Temos verificado um aumento do desemprego, redução acentuada do consumo, queda das encomendas na indústria e aumento da capacidade ociosa. Além da crise humanitária causada pelo COVID-19. O agronegócio, infelizmente não passará incólume.
A alta produção e produtividade da safra a ser colhida já está contratada. Um ponto positivo a se destacar será a redução dos custos de petróleo e derivados beneficiando a colheita. Na soja, por exemplo, o Brasil deve consolidar sua posição de maior produtor do mundo.
Algodão e milho, terão suas quedas de preço compensadas pelo aumento da produção a ser comercializada. O café preocupa, além de tudo, por questões sazonais típicas da cultura.
Também a retomada das exportações das commodities que acontecerá, puxada pela recuperação da China, deve aliviar a redução de renda do campo, e contribuir decisivamente para a manutenção de elevados superávits na balança comercial, garantindo uma diminuição na volatilidade da cotação do dólar. Apesar dos acordos firmados com os EUA, a China enxerga o Brasil como um parceiro confiável de longo prazo.
Da mesma forma na pecuária bovina, suinocultura e avicultura, vemos o setor externo como polo dinâmico de sustentação da atividade econômica.
O governo promete fazer a sua parte, com programas de alivio temporário à perda de renda de setores vulneráveis da população, suporte ao pequeno e médio empresário, expansão generalizada de crédito e redução de juros.
Será suficiente? Os programas de estímulo lastreados no “Orçamento de Guerra” terão que passar por ajustes ao longo do processo, calibrando as doses das diversas políticas.
Quanto aos produtos agrícolas de consumo interno, infelizmente, correm o risco de redução de preços, o que é bom para o consumidor, baixa inflação, mas prejudica o produtor afetando o plantio da próxima safra.
Num momento de tumulto, o sério problema logístico e de armazenagem agravam a situação. A presença forte do Ministério da Agricultura será necessária. Afinal o agronegócio representa um quinto do PIB do Brasil.
Um reforço urgente tem que ser pensado para a agricultura familiar. São muitos pequenos agricultores gerando um baixo valor agregado, e sem reserva de capital. Suas culturas são pouco intensivas em tecnologia e com baixo acesso aos canais de distribuição.
A crise atinge diretamente o setor de hortifrutigranjeiros, talvez o mais prejudicado e a merecer a maior atenção das autoridades no agro.
Outro ramo do agronegócio que preocupa é o sucroenergético: a crise não é apenas severa, aconteceu de forma muito rápida, como nunca antes.
Juntou-se à queda generalizada do PIB das principais economias, uma guerra de preços protagonizada pela Rússia e Arábia saudita, reduzindo o preço do barril de petróleo em mais de 60% num primeiro instante!
Obviamente, havendo repasse ao preço da gasolina, inviabiliza o etanol como sucedâneo. Infelizmente, num momento no qual se previa uma grande safra. Algumas unidades podem enfrentar escassez de caixa no momento crítico de início da safra, período em que se concentram os maiores desembolsos. Sem contar o fato de que algumas usinas tem exposição cambial, endividamento em dólar.
A paralisia econômica levou à uma redução no movimento dos postos de combustível de mais de 50%, num primeiro momento.
E o mercado internacional do açúcar não está ajudando, com elevado nível de estoques globais, e o Brasil vivendo um momento de elevada produção. O preço internacional do açúcar não se sustentou. Ainda bem que muitos produtores se beneficiaram da venda antecipada da maior parte da sua produção açucareira.
Voltando ao etanol, apesar de antipática, talvez a saída seja não repassar toda a queda de preço da gasolina ao consumidor, garantindo a paridade, para não corrermos o risco de desestruturar o estratégico setor sucroalcooleiro ao levar as unidades a comercializarem abaixo do custo de produção.
Para toda a nossa economia, a questão principal é a duração da paralisia da atividade econômica e consequentemente a quando começará a retomada do crescimento.
Ainda não temos elementos para afirmar que a saída da crise em que vivemos será em V ou em U. Se conseguirmos equacionar rapidamente o problema de saúde pública, em alguns meses veremos este momento no retrovisor. É o cenário desejado, crise em V.
(*) José Milton dos Santos Pestana Barbosa é Sócio e líder de operações da BlueTrade, uma das cinco maiores operações da XP Investimentos