Uma tese de doutorado defendida pela aluna Manoela Mendes Duarte, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), com orientação da Embrapa Florestas (PR), mostra que, ao passar pelo processo de tostagem para elaboração de chá, a erva-mate perde uma parte de seus compostos químicos e bioativos. Atualmente, a erva-mate (Ilex paraguariensis) é usada no preparo de bebidas de duas formas: chimarrão e tererê, preparados com o mate verde; e chá, preparado com o mate tostado.
Segundo o pesquisador da Embrapa Ivar Wendling, que orientou Duarte, o estudo também buscou respaldar o trabalho de melhoramento genético da erva-mate. “Estamos desenvolvendo cultivares com alto teor de cafeína e cultivares descafeinadas, e testando a resposta de alguns processos de beneficiamento nos teores dos compostos bioativos. Ou seja, materiais diferenciados quimicamente. Nossa dúvida era saber se os processos de tosta tradicional da erva-mate mantêm a qualidade fitoquímica”, explica.
O resultado das análises mostra que o processo de tosta para produção de chá-mate influencia significativamente os teores de compostos bioativos e as metilxantinas como cafeína e teobromina. “As elevadas temperaturas utilizadas durante o processo de tostagem ocasionaram uma redução média de 32% no conteúdo de cafeína nos genótipos estudados, o que mostrou que a temperatura tem relação direta com o processo”, relata Manoela Duarte. Já os ácidos cafeoilquínicos (compostos fenólicos veja quadro ao lado) se mostraram os mais estáveis após o processo da tosta. A atividade antioxidante teve redução média de 19,5% e o teor de compostos fenólicos totais apresentou redução média de 22% após o processo de tosta. “É importante ressaltar que os resultados para capacidade antioxidante são in vitro e a absorção desses compostos pelo organismo deve ser estudada”, esclarece Duarte.
Os resultados apresentados mostram a importância de conhecer os materiais genéticos utilizados para produção de chá-mate de melhor qualidade e padrão fitoquímico de interesse do consumidor. “A indústria deve se preocupar com as características iniciais da matéria-prima e os métodos de beneficiamento, considerando as perdas e diferenças existentes, a fim de garantir ao consumidor produtos com maior quantidade de compostos bioativos de interesse. Conhecer quimicamente o perfil dos genótipos permite elaborar produtos diferenciados, agregando valor e qualidade aos chás produzidos”, explica a pesquisadora Rossana Catie de Godoy, da Embrapa Florestas, que participou da pesquisa.
A pesquisa analisou as cultivares em desenvolvimento pela Embrapa e amostras de marcas comerciais. Essas últimas apresentaram valores menores nos compostos fenólicos, na atividade antioxidante, nas metilxantinas e nos ácidos cafeoilquínicos, quando comparadas às demais amostras cafeinadas. “Isso mostra que os resultados do programa de melhoramento genético da erva-mate da Embrapa, focado em propriedades químicas, está sendo eficiente”, frisa Wendling. Por outro lado, o desenvolvimento de produtos descafeinados é uma alternativa para os consumidores que têm algum tipo de problema de saúde e não podem consumir cafeína. “O consumo de produtos cafeinados é contraindicado em casos de doenças cardiovasculares graves, úlceras, tensão nervosa e insônia e a versão de produtos com baixos teores desse composto é uma alternativa para esse público”, explica Manoela Duarte.
Além de investir em materiais de melhor qualidade genética, também é preciso inovar no processamento da erva-mate, para reduzir as perdas dos compostos. “Não adianta disponibilizar cultivares melhoradas de erva-mate ao mercado e elas serem secas da maneira tradicional, com perda de compostos antioxidantes e cafeína. Agora, iremos pesquisar métodos que possam manter os compostos bioativos no processo de secagem e tostagem”, anuncia o pesquisador.
“O que queremos”, continua Wendling, “é melhorar um produto que já é amplamente apreciado pelos consumidores, com o incentivo a plantios direcionados a esse mercado, com as cultivares apropriadas, e apoiar as indústrias no desenvolvimento de novos produtos”. A pesquisa está na fase de avaliação das cultivares em campo, com experimentos no RS, PR e SC, e precisa passar ainda pelas fases de comprovação das composições químicas diferenciadas. “Com isso, temos a expectativa de disponibilizar as cultivares em três a seis anos”, explica o pesquisador.
“O estudo também permite que se obtenham produtos com perfil químico conhecido, o que possibilita o direcionamento para mercados específicos, como, por exemplo, produtos com diferentes teores de cafeína e compostos fenólicos e com maior valor agregado no desenvolvimento de novos produtos alimentícios”, aponta Cristiane Helm, pesquisadora da Embrapa Florestas.
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