Por Robinson Cannaval Junior * – A cadeia de produção de alimentos vive um momento de grandes transformações, impulsionado por fenômenos recentes ou pela aceleração exponencial de tendências. A evolução da biotecnologia, as transformações climáticas, a mudança do comportamento dos consumidores (consumo consciente) e a automação, entre tantos outros exemplos, de maneira isolada poderiam vir a ter um impacto significativo sobre o setor do agronegócio. Em conjunto, essas tendências poderão redefinir a estrutura, a conduta e o desempenho das empresas no segmento.
O mercado de insumos agrícolas tem assistido a grandes movimentações: internacionalmente, fusões e aquisições entre grandes players da indústria e, no Brasil, aquisições de distribuidores tradicionais por investidores estratégicos e fundos. Mesmo após a onda recente de aquisições por investidores estratégicos e fundos de investimentos, o mercado brasileiro de insumos ainda é bastante fragmentado: os cinco maiores distribuidores são responsáveis por apenas 6% do mercado. O restante se divide em cooperativas (27%), venda direta (25%) e a soma de outros distribuidores (42%). Nos Estados Unidos, para se ter uma comparação, os cinco maiores distribuidores são responsáveis por 39% do mercado.
O Brasil é o principal mercado mundial de defensivos agrícolas, mas seu uso é mais eficaz no país que em outros países produtores. O volume comercializado de fertilizantes tem aumentado em praticamente todas as safras, mas a participação de empresas brasileiras nesse mercado vem decrescendo desde 2016. De acordo com os dados da ANDA, o ano de 2018 fechou com 35,7 milhões de toneladas de fertilizantes entregues, sendo 23% desse volume de produto nacionais. Em 2016, essa porcentagem foi de 27% para 33,5 milhões de toneladas. A oferta de fertilizantes no Brasil está concentrada em quatro fornecedores e um deles entrou com pedido de recuperação judicial no primeiro trimestre deste ano.
Ainda no comparativo do mercado, os fertilizantes especiais, de alto valor agregado, têm tido um crescimento de 18% a.a., muito acima do mercado como um todo. Este segmento já movimenta quase R$ 8 bilhões, dos quais 70% vêm de fertilizantes foliares.
Apesar do forte componente de importação e da concentração de fornecedores, os preços de fertilizantes não têm conseguido acompanhar o dólar nos últimos anos. O mercado segue de perto os preços da soja com a relação sacas de soja por toneladas de produto estáveis entre 2014 (19,8) e 2018 (20,6).
Em se tratando de fatores externos, as pressões biológicas, regulatórias e jurídicas colocam em xeque a continuidade no uso do glifosato, principal defensivo químico para a agricultura. Porém, ainda não existem produtos que possam substituí-lo com igual eficácia.
O assunto é delicado e deve ser visto de vários prismas: são apurados quase 500 casos de ervas daninhas resistentes ao glifosato no mundo e, em 2019, a empresa responsável recebeu condenações no montante de cerca de US$ 2,3 bilhões por danos à saúde de pessoas expostas ao glifosato. Alguns países têm estudado banir o uso de glifosato, por pressões ambientais. A Alemanha já anunciou o início da descontinuidade no uso do herbicida, que deve ser totalmente banido do país até 2023. Contudo, o banimento do glifosato também pode ter efeitos ambientais negativos, como a pressão pelo aumento de área cultivada, o aumento de emissões de gases de efeito estufa (menor eficiência na produção e transporte de alimentos) e o aumento do uso de defensivos menos eficazes.
Ainda falando do mercado, os produtores brasileiros têm buscado cada vez mais alternativas para a redução de custos com defensivos agrícolas. Como consequência, produtos genéricos e uso de controle biológico de pragas têm tido destaque. Em 2015, os genéricos tinham uma fatia de 38% dos defensivos. Apenas dois anos depois, em 2017, já correspondiam a 51% do mercado.
É preciso que os players estejam então, cada um em sua área (produtores agrícolas, distribuidores e indústria) atentos a uma série de perguntas, como o que o mercado quer (visando desde concorrentes até o consumidor final), as tendências de consumo do produto direta e indiretamente, além de acompanhar as tecnologias existentes e as novas que chegam no setor.
Sobre o futuro, a chegada da chamada “agricultura 4.0”, trazendo tecnologias que prometem reduções de até 90% no volume de aplicações de alguns produtos, pressionará a indústria a rever seus modelos de negócio. Uma hipótese é que ao invés de vender litros ou quilos de produto, a indústria terá que pensar o seu negócio como provedor de soluções integradas de produtividade.
Em resumo, o Brasil é um grande mercado de fertilizantes e defensivos, porém movimentações recentes e novas tecnologias aumentam a complexidade de competição neste mercado. E os players, tanto da indústria, como distribuidores de insumos e os produtores do agronegócio, que quiserem se manter terão que encarar esses novos fatores determinantes de frente e se preparar para esse novo mercado em constante mutação.
(*) Robinson Cannaval Jr é Sócio fundador e diretor do Grupo Innovatech, Diretor executivo da Innovatech Consultoria, Formado em Engenharia Florestal pela ESALQ/USP, com especialização em Gestão estratégica de Negócios pela Unicamp e MBAs em Finanças e Valuation pela FGV.