O uso de espécies nativas em sistemas de integração agropecuários, além de agregar valor com a diversificação de produtos florestais de qualidade, é uma alternativa para produzir alimentos de forma mais equilibrada com o meio ambiente. Para a pesquisadora Maria Luiza Nicodemo, da Embrapa Pecuária Sudeste (São Carlos – SP), é necessário pensar em recuperação de serviços ambientais para a manutenção da estabilidade do planeta. “Acho que temos que pensar em modelos de produção mais sustentáveis, mesmo sendo mais complexos”, destaca.
A presença de árvores promove serviços importantes para o ambiente, que se reflete em melhorias para o solo e para a conservação da água, por meio do aumento de matéria orgânica na área, da atividade microbiológica e da ciclagem de nutrientes, podendo assim promover alterações na fertilidade e a maior infiltração e retenção de água no solo. O componente arbóreo também regula o microclima, favorecendo a o bem-estar animal, com reflexos na produção de carne e leite. A pastagem com as árvores aumenta também a diversidade de fauna, auxiliando no controle de pragas e de doenças. Além disso, diminui a pressão por abertura e desmatamento de áreas florestais, com o incremento na produtividade.
Se o produtor optar trocar o eucalipto por espécies florestais nativas, o aumento da biodiversidade no sistema e o potencial de recuperar serviços ambientais é mais significativo ainda.Outra vantagem é a econômica. Geralmente, a madeira dessas espécies tem mais qualidade, por isso o retorno financeiro é melhor.
A integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF ou agrossilvipastoril) e a integração Pecuária-Floresta (IPF ou silvipastoril) com componente arbóreo nativo são bastante tímidas no país. A Amazônia trabalha com nativas há muito tempo e de uma forma consistente. Já na região Sudeste utiliza-se principalmente o eucalipto em integração, assim como em outras regiões.
A pesquisadora ressalta que há muitas espécies com grande potencial, mas faltam informações. “Ainda não há muito trabalho de seleção e melhoramento com foco em nativas, diferente do eucalipto que já está mais consolidado em sistemas de integração”, comenta.
Em busca de respostas, um experimento na Embrapa Pecuária Sudeste utilizou sete espécies nativas em integração silvipastoril para caracterizar os serviços ecossistêmicos, como produção de alimento e de biomassa, manutenção de água e fertilidade do solo.
Foram usadas árvores para diversas finalidades – madeireiras, melíferas e as chamadas tutoras (que auxiliam no crescimento retilíneo das madeireiras). As espécies plantadas foram mutambo, capixingui, angico-branco, canafístula, ipê-felpudo, jequitibá-branco e pau-jacaré.
Um resultado interessante nesse sistema foi em relação a parasitas. Ficou comprovado, por exemplo, que a infestação por moscas-dos-chifres na área de pastagem com nativas foi 38% menor quando comparada às pastagens convencionais, demonstrando que as alterações de microclima e microfauna afetam a dinâmica da população. A análise dos dados de contagens de carrapatos não mostrou diferenças significativas. Em relação aos vermes gastrintestinais e aos bernes, os testes nos dois sistemas mostraram médias de parasitismo semelhantes.
Segundo Maria Luiza, a diversificação das espécies é recomendável para o controle de pragas e doenças em áreas com nativas. O indicado é o produtor ter uma combinação de árvores de acordo com a finalidade do sistema. A integração com nativas, de uma forma geral, contribui para aumentar a biodiversidade agrícola com diversificação de produtos diretos (madeira, lenha, carne, leite) e benefícios indiretos como fertilidade do solo e maior produtividade do capim.
A pesquisadora enfatiza que não tem receita de bolo. O produtor precisa planejar e avaliar cada etapa do processo – desde a implantação até o mercado consumidor para os produtos. “O pecuarista precisa estar disposto a mudar e a encontrar caminhos para conciliar as demandas produtivas à capacidade dos ecossistemas”, finaliza.