Estudo conduzido pela Embrapa Trigo (RS) e a Rede Técnica Cooperativa (RTC/CCGL) no Rio Grande do Sul mostrou que a associação entre genética de qualidade e manejo eficiente da cultura do trigo é capaz de reduzir os custos de produção em aproximadamente R$ 400,00/ha sem prejudicar o potencial produtivo dos grãos. A utilização de cultivares de alto padrão genético oferece ao produtor a possibilidade de ajustar o volume de sementes no plantio, ao mesmo tempo em que otimiza o uso de fungicidas, mantendo a rentabilidade do cultivo.
A pesquisa avaliou duas linhas de manejo no trigo na safra 2020: uma visando à redução da população de plantas, e outra com o uso racional de fungicidas, aproveitando fatores da genética das cultivares como aliados. A economia de R$ 400,00 por hectare é resultado da soma de R$ 140,00/ha em sementes e R$ 275,00/ha em fungicidas. Considerando o preço da saca de trigo comercializado em 2020 (R$ 70,00/sc) e a média CEPEA de 10 anos (R$ 40,00/sc), a redução de custos representa o valor de seis a dez sacas de trigo por hectare.
Se o cálculo for ampliado para os 900 mil hectares de trigo cultivados no RS em 2020, a economia chegaria a R$ 360 milhões com sementes e fungicidas, valor que poderia ser reinvestido em tecnologias capazes de promover o potencial produtivo das lavouras, como o uso de fertilizantes, que além de aumentar a produtividade do trigo também podem ser aproveitados na cultura subsequente, como a soja no verão, melhorando a rentabilidade em todo o sistema de produção
O investimento em sementes e fungicidas tem sido fundamental para garantir a produtividade no trigo. Entretanto, ambos os dispêndios são rentáveis até um limite. Quando em excesso, os supostos benefícios podem se transformar apenas em custos de produção. “Excessos no uso de insumos em determinadas situações levaram a uma falsa imagem de que o trigo não gera renda. Queremos desmistificar essa crença, provando que é possível ganhar dinheiro com o cultivo do trigo, estimulando os produtores a investirem na cultura de modo assertivo”, conta o engenheiro agrônomo da Embrapa Trigo Giovani Faé.
“Com a pesquisa, mostramos que é possível gerar renda no inverno com a cultura do trigo, fazendo uso de boa genética, manejo eficiente e uso de semente de qualidade”, resume o engenheiro agrônomo da RTC/CCGL Geomar Corassa.
Densidade de plantas não garante maior rendimento de grãos
Para demonstrar que é possível diminuir a quantidade de sementes por hectare sem prejudicar o rendimento final da lavoura, foram instaladas faixas de população de plantas em 20 áreas expositivas, em 17 municípios do Rio Grande do Sul. A cultivar utilizada foi a BRS Belajoia, instalada nas áreas com três densidades de semeadura: 40, 60 e 80 plantas por metro de fileira. Em cada local, a área total chegou a três hectares, destinando um hectare para cada faixa de população.
Para avaliar a resposta do rendimento de grãos à densidade de plantas, as lavouras expositivas foram instaladas em regiões mais quentes, que sofrem mais com os estresses do ambiente, e em regiões de clima mais ameno, que possibilitam maiores produtividades nos cultivos de inverno. Dessa forma, a pesquisa contemplou toda a metade norte do RS, onde está concentrada grande parte da produção de trigo no estado. As semeaduras seguiram o calendário indicado pelo zoneamento agrícola para cada local, com as operações efetuadas entre 25 de maio a 27 de julho, em época considerada ideal para a expressão do potencial produtivo da cultura.
A pesquisa mostrou que o aumento na densidade de plantas não representou ganhos significativos no rendimento final de grãos, mesmo em diferentes ambientes de produção. A média de rendimentos variou de 64 a 67 sacos por hectare, mas os custos quase dobraram, passando de R$ 234,00/ha na densidade de 43 pl/m para R$ 415,00/ha na densidade de 76 pl/m. “Esses resultados demonstram que os custos no aumento do volume de sementes não se reverteram em lucro financeiro”, explica Faé.
Lógica de plantio deve ser por metro linear, como na soja
“Em geral, o produtor tem adotado 150 quilos de sementes de trigo por hectare, mas na soja e no milho o cálculo é efetuado em plantas por metro linear. Queremos mostrar nesse trabalho que a implantação do trigo também deve seguir essa lógica de plantas por metro linear, e não a de quilos por hectare”, esclarece o engenheiro agrônomo da CCGL, explicando que o ajuste considera a variação de PMS (Peso de Mil Sementes) e a germinação nos lotes, que podem impactar no volume de sementes e reduzir custos de produção. “Para que o posicionamento seja assertivo, é importante que o produtor conheça a qualidade da sua semente”, recomenda.
Para o pesquisador da Embrapa Trigo Eduardo Caierão, o produtor precisa conhecer o histórico da área e o potencial genético da cultivar que está usando para definir a densidade de semeadura: “O produtor tende a investir numa densidade maior por segurança, considerando os riscos de um ambiente desfavorável à cultura. A partir do histórico da área, como qualidade do solo, problemas mais recorrentes de pragas e doenças, associados às previsões climáticas, é possível definir o quanto pode arriscar reduzindo a população de plantas, ajustando os custos tanto em cenários de alta produtividade, quanto num cenário de ambiente menos favorável ao trigo”, pontua.
Segundo ele, uma média bastante segura fica na faixa de 250 sementes aptas por metro quadrado. “É preciso destacar que estamos falando de semente de qualidade. Temos visto que o produtor aumenta o volume de sementes porque não garante a qualidade”, complementa Caierão, lembrando que a taxa de uso de semente certificada de trigo no RS ainda é baixa, próximo a 60%.
O custo da semente de trigo no RS foi em média de R$ 2,20/kg na safra 2020. Considerando a população recomendada de 43 pl/m (ou 250 sementes/m², cerca de 86 kg/ha), quando comparado aos 150 kg de sementes/ha tradicionalmente utilizados nas lavouras gaúchas, a redução de custos chega a R$ 140,00/ha. Além de reduzir custos, o ajuste na densidade de sementes também reduz o risco de acamamento em cultivares mais altas, permitindo o aumento das doses de fertilizantes nitrogenados que potencializam o rendimento na lavoura.
A redução no desembolso em insumos pode, num primeiro momento, inquietar empresas e profissionais que historicamente investem na cultura do trigo. Por isso, antes da divulgação da pesquisa, a Embrapa Trigo convidou sementeiros que atuam no mercado de trigo gaúcho para discutir os resultados do trabalho. Para o diretor administrativo da Associação dos Produtores e Comerciantes de Sementes e Mudas do Rio Grande do Sul (Apassul), Jean Carlos Cirino, o tema necessita de muito estudo e discussão: “É preciso deixar claro que a recomendação de população de plantas, assim como o completo posicionamento da cultivar, cabe ao obtentor vegetal. São vários os fatores e implicações técnicas para se chegar ao posicionamento de uma cultivar de trigo e seu desenvolvedor é o maior interessado em ser assertivo”.
A expectativa da Embrapa Trigo é que a redução nos custos de produção possa servir de incentivo ao aumento da área com trigo na Região Sul, movimentando também a comercialização de semente certificada.