Adoção de tecnologia tem! Alta produtividade de soja tem! Por isso o Estado tem se destacado nas duas últimas safras no Desafio Nacional de Máxima Produtividade. O resultado reflete o potencial que a nova fronteira agrícola tem a oferecer à produção de grãos brasileira.
O Estado da Bahia está muito distante das produtividades máximas de soja, segundo o levantamento histórico da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).
Da safra de 2000/2001 pra cá, a unidade federativa obteve uma média de 2.589,2 quilos por hectare (kg/ha) ou 43,15 sacas por hectare (sc/ha). Rondônia e Mato Grosso possuem os melhores rendimentos da oleaginosa, comparando os resultados das 12 últimas temporadas. Eles têm rendido 3.049,4 e 3.010,5 kg/ha, respectivamente, ou 50,82 e 50,18 sc/ha. Mesmo diante das estatísticas, dois produtores têm provado há duas safras consecutivas de que o solo baiano pode ser tão produtivo quanto às terras rondonienses ou mato-grossenses.
Com o uso de alta tecnologia, Roberto Pelizzaro, da fazenda Veneza, e Demétrio Guimarães Parreira, da fazenda Serrana, conseguiram obter 101,77 sc/ha e 108,71, respectivamente. Ambos os produtores são de Correntina (BA), município que está na porção sudoeste do Estado, e foram destaque nacional nas duas últimas edições das três do Desafio Nacional de Máxima Produtividade, desenvolvido pelo Comitê Estratégico Soja Brasil (CESB). A entidade sem fins lucrativos é formada por profissionais e pesquisadores de diversas áreas que se uniram para trabalhar estrategicamente e utilizar os conhecimentos adquiridos em suas respectivas carreiras e suas vivências, em prol da sojicultura nacional.
Na safra de 2010/2011, Pelizzaro apresentou o resultado de 101,77 sc/ha. Naquele mesmo ano, pelo levantamento da Conab, o Estado registrava 56 sc/ha – o incremento do produtor gerou um crescimento de 81,73% da produtividade. Já na temporada subsequente, Parreira demonstrou que o potencial das terras baianas pode chegar a um resultado de 108,71 sc/ha – a maior produtividade já obtida pelo desafio do CESB. A alta foi de 128,05% sobre a média de 47,67 sc/ha que a lavoura de soja garantiu à produção baiana na safra 2011/2012.
Fronteira nova e produtiva
O Desafio Nacional de Máxima Produtividade reflete, em parte, o potencial que essa nova fronteira agrícola do País deverá experimentar nos próximos anos. Maranhão, Piauí, Tocantins e Bahia formam o que se pode chamar de Mapitoba, a nova fronteira agrícola nacional – ou o Nordeste Cerrado, como foi definido pelo Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Icone). Especificamente no caso da soja, a entidade prevê um crescimento de 95,4% na produção nessa região, em função de crescentes ganhos em rendimento (quilos por hectare), favorecidos pela adoção de tecnologias.
Ivair Gomes, técnico e consultor agropecuário da região de Correntina, acompanhou de perto a evolução da lavoura de soja por lá. “Hoje aqui no oeste da Bahia, tais produtividades são atingidas graças às tecnologias aplicadas. Alguns produtores já superam 80 sacas de média em suas propriedades. Quando se iniciou a cultura da soja aqui, há cerca de 25 anos, esse resultado girava em torno de 30 sc/ha”.
Com o passar do tempo, de acordo com Gomes, cresceram os investimentos no Estado com calagem, fosfatagem, gessagem e adubação com micronutrientes – todas essas técnicas são balanceadas de acordo com análise de solo, nutrição foliar com micronutriente e aminoácidos. Outro fator de investimento também foi através da introdução de materiais genéticos – novas cultivares – mais produtivos e adaptados à região, além do uso da mecanização. “Para se ter uma ideia, em abertura de áreas novas hoje, já conseguimos, no primeiro ano de plantio de soja, uma produção de até 50 sc/ha. Então, muita coisa mudou dentro deste período. Creio que nos Estados vizinhos como Piauí, Maranhão e Tocantins, cujos os solos são bem parecidos, também já se consegue ver essas tais produções”.
Os bons ventos sopram a favor
Tanto Pelizzaro quanto Parreira tiveram o auxílio de Gomes para a elaboração dos projetos agrícolas vencedores no desafio do CESB. Na fazenda Veneza, a área para o teste de alta produtividade foi de 10 ha, a qual foi semeada em 25 de novembro de 2010 com uma variedade não transgênica. O plantio foi cruzado com espaçamento de 45 centímetros (cm), com 14 sementes por metro quadrado.
Entre os fatores de maior contribuição para atingir o alto rendimento da lavoura esteve justamente o qual os produtores não têm como interferir – o clima. Segundo Gomes, as chuvas, por exemplo, tem garantido uma média anual de 1.500 milímetros (mm) nos últimos 20 anos, distribuídos nos meses de outubro a abril. O fator altitude também auxiliou. Pela região há registros de áreas que chegam a 1.000 metros (m) do nível do mar. A essa altitude, são criadas condições de temperaturas amenas, associadas a um clima predominantemente seco. Essas características influenciam no bom desenvolvimento das fases de maturação e colheita, segundo a Circular Técnica 40 – Tecnologia da produção de semente de soja de alta qualidade, da Embrapa Soja, de Londrina (PR).
Nos tratos fitossanitários, o plantio foi com Trichoderma sp. (fungo que possui um alto potencial de controle biológico para doenças de raízes) e nematicida natural, a base de fungos com enraizador e inoculante, sem produto químico, evitando assim a presença de mofo, o que propiciou as plantas terem melhor engalhamento e enraizamento.
Se por um lado o desempenho foi surpreendente, por outro, o incremento tecnológico tornou a cultura um pouco mais onerosa. “No entanto, com a mesma variedade com a qual eu alcancei esta produtividade, meu pai conseguiu 92,5 sc/ha em 150 ha sem ser plantio cruzado”, ressalta Pelizzaro. “Então, o que dá para entender é que temos de correr atrás de produtividade, mas devem ser avaliados também o potencial de variedade, as técnicas a serem adotadas e o fator clima. Nessa situação é necessário ter um olho clínico para tudo, mas a gente chega lá”.
O histórico do produtor na região remete a uma jornada de 27 anos. Em 25 de julho de 1985, ele chegava ao município baiano com a família para conduzir as lavouras de soja e milho.
Atualmente são 1.640 ha cultivados, dos quais, cerca de 30% são destinados ao milho verão e os outros 70%, à soja.
Recorde em produtividade
A área experimental de 10 ha da fazenda Serrana recebeu o plantio em 15 de dezembro de 2011 por um material transgênico. A técnica de semeadura também foi cruzada, com espaçamento de 50 cm, o que garantiu 290 mil plantas finais. A associação do dobro da população recomendada, um material genético altamente produtivo e o favorecimento do clima, com chuvas bem distribuídas, também foram os pontos positivos para a obtenção do resultado da fazenda. Além disso, a lavoura contou com adubação de cobertura com ureia, tecnologia aliada com herbicidas, inseticidas, fungicidas e adubação foliar com aminoácidos.
“O que nos motivou a entrar no desafio foi justamente tentar, dentro das nossas condições climáticas, uma produtividade histórica”, frisa Parreira. E, de fato, ele conseguiu – 108,71 sc/ha passa ser o novo recorde do desafio do CESB. Na primeira edição da competição, na safra 2009/2010, o produtor paranaense Leandro Sartoteli Ricci chegara a marca de 108,4 sc/ha.
De acordo com os cálculos de Gomes, o custo da lavoura foi de mais de 54% que a média observada na região, fechando um custo de mais de R$ 2.000 por hectare (o custo médio do Estado da Bahia gira em torno de R$ 1.300).
Há 25 anos a fazenda Serrana tem conduzido os cultivos de soja, milho e algodão em Correntina, sob um sistema de rotação, nos três mil ha dispostos para a agricultura. De acordo com Parreira, há cerca de quatro anos, o consorciamento Santa Fé (braquiária de milho) rendeu boas produtividades em função da melhoria da estrutura do solo. “Hoje podemos ver a nossa produção em forte ascensão. As atenções estão voltadas aos controles físico, químico e biológico, como, por exemplo, a doença do mofo branco, que atualmente anda quebrando bastante a safra”, diz Parreira.
O produtor também é um dos que apostam no futuro promissor da Mapitoba na produção de grãos. “Devido à tecnologia aplicada, tanto em manejo de perfil de solo quanto a maquinários de última geração, podemos minimizar os erros excessivos nas aplicações de defensivos, adubos e sementes, além de trazer uma maior perfeição na condução da lavoura”, ressalta. Em termos de correção das técnicas, no relatório final do desafio, constou a informação de que a produtividade da Serrana poderia ser até maior se a época de semeadura ocorresse em novembro. Talvez esse dado possa refletir num próximo destaque à região nos desafios que ainda estão por vir – o maior deles, alimentar o mundo.