Pesquisadores da Embrapa Agroindústria Tropical (CE) desenvolveram clone de cajueiro que demonstrou excelente desempenho na região semiárida de altitude. O BRS 555, que acaba de ser lançado, é recomendado para o sertão do Seridó e para o semiárido serrano da mesorregião de Serra de Santana, no estado do Rio Grande do Norte. O elevado potencial produtivo é um destaque do clone, que registrou uma média de 2,7 mil quilos por hectare (kg/ha) de castanha do sexto ao nono ano de produção. A produção média do estado, em 2021, foi de 336 kg/ha, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Em média, a produtividade da castanha do novo clone foi 57,6% superior ao clone testemunha BRS 265, enquanto a produção do pedúnculo registrou um incremento de 60,4% na comparação com o BRS 265. A variedade apresenta uma amêndoa com bom peso, em média 2,5g.
Outra vantagem dessa nova variedade é a resistência à broca-do-tronco (Marshallius anacardii), praga com forte incidência e severidade na área serrana e que provoca a redução da copa, da estatura de plantas e, consequentemente, da produção.
De acordo com o pesquisador Francisco Vidal, para desenvolver o BRS 555 a pesquisa trabalhou na seleção fenotípica individual das plantas na fazenda Caucaia Agropecuária S.A, situada no município de Pio IX, no Piauí. Em seguida, os pesquisadores da Embrapa realizaram avaliações preliminares de clones no Campo Experimental da Embrapa, em Pacajus (CE). Posteriormente, a avaliação clonal dos genótipos selecionados e avalidação em área de produtor foram realizadas no município de Santana do Matos, região serrana do Rio Grande do Norte.
Parceria e produtividade
Domingo Divino é produtor rural e colaborador das pesquisas de campo desenvolvidas pela Embrapa. O BRS 555 foi testado em sua propriedade, no município de Santana do Matos, distante 205 km de Natal. “Os cajueiros foram plantados em 2010, mas só em 2014 começaram a produzir bem. Isso despertou a gente para fazer a colheita e medir os pesos dos frutos. Chegamos à conclusão de que o clone apresenta uma produtividade altíssima”, declara.
Divino destaca a resistência do novo clone à broca-do-tronco, praga com forte incidência na microrregião de Serra de Santana. “Os cajueiros são muito atacados pela broca-do-tronco aqui na região. E a gente notou nesses anos de pesquisa que o BRS 555 se destacou por não ser suscetível”, explica.
O produtor relembra a sua história na revitalização da cajucultura na região em que se localiza a sua propriedade. “Eu comecei como diarista, trabalhando na limpeza de caju na propriedade de outras pessoas que, na época, cultivavam cajueiro gigante. Até que apareceu um treinamento sobre cajucultura abordando substituição de copas e enxertia e, a partir disso, eu comecei a incentivar os produtores a enxertar, até enxertava para eles gratuitamente”.
Ele conta que ganhou notoriedade por seu trabalho quando passou a produzir mudas para vários estados. “Hoje, eu sobrevivo da venda muda de caju. Consigo vender minha produção para o Ceará, Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte”, complementa.
A importância dos clones para a cajucultura
No campo, são criadas técnicas de manejo que incluem irrigação, controle fitossanitário e condução de podas. Na indústria, são pensados caminhos que possibilitam o processamento integral do caju, agregando valor a cada fase da matéria-prima. No entanto, é nos laboratórios e campos experimentais que a Embrapa projeta o seu produto tecnológico com efeitos mais duradouros: os clones.
As variedades de cajueiro-anão desenvolvidas pela Embrapa abriram rotas para a otimização econômica da cadeia produtiva.
Obtidos por meio de um programa de melhoramento genético, os clones possibilitaram a redução do porte e a uniformização das plantas, proporcionando o aproveitamento do pedúnculo e a modernização dos tratos culturais e fitossanitários, imprescindíveis ao aumento de produtividade. Agregou-se a isso, a resistência ao estresse hídrico e algumas pragas e doenças, oferecendo aos produtores maior produtividade, economia com técnicas de manejo e rentabilidade com o aproveitamento do pedúnculo como caju de mesa e na indústria de processamento de sucos e doces. Com o cajueiro gigante é difícil aproveitar o pedúnculo, pois o porte da planta inviabiliza a colheita manual, que garante a maior integridade do fruto.
Nos últimos anos, a Embrapa Agroindústria Tropical instalou diversos experimentos para testar novos materiais clonais mais adaptados às regiões de cultivo. No Rio Grande do Norte, municípios como Serra do Mel, Apodi, Severiano Melo, Lagoa Nova, Parnamirim e Florânia atuaram como polos para o desenvolvimento de clones de cajueiro-anão.
Carlos de Medeiros Costa, secretário de Agricultura de Florânia, no sertão do Seridó (RN), destaca que a cajucultura do município passou por uma renovação com o aumento da produção, a seleção de qualidade e um novo padrão de mercado não somente para a amêndoa, mas também para o caju de mesa a partir da chegada dos clones da Embrapa.
“Hoje, Florânia tem entre 80% e 90% de cajueiro-anão precoce. Foi algo que revolucionou. Quem não migrou para o cultivo de cajueiro-anão precoce ficou para trás, pois muitos cajueiros gigantes estão improdutivos. Além disso, o produtor sabe que durante todo o ano ele vai ter essa renda do cajueiro, por isso ele cuida, investe, faz a poda, adubação, faz todos os tratos necessários. É de grande importância esse trabalho da Embrapa”, afirma o secretário.
Medeiros salienta, ainda, que o desenvolvimento de clones na região de Santana dos Matos foi imprescindível para a revitalização da cajucultura de Florânia, que agora conta com materiais adaptados às condições de clima e solo locais. “A maioria dos cajueiros são clones, principalmente do jardim clonal que a Embrapa trouxe, que é composto por variedades adaptadas aqui. Isso é importante, pois vimos com o passar do tempo que muitos projetos que traziam mudas produzidas em outras condições não tinham bons resultados de adaptação”, lembra.
Conjunto de medidas desenvolveu cajucultura no RN
O Rio Grande do Norte ocupa um papel importante na cajucultura brasileira. Em 2021, foram produzidas no estado 16.920 toneladas de castanha de caju, situando-o como terceiro maior produtor nacional, atrás somente do Ceará e do Piauí, respectivamente.
A cajucultura local sofreu fortes impactos antes da inserção das tecnologias desenvolvidas pela Embrapa. A estiagem e o envelhecimento dos pomares foram preponderantes para a redução da produtividade de caju no Rio Grande do Norte. A seca severa registrada entre 2012 e 2017 impossibilitou o plantio de várias culturas e sentenciou à morte os antigos cajueiros existentes nas propriedades de Serra de Santana, no sertão do Seridó (RN).
O cenário da cajucultura do Rio Grande do Norte passou a se modificar com o desenvolvimento de um conjunto de movimentos articulados pela Embrapa Agroindústria Tropical em parceria com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae-RN) e os órgãos públicos das regiões pertencentes à cadeia produtiva do caju. A partir da adoção do cultivo de clones de cajueiro-anão desenvolvidos pela Embrapa, os agricultores potiguares conseguiram preservar seus pomares produtivos, mantendo sua renda.
“A cajucultura vem sobrevivendo por força e mérito dos cajucultores e de parceiros como Embrapa, Sebrae, Senar e empresas privadas”, ressalta Elano Gomes, presidente da Câmara Técnica da Cajucultura (Catec – RN).
Entre as demais atividades que objetivam fortalecer a atividade e ampliar a produtividade em território potiguar destacam-se: a criação de novos viveiros para recuperação dos cajueiros antigos, capacitações, consultorias, missões técnicas para técnicos e produtores e, primordialmente, a adoção de clones mais produtivos e compatíveis com as condições edafoclimáticas do Rio Grande do Norte, a exemplo do BRS 555.
Franco Marinho, gestor de Fruticultura do Sebrae-RN, ressalta o trabalho para revitalizar a cajucultura potiguar e desenvolvê-la nas regiões serranas: “Nós estamos fazendo esse trabalho para revitalização em todo o estado do Rio Grande do Norte. A região mais adiantada é a oeste, com Mossoró, Apodi e, principalmente, Serra do Mel. A expectativa com o BRS 555 é intensificar as ações de revitalização na Serra de Santana e Mato Grande, na região serrana do RN. Além dessa zona, inseri-lo nas regiões serranas do Alto Oeste Potiguar, contribuindo com o aumento da produtividade e qualidade dos nossos cajueiros”, analisa.
Foto: Ricardo Moura / Embrapa Agroindústria Tropical