Dentro da imensa diversidade de insetos existentes, as abelhas são, sem dúvida, um dos mais importantes polinizadores. O trabalho efetuado por esses polinizadores, em especial as abelhas, representou R$ 43 bilhões, aproximadamente, para a economia brasileira em 2018. Do ponto de vista doméstico, a polinização garante nosso cafezinho, tão apreciado mundialmente, além de diversas frutas e grãos que fazem parte de nossa dieta e que representam importantes commodities para o mercado nacional e mesmo internacional.
Apesar desse importante – e bilionário serviço, dito ecossistêmico – as abelhas estão ameaçadas em todo o mundo, inclusive no Brasil, comenta a pesquisadora a pesquisadora do Instituto Biológico, Érica Weinstein Teixeira. “Essa ameaça ocorre principalmente, segundo cientistas de todo o globo, por conta de causas multifatoriais, que vão desde as mudanças climáticas, até o uso de grandes áreas com monoculturas que implicam em perdas de habitat, passando pela utilização inadequada de defensivos agrícolas, à desnutrição e doenças desses insetos”, afirma.
A Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, por meio de seu Instituto Biológico (IB-APTA), se debruça a estudar as doenças que acometem as abelhas há mais de uma década, mantendo em Pindamonhangaba o único laboratório especializado de sanidade apícola do país. Os trabalhos desenvolvidos pela unidade de pesquisa têm contribuído para a geração de conhecimento sobre o declínio das abelhas e ajudando na compreensão de mecanismos para salvar a vida desses insetos.
Segundo a pesquisadora do IB, o declínio de polinizadores figura como uma das grandes ameaças à humanidade em tempos atuais, tanto no que diz respeito à produção de alimentos, como ao desequilíbrio de ecossistemas. “As abelhas, assim como qualquer outro animal, são acometidas por microrganismos patógenos e parasitas e, em virtude da debilitação fisiológica que pode ser causada por qualquer um dos fatores mencionados estão cada vez mais vulneráveis. Esses fatores podem agir de forma única ou combinada, em diversas intensidades. Em formas mais graves, as colônias podem sucumbir e entrar em colapso”, explica a cientista especialista em sanidade apícola e que realizou seu pós-doutorado na área na United States Department of Agriculture e na Iowa State University (USDA) .
Estudo inédito desenvolvido pelo IB em conjunto com a Universidade de São Paulo (USP) e Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) aborda um desses microrganismos que afetam as abelhas Apis melliera africanizadas, predominantes no Brasil. A pesquisa foi publicada na revista científica internacional Journal of Insect Physiology
O trabalho focou o fungo Nosema ceranae, que pode causar diversas alterações fisiológicas e de comportamento nas abelhas melíferas africanizadas. A pesquisa demonstrou pela primeira vez que a infecção natural por N. ceranaedeprime o sistema imune de abelhas campeiras. “Descobrimos que este microrganismo é prejudicial ao sistema imune de abelhas mais jovens e mais velhas, já a dispersão, mitigação e controle da doença, irá depender do contexto social da colônia”, explica a pesquisadora.
Érica ressalta que este fungo unicelular vem sendo apontado como um dos responsáveis por declínio de populações de abelhas e colapsos no Hemisfério Norte. Pesquisas conduzidas pelo Instituto Biológico, juntamente com outras instituições brasileiras, já demonstraram, porém, que a sua ocorrência não é recente no país, estando amplamente presente no Brasil há pelo menos três décadas.
“Portanto, ele não é uma nova ameaça, diferentemente do que vem sendo preconizado para sua presença em clima temperado e em abelhas melíferas europeias. Nosso grupo de pesquisa demonstrou ainda que em colônias bem manejadas esse fungo não causa colapsos”, explica Érica ao se referir aos trabalhos sequencialmente produzidos pelo LASA relacionados a este microorganismo.
O “bem manejadas” significa que se as colônias tiverem boa alimentação ao longo de todo o ano, troca de quadros velhos por cera alveolada, por exemplo, além de todos os cuidados preconizados para as boas práticas apícolas, estarão aptas a lidarem de forma mais efetiva frente aos diversos estressores biológicos ou não presentes. Com isso, elas terão o sistema imunológico mais forte para conseguir vencer esse e outros fungos que elas têm contato.
“Ocorre que em grandes áreas em que são exploradas uma única cultura, as abelhas vivem em determinadas épocas do ano em um grande deserto de recurso alimentar, não tendo alimentos disponíveis, sem falar em abrigos naturais destruídos. Por isso, é muito importante pensarmos em formas de proteger esses organismos que trazem, inclusive, melhores produtividades para essas culturas, com seu serviço ecossistêmico”, explica a pesquisadora do IB.
Com a nova descoberta, Érica explica que os cientistas sabem que considerando a existência de diversos mecanismos sociais e individuais para reduzir infecção por fungo e sua dispersão na colônia, as abelhas podem responder de forma diferente, dependendo do contexto social. “Ficou demonstrado então que, dada à existência de mecanismos sociais e individuais para reduzir a infecção por fungos e sua dispersão na colônia, abelhas podem responder de forma diferente, dependendo das condições de criação”, afirma.
Pesquisas do IB são consideradas de ponta e ajudam na construção do conhecimento sobre abelhas em todo o mundo
Desde meados de 2006, pesquisadores de todo o mundo alertam de forma mais intensa para o declínio das abelhas e o impacto do sumiço desses polinizadores para todo o ecossistema, mas também para a economia, principalmente, para o Brasil, país que tem a agricultura como um de seus grandes pilares de sustentação econômica.
Cientistas de todo o globo desenvolvem diversas pesquisas para explicar os motivos desse sumiço. O Instituto Biológico, um dos seis Institutos de pesquisa ligados à Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA), tem contribuído para o avanço do conhecimento nessa área, por meio de estudos conduzidos com participação de diversas instituições científicas do Brasil e do exterior.
Os trabalhos são desenvolvidos no Laboratório Especializado de Sanidade Apícola (LASA) do IB localizado em Pindamonhangaba, interior paulista. Este é o único do país na área e realiza diagnóstico de vírus, fungos, bactérias e parasitas que acometem as abelhas Apis mellifera africanizadas.
“Dentre outras atividades de pesquisa, nosso laboratório tem capacidade para identificar o DNA e o RNA de patógenos ou parasitas presentes e possíveis variações de genótipos, que levam a diferenças em termos de virulência e forma das doenças se instalarem”, afirma Érica.