Idealizado por um grupo de engenheiros agrônomos e produtores rurais da região norte do Paraná, em meados da década de 70, esse conceito ganha cada vez mais adeptos pelo país, devido suas características de preservação do solo, proteção dos recursos hídricos e manutenção da biodiversidade em condições de clima tropical e sub-tropical.
Na época em que foi implantada por um grupo de agricultores de Ponta Grossa PR, a técnica do Plantio Direto se mostrava de absoluta necessidade para o controle da erosão de solo, problema que assolava as regiões de produção agrícola do país, relembra Maury Sade, engenheiro agrônomo e diretor executivo da Federação Brasileira de Plantio Direto na Palha ( FEBRAPDP), de Ponta Grossa, PR. Para ele, o uso extrativista das áreas de plantio por parte dos produtores rurais, foi determinante para a devastação de milhões de hectares nas regiões do Brasil Central e Norte, especificamente. As localidades próximas da região norte do Paraná e Rio Grande do Sul, os produtores encontravam-se a frente dos demais em termos de consciência da necessidade de se preservar os recursos naturais, entretanto, não deixavam de apresentar problemas sérios de erosão e compactação dos solos, explica o diretor executivo da entidade.
Sade conta que na época, a atividade pecuária que utilizava um modelo de pastejo extensivo para o gado, mais a utilização de práticas agronômicas pouco indicadas como queimadas e gradeamento das lavouras no pós colheita, eram os principais responsáveis pelo agravamento da situação. “A essência do desenvolvimento do SPD no Brasil persiste, ainda hoje, graças a abnegação e persistência de pesquisadores e produtores pioneiros que fomentam a importância no aprendizado sobre como explorar a agricultura em maior harmonia com a natureza, em um processo constante de mudança do comportamento humano. Muitos atores dessa façanha ainda estão presentes, na plenitude de seus trabalhos, ajudando no fomento do SPD, com belíssimos exemplos para serem vistos e discutidos”, conclui o técnico.
O crescimento do Sistema de PDP junto aos agricultores brasileiros se deu de forma bastante rápida, principalmente ao longo da década de 90, e teve como principal meio de difusão, a troca de experiências entre produtores rurais. Outro ponto importante para dar sustentação a essa idéia, foi a criação da Plataforma Plantio Direto, que conta, hoje, com a participação das principais entidades representativas do setor, em conjunto com as iniciativas público e privada. Proposto pela FEBRAPDP, representando os seus afiliados, esse projeto tem sua execução a cargo da Embrapa, com a participação de suas unidades, das Empresas Estaduais de Pesquisa e da assistência técnica e extensão rural de universidades, ministérios e os Clubes Amigos da Terra, além das fundações, associações e cooperativas, como co-executores. Conta ainda com o apoio da CPA/CAMPO, MARCHESAN e da IADEL, a colaboração da ABEAS, ANDEF, ANDA e ABIMAQ e o apoio logístico da APDC/ABID.
Maury, ressalta a contribuição dos professores de ensino médio e superior das principais escolas agrícolas do país, que abraçaram a causa e levaram esse conceito para sala de aula. segundo ele, cabe ressaltar também, a participação das empresas fornecedores de insumos para produção, que por meio de suas equipes técnicas e de representação de vendas, ajudaram a disseminar a técnica pelo país. ” O Grupo Plantio Direto, GPD, que conta com a parceira de empresas como, Monsanto do Brasil, Syngenta, Dow AgroSciences, Bunge Fertilizantes por intermédio da sua marca Manah e FEBRAPDP, realiza todos os anos, inúmeros dias de campo em propriedades rurais estratégicas, onde, agricultores de todas as partes do país têm a oportunidade de ver “in-loco”, os resultados dessa prática em diferentes tipos de cultura”, observa. “A federação organiza todos os anos inúmeros encontros de produtores rurais, com a participação de técnicos e pesquisadores de órgãos de instituições do Brasil e do exterior para discutir os temas mais relevantes no momento em termos de agricultura conservacionista ( Plantio Direto)”, conclui.
Segundo dados da FEBRAPDP, atualmente, a agricultura brasileira desenvolve-se dentro de uma área de aproximadamente 41milhões hectares, sendo que deste total, quase a metade está sobre o sistema de Plantio Direto, ou seja, algo em torno de 19 milhões ha. Destaca-se nesse contexto a expressiva expansão do PDP no Brasil, evoluindo de cerca de um milhão de hectares com culturas anuais, no início da década de 90, para mais de 12 milhões no ano 2000. Além disso, o sistema passou a ser utilizado em todas as culturas perenes, na cana-de-açúcar, na recuperação de pastagens por meio da rotação entre lavouras e pastagens, no reflorestamento, na fruticultura, na olericultura, constituindo-se em importante alternativa para a economia de operações manuais, de tração animal, tratorizadas ou aéreas. “Dessa forma, fica evidente a universalidade e abrangência do PDP, ensejando sua escolha como um potente instrumento a ser fomentado no manejo racional das bacias hidrográficas”, enfatiza o diretor da entidade.
O crescimento mais significativo ocorreu nas regiões de Cerrado, onde no ano de 1992, o volume de área plantada utilizando esta técnica, era de aproximadamente 270.000 ha, e atualmente esse número ultrapassa os 8.000.000 ha, segundo dados da APDC, Associação de Plantio Direto do Cerrado. Este crescimento é justificado em função do pioneirismo, empenho e perseverança de diversos técnicos, pesquisadores, instituições e empresas na difusão e aperfeiçoamento do Sistema, explica Jonh Nicholas Landers, diretor para projeto novos e secretário executivo da Associação de Plantio Direto do Cerrado. Segundo ele, nos últimos 2 anos, o governo federal por intermédio do Ministério do Meio Ambiente, custeia uma série de projetos em propriedades rurais nas regiões do Brasil Central e parte da região norte, onde estão sendo adaptados os princípios do sistema de plantio direto. Alguns exemplos de propriedades individuais que têm o acompanhamento da APDC, nos estados do Pará, Maranhão, Tocantins, Roraima, Rondônia, são apresentadas como modelos para os demais agricultores nos encontros promovidos pelo país.
Landers observa ainda que dos 50 milhões de hectares de áreas ocupados pela pecuária de corte no cerrado, mais de 70% mostram avançado estágio de degradação por erosão e compactação dos solos. O motivo, segundo ele, é que muitos pecuaristas encontram-se descapitalizados, o que torna inviável a realização de uma reforma mais profunda nas áreas de pastagem com a utilização de herbicidas e adubos para correção do solos. Por esse motivo, explica o técnico, é cada vez mais comum o arrendamento de enormes áreas de pastagem, por parte de agricultores até mesmo de outras regiões, para plantio de culturas de verão como, soja, milho, arroz, feijão, algodão, café, entre outras. De acordo com o diretor da ONG, isso proporciona ao pecuarista, num prazo de no máximo 3 anos, recuperar completamente o teor nutricional e de acidez das áreas dentro da fazenda, sem custo direto e podendo ampliar posteriormente, sua carga animal em até 3 vezes com forrageiras tropicais e sub-tropicais. “Esse é o conceito básico da integração entre lavoura e pecuária que precisa ser estimulado, pois promove um desenvolvimento sustentável de toda a cadeia agrícola nacional”, conclui.
No âmbito das pesquisas, devido a amplitude territorial da agricultura brasileira, cada região ou meso-região do país como são denominadas, apresenta peculiaridades na aplicação do sistema que vão de encontro com as dificuldades e problemas do dia a dia das propriedade. Segundo Benami Bacaltchuk pesquisador do CNPT, Centro Nacional de Pesquisa do Trigo, órgão ligado a Embrapa, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, a quantidade de estudos voltados à solução de problemas e apresentação de idéias que aprimorem o sistema de plantio direto é muito grande. Bacaltchuk diz ainda, que é difícil quantificar esses dados, mas, os investimentos por parte do governo federal são altíssimos, por intermédio dos Ministérios da Agricultura e Meio Ambiente. “Os estados do Paraná e Rio Grande do Sul, têm hoje, cerca de 70% de seus agricultores praticando o PDP e outros estados da federação estão seguindo o mesmo caminho”, declara.
A agenda 21 brasileira do governo federal, documento criado com a participação de representantes mundiais de defesa do meio ambiente, constatou que o sistema de plantio direto pode ser inserido como tecnologia capaz de contribuir, decisivamente para a sustentabilidade da agricultura e para a preservação do meio ambiente. O texto faz considerações a respeito da importância do setor agrícola demonstrar à sociedade brasileira, a sua capacidade de produzir alimentos com qualidade e preços compatíveis com o mercado interno, competitivos no mercado internacional e dentro dos padrões ambientais mais exigentes. O conteúdo da carta propõe ainda, estimular o engajamento das organizações e representantes de diferentes setores do agronegócio nas futuras discussões estaduais da Agenda 21 Brasileira, e que haja, como fruto da Plataforma Plantio Direto, condições de estabelecimento de núcleos estaduais de acompanhamento desse processo e discussões. Muitos ambientalistas consideram-na o principal documento assinado pelas autoridades mundiais que visa à realização, pelos países, de medidas básicas para que seja alcançada, no século atual, a sustentabilidade ambiental, assegurando a alimentação da população que continua a aumentar, aliada à necessidade de preservar os recursos naturais. Este é um dos grandes desafios da humanidade e, provavelmente, o maior problema do século.
Para o produtor rural, as vantagens da utilização do PDP, se comparado com os métodos convencionais são muitas, entre elas está a redução de até 70% no uso de combustíveis fósseis gerados pela queima de substâncias, causada pela exposição dos microorganismos e microelementos ao sol e que contribuem para a emissão de gases que interferem no efeito estufa. Além disso, são incalculáveis os benefícios no equacionamento da matriz energética do país. A absorção de cerca de 130 milhões de toneladas de carbono atmosférico para cada 1% de incremento no teor de matéria orgânica na camada superficial do solo, de 20cm, correspondente a área sob Plantio Direto de culturas anuais no Brasil, cifra que, em termos potenciais, poderia possibilitar a captação ou geração de créditos compensatórios, de mais de 1 bilhão de dólares/ano, considerando-se a viabilização desse mercado carbono na Bolsa de Chicago, por exemplo.
Herbert Arnold Bartz, proprietário da fazenda Rhinania de Rolândia, PR, é um dos pioneiros na utilização do sistema de Plantio Direto na Palha no Brasil e atesta os benefícios que essa prática pode trazer ao produtor. Bartz conta, que seu primeiro contato com esse modelo de agricultura aconteceu no ano de 1972, durante viagem à Inglaterra e EUA. O agricultor lembra, que assim que retornou do exterior, tratou logo de colocar em prática os métodos recém aprendidos. Para isso, Bartz trouxe na bagagem uma plantadeira Allis Clalmirs, modelo desenvolvido para atuar exclusivamente no plantio direto e que era uma grande novidade se comparada com os exemplares encontrados pelo Brasil na época. Segundo Bartz, a relutância por parte de muitos produtores, até mesmo amigos próximos para aderir ao novo paradigma foi muito grande. No entanto, ele conta que sua experiência com agricultores no exterior que já utilizavam a metodologia do plantio direto e puderam passar um pouco de suas experiência foi muito importante. Por esse motivo, atualmente, essa filosofia é passada aos demais produtores num trabalho de extensão que envolve praticamente toda a cadeia produtiva. Atualmente, o produtor mantêm 235 hectares, divididos com soja, milho, triticale durante o verão e aveia branca e preta como culturas de inverno. O modelo de rotação de cultura é segundo ele, fundamental para a sobrevivência do plantio direto, pois garante uma adubação natural e constante ao terreno. ” Os resultados com o PDP, estão levando muitos agricultores a arrendar terras em propriedades de pecuária, mudando bastante a geografia de algumas regiões do país, onde tradicionalmente só se via pastagem”, conclui.