Projeto, que reúne diversos criatórios de referência, quer identificar com maior exatidão e rigor touros realmente melhoradores para o desenvolvimento acelerado da raça Angus.
Ter dados precisos sobre os grandes pontos que tangem um animal na pecuária, e dessa forma selecionar os melhores para a coleta e venda de sêmen é o que rege o projeto do Centro de Referência Angus (CRA), da Fazenda Verdana, localizada no município de Itatinga, interior do Estado de São Paulo.
Bruno Grubisich, diretor da Seleon Biotecnologia e sócio da fazenda, conta que o programa consiste em uma prova de desempenho in-dividual, onde uma série de características ligadas a produtividade e a economicidade dos indivíduos é avaliada. “Cooptamos machos de vários criatórios contemporâneos e trouxemos aqui para a propriedade”. Lá, eles passaram por um período de adaptação e depois por uma prova de desempenho de eficiência alimentar, por uma avaliação de conformação de carcaça, precocidade de carcaça, musculosidade e umbigo corrigido (CPMU), ultrassonografia de carcaça, carrapato e pelo, entre outras. A partir daí os líderes que se destacaram nestas características foram direcionados a central para fazer uma análise da qualidade seminal para ser congelado e usado em programas de Inseminação Artificial por Tempo Fixo (IATF). “Aqui então temos os melhores indivíduos, os que se destacaram para cada categoria, conforme o desempenho e estes são os que nós direcionaríamos para ser eventualmente doadores de sêmen comercial, porque tem os argumentos bons pelo seu próprio desempenho”, declara. O diretor comenta esperar que estes sejam os futuros touros produtores de F1, que são os filhos de pai e mãe puros de raças distintas.
José Bento Sterman Ferraz, é professor titular de genética e melhoramento animal da faculdade de zootecnia e engenharia de alimentos da Universidade de São Paulo (USP), e diz que este projeto foi bem estruturado e trabalha com ele desde o começo, na definição do número de animais, o que seria medido e qual seu objetivo. “Queremos identificar touros que sejam adequados a cruzamento com vacas Nelore, produzindo bezerros economicamente viáveis e com a qualidade de carcaça e no futuro, até de carne, adequados ao mercado”, diz.
O docente comenta que o resultado pode variar e que nunca sabe o que irão conseguir, pois o animal colocado a prova poderá surpreender positiva ou negativamente. “Então conseguimos fazer uma análise genética dos 65 animais do programa e a avaliação genética com muita consistência”.
Estes touros serão testados em vacas Nelore, e apesar de irem a leilão, já vão com sêmen colhido para ser utilizados nesta estação de monta. “Acho isso brilhante, colocar a prova no campo, na vida real animais que selecionamos numa condição quase que experimental”, comenta Ferraz. Para ele, este é o caminho que a pecuária precisa tomar, ou seja, mostrar quem é que colhe resultado no campo, e é isso que estão tentando trabalhar e o estimula a estar junto num projeto como este da Verdana.
Funcionalidade do projeto
Os 65 animais participantes do CRA são provenientes das principais propriedades localizadas nos Estados de São Paulo, Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Grubisich diz que os indivíduos foram pré-avaliados e selecionados por um técnico da raça Angus, e todos saíram com avaliação positiva dos seus criatórios, que por sua vez foram selecionados porque primeiramente compraram a ideia e que podem contribuir positivamente por já ter um trabalho consistente, e já ter linhagens bem trabalhadas. “Então trata-se de um sistema de parceria, onde a Verdana fomentou toda essa prova, trouxe estes animais, fez a adaptação, fez toda testagem, com a ideia de disseminar o máximo possível essa genética e esse conceito para que consigamos ter mais parceiros usando”, declara. Segundo o empresário, o grande objetivo do CRA é que a partir dele se utilize esta genética em suas propriedades e na dos parceiros. “Vamos receber estas informações dos bezerros de volta e levar eles até gancho para sabermos se efetivamente o que estamos selecionando aqui está chegando lá na ponta como um produto carne de qualidade”. Assim sendo, será possível e viável elaborar um sumário de cruzamento industrial, o que é algo inédito e que leva tempo, investimento e trabalho. “Mas é fundamental para a valorização da pecuária brasileira”, comenta. Esse projeto busca ter um impacto positivo na pecuária e é tangível no sentido que seus idealizadores estão entendendo melhor como se combina duas raças que são tão diferentes. “Isso terá impacto em produtividade, visto que estamos buscando o melhor F1, aquele que vai ser mais eficiente. Acho que a cultura da ava-liação demorou um pouco mais para entrar no Brasil, mas hoje é realidade”, declara Grubisich. Para ele, hoje não se vende touro sem avaliação e o produtor está cada vez mais ligado ao índice de produtividade e ao o que é uma Diferença Esperada na Progênie (DEP). “Creio que na esteira deste movimento de entender as avaliações, chegamos com uma proposta bem focada e direcionada para o objetivo de cada propriedade”. No CRA foram criados grandes índices econômicos e a ideia é direcionar melhor para contribuir na busca por mais informação e mais confiança para quem quer utilizar o F1.
“Considerando que temos animais que comem 4 kg de alimento, para ganhar 1 kg, e animais que comem 20 kg, se conseguirmos selecionar touros que são eficientes no uso da comida e que são bons de carcaça, de crescimento, teremos os touros ideias para cruzamento”, declara o professor Ferraz. Ele comenta que hoje no Brasil ninguém tem este tipo de informação. “Na verdade, até os melhores países do mundo não a tem e não sabem quão eficientes são os touros que estão sendo utilizados no cruzamento”.
Encabeçando os melhores
Depois das avaliações realizadas nestes animais, um ranking foi feito para mostrar os resultados obtidos pelo CRA. Assim, estar entre os dez ou cinco melhores já deveria ser orgulho para qualquer pecuarista. Imagine então quão grande é a felicidade de conseguir estar com animais na primeira e na segunda colocação desta lista. É assim que Nivaldo Dzyekanski, produtor rural da região de Itaiópolis (SC), está se sentindo. Ele, que é dono da Brasil Florestal, e cuida de gado a 12 anos diz que o trabalho na pecuária vem em decorrência da outra atividade que possui, que é a exportação de madeira plantada, reflorestada, de pinos. “Recuperei uma área que já era da minha família, e nessa área comecei a cultivar gado. Fomos pesquisar raças para escolher alguma para criar, e escolhemos o Angus”, comenta. A partir daí o produtor foi aos Estados Unidos e Argentina para conhecer os melhores criatórios, e, como Santa Catarina é o único Estado da Federação que é fechado à aftosa, teve que importar os embriões para iniciar a criação.
O produtor assume e é sincero ao dizer que não esperava estes resultados tão positivos de seus animais já no começo do projeto, mesmo sabendo que sua genética é apuradíssima. “Somos por cinco vezes consecutivas líderes do ranking de Santa Catarina. Temos um plantel de elite, mas aqui, aonde estão os melhores do País todo, não esperava ter o primeiro e o segundo lugar”.
Ele conta que acreditou no projeto porque os criadores de Angus no Brasil não têm a estrutura que o laboratório possui, para fazer os testes dos animais, para fazer os comparativos dos itens, além do conhecimento e experiência. “Então aqui se trata de uma junção de forças, pois os criadores têm os animais, que são os melhores do País, e a Seleon com o CRA tem a estrutura para obtermos os resultados positivos, além da seriedade do trabalho aqui realizado”, declara.
No Brasil o sêmen que mais se utiliza é o de Angus, mas apenas 10% deste sêmen é brasileiro, o resto é importado. “Isso pode deixar de ser negócio um dia, porque o que vem de fora está em condições diferentes das nossas, seja em clima, nutrição alimentar, entre outros”. Dessa forma, para Dzyekanski o caminho é difundir os touros nacionais, que já estão melhor adaptados. “Assim vamos chegar melhor ao objetivo de nós, criadores, que é vender este material”, comenta. Investir no futuro da pecuária
Tanto para quem cria, quanto para que adere um projeto como este é necessário o planejamento de investimento, para que primeiramente o programa funcione, e depois, gere os resultados para os dois lados da parceria. Grubisich diz que o CRA é um meio para um fim maior, se tratando de uma unidade de negócios e por isso tem que ser lucrativo e, autos-sustentável. “Teve o investimento importante tanto da nossa parte, quanto dos parceiros, onde é até difícil dimensionar um valor. Mas instalamos toda estrutura física e técnica, a parte de manejo e nutrição dos animais e a própria testagem na central”, diz. Ele comenta que no plano de negócios, imagina ter o retorno do investi-mento feito em aproximadamente três ou quatro anos, e crê que pessoas entendam que este in-vestimento traz de volta um valor de informação que é superior a qualquer ação monetária que possa ter sido feita. Para Dzyekanski, este programa vai agregar bastante à pecuária nacional, porque terão os sêmens de animais já adaptados e um universo grande de animais. “Dados comparativos importantes e os critérios que eles estão utilizando aqui são bons, como por exemplo, testar carrapato, rusticidade, precocidade, entre outros, que são dados que vão ajudar o pecuarista brasileiro”.
Dessa forma, o pecuarista conta que o investimento não deve ser o empecilho por parte de seus colegas criadores. “É um programa que temos que recomendar a todos, não somente aos compradores, que tem um critério na compra de touro”. Segundo ele, a recomendação deve ir também aos homens do campo, criadores da raça, para que somem forças ao projeto. “Quanto mais animais tivermos aqui, mais apurada vai ser a qualidade e todos vão ganhar com isso. Os lucros colhidos com certeza serão maiores do que o aporte que demos no início”, declara.
O empresário e sócio da Verdana comenta que a ideia é ser um veículo para viabilizar a venda de genética Angus nacional, uma vez que os grandes criatórios já incorporaram as melhores genéticas do mundo. “Para a próxima fase do projeto a ideia é aumentar o número de indivíduos a prova, e eventualmente ter mais de uma prova por ano”. Além disso, o desejo é poder disponibilizar e democratizar cada vez mais este tipo de genética, com mais parceiros e com o crescimento e satisfação por parte de todos envolvidos no CRA.
“Valorizamos o trabalho do pecuarista brasileiro, que por sua vez tem uma vocação forte para este meio, e esse trabalho sempre será transparente, com todos os dados disponíveis para quem quiser acessá-lo”, declara Grubisich. O diretor diz que além disso, a Verdana está aberta a conversas para melhorar o programa cada vez mais. “Produtividade e eficiência são os nomes do jogo, e temos que partir para isso”.
Texto: Bruno Zanholo • Fotos: Leandro Maciel de Souza