Veículos elétricos vêm ganhando mercado em vários países do mundo. Na China, os investimentos na fabricação de veículos elétricos colocam o país na liderança desse mercado. Na Europa, países como Noruega, Irlanda, Holanda, França e Reino Unido anunciaram a proibição da venda de carros movidos por motor a combustão em prazos que variam de 2025 a 2040. Nos Estados Unidos, a Tesla se tornou a companhia automotiva de maior valor de mercado e veículos elétricos são apresentados como parte de uma ruptura tecnológica no setor de transportes.
No Brasil, o uso de veículos elétricos ainda é estatisticamente insignificante, mas essa nova realidade começa a estabelecer suas bases por aqui. Além das indústrias que têm vínculo direto com o tema, a perspectiva dos veículos elétricos já chegou ao público mais amplo, com séries de reportagens veiculadas na televisão e nas imprensas especializadas em veículos automotores4 e em biocombustíveis. Esse último setor merece particular reflexão, pois o Brasil é singular na produção e uso de biocombustíveis e a eletrificação de veículos tem potencial para alterar esse mercado, em especial do etanol.
Nesse contexto, a Presidência do Conselho de Administração e a Direção Geral do CNPEM criaram um grupo de trabalho que atuou ao longo de seis meses para diagnosticar a situação. O grupo trabalhou com base no conhecimento existente no CNPEM e em publicações recentes sobre o tema. O grupo também organizou a Reunião Estratégica “Futuro da motorização de veículos: eletricidade ou combustíveis?”, realizada na sede do CNPEM. A reunião compôs um painel diversificado de opiniões de profissionais da academia e da indústria, com conhecimento técnico e de mercado nas áreas de energia elétrica, combustíveis e veículos automotores. O presente documento sintetiza o resultado desse processo de diagnóstico. O documento analisa os cenários global e brasileiro nas áreas de eletrificação de veículos e biocombustíveis, discute as singularidades brasileiras com especial atenção ao etanol e propõe caminhos para o desenvolvimento dos biocombustíveis no Brasil em sintonia com um contexto mais amplo de descarbonização.
O avanço das energias solar e eólica se deve a avanços da tecnologia e melhorias das condições de financiamento, o que vem permitindo quedas consistentes do custo da energia gerada. As baterias para veículos elétricos parecem trilhar caminho semelhante, embora o consumo global de energia por veículos elétricos ainda seja relativamente pequeno. No atual estágio da tecnologia, a viabilidade econômica dos veículos elétricos depende de mercados nicho ou de subsídios. No entanto, com a queda do custo das baterias, espera-se que os veículos elétricos venham a alcançar custos competitivos ao longo das próximas décadas.
A China lidera nas novas tecnologias de eletrificação. Ela produz mais de 60% das células e dos módulos fotovoltaicos do mundo. Dos 54 TWh (0,19 EJ) de eletricidade consumida em 2017 por veículos elétricos, 91% do consumo ocorreu na China, principalmente em ônibus e veículos de duas rodas. A frota mundial de carros elétricos de passageiros atingiu 3,1 milhões de unidades em 2017 (0,25% da frota mundial). Desses carros elétricos, 40% estão na China, comparado com 25% na Europa e 25% nos Estados Unidos.
Os cenários para o futuro do sistema energético global divergem principalmente na aceitação ou não da premissa de descarbonização, entendida como alinhamento às metas do acordo de Paris. Em todos os cenários, bioenergia e biocombustíveis crescem em termos absolutos até 2050-2060. Em ter- mos relativos, a bioenergia fica estacionada em 10,1-12,0% da energia primária (sem descarbonização) ou cresce para 17,6-23,2% (com descarbonização). Por sua vez, os biocombustíveis crescem em todos os cenários, partindo de 4,8% da bioenergia em 2014 para 11,9-20,7% em 2050-2060. O crescimento dos biocombustíveis reflete sua modernidade dentro da bioenergia, o que lhe dá vantagem sobre bioenergias tradicionais (como a lenha) para as quais se buscam substitutos mais modernos.