O governo brasileiro realizou consulta pública para o Plano Safra 2021/2022 – um assunto de interesse nacional, dado que a contribuição do agronegócio para a economia brasileira é ainda mais importante neste momento em que outros setores estão seriamente afetados pelas restrições causadas pela pandemia da Covid-19. Para além das exigências do curto prazo, é importante que os recursos que financiarão a próxima safra também favoreçam a modernização do agronegócio, incentivando seu alinhamento às exigências ambientais e climáticas dos importadores e dos acordos internacionais firmados pelo Brasil.
Para a Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura – movimento formado por mais de 280 representantes do agronegócio, setor financeiro, sociedade civil e academia – isso é fundamental para preservar a competitividade internacional.
“Como principal instrumento de implementação da política agrícola brasileira, o Plano Safra precisa não só viabilizar a produção agrícola, mas também atuar estrategicamente para salvaguardar sua competitividade no curto, médio e longo prazos. Isso não pode ser feito sem total alinhamento às metas climáticas que nosso país assumiu e que estão sendo cobradas internacionalmente”, explica Juliano Assunção, líder da Força-Tarefa Finanças Verdes da Coalizão Brasil e diretor executivo do Climate Policy Initiative (CPI), PUC-Rio. “A boa notícia é que o Brasil já domina práticas produtivas de baixas emissões de carbono e o monitoramento necessário para assegurar que os projetos financiados não incluam desmatamento ou conversão de áreas naturais, bem como exigência de legalidade das terras registradas no Cadastro Ambiental Rural”, destaca.
Em suas sugestões ao governo, a Coalizão Brasil partiu do fato de que o país já conseguiu aumentar a produtividade agropecuária sem elevar o desmatamento. A entidade também considerou a necessidade de por em prática o artigo 41, II e parágrafo 1o. do Código Florestal (Lei 12.651/2012), que coloca o crédito (entre outros instrumentos) como caminho para regularização ambiental de imóveis rurais. E lembrou que é necessário simplificar e desburocratizar programas e fontes de financiamento, pois lidar com uma multiplicidade de regras e de linhas de crédito distintas é custoso tanto para os produtores como para as instituições financeiras. “Reduzir a complexidade e distorções do crédito rural facilitará o acesso pelos produtores e estimulará a competição entre as instituições financeiras, melhorando as condições de financiamento no mercado”, ressalta Leila Harfuch, também líder da Força-Tarefa da Coalizão Brasil e gerente geral da Agroicone.
Estudos do CPI/PUC-Rio em conjunto com o Banco Central do Brasil mostram que o aumento da oferta de crédito pode aumentar a produtividade rural e, ao mesmo tempo, reduzir as pressões por desmatamento. Uma parcela significativa de produtores, em geral pequenos, enfrentam restrições relevantes no acesso ao crédito e não conseguem investir adequadamente em suas operações. Um aumento da disponibilidade de crédito para esse grupo permite, portanto, que eles façam um uso mais intensivo da terra. A consequência é uma menor expansão da área agropecuária e maior preservação das florestas.
Recentemente, a política agropecuária brasileira teve avanços relevantes no alinhamento entre instrumentos financeiros e práticas sustentáveis, conforme apontou a Coalizão Brasil. O Banco Central lançou, em 2020, a dimensão da sustentabilidade de sua agenda BC#, com o anúncio do Bureau Verde de Crédito Rural e da intenção de gerar incentivos para tornar o crédito rural mais verde. A Resolução No. 4.824 do Conselho Monetário Nacional (CMN) de junho de 2020 aumentou em até 10% o limite de crédito de custeio no Plano Safra 2020-2021 para produtores com o CAR (Cadastro Ambiental Rural) validado, que é um primeiro passo para a conformidade com o Código Florestal. Outra medida importante nesse Plano Safra foi permitir o financiamento da aquisição de CRA (Cotas de Reserva Ambiental, cuja principal função é servir como mecanismo de compensação de Reserva Legal). Além disso, o Banco Central sinalizou a possibilidade de aumento dos limites de crédito para operações com características sustentáveis em até 20%.
Expandir o mercado de seguros rurais é uma frente importante de política pública. Para os anos agrícolas de 2019/2020 e de 2020/2021, foram anunciados aumentos significativos no financiamento do Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural (PSR), alcançando R$ 1 bilhão e R$ 1,3 bilhão, respectivamente. No entanto, a disponibilidade e o acesso a seguros rurais e outros instrumentos de gestão de risco ainda é limitada, e o orçamento esperado ainda sofre contingenciamentos. É importante viabilizar instrumentos para reduzir as assimetrias de informação e permitir às seguradoras avaliarem melhor o risco dos produtores. O Bureau Verde que está sendo construído pelo Banco Central pode contribuir nessa direção ao permitir que seguradoras tenham informações confiáveis sobre produtores com boas práticas de manejo e, em consequência, com risco menor. Há o potencial para a formação de um ciclo virtuoso.
“Aprimorar as políticas públicas voltadas ao setor rural consiste em reduzir distorções e canalizar recursos para ações e programas com maior retorno econômico, social e ambiental. A sinergia e coordenação de esforços entre os diversos órgãos e esferas governamentais é primordial para tornar a política pública mais eficiente e eficaz”, recomendou a Coalizão Brasil em sua contribuição na Consulta Pública.