Pecuária

VPJ – pequenos no tamanho grandes nos lucros

No entanto, apesar da magnitude desses dados, se considerarmos a dimensão territorial brasileira, bem como as condições climáticas favoráveis ao desenvolvimento da ovino-caprinocultura, nossos rebanhos são numericamente inexpressivos, principalmente quando comparados com a criação de bovinos, cujo efetivo nacional é da ordem de 180 milhões de cabeças.

A Região Nordeste possui a maior população desses animais com 10,4 milhões de caprinos e 7,2 milhões de ovinos, o que corresponde a 90% e 39% dos rebanhos do país. A cadeia produtiva do setor emprega atualmente 55 mil pessoas e matêm uma produção de 21 mil toneladas por ano, segundo dados do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA).

Por conta desses e de outros números, a atividade, nas diferentes regiões brasileiras, está deixando seu status de secundária, unicamente como fonte de complementação de renda para pequenos e médios pecuaristas e começa atrair a atenção de grandes empresários do setor rural. Sebastião Pereira de Faria, superintendente técnico da Associação Paulista dos Criadores de Caprinos (CAPRIPAULO), fala que esse crescimento teve início a partir dos anos 90, mas, foi somente na segunda metade da década que o número de criadores interessados em investir nesse ramo da pecuária, com enfoque exclusivo na produção de carne, cresceu de forma significativa. Antes disso, explica ele, a atividade era limitada ao círculo dos sitiantes e pequenos pecuaristas. Produtores que encaravam a criação como uma forma de garantir a subsistência de suas famílias na zonas rurais.

Segundo o pesquisador da Embrapa semi-árido, Clóvis Guimarães Filho, embora desordenadamente, a cadeia produtiva brasileira mostra sinais de avanço, sobretudo no que se refere ao setor de processamento. Com o surgimento de abatedouros em regiões estratégicas do Brasil, é esperado o número de abates clandestinos no país diminua substancialmente. Apenas no Nordeste brasileiro existem atualmente nove destes frigoríficos especializados em pequenos ruminantes, com capacidade total para abate de 31.550 animais/dia. Para o técnico da Embrapa Caprinos, o problema dos abate informal, compreendem o principal gargalo que impede o crescimento da formalidade dentro do setor. Segundo ele, por esse motivo todos os abatedouros qualificados trabalham com capacidade ociosa. “Numa situação dessas, falar em qualidades sensoriais, como sabor, maciez e suculência ou de formas de valorização dos produtos típicos como a “manta talhada”, parece um mero exercício de futurologia”, declara o pesquisador.

No que concerne a qualidade da carne que é oferecida ao mercado e sua frequência no abastecimento, de uma maneira geral, o país encontra-se ainda bastante atrasado se comparado com outros países, enfatiza o técnico. “Até mesmo nossos vizinhos do Mercosul, Uruguai e Argentina, possuem uma cadeia produtiva melhor organizada. Esse fato garante a eles a conquista de novos mercados, suprindo inclusive demandas internas de algumas regiões brasileiras, como o Sudeste, que hoje tem 80% do seu abastecimento suprido por esses países”.

Já para o superintendente da CAPRIPAULO, Sebastião Pereira de Faria Júnior, o que existe no Brasil é uma forte demanda reprimida, causada, principalmente, pela falta de oferta de uma carne inspecionada e com classificação, que atenda a nichos específicos de consumidores. Segundo ele, a demanda mundial por essa carne é altíssima, principalmente em países da Ásia, África e Oriente Médio, povos que têm esta carne como produto importante no seu cardápio. Só para se ter uma idéia, o abate mundial de caprinos e ovinos no período que abrange os anos de 1991 a 2000, cresceu em média 7,5 %. No mercado brasileiro, no mesmo período, o crescimento apresentado foi da ordem de 45,9 % e 57,8 % para caprinos e ovinos, respectivamente. Esses números dão bem uma mostra do potencial de produção brasileira nas diferentes regiões onde ela se desenvolve, ressalta o técnico. Para ele, com uma maior participação mais próxima dos representantes da cadeia produtiva é possível, no curto prazo, se reverter esse quadro, haja vista, o fato do ciclo de vida desses ruminantes ser em média de 120 a 150 dias contribuir sobremaneira para o crescimento do rebanho.

A importância que a atividade tem no contexto socio-cultural dos estados da região Sul, RS, SC e PR, de alguns anos para cá, vem migrando para regiões mais próximas ao Sudeste e Centro Oeste do país. Algumas microregiões no Médio Jaquaribe (CE) e Serrinha (BA), ambas no Nordeste, também encontram-se hoje bastante povoadas. Algumas raças deslanadas nacionais, encabeçadas pela espécie Santa Inês, aliadas a uma forte genética importada de países como Austrália, África do Sul e EUA, de raças que conseguem se adaptar às mais adversas condições de clima e topografia em seus países de origem. Segundo o técnico da CAPRIPAULO, Texel, Suffolk, Ilê de France, Polyplay, Hampshire e Dorper, são algumas raças que com suas características intrínsecas, estão transformando a cara da ovinocaprinocultura no país. A caprinocultura, apesar de possuir peculiaridades próprias, está seguindo o mesmo caminho, buscando no apuro da seleção genética de raças como, Boer, desenvolver animais de genética superior que agreguem valor aos seus produtos, tornando-se assim mais competitivos frente a um mercado que começa a se tornar competitivo.

Hoje, cerca de 50 % do rebanho brasileiros está instalado em propriedades com menos de 30 hectares, mantendo uma produção média nas condições do semi-árido árido de 2,8 kg/ha na caatinga nativa. Entretanto, esses índices podem alcançar de 31,4 kg/ha a 71,2 kg/ha com o uso de técnicas de manipulação da vegetação nativa, explica o pesquisador da Embrapa Caprinos. Para ele, o fato da produtividade da caprino-ovinocultura de corte no Brasil ainda ser baixa deve-se, além das razões supracitadas, outras de caráter mais técnico, entre elas sita-se: o regime de manejo da exploração que, predominantemente, é o extensivo, com alta dependência da vegetação nativa, utilização de raças não especializadas e uso de práticas rudimentares de manejo. Além disso, a assistência técnica deficitária, baixo nível de organização e de gestão das unidades produtivas são fatores que ajudam a agravar o problema.

Nos últimos anos, os produtores paulistas vêm desenvolvendo ações no âmbito das associações, no sentido de promover uma maior profissionalização do setor. Uma dessas ações foi desenvolvida através da parceria formada pela CAPRIPAULO junto com a ASPACO, Associação Paulista dos Criadores de Ovinos, para assinatura de um protocolo de intenções com a SENAR, Serviço Nacional de Aprendizagem Rural, objetivando criar um programa de capacitação de produtores. De acordo com o técnico da associação paulista é de vital importância a capacitação profissional, em diferentes níveis, de profissionais especializados na criação de ovinos e caprinos. “Esse programa tem como objetivo capacitar, desde o peão que aplica o manejo nos animais na fazenda, passando pelo proprietário, e vai até os veterinários e zootecnistas que dependem dessa especialização para atender e supervisionar esses criatórios”.

Outra iniciativa pioneira dos criadores de São Paulo, com o apoio da ARCO, Associação Brasileira de criadores de Ovinos e caprinos de Bagé, RS, e do Centro de Exposições Imigrantes, SP, foi a criação de um evento exclusivo da cadeia produtiva. A Feinco, Feira Internacional de Caprinos e Ovinos, que teve sua primeira edição realizada no último mês de março, e que segundo os organizadores foi um sucesso, tanto institucional como comercialmente, promete repetir a dose em março de 2005, e reunir um número ainda maior de criadores, empresários, técnico e profissionais ligados ao segmento tanto do Brasil como do exterior. Francisco Pastor, responsável pela organização do evento classifica a feira como um ponto de partida para a organização e profissionalização definitiva do segmento. “Com a crescente demanda por produtos caprinos e ovinos, o crescente número de empresários dispostos a investir nessas atividades, a agroindústria instalada e as tecnologias já disponibilizadas pela pesquisa, capazes de atender aos diversos segmentos da cadeia produtiva, a criação brasileira irá se destacar no cenário brasileiro como atividades de grande impacto sócio-econômico”, declara.

O crescimento desse segmento já está atraindo a atenção de grandes empresários do setor rural, pecuaristas que, inclusive, contam com projetos em adiantado estágio de desenvolvimento. Com todo seu aparato de criação montado, a adaptação para se dá muitas vezes dentro da própria fazenda que recebe alguns arranjos para receber os animais. Com a aplicação de modernas técnicas, extraídas na grande maioria da bovinocultura como: inseminação artificial, fertilização in-vitro, transferência de embriões, entre outras práticas de manejo, um número cada vez maior de pecuaristas, está conseguindo manter as duas atividades de forma complementar dentro das propriedade. Um exemplo de projeto pecuário tradicional na bovinocultura e que começa a despontar para essa nova pecuária é de propriedade do empresário do setor eventos e pecuarista Valdomiro Poliselli Júnior. A VPJ Pecuária desenvolve na cidade de Jaguariúna, SP, um trabalho de seleção genética com a raça sul africana “Dorper” para cruzamento com exemplares da raça Santa Inês.

De acordo com Poliselli, o objetivo da VPJ Pecuária é justamente ampliar o fornecimento de genética “Dorper” para o mercado nacional. Segundo Poliselli, ao realizar seu primeiro contato com um exemplar da raça no Canadá há cerca de cinco anos, o fato que mais lhe chamou a atenção foi a performance apresentadas pelos animais em pista. Logo que retornou ao Brasil procurou saber mais sobre a origem dos animais, descobrindo que o ambiente onde eles eram criados no país de origem era bastante rústico. Áreas de montanha, com baixas temperaturas e escassez total de comida muito, ou seja, características muito próximas da maioria das regiões onde a atividade pecuária se desenvolve.

Daí a trazer seu primeiro lote de embriões para o Brasil foi uma questão de tempo. Há cerca de um ano foram trazidos 500 embriões da Austrália, oriundo da África do Sul para um trabalho de cruzamento com as raças Santa Inês e Morada Nova. O criatório foi montado na cidade sede da VPJ Pecuária e mantêm atualmente 250 matrizes e 2 reprodutores. Um lote de 100 fêmeas estão aguardando liberação do serviço de inspeção sanitária da Austrália para embarcar para o Brasil. De acordo com o criador, os animais da raça “Dorper” possuem a maior parte das características desejáveis para um projeto de produção de carne. Além disso, sua origem na África do Sul, por meio do cruzamento do Dorset Horn com o Blackhead Persian (conhecida no Brasil por Somális) apresenta-se como uma ótima opção para ser explorada em regiões semi-áridas e áridas.

O criador conta que foi durante a década de 1930 que surgiram os primeiros cordeiros produtos deste cruzamento, que se destacavam-se pelo rápido crescimento e pela qualidade e peso das suas carcaças; sendo que alguns eram totalmente brancos e recebiam a denominação de Dorsian, outras eram brancos com a cabeça e pescoço pretos, sendo conhecidos como Dorper. Esses animais surpreendiam desde o começo por apresentar uma curva de crescimento bastante acentuada e uma alta conversão alimentar. Além disso, seu índices reprodutivos garantem às fêmeas da raça, uma média de três partos a cada dois. “É perfeitamente possível alcançar um peso de 45 kg logo ao desmame o que é característica importante na produção de ovinos tipo carne “, explica o pecuarista. Outra característica que segundo o criador é um diferencial da raça Dorper é o acabamento de carcaça que atinge em média 53% para animais em manejo comum. A raça Dorper possui grande adaptabilidade, resistência, rusticidade, alta habilidade materna, além de ser extremamente reprodutiva, características que certamente vão garantir a ela um lugar de destaque no contexto da ovinocultura brasileira”, conclui Poliselli.

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