Mais de um terço da população mundial está hoje em quarentena para reduzir a propagação do novo coronavírus (Covid-19). Neste momento de distanciamento social vivido por milhões de brasileiros – e bilhões de pessoas – pode surgir a dúvida: será que apenas humanos ficam em quarentena? A resposta é não. Materiais vegetais, como sementes, tubérculos e material in vitro também passam por esse período de isolamento, para evitar que pragas quarentenárias, como fungos, bactérias, vírus, nematoides e plantas daninhas existentes em outros países, entrem no Brasil e causem prejuízos para a nossa agricultura. Esta quarentena de plantas é uma prática comum e que ocorre há bastante tempo, não sendo motivada pela Covid-19.
A Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo mantém no Instituto Agronômico (IAC-APTA), em Campinas, o único quarentenário público de materiais vegetais do Estado de São Paulo. Além do IAC, apenas a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) possui um quarentenário público, localizado em Brasília. O quarentenário do IAC tem permissão do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) para receber todas as espécies de materiais vegetais. Em 2019, o IAC recebeu 143 quarentenas, totalizando em 14.648 acessos de diferentes espécies e países.
Segundo a pesquisadora do Instituto, Roberta Pierry Uzzo, esses materiais são importados por empresas e instituições científicas para o desenvolvimento de pesquisas e não são de uso comercial. “Essas sementes, por exemplo, serão usadas em estudos e servirão para o desenvolvimento de novas cultivares de plantas”, exemplifica.
Apesar do nome quarentena, o período de permanência desses materiais no quarentenário não é de 40 dias. “Isso depende muito. Há materiais que ficam no quarentenário por semanas. Outros, como toletes de cana, podem permanecer por anos, até conseguirmos verificar se de fato não há nenhum perigo de entrada de patógenos exóticos no Brasil. Isso é fundamental para a segurança fitossanitária da nossa agricultura”, explica a pesquisadora do IAC. Roberta conta que um tolete de cana, por exemplo, precisa ser plantado para verificar se os patógenos não se manifestam quando a planta cresce, levando meses ou até anos para que o resultado seja confiável.
Durante o período de quarentena, esses materiais são avaliados por profissionais da área de entomologia, matologia, virologia, fitopatologia e nematologia que realizam testes para identificar insetos, vírus, fungos, bactérias, nematoides e plantas daninhas. Eles são plantados em casa de vegetação e são monitorados diariamente, para observação de suas características e identificação de sintomas que indiquem a presença de pragas exóticas. São também realizados testes de laboratório em amostras coletadas de sementes com a finalidade de identificar possíveis pragas presentes. “Materiais importados em forma de cultura de tecidos ficam acondicionados em salas com temperatura e umidade controladas, conforme a necessidade da cultura. Os materiais permanecem isolados de outros materiais importados, em compartimentos de casa de vegetação ou laboratórios. Fazemos um laudo relatando todas as pragas que encontramos, tanto os patógenos que já existem no Brasil, como os exóticos”, conta. Quando patógenos exóticos são identificados, o fato é relatado ao MAPA, que determina a destruição do material.
Do aeroporto diretamente para o quarentenário
Assim que chegam nos aeroportos do País, os materiais vegetais vão diretamente para um quarentenário, seja ele do IAC ou de outras instituições públicas ou privadas. Existe um procedimento padronizado pelo MAPA, para introdução de materiais vegetais para pesquisa. A instituição solicita permissão ao MAPA, com informações detalhadas sobre o material a ser importado, como local de origem, número de acessos e quantidade. O quarentenário é consultado sobre sua capacidade de avaliação fitossanitária e então a instituição é autorizada a fazer a importação, já com data prevista para a chegada no País. No aeroporto brasileiro, eles passam por fiscalização do Ministério, que lacra os materiais com seu selo, e prescreve a quarentena. Eles então são transportados ao quarentenário por despachantes credenciados pelo MAPA ou por uma transportadora, também autorizada, atendendo todas as normas fitossanitárias de segurança.