Pelo cenário atual, a pecuária de corte intensiva tem apresentado sinais de desgaste financeiro. Apesar da supervalorização da arroba do boi, os custos também estão mais altos e com perspectivas de um mercado mais fechado. Mesmo assim há indícios de que esse cenário possa se reverter.
Não parece animador o cenário atual da pecuária de corte no País, em especial, o sistema de engorda intensivo do rebanho, caracterizado pelo confinamento. As pressões vêm de todos os lados – alta nos preços dos principais insumos que compõem a alimentação do gado, que, por sua vez, majoram os demais ingredientes da dieta; e a supervalorização também dos preços do boi magro.
De acordo com o especialista em mercado de carne da Scot Consultoria, Alex Santos Lopes da Silva, há praças no Estado de São Paulo em que essa categoria de animal é negociada entre R$ 1.500 a R$ 1.600.
“Este ano é estimado um custo mais elevado para o confinamento se comparado ao ano de 2010. Isso em função dos principais insumos utilizados como o milho, o farelo de soja, que acabam sendo balizadores de outros ingredientes. Há o alcance de valores 50% maiores dos verificados no ano passado”, compara Silva.
Na avaliação do consultor pecuário, o milho, por exemplo, tem preços fortes no momento em função de ter passado por uma crise de liquidez muito forte no primeiro semestre de 2010. Na época, havia muito grão para pouca demanda do produto – isso fez com os preços despencassem consideravelmente. “Foi uma situação muito ruim para o próprio agricultor, ao passo que, para o confinador, foi bastante favorável, pois pôde adquirir o cereal por um custo bem baixo”.
O quadro do milho começou a mudar, mesmo que de forma lenta, com o aceite do produto à exportação. Depois houve intervenções do governo, através de leilões, que serviram para melhorar os preços – uma situação que, segundo Silva, perdura até hoje. Já no caso do boi magro, foi justamente a falta dessa categoria animal no mercado que fez com que os preços alcançassem patamares mais elevados.
“Além disso, há a expectativa de crescimento de gado confinado em relação a 2010. Então, você vem numa dificuldade de compra de boi magro por falta de oferta. Quem tem esse animal para venda escuta que há a perspectiva de maior número de cabeças a serem confinadas, e, nisso, já percebe uma alta na procura. Nesse sentido, esse pecuarista acaba por reter ainda mais seus animais na busca de preços melhores, o que leva a uma consequente elevação dos preços do boi magro”, avalia Silva.
Péssimo negócio?
Grosso modo, os custos pertinentes à atividade de confinamento estão preponderantemente ligados a dois itens principais – a aquisição do animal para a engorda (boi magro) e a alimentação do rebanho, que correspondem, respectivamente, a cerca de 70% a 75% e 20%, no total dos custos.
A situação não vem se desenhando de bom grado a Edilson de Souza, produtor rural de Alto Paraíso de Goiás (GO). Ele possui um confinamento de pequeno porte com 1.200 animais, e ainda conta com a produção de grãos como soja, milho, feijão e sorgo.
Apesar de Souza desenvolver todo o ciclo pecuário com cria, recria e engorda – sem ter de precisar comprar animais – e ainda produzir os ingredientes necessários à alimentação, mesmo assim, o confinamento não tem compensado. “A pecuária para mim tem sido um péssimo negócio”, desabafa. “Apesar do preço da arroba estar alta desde o ano passado, os custos também aumentaram muito. Em 2010, falava-se em milho a R$ 14 [a saca de 60 quilos] na nossa região. Este ano a perspectiva é vender essa mesma saca a R$ 22. Ainda, estima-se um custo para a produção de uma arroba entre R$ 88 a R$ 90, ao passo que se fala num preço de venda desse mesmo peso, aqui na região, por volta de R$ 90 a R$ 95”, contabiliza.
Souza enxerga na agricultura um negócio mais rentável, pois é mais lucrativo a venda do milho, por exemplo. Nesse sentido, o produtor já tomou a decisão – deve parar com a bovinocultura de corte até 2013. “Estou saindo da pecuária de corte, estou com uma absoluta desilusão… Cheguei a conclusão de que o pecuarista no Brasil não tem direito a ter lucro… Isso fica mesmo nas mãos de multinacionais, frigoríficos, ou mesmo supermercadistas, mas o pecuarista, realmente, é o elo mais frágil dessa corrente”, afirma.
Para ele, não é pelo fato de ser pequeno na atividade que a situação se tornou mais agravante, e sim, por ser uma condição geral da pecuária de corte no País. “Eu, apesar de ser pequeno, modéstia parte, tenho uma visão empresarial do negócio, tenho absoluto controle de custos. Conseguimos produzir de uma forma muito racional e muito econômica, e, por isso, não há vantagem, uma produção em maior escala. Basicamente, pelo mesmo preço que eu vendo meu boi, o grande pecuarista está vendendo também”, frisa.
Ou negócio arriscado?
Já na opinião de Alberto Pessina, confinador de seis mil cabeças em Lençóis Paulista (SP), a atividade agora se tornou arriscada. “Pelo fato de o ano passado ter sido muito bom, há muita gente que acredita num 2011 semelhante, e isso é um risco muito grande. A economia no País não tem crescido como no ano passado, não há um mercado mundial aceitando carne como antes – em exportações, por exemplo, o volume desta safra deve ser 15% a menos em relação a 2010. Isso fará com que haja mais oferta de carne no mercado interno. Ainda, se realmente houver um pessoal animado para confinar, com perspectivas de crescimento de 30%, de acordo com as pesquisas da Associação Nacional dos Confinadores (Assocon) e do Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea), não haverá fatores para uma subida de preços da arroba. E, aí, está um cenário perigoso”, pontua Pessina. Pelos cálculos do pecuarista, a rentabilidade média atual do confinamento dele gira em torno de 0,81% – menos que uma aplicação bancária como o Certificado de Depósito Bancário (CDB).
Antenado com o comportamento do mercado e com as ferramentas de gestão de pecuária e de venda no mercado futuro, o produtor não vê horizontes positivos com os patamares de preços a que chegou o boi magro. “Os caras estão pedindo aí, por um garrote de 12 arrobas, na faixa de R$ 105 a arroba. Quer dizer, você vai vender no mercado futuro, e em outubro se fala num pagamento de R$ 100 a arroba do boi gordo. Esse preço fica praticamente inviável e, por isso, nem valeria a pena comprar esse boi magro”, constata. O produtor ainda segue no preenchimento das seis mil cabeças a serem confinadas. Restam apenas de 30% a 35% reses para completar o total. Pessina revela que não consegue encontrar animais a preços minimamente rentáveis. A estimativa é fazer as vendas de agosto a novembro.
A última esperança
Mesmo com a sinalização de negócios ruins para a bovinocultura de corte, Silva vê perspectivas para uma inversão do cenário atual em função da demanda mundial por alimentos, que deve se tornar mais pontual daqui para frente. “Quem conseguir ficar na atividade vai se dar bem. Isso não há dúvidas!”, acredita o consultor de mercado. “Passamos por um período, durante uns trinta anos, de redução da margem, do que o pecuarista recebia, mas isso já dá sinais de perda de força. Então, vemos uma arroba cotada a R$ 100, na safra, no Estado de São Paulo, isso é um preço elevado em relação aos anos anteriores”.
Na ótica de Silva, o sistema de confinamento traz vantagens pelo fato de se disponibilizar uma oferta de animais no período de entressafra, caracterizado pela baixa quantidade de boi gordo posto para abate. Em termos gerais, a totalidade de animais terminados nesse sistema de engorda ainda é baixo, sendo cerca de 5% da produção da carne bovina brasileira – os 95% restantes, provém da pecuária a pasto.
Confinamento deve crescer 31%
A Assocon projeta um crescimento de 31% no volume de gado confinado no País em 2011. Esse foi o resultado do primeiro levantamento da entidade realizado em abril, o qual comparou os números finais de 2010 com a expectativa de produção de seus associados para 2011.
Foram ouvidos 61 pecuaristas associados de 11 Estados (SP, GO, MT, MS, MA, PR, RJ, MG, PA, BA e RO). Sessenta e cinco por cento dos entrevistados acreditam que a produção de gado confinado no Brasil será maior do que em 2010, já 10% apostam em diminuição e 25% em estabilidade.
Segundo Bruno Andrade, zootecnista da Assocon e responsável técnico pelo levantamento, a expectativa para uma maior produção de gado confinado é alta, entretanto, a totalidade para cumprimento da meta de 2011 não está totalmente adquirida, apresentando somente, entre todos os entrevistados, a quantidade suficiente para se repetir os números de 2010.