Ao completar 40 anos, Associação Brasileira de Sementes e Mudas (Abrasem) considera um dos principais desafios do setor está no combate à pirataria e a conscientização dos produtores na adoção de sementes certificadas.
“Essas ferramentas são de extrema importância e pode oferecer maior produtividade e renda ao agricultor”, diz o presidente da entidade Narciso Barison Neto, em entrevista concedida à repórter Fátima Costa, ele reforça também que novas tecnologias ainda estão por vir.
Revista Rural – Recentemente, a Associação Brasileira de Sementes e Mudas (Abrasem) divulgou a 6ª edição dos estudos da Céleres e Céleres Ambiental sobre os impactos econômicos e socioambientais da adoção de biotecnologia nas lavouras brasileiras. Os estudos revelaram que o produtor de uma lavoura de 50 hectares de milho resistente a insetos já acumulou retorno adicional de até US$ 100,4 mil, desde que essa tecnologia foi comercializada no Brasil. Quais são as projeções que a entidade faz quanto ao uso da biotecnologia nos campos brasileiros?
Narciso Barison Neto – De acordo com o estudo, desde que foi implantada no País, em 1996, a biotecnologia proporcionou aos agricultores benefícios econômicos de US$ 18,8 bilhões. Sem dúvida, os ganhos de produtividade são os maiores benefícios. Com relação aos custos, hoje as empresas que detém essa tecnologia sabem que não se podem cobrar preços altíssimos aos agricultores, com isso criaram uma competitividade justa. Nos últimos anos, houve um reajuste neste mercado. Além disso, dados deste estudo apontam ainda para seis resultados relacionados à biotecnologia e os seus benefícios, dentre eles, podemos afirmar que a tecnologia não tem vida longa, em média cada lançamento utilizando no Brasil e no mundo dura apenas 17 anos. Por isso, a cada temporada novos produtos são colocados à disposição do agricultor. Outro dado importante é a característica dessa tecnologia que chega aos campos brasileiros, a exemplo de sementes de soja tolerantes à seca, resistentes às doenças e com adição de ômega 3 e de proteínas na composição. De certa forma, essas ferramentas são de extrema importância e pode oferecer maior produtividade e renda ao agricultor. Outro dado é que temos o compromisso de alimentar cada vez mais pessoas, afinal são 400 mil bebês que nascem todos os dias no mundo. Temos daí, o dever de produzir mais e com melhor qualidade.
Rural – O que ainda falta para que essa biotecnologia, considerada ainda cara, chegue às mãos de mais produtores? A agricultura familiar já pode ser beneficiada por ela?
Barison Neto – De fato, como você colocou, é uma tecnologia ainda cara. Mas, há casos relatados no Rio Grande do Sul em que há propriedades de diferentes tamanhos que já se utiliza desta biotecnologia. Só naquele Estado, segundo dados do governo são mais de 330 mil associados que fazem o uso da tecnologia de sementes. Um número considerado grande. A agricultura familiar pode ser beneficiada e necessita de um incentivo mais apurado de políticas do governo para que o agricultor comece a ter acesso a essa ferramenta por meio dos sistemas, como o Programa Troca a Troca. [Ele se refere ao programa desenvolvido, no início de 2012, pela Secretaria de Desenvolvimento Rural do Rio Grande do Sul que criou o sistema troca-troca do Fundo Estadual de Apoio aos Pequenos Estabelecimentos Rurais (Feaper), que operava com o limite de R$ 200 por agricultor e com juros zero, além de disponibilizar, por meio também do Feaper, 75 mil sacas de milho para a safrinha, que foram ofertadas para os municípios, sindicatos rurais e cooperativas no sistema troca-troca de sementes. O Governo do Estado também anistiou as dívidas dos agricultores que adquiriram sementes pelo sistema troca-troca, totalizando R$ 24 milhões, benefício que atende mais de 210 mil agricultores]. Porém, as sementes transgênicas deixaram de fazer parte do programa Troca-Troca de sementes, em abril do mesmo ano.
Rural – Dados relevam que o uso de sementes certificadas na soja é um dos mais altos dos últimos dez anos. Isso demonstra que o agricultor está mais tecnificado?
Barison Neto – Sim. Há exatamente 15 anos tínhamos uma produtividade de 150 sacas por hectares. Hoje são 300, praticamente o dobro. Resultado do uso de sementes certificadas, do uso da tecnologia e da genética – como o germoplasma – [Elemento dos recursos genéticos que maneja a variabilidade genética entre e dentro da espécie, com fins de utilização para a pesquisa em geral, especialmente para o melhoramento genético]. Com a demanda no mercado, cada vez mais há novas pesquisas. Outro ponto é que quando o produtor de grãos está capitalizado e, sempre que isto ocorre, eles procuram sementes de melhor qualidade, com biotecnologia envolvida e qualidade de germinação vigorosa, o que gera um ciclo em todas as grandes culturas, a exemplo do milho. O Brasil colheu uma produção recorde em 2012 e exportou a marca histórica de quase 20 milhões de toneladas de milho, o dobro das exportações de 2011, o que consequentemente colocou o País na lista de segundo maior exportador do grão, consequência da tecnificação.
Rural – A Abrasem espera um ano favorável para o setor, com crescimento de 10% no faturamento sobre os R$ 9 bilhões estimados. Quais os fatores que podem contribuir para esse aumento?
Barison Neto – Tenho a impressão que o marco regulatório internacional [conjunto de normas, leis e diretrizes que regulam o funcionamento dos setores nos quais agentes privados prestam serviços de utilidade pública] permitiu que as empresas investissem mais. Junto, com a Lei de patentes, essas ações contribuíram para os investidores olhassem para o Brasil como um mercado muito importante de commodities agrícolas. Neste ano, acreditamos que ultrapasse os o faturamento de R$ 9 bilhões anuais.
Rural – Em junho do ano passado, foi realizado o World Seed Congress 2012 – Congresso Mundial de Sementes, o maior evento do setor de sementes do mundo. Mais de 65 países, por meio de suas associações e empresas de sementes, de biotecnologia e máquinas agrícolas, estiveram no Congresso, organizado pela International Seed Federation (ISF) e, no Brasil, pela Associação Brasileira de Sementes e Mudas (Abrasem). Quais foram as contribuições que este evento trouxe para o mercado brasileiro?
Barison Neto – O Congresso Mundial de Sementes foi uma oportunidade para debates sobre temas relevantes, principalmente em relação ao combate a pirataria. O evento também marca a ‘maior idade’ do Brasil, em termos de tecnologia de sementes. O congresso reuniu toda a cadeia produtiva. E se o nosso país foi escolhido e porque o mundo reconheceu a sua importância.
Rural – Dados da Abrasem revelam que o mercado mundial de sementes movimenta US$ 37 bilhões por ano. Só aqui o setor é responsável por US$ 2,6 bilhões e as entidades brasileiras representam 55% desse total. Podemos dizer que o mundo está de olho no mercado brasileiro?
Barison Neto – Nós chamamos a atenção não só pela área das principais commodities, mas também o que chamamos de ‘hortigranjeiro’ que são as pequenas áreas que entram sementes dos mais diversos tipos de plantas e flores. São mais de 700 empresas multiplicadoras, além das gigantes multinacionais. Somos o celeiro do mundo, alimentando o mundo. A FAO [Food and Agriculture Organization] determina que em média um adulto se alimente com 400 gramas/ dia de frutas e verduras, só no Brasil o consumo fica entre 140 a 150 gramas/ dia. Imagine o quanto movimentaria esse mercado interno caso esses números fossem obedecidos. Hoje, o mercado movimenta R$ 600 milhões/ano e de semente até o consumidor são R$ 20 bi – esse segmento é o mais importante no mercado internacional. O mercado mundial de sementes movimenta US$ 37 bilhões por ano.
Rural – De que forma a Abrasem trabalha para fortalecer o setor de sementes e, ao mesmo tempo, incentivar uma agricultura sustentável?
Barison Neto – A agricultura sustentável responde a menos emissão de gás carbono e é uma ferramenta que oferece e uma segurança alimentar – uma vez que inclui um cultivo responsável. A Associação Brasileira de Sementes e Mudas também considera que combater a pirataria e conscientizar os agricultores ainda é os principais desafios do setor para os próximos anos. Digo sempre que o barato sai caro. Gostaria de acrescentar também que a Abrasem está inserida no contexto mundial de sementes e, este ano, quer consolidar ainda mais suas atividades junto à FELAS (Federação Latino-Americana de Associações de Sementes), SAA (Seeds Association of the Americas) e ISF (International Seed Federation).
Rural – Quais são as principais necessidades do produtor atualmente?
Barison Neto – Atualmente, podemos afirmar que a agricultura ainda e sempre será vulnerável às condições climáticas. Porém, o governo criou para os agricultores o Seguro Agrícola, que no ano passado, beneficiou produtores do Sul do País, que perderam 50% de suas safras. Um problema que foi contornado. Outro dado interessante no campo foi a criação de um Marco Regulatório, cada vez mais eficiente. Só que há questões que ainda restam, tais como a política agrícola, o principal gargalo ainda é a questão de logística, armazenagens e principais portos.
Rural – Quais são as novidades que o agricultor pode aguardar para os próximos anos?
Barison Neto – Teremos nos próximos anos dois eventos importantes relacionados à biotecnologia. O primeiro se refere ao lançamento da Intacta no Brasil que está dependendo da aceitação da tecnologia por alguns dos principais mercados importadores, como China e União Europeia, uma tecnologia tolerante à seca e resistente a herbicidas. Outra é a biotecnologia Soja Cultivance, desenvolvida pela Basf em parceria com a Embrapa, que ainda aguarda liberação para comercialização na União Europeia e China. Aprovada no Brasil desde 2009, a Cultivance é uma modalidade resistente a ervas daninhas. Essas novas tecnologias promoverão cultivares mais resistentes e produtivas para o agricultor brasileiro ainda em 2013.