosa, recomenda-se o uso de sistema de superfície (sulcos, faixas, bacias em nível e tabuleiro). No entanto, em algumas culturas como o abacaxi que possui sistema de radícula a uma profundidade de 20 cm no solo, esse método pode provocar encharcamento na área, o que é muito prejudicial para o abacaxizeiro.

Já para topografias mais acidentadas e solos mistos, recomenda-se a irrigação por pressurização. Nestes casos pode ser usada também, a aspersão convencional de hastes longas de modo que os mesmos fiquem no nível da copa das plantas, podendo o modelo ser fixo ou móvel. Outros sistemas de aspersão por pivô central, podem, também, ser usados em pomares. Quando for usar aspersão convencional, deve-se levar em conta a desvantagem da mesma promover queda de flores das plantas. Em condições onde o produtor planta entre as ruas do pomar outra cultura em sistema de consórcio, os sistemas de micro-aspersão também funcionam como opção.

Em solos de formação média, onde, há limitação de água, a irrigação localizada por gotejamento ou micro-aspersão são as mais indicadas por sua aplicação localizada. Em condições onde o solo é arenoso com baixa retenção de água, esse método, também, mostra-se eficiente.

No caso do sistema de micro-aspersão, quando o espaçamento for igual ou inferior a 3 m, os microaspersores podem ser instalados entre plantas ao longo da fileira, na proporção de um para cada duas plantas. Já para espaçamentos entre plantas ao longo da fileira iguais ou superiores a 4 m, recomenda-se instalar o emissor junto a planta no primeiro ano, movendo-o para uma posição entre duas plantas a partir do segundo ano. No caso do sistema de gotejamento o recomendado é optar por quatro gotejadores por planta dispostos em forma de anel ou espiral ( rabo de porco) em torno da planta. A necessidade hídrica varia de acordo com tipo e condição da cultura utilizada e da região, por esse motivo o planejamento é fundamental. Durante o processo de brota quando ocorre a saída dos botões florais e desenvolvimento dos frutos, há uma maior demanda de água e as plantas são mais sensíveis ao déficit hídrico. Qualquer problema na fase produtiva pode acarretar no sucesso da germinação do fruto, reduzindo a produtividade, inclusive com perda na qualidade. No entanto, o técnico fala que o excesso de água também causa problemas, diminuindo os teores de vitaminas dos frutos.

Manejo da Irrigação

Segundo o técnico, o manejo do sistema deve ser feito sempre por um profissional capacitado para a função, pois, os processos envolvem geralmente tomadas de decisões sobre quando irrigar e quanta água aplicar. Entre os métodos disponíveis, os mais utilizados baseiam-se em turno de rega calculado, medidas do teor ou potencial da água no solo e instrumentos de evaporação. No primeiro caso, que também é conhecido como frequência diária da irrigação, a ação deve ser considerada pela razão entre lâmina de irrigação real necessária e a evapo-transpiração da cultura. Para auferir a lâmina disponível de água, o produtor precisa considerar aspectos quanto ao teor de umidade do solo, além do ponto de murcha permanente da planta. A profundidade efetiva do sistema radicular da cultura e a variação máxima permissível de água no solo são pontos importantes para se evitar redução na produtividade das culturas.

Os valores de variação de água indicados para lavouras de acerola, por exemplo, ficam entre 35% e 40% durante a fase reprodutiva da planta, aumentando para 50% e 60%, permitindo um maior controle sobre a operação na lavoura. Quanto a variação do sistema radicular, o valor adotado, a princípio, é de 600 mm. Segundo o pesquisador, isso ocorre porque, em ambos os casos, as pesquisas ainda estão em fase de desenvolvimento. A medição do conteúdo de umidade do solo para definir o momento de irrigar, pode ser obtido por métodos diretos e indiretos. Alguns métodos como o gravimétrico, o de reflectometria no domínio do tempo e onda sonda de neutrons permitem a obtenção direta do teor de água na área. Por outro lado, os blocos de resistência elétrica e o tensiômetro permitem uma medição indireta dessa umidade, isto é, eles fornecem a leitura do potencial de água do solo que pela curva de retenção.

Exemplo Práticos

No norte de Minas Gerais, a baixa pluviosidade é um dos fatores mais limitantes para a produção agrícola. Nessas condições, o uso da irrigação é fundamental para garantir a oferta de frutos ao longo do ano, observa o técnico. É necessário ressaltar portanto, que para se obter alta produtividade, utilizando-se a irrigação é fundamental que outras tecnologias de manejo da cultura sejam ajustadas ao sistema de produção. “Um planejamento criterioso dos sistemas de irrigação para uma determinada área envolve uma adequada caracterização dos recursos hídricos, solos, topografia e clima em relação à cultura a ser utilizada. Tamanho e relevo da área, qualidade e quantidade de água disponível, número de horas diárias possíveis de funcionamento do sistema, grau de automação pretendido, tipo de dispositivo para fertirrigação, além da mão-de-obra que precisa ser qualificada”, conclui.

Coelho fala sobre o abacaxizeiro que é tido como uma planta com necessidades hídricas relativamente reduzidas, por possuir mecanismos que facilitam a sua adaptação a condições de deficiência de água. Segundo ele, essa adaptação decorre de uma série de características morfológicas típicas das plantas xerófilas, tais como a capacidade de armazenar água na hipoderme das folhas, ter baixa transpiração durante o dia e armazenar água de forma eficiente.” A necessidade hídrica do abacaxi varia ao longo do ciclo da planta dependendo do seu estágio de desenvolvimento e das condições de umidade do solo. Em geral a quantidade de água exigida pela planta é de 60 a 150 mm por mês. A faixa ideal de precipitação pluviométrica está entre 1 e 1,5 lt/ano, isso bastante distribuído. Em regiões onde ocorre baixo volume de chuvas, abaixo dos 15 mm mês ou longas estiagens, a irrigação se faz necessária nos locais onde os requisitos básicos não são observados”, explica.

Outra cultura bastante curiosa quando o assunto é sistema de irrigação é o morango que devido sua fragilidade a ação de fungos e nematóides necessita de água em quantidades muito bem dosadas. Élcio Donizeti Spinassi produtor de morangos na cidade de Jarinú, SP, diz que o sistema de irrigação por gotejamento utilizado nos canteiros é bastante eficiente, inclusive para aplicação da fertirrigação na lavoura. Segundo Spinassi, os aumentos observados na produtividade por áreas são superiores a 50%, além de uma melhora considerável na qualidade do fruto. “Hoje, a quantidade de defensivos aplicada é bem inferior se comparada com outros anos. Outra coisa positiva é que com a baixa infestação das lavouras é possível usar fungicidas menos agressivos”, conclui.

Atualmente, o produtor mantém em 14 hectares plantados uma produção de 8 mil caixas por dia, volume esse que segundo ele oscila de acordo com o momento da colheita. Os canteiros são todos irrigados com duas mangueiras colocadas de forma estratégica. O produtor fala que o custo de implantação do sistema se paga em 3 ou 4 anos, sendo que o tempo de vida útil é de 10 anos se bem utilizado. Antônio Donizzeti de Oliveira produtor de pêssego, ameixa e nectarina, no interior paulista, conta que também usa a irrigação por gotejamento e que sua produção quase dobrou nos últimos anos. Produzindo 12 variedades diferentes de frutas de caroço, o fruticultor mostra com orgulho o barracão onde fica o sistema de controle do equipamento. As 22 quadras que compõem o pomar são controladas por ele próprio que diz fazer questão de operar o sistema para evitar problemas. Ao todo o Sítio do Tanque mantém uma produção anual de 16 mil frutos por hectare plantado e a meta é aumentar, enfatiza o proprietário.

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