Pesquisa pública brasileira desenvolveu uma cultivar híbrida de melão do tipo amarelo recomendada para plantio nas condições ambientais da região do Vale do São Francisco, que concentra pequenos e médios produtores rurais. O melão BRS Anton foi desenvolvido no âmbito do programa de melhoramento genético do meloeiro da Embrapa e posiciona-se como uma opção para esse nicho de produtores, contribuindo para a competitividade e sustentabilidade da cultura nas localidades que margeiam o rio. A nova cultivar apresenta frutos doces, precocidade, boa produtividade e resistência a duas raças do fungo do oídio que ataca a planta. É resistente a danos causados durante o transporte e também ao frio, o que facilita sua refrigeração para a exportação.
“As condições ideias para a produção do melão são dias quentes, com alta luminosidade, alternados com noites com temperaturas amenas. Portanto, em todas as regiões do País, pelo menos em alguma época do ano, é possível cultivar melão. É claro que, na medida em que se caminha do Norte para o Sul, o número de meses favoráveis ao cultivo diminui. Já no Nordeste, as condições climáticas predominantes possibilitam o cultivo de melão praticamente durante todos os meses do ano”, avalia o agrônomo Valter Rodrigues Oliveira, pesquisador da Embrapa Hortaliças.
Embora a indicação de plantio do melão BRS Anton seja para a região do Vale do São Francisco, a cultivar também apresenta boa adaptação nos tradicionais polos de cultivo de melão do Nordeste, como o Vale do Açu, no Rio Grande do Norte, e a região do Baixo Jaguaribe, no Ceará. “É natural que as empresas multinacionais de sementes concentrem o desenvolvimento e a validação de novas cultivares no Rio Grande do Norte e no Ceará, que focam na produção de melão para exportação, um negócio muito rentável. O posicionamento do melão BRS Anton para o Vale do São Francisco é importante porque dará aos produtores da região uma nova opção de cultivar com características que se adequam muito bem ao sistema de produção local, agregando mais valor e competitividade para esse nicho”, pondera Oliveira.
Alta produtividade e resistência genética
O melão amarelo BRS Anton é uma tecnologia nacional, adaptada para as condições brasileiras e mais adequada para os sistemas de produção adotados no País. Na etapa de validação em áreas de produção comercial, a cultivar obteve um potencial produtivo de 35 toneladas por hectare, valor bastante superior à produtividade média do melão nacional, atualmente estimada em 25 t/ha.
Assim como ocorre com a maioria das espécies de hortaliças, o meloeiro sofre pressão grande de pragas e doenças, especialmente no Nordeste, onde o cultivo intensivo e o clima quente, intensificam a presença de problemas fitossanitários. Entre as doenças mais problemáticas do melão está o oídio, ocasionado por um fungo que se encontra amplamente disseminado pelo País.
“Quando o oídio incide no meloeiro com alta severidade, as folhas secam e os frutos ficam expostos, causando o que chamamos de escaldadura, ou seja, a queima do fruto pela exposição à radiação solar direta, afetando a produtividade da planta e a qualidade dos frutos, que ficam inadequados para comercialização”, explica o pesquisador, ao enfatizar a importância de a planta possuir resistência genética à doença, como é o caso do melão BRS Anton. A nova cultivar apresenta resistência às raças 1 e 2 do oídio, que predominam nas principais regiões de produção do melão do País.
A precocidade é outro atributo de valor do melão BRS Anton, que possui um ciclo de cultivo em torno de 64 dias a partir do transplante das mudas. Cultivares precoces ficam menos tempo no campo, logo, ficam menos expostas a condições ambientais adversas e menos expostas a doenças e pragas. De acordo com Oliveira, na maioria das vezes, a precocidade tem efeito direto na redução do custo de produção e, por isso, a busca pela precocidade é uma constante no melhoramento genético do meloeiro. Contudo, ela precisa sempre estar associada com alto rendimento e qualidade. Não adianta ser precoce se não entregar produtividade e frutos de boa qualidade.
Frutos doces e tolerantes ao frio
A rusticidade da planta, a longa vida pós-colheita e a resistência do fruto ao transporte são as características do melão amarelo que o tornaram líder do mercado nacional desde que ele começou a ser cultivado no país. Esses atributos também estão bem evidenciados no melão BRS Anton.
Os pesquisadores constataram que o principal diferencial da nova cultivar é a qualidade dos frutos do ponto de vista da resistência pós-colheita, visto que a maior rugosidade e espessura da casca minimizam os danos externos que alteram a qualidade sensorial da polpa.
“A casca rugosa e a polpa espessa e muito firme dão aos frutos do BRS Anton as qualidades necessárias para serem produzidos nos principais polos de produção de melão do Nordeste, como o Vale do São Francisco, e transportados até os centros consumidores mais distantes, no Centro-Sul do Brasil, com mínima perda de qualidade”, pondera Oliveira.
Outro atributo importante da nova cultivar é a tolerância ao transporte e ao armazenamento sob baixas temperaturas. Testes indicaram que os frutos do melão BRS Anton não apresentaram qualquer injúria externa ou interna, causada pelo frio, quando armazenados em temperaturas superiores a 8ºC.
A tolerância ao frio é um atributo importante para alcançar mercados consumidores mais distantes, o que confere dupla aptidão para a cultivar, pois ela também pode ser direcionada para exportação. “Os testes comprovaram que ele pode, sim, ser considerado um melão de dupla aptidão. Com pequenos ajustes no manejo da cultura, especialmente no espaçamento entre plantas, pode-se adequar o tamanho de frutos para um ou outro mercado”, comenta o pesquisador. No caso do mercado brasileiro, a tendência de consumo tem demonstrado preferência por frutos menores, em função de famílias com menos integrantes e consumidores que desejam evitar desperdícios.
Além do tamanho dos frutos, no topo da preferência dos consumidores estão os melões mais doces e, nesse quesito, o melão BRS Anton entrega muita qualidade. Segundo Oliveira, o teor de sólidos solúveis, que é a medida normalmente utilizada para se avaliar o grau de doçura dos frutos, atinge facilmente 13 °Brix, um indicativo de frutos bem doces.
A qualidade dos frutos de melão também está muito associada ao ponto exato do amadurecimento no momento da colheita, o que assegura um aroma mais acentuado e um sabor mais doce. O ciclo de produção do melão BRS Anton, do plantio até a colheita, é de cerca de 64 dias para a região do Vale do São Francisco. Quando alcança esse ponto, os frutos apresentam coloração amarela uniforme por toda a superfície, condição em que se tem a combinação ideal de sabor e consistência de polpa, o que torna o fruto muito agradável ao paladar.
O mapa do melão brasileiro
Historicamente, nas décadas de 1970 e 1980, a região do Vale do São Francisco era o maior polo produtor de melão do País, até que, no início da década de 1990, ocorreu uma alteração no mapa de produção de melão, com a migração da cultura para o Rio Grande do Norte e o Ceará, estados que hoje lideram os volumes produzidos e exportam parte significativa de sua produção para o mercado europeu. Já a produção de melão no Vale do São Francisco é destinada ao mercado interno, mais especificamente para os grandes centros urbanos consumidores das regiões Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul do País.
Nos dias atuais, no Vale do Submédio São Francisco, que engloba áreas do oeste de Pernambuco até o norte da Bahia, são plantados anualmente três mil hectares de melão, que equivale a 13% da área cultivada com essa espécie no País. Por ano, a região produz 55 mil toneladas de melão, que respondem por cerca de 10% a 12% da produção nacional.
A aptidão da região para o cultivo de frutas e hortaliças deve-se, sobretudo, a condições climáticas favoráveis – temperatura, umidade relativa e índices de precipitação – ao longo de todo o ano, sendo uma área especificamente reconhecida pelo cultivo de uvas de mesa e mangas com registro de Indicação de Procedência.
Novos melões na mira da pesquisa
O programa de melhoramento genético de melão da Embrapa concentra seus trabalhos no melão do tipo amarelo, no entanto, cultivares para o segmento dos tipos pele de sapo e cantaloupe também estão sendo desenvolvidas. A perspectiva é que no curto prazo seja disponibilizada uma nova cultivar de melão-pele-de-sapo, atualmente em fase de finalização.
Além da resistência ao oídio, os pesquisadores buscam por genes de resistência ao vírus do amarelão e à mosca-minadora para serem incorporados nas cultivares da Embrapa, uma vez que esses problemas fitossanitários causam muitos danos na cultura do meloeiro, especialmente na região Nordeste.
A trajetória do melão BRS Anton
A nova cultivar híbrida de melão BRS Anton foi obtida a partir do cruzamento de duas linhagens genitoras distintas, uma feminina e outra masculina. Os trabalhos de melhoramento genético da cultivar foram iniciados em 2005, quando foram formadas as duas populações que serviram de base para a seleção das linhagens. O processo de desenvolvimento da cultivar durou cerca de sete anos, seguido pelo período de testes de validação, que ocorreram entre 2013 e 2016.
No ano seguinte, foram realizados os trâmites para registro e proteção da nova cultivar, respectivamente, no Registro Nacional de Cultivares e no Serviço Nacional de Proteção de Cultivares, órgãos do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). Por fim, no último ano, foi realizado o licenciamento do melão BRS Anton para a empresa Agrocinco, responsável pela produção e comercialização das sementes da nova cultivar.
Tipos de melão
Os melões são divididos em dois grupos: aromáticos e não aromáticos. Fazem parte do primeiro grupo os melões que exalam aroma intenso e bem característico quando os frutos estão maduros, como é o caso do melão cantaloupe (casca bastante rendada e polpa laranja) e do melão gália (casca suavemente rendada e polpa verde). Os melões não aromáticos têm um aroma pouco perceptível, mesmo quando maduros, como acontece com o melão amarelo, principal representante desse grupo, seguido pelo melão pele de sapo, segundo tipo mais produzido no Brasil.
Transporte refrigerado de melão
A adoção da cadeia do frio no transporte de melões aromáticos, popularmente chamados de melões nobres, é uma necessidade até mesmo quando os frutos são destinados a mercados consumidores localizados próximos às áreas de produção. Esses melões, apesar de muito doces e saborosos, quando não são mantidos em baixas temperaturas depois de colhidos, perdem qualidade muito rapidamente.
Já para os melões não aromáticos, como o melão amarelo, a cadeia do frio para distribuição dos frutos para o mercado interno apenas tem sido adotada quando envolve mercados consumidores muito distantes dos centros de produção ou quando os frutos visam atender mercados mais exigentes, uma vez que a refrigeração agrega custos ao produto. Quando o melão se destina à exportação, a cadeia do frio é item obrigatório.
Foto: Divulgação / Embrapa