Na onda da explosão dos produtos orgânicos pelas gôndulas e balcões de sacolões e hipermercados, principalmente observada nos últimos 18 meses, o leite ecologicamente correto se preparara para ocupar o seu espaço, bem no momento onde as novas exigências de tecnificação da atividade estão apertando os produtores de leite. Se atender as normas vigentes já está para alguns, entregar o produto com o certificado de orgânico, parece impossível; pois há todo um reaprendizado de como lidar com um série de problemas inerentes á pecuária leiteira.
Mas engana-se quem acho que o leite orgânico é excentricidade. No Brasil, ele já representa 3% da produção; sendo que a região Sul lidera o fornecimento do produto, com 10 mil litros de leite por dia. A região Sudeste produz, atualmente, 1,8 mil litros/dia. Em todo o Brasil, os produtos orgânicos, em geral, já movimentaram US$ 150 milhões, somente no ano passado, fatia que aumenta significativamente, mês a mês, conforme informa a Associação dos Agricultores Orgânicos – AAO. Para que gosta de números envolvendo os EUA, grande parte do leite orgânico produzido na Argentina é exportado para os EUA e a demanda cresce de 20 a 30%, anualmente. Em oito anos, o faturamento com o produto subiu de US$ 1,5 milhão para US$ 100 milhões (dados obtidos junto ao Instituto Nacional de Tecnologia Agropecuária da Argentina-INTA). Produto orgânico é todo aquele que, em seu processo produtivo, não recebeu a adoção de insumos químicos, por exemplo, de agrotóxicos, venenos, etc. Também há uma série de exigências ambientais quanto o local onde é produzido; por exemplo, de segurança sanitária da mão-de-obra. No caso específico do leite, ainda é necessária a isenção de hormônios, antibióticos e vermífugos. è também expressamente proibida a utilização de drogas promotoras de crescimento, estimulantes de apetite e uréia.
De posse destas informações, as perguntas surgem em bom número: como tratar e controlar as mastites? Como tratar e controlar as mastites? Como impedir as parasitoses? E em se tratado de gado europeu, como controlar os carrapatos? Muitas das respostas, desta vez, os próprios brasileiros terão que formular, uma vez que os modelos de produção de leite orgânico, hoje, estão em países de clima temperado. Mas, de antemão, há algo para ser estudados na produção de leite por animais de origem zebu, totalmente adaptados ás condições tropicais do País, com exigências mínimas de certos insumos, porém com a produção bastante aquém das explorações tidas como economicamente viáveis. Mas vale destacar que este fato pode representar uma alternativa importante para aumentar a de receita destes pequenos produtores, pois o litro de leite orgânico supera a casa dos R$ 2,00 para o consumidor final. De qualquer forma, já existe um alento vindo da Embrapa Gado de Leite, do Campo Experimental de Coronel Pacheco/MG (CECP), que está desenvolvendo uma pesquisa para tentar gerar respostas mais efetivas.
Com certeza, dois são os grandes desafios para a produção do leite orgânico. O primeiro deles recai sobre a mão-de-obra instalada na fazenda e procedimento de controle sanitário. As edificações da propriedade têm que ter, necessariamente, rede de esgoto; o que, em muitos, casos vão exigir seu tratamento, internamente. E isto, com certeza é bastante dispendioso. Também o lixo da fazenda merece cuidados. deve haver coleta de lixo seletiva, com transporte, por exemplo, para um aterro sanitário.
Com isso, os funcionários da fazenda precisam passar por toda uma reciclagem, reorientando seus próprios comportamentos dentro da propriedade. Exemplificando, é necessário que periodicamente se submetam a exames laboratoriais para controle de tuberculose e verminoses, entre outras doenças. Para aqueles que gostam de ter uma horta no quintal de casa, não há proibição, mas inúmeras recomendações de manejo devem ser respeitadas.
Uma fazenda próxima á capital paulista (130 km), a Serra Dourada, situada no município de Extrema/MG, neste momento passa pelo processo de pastagem da produção de leite convencional para a produção de leite orgânico. O responsável pela etapa é o agrônomo Carlos Aberto Rodrigues. Ele conta que a mudança de comportamento dos funcionários é um processo difícil, que requer acompanhamento diário e tempo para que a nova forma de viver, na fazenda, seja assimilada. É evidente que a passagem demanda recursos financeiros, pois as exigências aumentam em todos os sentidos do exercício da mão-de-obra – é preciso formar o profissional -, na prevenção de doenças e na obtenção da dieta que será oferecida ao gado, explica Rodrigues.
Mas as normas vigentes de produção do leite orgânico, apesar de rígidas, presumem a passagem de uma produção para outra. O item alimentação das vacas em lactação, por exemplo, exige que, no ato da certificação do produto, a dieta tenha, pelo menos, 50% de ingredientes orgânicos. Contudo, para se chegar aos 560, a legislação dá um prazo de cinco anos. Da mesma forma, a terapia para as doenças mais comuns não é um bicho de sete cabeças. Em caso de incidência de mastite, por exemplo, as normas exigem a apartação do animal acometido, o não aproveitamento do seu leite e o cumprimento do dobro do prazo de carência estipulado na bula do medicamento utilizado. Somente após o término deste prazo é que o animal poderá voltar a produzir.
Uma outra propriedade, situada em Chapecó – oeste de Santa Catarina, a produção de leite orgânico está em franca atividade. Além do produto não apresentar resíduos de antibióticos ou quaisquer outras substâncias químicas artificiais, o custo da produção caiu 30% e a remuneração, o preço pago pelo laticínios, aumentou 50%, em função destas características.
O casal Ivo e Nilde Malagutti, titulares da propriedade, contam que controlam berne e carrapato com calda de broto de pinheiro, um antibiótico natural. Uma outra calda, agora á base de sabão é óleo de soja, trata as mastites, que são em números bastante reduzido. Assim como na Serra Dourada, o grande trabalho fica para a prevenção de doenças, toda feita com a administração de medicamentos homeopáticos. Nilde explica que a terapia é mais demorada. Já, Rodrigues, que ela até fez subir a produção leiteira da Serra Dourada, pois os medicamentos fizeram uma verdadeira faxina nos úberes dos animais.
Normas – A Instrução Normativa Nº 7, do Ministério da Agricultura e do Abastecimento, de 17 de maio de 1999, estabelece uma série de procedimentos pertinentes á produção do leite orgânico. As exigências tocam na alimentação do gado, nas instalações, no manejo, na escolha dos animais, na sanidade e até no processamento do produto (empacotamento, por exemplo). Para alimentar o gado, a auto-suficiência na produção da dieta é o melhor caminho. Ela deve ser equilibrada e suprir todas as necessidades dos animais. O consórcio de gramíneas e leguminosas, na pastagem, é uma boa pedida. O plantio de árvores nativas, em sistema silvipastoril, é característica a ser atendida.