Como as sementes geneticamente modificadas vêm tomando conta das lavouras brasileiras e trazendo lucratividade para os produtores. Os transgênicos deverão ser responsáveis pela maior parte da produção de grãos nos próximos anos e novas culturas deverão receber sementes modificadas.
A produção de culturas geneticamente modificadas, conhecidas como transgênicas, está crescendo a cada ano no Brasil e no mundo. O principal exemplo disso é a soja, já que mais de 50% da produção nacional é plantada com a tecnologia genética. A tendência para os próximos anos é de forte crescimento das culturas que já possuem sementes liberadas para comercialização e de cultivares, que ainda não foram contemplados com a tecnologia, deverão ser liberados para comercialização.
Os 23 países que cultivam transgênicos no mundo somam 114,3 milhões de hectares plantados com sementes GM (geneticamente modificada). Os números de 2007 apontam os EUA como os maiores produtores de transgênicos do mundo, com pouco mais de 50% de todas as lavouras GM do planeta, sendo 57,7 milhões de hectares naquele país. Aqui no Brasil são 15 milhões de hectares, sendo apenas 500 mil de algodão e o restante, 14,5 milhões, de soja. Em 2008 já tivemos um crescimento de área plantada, mas que ainda não pôde ser medido, e o milho Bacillus thuringiensis (Bt) também passou a ser cultivado neste ano, o que deve incrementar os números.
Considerado por muitos como o celeiro do mundo, o Brasil ainda tem muito a crescer neste ramo. Em 1998, o governo autorizou a comercialização da primeira semente de soja geneticamente modificada, mas um embargo à autorização até 2003 fez com que muitos agricultores brasileiros contrabandeassem sementes GM da Argentina. “Os produtores estavam vendo os argentinos conseguindo ótimos resultados produzindo a soja transgênica, e como aqui a questão da liberação tinha sido embargada, alguns começaram a trazer e plantar as sementes dos nossos vizinhos”, explica Alda Lerayer, diretora executiva do Conselho de Informações sobre Biotecnologia (CIB).
A segunda cultivar aprovada pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) foi o algodão em março de 2005. Após liberar a comercialização se inicia a multiplicação das sementes, o que demora cerca de um a um ano e meio. Por isso que o produtor brasileiro ainda não teve tempo suficiente para proliferar a cultura do algodão GM no País.
A última semente aprovada pela CTNBio foi a do milho, em maio de 2007. Na safra 2008 do grão, o transgênico deverá representar apenas 6,4% dos milharais no Brasil, mas esse número deve crescer muito para o próximo ano. As aprovações, não só do milho, estão sendo liberadas depois de diversos estudos de impacto do meio ambiente e na saúde humana. Só no mês de setembro foram aprovadas duas sementes de milho e uma de algodão. Agora os produtores brasileiros têm cinco opções de milho GM, três de algodão e uma de soja.
Exemplos de sucesso
Mas quem pensa que a biotecnologia só serve para o grande produtor está enganado. Números mostram que 90% dos agricultores que plantam sementes transgênicas são pequenos produtores. No mundo, dos 12 milhões de produtores, 11 milhões são pequenos. Apesar do algodão transgênico ter sido plantado em apenas 500 mil hectares, 70% do algodão na Bahia é produzido por meio da semente geneticamente modificada. Os produtores que aderiram a nova tecnologia estão felizes com os resultados e pretendem ampliar a plantação para a próxima safra. Um dos motivos do sucesso certamente é a redução de aplicações de defensivos, que antes eram cerca de 20 e hoje são cerca de sete. Além da redução de custo com a aplicação, tem o aumento do rendimento por hectare e da qualidade do produto colhido.
Produtores de Catuti, no norte de Minas Gerais, a 650 Km da capital Belo Horizonte, fizeram uma experiência com a semente transgênica do algodão. “Primeiro nós plantamos 40 hectares de algodão em cinco propriedades. Com o resultado surpreendente que tivemos na primeira colheita, espalhamos para os outros produtores. Hoje são 28 propriedades com 117 hectares de algodão GM plantados na região”, explica José Tibúrcio de Carvalho Filho, diretor regional norte da Associação Mineira dos Produtores de Algodão (Amipa). Segundo um dos produtores, José Alves de Souza, antes do uso da semente transgênica os algodoeiros da região já não conseguiam mais ter lucro e a produção diminuía a cada ano. O rendimento médio das lavouras da região era de 40 kg de algodão por hectare e agora a média passou para 190 kg na mesma área. “Além de ter aumentado a quantidade, melhorou muito a qualidade do algodão também. O custo de plantio é maior, mas na hora do lucro você também consegue muito mais”, diz Souza. Com isto, os produtores da região se juntaram para vender a mercadoria para a indústria têxtil e estão conseguindo melhor preço do que antigamente quando acabavam vendendo para atravessadores. “Hoje nós somos 28 produtores na região e estamos organizados como uma cooperativa. Com a garantia de produto de qualidade nós temos mais condições de negociar com as indústrias”, explica outro produtor da região, Francisco Neto. “Mas tudo isso foi feito com auxílio técnico. Para se usar a tecnologia, o produtor deve buscar conhecimento para ter um rendimento como tivemos aqui”, afirma Tibúrcio.
Soja
Produzida há mais de 10 anos no Brasil, o grão já representa 82% da soja plantada no Rio Grande do Sul e 65% no território nacional. As primeiras sementes plantadas em solo brasileiro eram argentinas que foram contrabandeadas do país vizinho por produtores gaúchos. “Nós conhecíamos os resultados da lavoura transgênica dos argentinos e assim que foi aprovada no Brasil, em 1998, nós começamos a plantar. Mesmo com o embargo da autorização, nós (produtores da região) nos reunimos e decidimos plantar transgênico porque achamos que o motivo do embargo incorreto”, afirma Almir Rebelo, produtor de soja e milho transgênicos. Localizado no maior município produtor de soja do Brasil, em Tupanciretã, a 364 km de Porto Alegre, o agricultor ainda usa sementes argentinas por considerá-las mais produtivas que a semente brasileira. “A semente argentina dá mais resultado e eu prefiro plantá-la, apesar de pagar os royalties”, diz Rebelo, que planta 60 hectares do grão, na cidade que produz em 140 mil hectares.
Porém, o gaúcho reclama da política de cobrança dos valores que as empresas detentoras da biotecnologia têm a receber. “Antes, nós, produtores, negociávamos direto com a empresa e pagávamos 1% de royalties. Agora, quem negocia o valor são as cooperativas e as associações de sementes que recebem uma porcentagem sobre o que é cobrado e assim nós já estamos pagando mais de 2% de royalties”, explica Rebelo.
Além de produzir soja, ele iniciou o plantio de milho GM. “Ainda é época de safrinha, mas para o ano que vem eu imagino que a plantação de milho Bt deverá dobrar no Brasil”, comenta o produtor gaúcho.
Primeira geração
Os produtores brasileiros de diversas culturas podem ir se preparando porque outras sementes estão a ponto de serem liberadas para comercialização. É o caso do arroz e do feijão. Segundo grão mais consumido no mundo, só perdendo para o trigo, o arroz já entrou com pedido de liberação pela Bayer CropScience. Apesar da semente estar pronta desde 2000, a empresa passou os últimos oito anos realizando testes de impacto sobre o meio ambiente e à saúde humana. “Os testes são demorados porque precisa analisar os impactos ao meio ambiente. Quais insetos podem morrer, se o solo será prejudicado e também a questão de segurança da ingestão humana”, explica o coordenador da pesquisa Arroz Irrigado da Embrapa Clima Temperado (RS), Ariano Magalhães Júnior. Ele é o pesquisador responsável por outra semente de arroz transgênica que a Embrapa desenvolveu, mas que não tem condições de seguir o curso até a aprovação. “A gente elaborou os estudos e já temos uma semente geneticamente modificada de arroz. O problema é que não temos recurso para prosseguir com os testes. Se a Bayer, uma empresa que tem interesse comercial na liberalização da semente, levou oito anos pesquisando, imagine a Embrapa”, diz. Para o produtor de soja transgênica, Almir Rebelo, o Governo é o maior culpado. “É irresponsabilidade do governo em não investir na biotecnologia. Ainda mais no arroz, um produto tão importante para o Brasil. Nós, produtores de transgênicos, somos a favor da biotecnologia. Nós gostaríamos muito de contribuir com a Embrapa comprando sementes dela para que possa ter outras pesquisas no futuro”, afirma o produtor.
A exemplo do arroz, outras culturas transgênicas já estão em fase de testes, como o feijão, a batata, o mamão, a cana-de-açúcar. Na Embrapa Arroz e Feijão (GO), está em fase de estudos uma semente que, segundo pesquisadores, deverá resistir ao problema da doença do mosaico dourado – que ataca lavouras em praticamente todos feijoeiros no Brasil.
“Nós ainda estamos na primeira geração dos transgênicos. Ainda temos muito para desenvolver e otimizar a produção brasileira de diversas culturas, não só de grandes lavouras”, explica a Diretora Executiva do Conselho de Informações sobre Biotecnologia (CIB), Alda Lerayer. Para ela, existem três gerações de sementes modificadas: a primeira é a que estamos vivendo agora, com as lavouras sendo preparadas para diminuir perdas causadas pelas pragas e doenças. Na segunda geração, os pesquisadores vão começar a adicionar valores nutricionais a essas sementes e, além de serem resistentes às pragas, os cultivos terão nutrientes de outros alimentos. E a terceira geração, será aplicada em plantas farmácias, que terão maior potencial de ação nos medicamentos o que trará avanço e redução de custos na área.