A segunda safra de milho brasileiro está causando grande alvoroço no mercado internacional de commodities. Os problemas climáticos resultaram em grande demanda e valorização do cereal no mercado interno fazendo com que muitos vendedores realizassem “washout” em contratos já firmados do exterior.
Para quem não está familiarizado com o termo, o “washout” é um método especial de acordo entre as partes quando um contrato de suprimento não será completado com a entrega física da mercadoria contratada. É um acordo que resulta no pagamento da diferença do preço do contrato e o preço de mercado, já que a entrega física da mercadoria não ocorrerá.
Segundo a economista e doutora em agronegócios, Claudine Saldanha Cesar Pinheiro Machado, CEO da boutique financeira Pinheiro Machado, esse acordo é feito sem declarar “default”, por exemplo, quando o vendedor sabe que não entregará a commodity contratada, antes de descumprir o contrato pode propor o “washout”, ou seja, propõe uma compensação ao comprador para que ele compre no mercado spot as commodities que não receberá na data contratada. “É importante notar que esse é um passo antes de declarar a falha em cumprir o contrato e que as partes firmam um acordo, ou seja, ambos precisam concordar com os termos desse acordo”, destaca.
Ainda segundo a especialista é fundamental que o acordo esteja bem documentado e que a forma de cálculo da diferença de preços fique clara, pois isso pode evitar uma discussão futura do próprio contrato. “ O ‘washout’ não é uma cláusula prevista em todas as negociações de commodities. Ela é um meio tradicional neste mercado de se liquidar um contrato que, por algum motivo, não poderá ser cumprido. É uma forma de solução negociada, cuja aceitação não é obrigatória para a outra parte”, ressalta.
A definição do valor do “washout”, contudo, pode ser controversa. Por isso, durante a negociação é importante estabelecer um critério tecnicamente efetivo de cálculo e redigir o acordo a termo. Isso é muito importante, porque muitas arbitragens e mesmo litigâncias internacionais envolvem questões desses acordos. “Se não for, a parte que se sentiu lesada deverá iniciar uma arbitragem em Londres, buscando indenização por perdas e danos”, diz a economista.
Possíveis impactos
O mercado internacional de commodities é sofisticado, as partes fazem hedge das posições quando assumem os compromissos contratuais. Nesse sentido, movimentos de curtíssimo prazo acontecem, especialmente, quando há quebra de safra. É importante ressaltar, contudo, que uma oferta de “washout” é corriqueira nos mercados internacionais e não é vista como uma ofensa ou julgada de maneira negativa.
Tampouco deve-se imaginar que a utilização de um costume de mercado para se fazer ajustes decorridos de variação de curto prazo, como o washout, seja utilizado apenas pelos produtores. Normalmente são as traders que se valem de mecanismo em contratos entre elas, muitas vezes em contratos circulares, onde há recompra do produto de uma pela outra. “Dessa forma, não acreditamos que uma proposta de washout possa impactar no relacionamento comercial entre as partes. Nem há que se falar em “ondas de cancelamentos”. Trata-se de um movimento tradicional nos mercados de commodities, de liquidar contratos quando há variação muito brusca dos preços no curto prazo”, reforça a CEO da Pinheiro Machado.
A especialista acrescenta ainda que não haverá impactos macroeconômicos para o setor como um todo, pois o comércio internacional de commodities não é tão frágil. Porém, no aspecto microeconômico, um washout mal negociado ou acordado sem formalidades mínimas pode trazer uma série de problemas para ambas as partes. “Se os contratos forem bem renegociados, pautados em comunicação escrita cuidadosa, mesmo que se tenha uma discussão arbitral posterior, os passos estão claros e tomados dentro de um padrão internacional como o do Gafta, por exemplo. Isso amplia a capacidade de defesa em um tribunal arbitral estrangeiro”, afirma.
Vale lembrar, sempre, que os contratos internacionais de commodities são padronizados com cláusula arbitral em Londres e regidos pela lei inglesa. Por isso, para o operador brasileiro, há que se ter cuidado não dobrado, mas sim triplicado. Isso porque se uma proposta de acordo for frouxamente delineada, com brechas para erros no estabelecimento do preço ou com alegações que o próprio contrato já previa que não são válidas, vai gerar discussão e poderá sair mais caro do que cumprir o contrato, se isso for possível, é claro”, destaca a doutora em agronegócios.